Conclusões do advogado-geral Cosmas apresentadas em 21 de Septembro de 1999. - Angelo Ferlini contra Centre hospitalier de Luxembourg. - Pedido de decisão prejudicial: Tribunal d'arrondissement de Luxemburgo - Grão-Ducado do Luxemburgo. - Trabalhadores - Regulamento (CEE) n.º 1612/68 - Igualdade de tratamento - Pessoas não filiadas no regime nacional da segurança social - Funcionários das Comunidades Europeias - Aplicação de tabelas por despesas médicas e hospitalares ligadas à maternidade. - Processo C-411/98.
Colectânea da Jurisprudência 2000 página I-08081
I - Introdução
1 Com o presente pedido de decisão prejudicial, formulado nos termos do artigo 177._ do Tratado CE (actual artigo 234._ CE), o Tribunal d'arrondissement de Luxembourg (8.° Secção) apresentou ao Tribunal de Justiça uma questão prejudicial sobre a interpretação, por um lado, dos artigos 7._ e 48._ do Tratado CEE (1), do Regulamento (CEE) n._ 1612/68 do Conselho, de 15 de Outubro de 1968, relativo à livre circulação de trabalhadores na Comunidade (2), com as alterações do Regulamento (CEE) n._ 312/76 do Conselho, de 9 de Fevereiro de 1976 (3), e do Regulamento (CEE) n._ 1408/71 do Conselho, de 14 de Junho de 1971, relativo à aplicação dos regimes de segurança social aos trabalhadores assalariados, aos trabalhadores não assalariados e aos membros da sua família que se deslocam no interior da Comunidade, alterado e actualizado pelo Regulamento (CEE) n._ 2001/83 do Conselho, de 2 de Junho de 1983 (4), e, por outro, do artigo 85._, n._ 1, do Tratado CEE. Com mais precisão, o Tribunal de Justiça é solicitado para decidir se a proibição da discriminação entre nacionais dos Estados-Membros da Comunidade e a protecção da concorrência são obstáculo, por um lado, a uma regulamentação nacional luxemburguesa e, por outro, a uma circular da Union des caisses de maladie (união das caixas de seguro de doença, a seguir «UCM») e a uma decisão da Entente des hôpitaux luxembourgeoise (acordo entre os hospitais luxemburgueses, a seguir «EHL»), de que resulta a aplicação de tabelas relativas a cuidados médicos e hospitalares diferentes consoante se trata de pessoas filiadas no regime nacional de segurança social do Luxemburgo ou de pessoas não filiadas nesse regime, tais como, no caso em apreço, os funcionários das Comunidades Europeias, filiados no regime comum de seguro de doença das Comunidades Europeias (a seguir «RCSD»).
II - O quadro legal
A - O quadro legal comunitário
a) Disposições do Tratado e dos regulamentos pertinentes
2 Nos termos do artigo 7._, primeiro parágrafo, do Tratado CEE (que passou a artigo 6._, primeiro parágrafo, do Tratado CE, e a seguir, após alteração, a artigo 12._, primeiro parágrafo, CE):
«No âmbito de aplicação do presente Tratado, e sem prejuízo das suas disposições especiais, é proibida toda e qualquer discriminação em razão da nacionalidade.»
3 Nos termos do artigo 48._, n._ 2, do Tratado CEE (que passou a artigo 48._, n._ 2, do Tratado CE e a seguir, após alteração, a artigo 39._, n._ 2, CE):
«[A livre circulação dos trabalhadores] implica a abolição de toda e qualquer discriminação, em razão da nacionalidade, entre os trabalhadores dos Estados-Membros, no que diz respeito ao emprego, à remuneração e demais condições de trabalho.»
4 Além disso, nos termos do artigo 7._ do Regulamento n._ 1612/68:
«1. O trabalhador nacional de um Estado-Membro não pode, no território de outros Estados-Membros, sofrer, em razão da sua nacionalidade, tratamento diferente daquele que é concedido aos trabalhadores nacionais no que respeita a todas as condições de emprego e de trabalho, nomeadamente em matéria de remuneração, de despedimento e de reintegração profissional ou de reemprego, se ficar desempregado.
2. Aquele trabalhador beneficia das mesmas vantagens sociais e fiscais que os trabalhadores nacionais.»
5 Nos termos do artigo 2._ do Regulamento n._ 1408/71, na versão consolidada pelo Regulamento n._ 2001/83:
«1. O presente regulamento aplica-se aos trabalhadores assalariados ou não assalariados que estão ou estiveram sujeitos à legislação de um ou mais Estados-Membros e que sejam nacionais de um dos Estados-Membros, apátridas ou refugiados residentes no território de um dos Estados-Membros, bem como aos membros da sua família e sobreviventes.»
6 Além disso, nos termos do artigo 3._, n._ 1, do mesmo regulamento:
«As pessoas que residem no território de um dos Estados-Membros e às quais se aplicam as disposições do presente regulamento estão sujeitas às obrigações e beneficiam da legislação de qualquer Estado-Membro, nas mesmas condições que os nacionais deste Estado, sem prejuízo das disposições especiais constantes do presente regulamento.»
7 Por fim, nos termos do artigo 85._, n._ 1, do Tratado CEE (que passou a artigo 85._, n._ 1, do Tratado CE, e depois a artigo 81._, n._ 1, CE):
«São incompatíveis com o mercado comum e proibidos todos os acordos entre empresas, todas as decisões de associações de empresas e todas as práticas concertadas que sejam susceptíveis de afectar o comércio entre os Estados-Membros e que tenham por objectivo ou efeito impedir, restringir ou falsear a concorrência no mercado comum, designadamente as que consistem em:
a) Fixar, de forma directa ou indirecta, os preços de compra ou de venda, ou quaisquer outras condições de transacção.
...»
b) Disposições do Estatuto dos Funcionários das Comunidades Europeias (a seguir «EF») e da regulamentação comum no quadro do RCSD
8 Por força dos artigos 64._ e 72._ do EF, os funcionários das Comunidades Europeias pagam contribuições para o RCSD, que toma a cargo as despesas médicas. Por força do artigo 72._, n._ 1, do EF, o cônjuge do funcionário está coberto contra os riscos de doença visados neste artigo.
9 Tendo em vista, nomeadamente, a aplicação das disposições supracitadas, foi feita uma regulamentação comum relativa aos riscos de doença dos funcionários das Comunidades Europeias. Por força do artigo 2._ desta regulamentação comum, os funcionários são filiados no RCSD. Além disso, o seu artigo 3._ prevê que os cônjuges dos funcionários também são filiados, estando esta filiação submetida a certas condições, relativamente às quais não há dúvidas de que estejam preenchidas, no caso em apreço, quanto à esposa de Ferlini.
10 Nos termos do artigo 72._ do EF, dos artigos 1._, 2._ e 3._ da regulamentação comum e do título VIII do anexo I desta regulamentação, no que diz respeito aos cuidados hospitalares dispensados em caso de parto, na época em que tiveram lugar os factos do processo principal, as despesas reembolsadas pelo RCSD eram os honorários médicos referentes ao parto e à anestesia, assim como as despesas da sala de parto e as despesas de cinesiterapia, e, além disso, todas as outras despesas relativas a prestações ligadas directamente ao parto; estas despesas são reembolsadas a 100%, com um limite máximo. As despesas de estadia no estabelecimento hospitalar eram reembolsadas a 85%, com um limite máximo.
11 O artigo 9._, n._ 2, da regulamentação comum prevê que «as instituições esforçam-se, na medida do possível, por negociar com os representantes do corpo médico e/ou autoridades, associações e estabelecimentos competentes, acordos que fixem percentagens aplicáveis aos beneficiários tendo em conta as condições locais e, se as houver, as tabelas já em vigor, tanto relativamente aos serviços médicos como aos serviços hospitalares».
12 Dos elementos do processo resulta que, à data dos factos objecto do processo principal, não tinha sido concluído qualquer acordo entre o RCSD e o EHL, apesar das iniciativas das Comunidades neste sentido (5).
B - O quadro legal nacional
a) Seguro de doença-maternidade para os filiados no regime nacional
13 Segundo a decisão de reenvio, a legislação nacional aplicável, à data dos factos em litígio no processo principal, aos filiados nas caixas de doença luxemburguesas estava contida essencialmente nos artigos 308._-bis a quater do código da segurança social (6).
14 Atenta a natureza do regime de segurança social querido pelo legislador luxemburguês, as tabelas aplicáveis aos actos médicos são absolutamente uniformes. Elas são fixadas exclusivamente segundo a natureza da prestação e não variam nem em função do rendimento do doente nem em função das qualificações do prestador de cuidados.
15 No que respeita ao seguro doença-maternidade, as pessoas cobertas estão obrigatoriamente filiadas nas caixas de doença, estabelecimentos públicos autónomos dotados de personalidade jurídica, com tutela do Estado. As caixas de doença são principalmente financiadas por meio de contribuições, quer directas quer indirectas.
16 Como indicam tanto A. Ferlini como a Comissão, o sistema aplicável às prestações em caso de maternidade diferia daquele que era válido para as prestações em caso de doença. Na data dos factos objecto do processo principal, o sistema aplicável às prestações em caso de doença previa a celebração de convenções colectivas entre as caixas de seguro e as diversas categorias de prestadores, sem distinção entre os sectores hospitalar e não hospitalar. Portarias ministeriais conferiam força obrigatória erga omnes a estas convenções, mesmo para os prestadores não membros da associação que negociara a convenção (7). Em contrapartida, o sistema válido para o seguro de maternidade tinha por base o pagamento de um montante fixo pelo Estado. Segundo A. Ferlini, o sistema parecia estar mais ligado, na realidade, ao sector dos subsídios familiares que ao sector do seguro de doença.
17 Como é indicado na decisão de reenvio, por força da legislação aplicável na data dos factos objecto do processo principal (leis de 27 de Junho de 1983 e de 3 de Julho de 1975), os beneficiários tinham direito, aquando do parto, a cuidados de uma parteira, a assistência médica, a estadia em maternidade ou clínica, a fornecimento de produtos farmacêuticos e a produtos dietéticos para os recém-nascidos. Estas prestações estavam a cargo do Estado mediante um sistema de montante fixo determinado para cada prestação, separadamente, por regulamento grão-ducal.
18 À data dos factos objecto do processo principal, o regulamento grão-ducal, 31 de Dezembro de 1974 (8), alterado, que tinha por objecto fixar, por aplicação dos artigos 6._ e 13._ do código da segurança social, as prestações em espécie no caso de doença e de maternidade. O artigo 12._ deste regulamento determinava o montante fixo supramencionado e pormenorizava os diversos componentes deste montante e os preços correspondentes a cada um deles.
19 Em conformidade com a circular da UCM, de 1 de Dezembro de 1988, relativa à repartição dos elementos que compõem os montantes fixos referentes às despesas de maternidade a partir de 1 de Janeiro de 1989, citada na decisão de reenvio (9), na prática, o sistema imposto pela lei em vigor à data dos factos em litígio e o regulamento grão-ducal de 31 de Dezembro de 1974 em causa previa um cálculo com base em três componentes, a assistência médica, as despesas de maternidade e os produtos dietéticos (10).
b) Seguro de doença-maternidade para os não beneficiários do regime nacional
20 Como indicam o Governo luxemburguês e a Comissão, as tabelas previstas no Luxemburgo para as prestações de cuidados às pessoas abrangidas pelo Regulamento n._ 1408/71 são as aplicáveis aos beneficiários do regime nacional. Além disso, estas pessoas estão expressamente incluídas no âmbito das convenções colectivas em matéria de doença. Portanto, deve admitir-se que, no caso de seguro de maternidade, o montante fixo previsto no regulamento grão-ducal, de 31 de Dezembro de 1974, também se aplica a estas pessoas.
21 Em contrapartida, para as outras pessoas não filiadas no regime nacional de segurança social, verifica-se que as regulamentações e as convenções colectivas supracitadas não se aplicavam e que, com reserva de disposições legais ou regulamentares ou de compromissos internacionais que vinculam o Grão-Ducado do Luxemburgo, os prestadores de cuidados gozam de inteira liberdade quanto à fixação das tabelas.
22 Assim, não existindo convenção entre o RCSD e o EHL, este último fixou unilateralmente as tabelas de cuidados hospitalares aplicáveis a contar de 1 de Janeiro de 1989 às pessoas não filiadas no regime nacional de segurança social, incluindo os funcionários das Comunidades, que estavam filiados no RCSD.
III - A matéria de facto
23 A. Ferlini é funcionário da Comissão das Comunidades Europeias e trabalha no Luxemburgo. Todavia, a decisão de reenvio não precisa se A. Ferlini e a sua esposa têm a nacionalidade de um Estado-Membro da Comunidade (11).
24 Pelo facto de A. Ferlini ser funcionário das Comunidades Europeias, ele e a esposa estão filiados no RCSD.
25 Entre 17 e 24 de Janeiro de 1989, a esposa do recorrente esteve internada no Centre hospitalier de Luxemburgo (a seguir «CHL») onde deu à luz. A decisão de reenvio indica que o CHL é um estabelecimento público.
26 Em 24 de Fevereiro de 1989, o CHL enviou ao recorrente uma factura de despesas de hospitalização, no montante de 73 460 LUF.
27 A. Ferlini impugnou um despacho condicional de pagamento, datado de 22 de Abril de 1993, que o intimava a pagar o montante supramencionado ao CHL.
28 Por decisão proferida em 24 de Junho de 1994, o Tribunal de paix de Luxembourg, decidindo em matéria civil e em processo contraditório, declarou improcedente a impugnação e condenou A. Ferlini a pagar ao CHL o montante supramencionado, acrescido dos juros legais.
29 Em 5 de Outubro de 1994, A. Ferlini interpôs recurso desta decisão.
30 Como é indicado na decisão de reenvio, segundo o recorrente, a facturação efectuada pelo CHL resulta, por um lado, da aplicação das tabelas hospitalares fixadas pelo EHL, válidas, a partir de 1 de Janeiro de 1989, para as pessoas e organismos não filiados no regime nacional de segurança social e, por outro, da aplicação das tabelas válidas para os filiados nas caixas de doença, que resultavam de uma circular da UCM, de 1 de Dezembro de 1988. Ora, aquelas tabelas ultrapassavam em muito as aplicadas aos beneficiários do regime nacional de segurança social e eram discriminatórias.
31 Em apoio do recurso, A. Ferlini afirma que a fixação das despesas com os cuidados hospitalares feita pelo CHL é contrária ao princípio da igualdade. Em seguida, sustenta que o sistema de tabelas dos cuidados hospitalares aplicado aos funcionários das Comunidades, tal como resulta de um acordo entre os hospitais luxemburgueses, reunidos numa associação de hospitais luxemburgueses, é contrário ao artigo 85, n._ 1, do Tratado.
32 A título subsidiário, o recorrente considera que o montante reclamado é excessivo e desproporcionado em relação aos serviços prestados.
33 O recorrido CHL pede que seja negado provimento ao recurso e a confirmação da decisão impugnada, assim como uma indemnização por encargos com o processo. O CHL afirma essencialmente que a situação dos funcionários das Comunidades não é comparável à dos filiados no regime nacional de segurança social. Os primeiros não pagam impostos nem cotizações para o regime nacional de segurança social e o seu rendimento é mais elevado; por outro lado, na data dos factos objecto do processo principal, o RCSD não tinha celebrado qualquer convenção com o EHL. Por fim, o CHL sustenta que as condições enunciadas no artigo 85._ do Tratado não se verificam no caso em apreço.
IV - A questão prejudicial
34 Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, o artigo 48._ do Tratado e os Regulamentos n.os 1408/71 e 1612/68 abrangem apenas os nacionais da Comunidade que obtêm, num outro Estado-Membro, um emprego ou uma cobertura social regida pelas leis deste. No entanto, na medida em que os funcionários das Comunidades residem num Estado-Membro diferente do seu, devido precisamente às suas funções, não se pode admitir que eles sejam colocados numa situação menos favorável que a de qualquer outro trabalhador nacional de um Estado-Membro. Pelo contrário, eles devem gozar das vantagens que decorrem do direito comunitário para os nacionais dos Estados-Membros em matéria de livre circulação de pessoas, de liberdade de estabelecimento e de protecção social.
35 O juiz nacional considerou também não poder pronunciar-se sobre as questões colocadas pelo recorrente e as objecções formuladas pelo recorrido sem uma interpretação dos princípios que regem o direito da concorrência, nomeadamente no que diz respeito à questão da competência dos Estados-Membros para organizar o seu sistema de segurança social, o estatuto particular das empresas e das prestações, assim como a incidência no mercado comum.
36 Tendo em consideração as questões que precedem, o Tribunal d'arrondissemnet de Luxembourg (8.° Secção) decidiu apresentar o seguinte pedido de decisão prejudicial ao Tribunal de Justiça:
«À luz do princípio da não discriminação entre nacionais dos Estados-Membros da União Europeia, princípio consagrado nos artigos 6._ e 48._ do Tratado CE e, no âmbito da livre circulação de trabalhadores na Comunidade, no Regulamento n._ 1612/68 do Conselho, de 5 de Outubro de 1968, relativo à livre circulação dos trabalhadores na Comunidade, na redacção dada pelo Regulamento n._ 312/76 do Conselho, de 9 de Fevereiro de 1976, e, no âmbito da segurança social, no Regulamento n._ 1408/71 do Conselho, de 14 de Junho de 1971, relativo à aplicação dos regimes de segurança social aos trabalhadores assalariados, aos trabalhadores não assalariados e aos membros da sua família que se deslocam no interior da Comunidade, na versão consolidada do Regulamento n._ 2001/83 do Conselho, de 2 de Junho de 1983,
e
à luz do artigo 85._, n._ 1, do Tratado CE que proíbe todos os acordos entre empresas, todas as decisões de associações de empresas e todas as práticas concertadas que sejam susceptíveis de afectar o comércio entre os Estados-Membros e que tenham por objectivo ou efeito impedir, restringir ou falsear a concorrência no mercado comum,
será compatível com o direito comunitário o regulamento grão-ducal, de 31 de Dezembro de 1974 (Mémorial A n._ 95, de 31.12.1974, p. 2398), na redacção alterada, que tem por objecto determinar, por aplicação dos artigos 6._ e 13._ do código de segurança social, as prestações nos casos de doença e de maternidade, as tabelas dos serviços hospitalares a partir de 1 de Janeiro de 1989 válidas para as pessoas e organismos não filiados no regime de segurança social nacional, a circular da UCM, de 1 de Dezembro de 1988, relativa à repartição dos elementos que constituem os montantes fixos para despesas de maternidade a partir de 1 de Janeiro de 1989 e as práticas do EHL, traduzidas em aplicar às pessoas e organismos não filiados no regime de segurança social nacional e aos funcionários das Comunidades Europeias filiados no RCSD tabelas uniformes para despesas médicas e de hospitalização superiores às aplicadas aos residentes filiados no regime de segurança social nacional?»
V - Resposta à questão prejudicial
37 Com a questão prejudicial que o Tribunal d'arrondissement de Luxembourg (8.° Secção) apresentou ao Tribunal de Justiça, este é solicitado a tomar posição quanto à proibição de discriminações em razão da nacionalidade (B) e à protecção da concorrência (C), tendo em vista a fixação, num Estado-Membro, das tabelas de cuidados médicos e hospitalares dispensados em caso de maternidade válidas para os não beneficiários do regime nacional de segurança social, incluindo os funcionários das Comunidades que, devido às suas funções, trabalham e residem nesse Estado, mas estão filiados no RCSD. Examinaremos estas duas questões, depois de ter feito um breve comentário relativamente à formulação da questão prejudicial (A).
A - Quanto à formulação da questão prejudicial
38 Tendo em consideração a formulação da questão prejudicial, desejaríamos recordar que o Tribunal de Justiça, no âmbito do artigo 177._ do Tratado, não se pronuncia sobre a interpretação ou a validade de disposições nacionais nem sobre a compatibilidade destas disposições com as disposições do direito comunitário, mas dá ao órgão jurisdicional de reenvio todos os elementos de interpretação que lhe permitirão julgar se uma disposição do direito interno é ou não compatível com as regras comunitárias (12).
39 Consequentemente, é preciso considerar que a questão prejudicial apresentada pelo órgão jurisdicional nacional diz respeito à questão de saber se os artigos 7._ e 48._ do Tratado CEE e as disposições dos Regulamentos n.os 1612/68 e 1408/71 devem ser interpretados no sentido de serem opostos a regulamentações nacionais ou a práticas implementadas por associações de prestadores de cuidados médicos e hospitalares dispensados em caso de maternidade, das quais resulta que, por esses cuidados, a pessoas e organismos que não são filiados no regime nacional de segurança social, incluindo os funcionários das Comunidades, filiados no RCSD, são aplicadas tabelas mais elevadas que as aplicáveis aos residentes filiados no regime nacional de segurança social.
B - Quanto à proibição de discriminações em razão da nacionalidade
40 A proibição de discriminações em razão da nacionalidade constitui o conteúdo negativo do princípio da igualdade de tratamento dos nacionais dos Estados-Membros da Comunidade - agora cidadãos da União - e uma expressão do princípio geral de igualdade, que é uma noção de base do direito comunitário.
41 Esta proibição, que é especificada por numerosas disposições do direito comunitário, não se opõe, de uma maneira geral, à existência de distinções, que podem consistir em aplicar regras diferentes a situações similares ou em aplicar a mesma regra a situações diferentes (13). O que esta proibição visa são as distinções arbitrárias, que se podem identificar verificando se são objectivamente justificadas (14).
42 Segundo uma jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, a proibição das discriminações em razão da nacionalidade visa não só as discriminações directas, mas também as discriminações indirectas ou disfarçadas, que, mesmo quando não são directamente em razão da nacionalidade, critério proibido, são em razão de outros critérios que produzem resultados idênticos ou, pelo menos, análogos aos que chega a aplicação do critério da nacionalidade (15). Quanto a este ponto, deve assinalar-se que, no caso em apreço, a discriminação em litígio é um exemplo característico de discriminação indirecta em razão da nacionalidade. A aplicação do critério da filiação no regime nacional de segurança social, em que se fundamenta a diferenciação de tabelas de cuidados médicos e hospitalares, implica uma aplicação disfarçada do critério da nacionalidade, na medida em que, como a Comissão sublinha, a maior parte dos filiados no regime nacional são nacionais do Luxemburgo, enquanto a maioria esmagadora dos não filiados, sobretudo entre os funcionários das Comunidades, são nacionais de outros Estados-Membros (16).
43 Depois destas observações preliminares, pensamos que, tendo em conta as diversas disposições do direito comunitário que o Tribunal de Justiça é solicitado a interpretar, é preciso que examinemos sucessivamente as seguintes questões. Em primeiro lugar, para julgar se estamos, no caso em apreço, na presença de discriminação em razão da nacionalidade contrária ao direito comunitário (d) será preciso, tendo em vista os factos do processo principal, identificar o fundamento jurídico da proibição desta discriminação e examinar as condições de aplicação mais específicas desta proibição (a). Em seguida, será preciso fazer certas observações quanto a saber se estas condições estão preenchidas no caso em apreço e, mais precisamente, quanto à existência de um tratamento diferente aplicado a situações similares no quadro dos factos do processo principal e dos dados do direito nacional luxemburguês (b). Por fim, será preciso examinar se esta diferença de tratamento é objectivamente justificada ou não (c).
a) Quanto ao fundamento jurídico da proibição das discriminações em razão da nacionalidade
aa) Quanto à aplicação do Regulamento n._ 1408/71
44 Segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, «uma pessoa tem a qualidade de trabalhador na acepção do Regulamento n._ 1408/71 quando está segurada, mesmo que contra um só risco, a título de um seguro obrigatório ou facultativo no âmbito de um regime geral ou especial de segurança social mencionado no artigo 1._, alínea a), do Regulamento n._ 1408/71, e isto independentemente da existência de uma relação de trabalho» (17).
45 Mesmo se estão filiados num regime específico, tal como o RCSD, não parece que os funcionários da Comunidade, como é o caso de A. Ferlini, possam ser considerados trabalhadores, na acepção da definição que precede.
46 Como o advogado-geral Lenz indicou, em termos de caracterização, nas suas conclusões no processo Schmid (18), a noção de trabalhador assalariado deva ser «definida em função das finalidades e do objecto material do regulamento» (19). Por outras palavras, a qualidade de trabalhador assalariado depende essencialmente da possibilidade geral de aplicação do regulamento.
47 A este respeito, deve recordar-se que, embora o Regulamento n._ 1408/71, que foi adoptado com fundamento no artigo 51._ do Tratado CEE (que passou a artigo 51._ do Tratado CE, e posteriormente, após alteração, a artigo 42._ CE), esteja ligado ao estabelecimento da livre circulação dos trabalhadores, o seu objectivo fundamental é a coordenação das diversas legislações nacionais relativas às prestações sociais, de tal modo que a livre circulação dos trabalhadores não tenha por efeito colocar os trabalhadores que usufruem desta liberdade numa situação menos favorável do que a dos trabalhadores que exerçam a sua actividade no interior de um único Estado-Membro.
48 No caso em apreço, como a Comissão sublinha nas suas observações, as condições gerais de aplicação do Regulamento n._ 1408/71 não estão preenchidas porque não se trata da coordenação de regimes nacionais de segurança social mas de prestações de cuidados dispensados no interior de um único Estado-Membro e da aplicação de tabelas diferentes, quanto a estas prestações, a uma categoria de pessoas que abrange essencialmente trabalhadores nacionais de outros Estados-Membros. Em consequência, não é possível qualificar A. Ferlini como trabalhador na acepção do Regulamento n._ 1408/71.
49 A razão pela qual A. Ferlini não pode ser qualificado como trabalhador «assalariado», na acepção do Regulamento n._ 1408/71, está ligada à razão, que decorre directamente do artigo 2._, n._ 1, deste último, pela qual não se pode aplicar este regulamento ao caso em apreço. Por força desta disposição, o Regulamento n._ 1408/71 «aplica-se aos trabalhadores assalariados ou não assalariados que estão ou estiveram sujeitos à legislação de um ou mais Estados-Membros e que sejam nacionais de um dos Estados-Membros, apátridas ou refugiados residentes no território de um dos Estados-Membros, bem como aos membros da sua família e sobreviventes». No caso em apreço, A. Ferlini, na sua qualidade de funcionário da Comissão das Comunidades Europeias, está filiado no RDSD. Por conseguinte, como resulta dos elementos do processo, nem ele nem a sua esposa estão submetidos a uma legislação nacional em matéria de segurança social, como exige o artigo 2._, n._ 1, do Regulamento n._ 1408/71.
50 Tendo em vista o que precede, nem A. Ferlini nem a sua esposa podem entrar no âmbito de aplicação pessoal do Regulamento n._ 1408/71 (20). Todavia, visto que, em direito comunitário, a noção de trabalhador não é unívoca, mas tem um conteúdo diferente segundo o sector em que é utilizada (21), não está excluído que A. Ferlini e a sua esposa estejam abrangidos pelo âmbito de aplicação pessoal de outras regras de direito comunitário, tais como o artigo 48._ do Tratado ou o Regulamento n._ 1612/68.
ab) Quanto à aplicação do artigo 48._ do Tratado e do Regulamento n._ 1612/68
51 Se tomarmos em consideração a jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa aos nacionais dos Estados-Membros da Comunidade que têm a qualidade de funcionários internacionais em geral (22), é preciso, a fortiori, considerar que os funcionários das Comunidades, como A. Ferlini, conservam a qualidade de trabalhador, que lhes permite, a eles assim como aos membros da sua família, entrar no âmbito de aplicação pessoal do artigo 48._ do Tratado CEE e do Regulamento n._ 1612/68.
52 No entanto, pode-se colocar a questão de saber se o tratamento aplicado a A. Ferlini e sua esposa entra no âmbito de aplicação material das regras comunitárias em questão (23). Mais precisamente, convém examinar se a aplicação, por cuidados médicos e hospitalares dispensados em caso de maternidade, de tabelas mais elevadas que as em vigor para os filiados no regime nacional de segurança social diz respeito a uma «condição de trabalho», na acepção das disposições do artigo 48._, n._ 2, do Tratado e do artigo 7._, n._ 1, do Regulamento n._ 1612/68 ou a um «benefício social», na acepção do artigo 7._, n._ 2, deste mesmo regulamento.
53 A noção «condição de trabalho», que é utilizada nas disposições supracitadas, parece compreender elementos ligados directamente ao contrato de trabalho, como a remuneração, o despedimento, o cálculo da antiguidade, a reinserção profissional ou a retoma do trabalho. A este respeito, é significativo que o Tribunal de Justiça, para decidir se um sistema que prevê o pagamento de contribuições para o seguro de velhice e sobreviventes, quando o trabalhador efectua o seu serviço militar, diz respeito a uma «condição de trabalho», examinou se o pagamento constitui uma obrigação legal ou contratual de que seria titular o empregador (24).
54 No caso em apreço, pensamos que a aplicação de tabelas mais elevadas aos cuidados médicos e hospitalares dispensados em caso de maternidade não pode entrar no campo semântico dos termos «condição de trabalho». Como a Comissão observou, embora a aplicação destas tabelas possa sobrecarregar o rendimento líquido dos não filiados no regime nacional luxemburguês de segurança social, visto que é provável que estes últimos sejam obrigados a pagar montantes mais importantes pelo facto de os seus organismos de seguro não poderem reembolsar a totalidade das tabelas aplicadas, é preciso admitir que este encargo está ligado, de maneira indirecta e hipotética, às «condições de trabalho» e, mais particularmente, à remuneração destes trabalhadores. Em substância, a posição contrária conduziria a adoptar a concepção simplificadora segundo a qual qualquer forma de aplicação das tabelas de produtos ou de serviços que implica uma majoração das despesas extraordinárias, tais como as despesas ligadas aos cuidados médicos e hospitalares dispensados em caso de maternidade, deve ser considerada como tendo uma incidência sobre a remuneração dos trabalhadores fixada por via convencional ou legal.
55 Visto que não parece que se possa admitir que o nível das tabelas dos cuidados médicos e hospitalares dispensados em caso de maternidade depende das «condições de trabalho», é preciso examinar se a fixação destas tabelas apresenta as características de um «benefício social», na acepção do artigo 7._, n._ 2, do Regulamento n._ 1612/68. Uma jurisprudência constante define estes benefícios como sendo «todos aqueles que, ligados ou não com um contrato de trabalho, são geralmente reconhecidos aos trabalhadores nacionais, em razão da sua qualidade objectiva de trabalhadores ou do simples facto da sua residência no território nacional, e cuja extensão aos trabalhadores nacionais de outros Estados-Membros se afigura, por isso, como apta a facilitar a sua mobilidade no interior da Comunidade. É esse o caso das prestações para deficientes» (25).
56 Segundo a Comissão, tendo em consideração a definição supracitada, não se exclui que se possa considerar a garantia, para prestações médicas, de um nível de preços razoável e, em conformidade com os princípios do sistema luxemburguês, que tem por base os custos reais das prestações em questão, como um benefício social que deve ser concedido a todas as pessoas que trabalham no Luxemburgo.
57 Segundo A. Ferlini, o montante fixo pago pelo Estado luxemburguês em caso de parto constitui incontestavelmente um «benefício social», que não difere fundamentalmente do subsídio de maternidade, que o Tribunal de Justiça considerou como tal (26). A tabela das prestações abrangidas pelo montante fixo constitui um elemento essencial deste último, que deveria ser concedido a todos os que beneficiam da livre circulação de pessoas no Luxemburgo. Na prática, os funcionários das Comunidades não gozam deste benefício que consiste no montante fixo, mas esta questão não foi colocada no âmbito do processo principal. No entanto, A. Ferlini sustenta que é possível invocar a natureza de benefício social do montante fixo para reivindicar, pelo menos, a igualdade ao nível da facturação dos cuidados médicos e hospitalares dispensados em caso de maternidade.
58 Tanto a Comissão, que invoca um direito a tabelas razoáveis e correspondentes aos custos reais, como A. Ferlini, que invoca o montante fixo pago em caso de parto, tentam dar um conteúdo positivo ao direito à igualdade de tratamento quanto às tabelas de prestações em questão, de tal modo que a qualificação deste direito como «benefício social» esteja em harmonia com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, que qualificou como «benefícios sociais» nomeadamente prestações com um conteúdo positivo (27). Todavia, as informações fornecidas pela decisão de reenvio não mostram de maneira absolutamente clara que, na data dos factos objecto do processo principal, as tabelas aplicadas aos filiados no regime nacional de segurança social correspondiam aos custos das prestações, enquanto as tabelas aplicadas aos não filiados, e mais particularmente aos funcionários das Comunidades, não correspondiam a esse custo, nem que o montante fixo que cobria os cuidados dispensados em caso de parto nem, a fortiori, que a tabela destes cuidados tinha a mesma natureza do subsídio de maternidade. Cabe ao juiz nacional, que tem um conhecimento profundo do direito nacional e dos factos do processo principal, verificar se os argumentos descritos acima são válidos.
59 Todavia, pensamos que se pode considerar que a tabela em litígio dos cuidados médicos e hospitalares dispensados em caso de parto está abrangida pelo âmbito material do princípio da igualdade de tratamento consagrado pelo artigo 7._ do Regulamento n._ 1612/68, sem necessidade de verificar se estamos em presença de uma prestação ou de um benefício de conteúdo positivo. Basta fazer um raciocínio «a majori ad minus». Uma vez que a igualdade de tratamento é válida para os «benefícios sociais», deve admitir-se que se aplica a qualquer regulamentação que, mesmo que não dê origem a um benefício de conteúdo positivo, em sentido estrito, diga respeito à situação social dos trabalhadores - independentemente de saber se existe ou não um elo de ligação com um contrato de trabalho determinado -, que se aplica de uma maneira geral aos trabalhadores nacionais, principalmente em razão da sua qualidade objectiva de trabalhadores ou pura e simplesmente em razão da sua residência no território nacional e cuja extensão aos trabalhadores nacionais de outros Estados-Membros parece, por esse motivo, ser de natureza a facilitar a sua livre circulação no interior da Comunidade. É manifesto que a tabela dos cuidados médicos e hospitalares dispensados em caso de maternidade cobre todos os elementos da definição supracitada.
60 Admitindo que os factos do processo principal entram no âmbito do artigo 7._, n._ 2, do Regulamento n._ 1612/68, deve assinalar-se um último problema. Em conformidade com jurisprudência recente do Tribunal de Justiça, uma legislação nacional, que entra no âmbito do artigo 48._ do Tratado e do artigo 7._, n._ 2, do Regulamento n._ 1612/68, que impede ou dissuade um nacional de um Estado-Membro de deixar o seu país para exercer o seu direito de livre circulação é considerada contrária ao artigo 48._ do Tratado, sem ser necessário examinar se existe uma discriminação indirecta em razão da nacionalidade (28). Parece resultar desta jurisprudência que o caso em que uma legislação nacional impede ou dissuade os trabalhadores de exercerem o seu direito de livre circulação é diferente daquele em que existe uma discriminação indirecta em razão da nacionalidade, no quadro do exercício desse mesmo direito. Mais precisamente, parece que, no primeiro caso, o âmbito de aplicação seja mais amplo que no segundo e que o fundamento reside numa simples presunção (29).
61 No entanto, no caso em apreço, dificilmente se pode afirmar que, além da constituição de uma discriminação indirecta em razão da nacionalidade, a aplicação num Estado-Membro, pelos cuidados dispensados em caso de maternidade, de tabelas mais elevadas que as em vigor para os filiados no regime de segurança social deste Estado-Membro impediria ou dissuadiria, de uma maneira geral, um nacional de um outro Estado-Membro de trabalhar no primeiro Estado, sobretudo enquanto funcionário das Comunidades. Chegamos a esta conclusão, porque tomamos em consideração o carácter excepcional, relativamente previsível e limitado das despesas com os cuidados dispensados em caso de maternidade, tendo em conta também a ampla possibilidade de seguro e de cobertura destas despesas nos diversos Estados-Membros, que o RCSD oferece. Em contrapartida, se se demonstrasse que num Estado-Membro, como, no caso em apreço, o Grão-Ducado do Luxemburgo, existe uma tabela que comporta uma discriminação similar para a totalidade - ou para uma parte importante - dos cuidados médicos e hospitalares em geral, poder-se-ia, com efeito, sustentar que isso dissuadiria, eventualmente, os nacionais de um Estado-Membro de deixarem o Estado-Membro onde residem para trabalharem enquanto funcionários das Comunidades no Estado em questão.
ac) Quanto à aplicação do artigo 7._ do Tratado CEE
62 O artigo 7._ do Tratado, por força do qual «no âmbito de aplicação do presente Tratado, e sem prejuízo das suas disposições especiais, é proibida toda e qualquer discriminação em razão da nacionalidade», só se pode aplicar autonomamente nos casos sujeitos ao direito comunitário para os quais o Tratado não previu proibição específica de discriminações (30).
63 Na medida em que o princípio que proíbe as discriminações em razão da nacionalidade está reafirmado, especificamente no artigo 48._ do Tratado, é, portanto, necessário admitir que, no caso em apreço, não se pode aplicar o artigo 7._ do Tratado a não ser que o artigo 48._ do Tratado e o Regulamento n._ 1612/68 não sejam aplicáveis. Tendo em consideração as análises que precedem, o problema da aplicação do artigo 7._ do Tratado pode portanto colocar-se no caso de o Tribunal de Justiça determinar que quer A. Ferlini não tem a qualidade de trabalhador na acepção do artigo 48._ do Tratado e do Regulamento n._ 1612/68, quer a discriminação em litígio não entra no âmbito de aplicação material destas disposições, isto é, não diz respeito nem às «condições de trabalho» nem aos «benefícios sociais».
64 Num caso destes, será necessário examinar se os factos do processo principal entram no âmbito de aplicação do Tratado, condição à qual está subordinada a aplicação do princípio da não discriminação, tal como enunciado no artigo 7._ do Tratado.
65 Quanto a este ponto, deve sublinhar-se que o Tribunal de Justiça parece aceitar que se faça uma interpretação ampla do conteúdo desta condição e reconhece que situações que, apesar de não terem uma ligação directa com as liberdades fundamentais consagradas no direito comunitário, têm uma incidência indirecta sobre o exercício dessas liberdades entram no âmbito de aplicação do Tratado (31). Por outros termos, a determinação do âmbito de aplicação do Tratado, na acepção do artigo 7._, comporta uma dinâmica que permite integrar gradualmente neste âmbito de aplicação uma série de matérias que não são estranhas ao direito comunitário ou são mesmo parcialmente regidas por ele (32).
66 Em particular, no que diz respeito aos funcionários das Comunidades, no acórdão Forcheri, que, como no presente processo, dizia respeito à situação da esposa de um funcionário das Comunidades Europeias (33), o Tribunal de Justiça considerou, em primeiro lugar, que «a situação jurídica dos funcionários da Comunidade no Estado-Membro da sua afectação releva a um duplo título do âmbito de aplicação do Tratado, quer pelo seu vínculo funcional perante a Comunidade, quer pelo facto de deverem tais funcionários usufruir do conjunto de vantagens que decorrem do direito comunitário para os nacionais dos Estados-Membros no domínio da livre circulação de pessoas, no domínio da residência e no domínio da protecção social» (34). Assim, no mesmo acórdão, o Tribunal de Justiça, ao examinar a questão mais particular de saber se, no caso do cônjuge de um funcionário das Comunidades que não tem a nacionalidade do Estado-Membro onde está instalado com este último, o pagamento de uma taxa de inscrição entra no âmbito de aplicação do Tratado e é compatível com o direito comunitário, considerou que, «quando um Estado-Membro leva a cabo cursos de ensino relativos especificamente à formação profissional, o facto de exigir, a nacionais dum outro Estado-Membro licitamente instalados no primeiro Estado-Membro, uma taxa de inscrição complementar que não é exigida aos seus próprios nacionais, constitui uma discriminação em razão da nacionalidade, proibida pelo artigo 7._ do Tratado» (35).
67 No acórdão supracitado, que precedeu cronologicamente os acórdãos Echternach e Moritz (já citado na nota 22) e Schmid (já citado na nota 18), o Tribunal de Justiça, considerando tacitamente que um funcionário das Comunidades, nacional de um Estado-Membro da Comunidade, não é um trabalhador na acepção do artigo 48._ do Tratado e do Regulamento n._ 1612/68, mas admitindo que não é possível que lhe recusem os direitos concedidos por estas regras comunitárias, decidiu fundamentar o seu acórdão no artigo 7._ do Tratado. Por conseguinte, a questão que se colocou dizia respeito à determinação das pessoas que, sem serem trabalhadores na acepção supracitada, poderiam entrar no âmbito de aplicação do Tratado. Para responder a esta questão, o Tribunal de Justiça recorreu ao critério do «nacional de um outro Estado-Membro legalmente instalado no primeiro Estado-Membro». Além disso, enquanto, nos fundamentos do acórdão, parece que a esposa de Forcheri adquire o seu direito à igualdade de tratamento pela sua qualidade de cônjuge de um funcionário das Comunidades, circunstância da qual resulta que ela está legalmente instalada no Estado-Membro em questão, no dispositivo do acórdão, o Tribunal de Justiça parece referir-se de maneira geral à condição que consiste no estabelecimento legal, feita abstracção do caso particular dos cônjuges dos funcionários das Comunidades. Isto conduziu os comentadores do acórdão a falar de uma nova perspectiva aberta pelo Tribunal de Justiça ao direito comunitário; por outras palavras, logo que um nacional da Comunidade, mesmo se não tiver a qualidade de trabalhador, na acepção do artigo 48._ do Tratado e do Regulamento n._ 1612/68, se estabeleceu legalmente no território de um Estado-Membro, beneficiará da igualdade de tratamento para todas as matérias que entram no campo de aplicação do Tratado (36).
68 Quanto a este ponto, deve assinalar-se que esta perspectiva, que se abriu em 1983 na jurisprudência do Tribunal de Justiça, foi consagrada pelos artigo 8._, (que passou, após alteração, a artigo 17._ CE) e 8._-A (que passou, após alteração, a artigo 18._ CE) do Tratado CE (37). Como o Tribunal de Justiça indicou na sua jurisprudência recente «o artigo 8._, n._ 2, do Tratado liga ao estatuto de cidadão da União os direitos e os deveres previstos no Tratado, nomeadamente o de não sofrer qualquer discriminação em razão da nacionalidade no âmbito de aplicação ratione materiae do Tratado, previsto no seu artigo 6._ Daqui resulta que um cidadão da União Europeia que, como a recorrente no processo principal, reside legalmente no território do Estado-Membro de acolhimento pode invocar o artigo 6._ do Tratado em todas as situações que se incluam no domínio de aplicação ratione materiae do direito comunitário...» (38). A similitude desta interpretação dos artigos 8._ e 8._-A do Tratado com a jurisprudência Forcheri é mais que evidente. Em consequência, embora os artigos supracitados não possam ser aplicados à data dos factos objecto do processo principal, esta interpretação, que o Tribunal de Justiça deles deu, pode esclarecer o significado da jurisprudência Forcheri.
69 Se aplicarmos esta jurisprudência no caso em apreço, há que admitir que, visto que a esposa de A. Ferlini tinha a qualidade de nacional de um Estado-Membro da Comunidade - elemento que cabe ao juiz nacional verificar - e estava legalmente instalada no Luxemburgo enquanto cônjuge de um funcionário das Comunidades, que trabalha nesse país, ela não podia ser objecto de uma discriminação em razão da nacionalidade, proibida pelo artigo 7._ do Tratado, em todos os casos que entram no âmbito de aplicação deste último. É manifesto que as tabelas de cuidados médicos e hospitalares dizem respeito aos serviços que, como a Comissão indica nas suas observações, entravam e entram, sem qualquer dúvida, neste âmbito de aplicação (39), sem ser necessário verificar se dizem respeito às «condições de trabalho» ou aos «benefícios sociais», como no caso de aplicação do artigo 48._ do Tratado e do Regulamento n._ 1612/68 (40).
70 A esposa de A. Ferlini goza do direito supracitado de modo autónomo. Em qualquer caso, ela retira-o da sua qualidade de cônjuge de um funcionário das Comunidades, nacional de um Estado-Membro da Comunidade - qualidade que cabe igualmente ao órgão jurisdicional nacional verificar -, cuja situação jurídica entra, em conformidade com o que precede, no âmbito de aplicação do Tratado e que, com a sua família, deve gozar da totalidade dos benefícios atribuídos pelo direito comunitário aos nacionais dos Estados-Membros em matéria de livre circulação de pessoas, de liberdade de estabelecimento e de protecção social.
71 A última questão - que não é, todavia, a menos importante - que deve ser examinada no quadro da interpretação do artigo 7._ do Tratado diz respeito à possibilidade de aplicar este artigo não só às discriminações que resultam da acção das instituições da Comunidade ou dos Estados-Membros, mas também àquelas que existem nas relações entre particulares. Tendo em consideração os factos do processo principal, esta questão coloca-se se considerarmos que uma discriminação é imputável às actividades de pessoas colectivas de direito privado; por outras palavras, se considerarmos que uma discriminação é imputável ao CHL, ao EHL ou à UCM e se considerarmos que as pessoas colectivas em questão são pessoas colectivas de direito privado. Quanto a este ponto, convém assinalar que, posto de lado o facto que indica simplesmente que o CHL é um estabelecimento público, a decisão de reenvio não contém informações suficientes para que possamos decidir quanto ao carácter público ou privado destas pessoas colectivas. Portanto, cabe ao juiz nacional, que conhece o direito nacional, esclarecer este ponto.
72 Pensamos que, apesar das sérias hesitações marcadas de tempos a tempos pela doutrina (41), a evolução da jurisprudência do Tribunal de Justiça permite-nos, no caso em apreço, responder afirmativamente à questão de saber se o artigo 7._ do Tratado pode ter o que se designa habitualmente por «efeito directo horizontal».
73 Esta resposta pode fundamentar-se no facto de as acções das pessoas colectivas de direito privado são incompatíveis com o direito comunitário, porque implicam discriminações em razão da nacionalidade, serem imputadas ao próprio Estado-Membro.
74 No quadro da regulamentação das relações de trabalho, o Tribunal de Justiça admitiu uma imputação deste tipo quando considerou que a acção das pessoas colectivas de direito privado tem um carácter quase regulamentar, que a assimila à acção do próprio Estado-Membro. Assim, no que diz respeito aos artigos 7._ e 48._ do Tratado, o Tribunal de Justiça considerou que «os artigos 7._, 48._ e 59._ têm em comum proibirem, nos domínios de aplicação respectivos, qualquer discriminação exercida em razão da nacionalidade. A proibição desta discriminação impõe-se não apenas à actuação das autoridades públicas, mas abrange também as regulamentações de outra natureza, destinadas a disciplinar, de forma colectiva, o trabalho assalariado e as prestações de serviços» (42). No que diz respeito mais especificamente ao artigo 48._ do Tratado, o Tribunal de Justiça também considerou que «a abolição dos obstáculos à livre circulação de pessoas e à livre prestação de serviços [objectivos fundamentais da Comunidade, enunciados no artigo 3._, alínea c), do Tratado] seria comprometida se a abolição das barreiras de origem estatal pudesse ser neutralizada por obstáculos resultantes do exercício da sua autonomia jurídica por organizações ou organismos de direito privado... Além disso, observou que as condições de trabalho nos diversos Estados-Membros são regidas tanto por via de disposições de carácter legislativo ou regulamentar como por convenções ou outros actos celebrados ou adoptados por pessoas privadas. Por conseguinte, limitar o objecto do artigo 48._ do Tratado aos actos das autoridades públicas acarretaria o risco de criar desigualdades quanto à sua aplicação» (43).
75 No entanto, se, no presente processo, se devesse concluir que a discriminação resulta das decisões e práticas da UCM ou do EHL, não se poderia aplicar a jurisprudência supracitada do Tribunal de Justiça e decidir que o artigo 7._ do Tratado se aplica no caso em apreço, uma vez que, independentemente da natureza pública ou privada destas pessoas colectivas, a sua acção visa, de uma maneira geral, regular, de maneira colectiva, a segurança social no Luxemburgo. É verdade que, como resulta da decisão de reenvio e das observações das partes, estas pessoas colectivas participam activamente nas negociações colectivas relativas à fixação das tabelas dos cuidados médicos e hospitalares e, por esse facto, desempenham, no quadro da segurança social, um papel análogo ao das organizações sindicais representativas dos trabalhadores e dos empregadores no quadro da regulamentação colectiva das relações de trabalho. Portanto, consideradas sob o ângulo das suas competências gerais, estas pessoas colectivas são organismos que têm por função contribuir para a regulamentação da segurança social, o que confere, de uma maneira geral, carácter quase regulamentar à sua acção. No entanto, no processo principal, a fixação pelo EHL das tabelas de cuidados médicos e hospitalares dispensados em caso de maternidade aos não filiados no regime nacional de segurança social não depende da regulamentação colectiva da segurança social, porque, por um lado, aquela fixação é unilateral e não colectiva e, por outro, respeita aos não filiados no regime nacional de segurança social (44). Estes dois elementos não permitem considerar que a acção do EHL que está na origem do litígio no processo principal deva ser concebida, em substância, como uma acção do próprio Estado.
76 Todavia, pensamos que a conclusão que precede não impede que se possa imputar ao Estado-Membro a responsabilidade da discriminação em razão da nacionalidade que resulta da acção das pessoas colectivas de direito privado.
77 Com efeito, no caso em apreço, a origem das discriminações em razão da nacionalidade parece situar-se na legislação nacional (artigos 6._, 13._ e 308._-bis e seguintes do código da segurança social), que previu a possibilidade de regulamentar por meio de convenções colectivas as tabelas dos cuidados médicos e hospitalares e a adopção do regulamento grão-ducal de 31 de Dezembro de 1974, que definiu as prestações em espécie no caso de parto. É precisamente ao nível da interpretação deste quadro legal e regulamentar, que é manifestamente imputável ao Estado-Membro, que se situa a não extensão aos nacionais dos outros Estados-Membros da Comunidade, não filiados no regime nacional de segurança social, das tabelas em vigor para os nele filiados. Este quadro legal e regulamentar, sem fixar directamente tabelas mais elevadas para a primeira categoria de pessoas, parece permitir aos organismos competentes fixar tais tabelas. Por outras palavras, é ao nível deste quadro legal e regulamentar que se situa, em primeiro lugar, a discriminação, que resulta não de uma acção positiva, mas da circunstância de uma dada categoria de pessoas ser desprovida de protecção ou, pelo menos, de ser admitida a possibilidade de lhe aplicar um tratamento diferente. Assim, se o comportamento das pessoas colectivas que dispensam cuidados hospitalares e fixam as respectivas tabelas implica uma discriminação em razão da nacionalidade, isso deve-se, em primeiro lugar, ao facto de o quadro legal e regulamentar supracitado lhe dar a possibilidade de exercer tal discriminação.
78 A este respeito, o Tribunal de Justiça indicou que o facto de um Estado-Membro se abster de agir ou, se for caso disso, não adoptar as medidas suficientes para impedir obstáculos às liberdades comunitárias garantidas no mercado único sem fronteiras internas, obstáculos criados nomeadamente por acções de particulares no seu território, poder ter consequências tão graves como um acto positivo que viole essas liberdades. Quanto a este ponto, os Estados-Membros têm obrigação de não só não praticarem actos ou adoptarem comportamentos susceptíveis de constituir um obstáculo às liberdades fundamentais, mas também, em ligação com o artigo 5._ do Tratado CEE (que passou ulteriormente a artigo 5._ do Tratado CE e, agora, a artigo 10._ CE), de tomarem todas as medidas necessárias e apropriadas para assegurar no seu território o respeito dessas liberdades (45).
79 Dada esta imputação da discriminação a um Estado-Membro devido à acção de particulares no seu território, não é duvidoso que se possa aplicar às relações entes particulares não só o artigo 48._ do Tratado e o artigo 7._ do Regulamento n._ 1612/68, mas também o artigo 7._ do Tratado, sobretudo na medida em que as obrigações que decorrem deste artigo estão bem definidas e claras. A este respeito, não é absolutamente nada espantoso que, no que diz respeito ao artigo 119._ do Tratado CEE (actual artigo 119._ do Tratado CE; os artigos 117._ a 120._ do Tratado CE foram substituídos pelos artigos 136._ a 143._ CE), doravante seja admitido que, visto que este artigo tem um carácter imperativo, a proibição das discriminações entre trabalhadores masculinos e femininos se impõe não só às autoridades públicas, mas também se estende a todas as convenções que visam regular colectivamente o trabalho subordinado, assim como aos contratos entre particulares (46). Assim sendo, é verdadeiramente difícil imaginar que, devendo um contrato de trabalho celebrado entre particulares, por força do artigo 119._ do Tratado, ser conforme ao princípio da igualdade das remunerações entre trabalhadores masculinos e femininos, o princípio da igualdade de tratamento entre nacionais dos Estados-Membros da Comunidade, consagrado no artigo 7._ do Tratado, poderia não ser respeitado no caso de uma convenção sobre a prestação de cuidados médicos e hospitalares. Em consequência, mesmo no caso de se entender que a discriminação em razão da nacionalidade resulta do poder discricionário de um estabelecimento hospitalar isolado, como o CHL, ou da sua aplicação de decisão de uma associação de estabelecimentos hospitalares, como o EHL, e que se trata de pessoas colectivas de direito privado, teria, ainda assim, que se admitir que o artigo 7._ do Tratado é aplicável.
ad) Conclusão relativa à escolha da base jurídica
80 Tendo em vista as considerações que precedem, propomos, portanto, que o Tribunal de Justiça, no que diz respeito à base jurídica da proibição das discriminações em razão da nacionalidade, declare que o juiz nacional deve aplicar o artigo 7._, n._ 2, do Regulamento n._ 1612/68 aos factos do processo principal. Se, apesar disso, o Tribunal de Justiça considerar que estes factos não entram no âmbito material deste regulamento, então pode muito bem decidir que se deve aplicar o artigo 7._ do Tratado.
b) Quanto à aplicação de um tratamento diferente aos casos similares
81 Tendo em conta os factos do processo principal, é oportuno um certo número de observações relativas, por um lado, à existência e, mais particularmente, ao objecto do tratamento discriminatório (ba) e, por outro, à similitude destes casos tratados diferentemente (bb).
ba) Objecto da diferença de tratamento
82 Na decisão de reenvio, o juiz nacional não indica de maneira pormenorizada em relação a que componentes particulares dos cuidados hospitalares dispensados em caso de parto existe uma diferença de tratamento, quanto às tabelas aplicadas, entre os filiados e não filiados no regime nacional de segurança social. Os únicos dados numéricos a este respeito que contém a decisão de reenvio figuram na discrição das afirmações do recorrente (47), mas em qualquer caso não é indicado precisamente com base em que regras, convenções ou decisões cada um dos preços mencionados tinha sido fixado. O único dado que possa ser retirado da decisão de reenvio, e mais particularmente da formulação da questão prejudicial, para delimitar a resposta do Tribunal de Justiça, é o facto que resulta do conjunto das disposições em vigor no Luxemburgo, na data dos factos objecto do processo principal que, para os cuidados médicos e hospitalares dispensados em caso de parto, se aplicava às pessoas e aos organismos não filiados no regime nacional da segurança social e aos funcionários das Comunidades, filiados no RCSD, tabelas uniformes mais elevadas que as em vigor para os residentes filiados no regime nacional de segurança social.
83 No entanto, deve assinalar-se que como A. Ferlini sustenta e como parece resultar dos documentos que junta em anexo, com base nos preços aplicados na prática, a diferença de tratamento respeita apenas a certas prestações hospitalares e, sobretudo, a despesas gerais ligadas ao parto, para as quais as tabelas eram, no caso dos não filiados no regime nacional de segurança social, fixadas por uma decisão unilateral do EHL. Segundo A. Ferlini, para certas prestações de cuidados diferentes das despesas de parto e de hospitalização, o EHL tinha decidido, de maneira igualmente unilateral, aplicar aos não filiados no regime nacional de segurança social preços uniformes que tinham sido objecto da convenção celebrada, em 31 de Dezembro de 1974, entre a UCM e o EHL, relativa às despesas cobertas pelo montante fixo de parto previsto para os filiados nas caixas de seguro de doença luxemburguesas. Também segundo A. Ferlini, esta convenção foi provavelmente celebrada tendo em vista a existente entre a UCM e a AMMD.
84 Em todo o caso, não é ao Tribunal de Justiça, mas ao juiz nacional, que conhece o direito nacional e os factos do processo principal, que cabe definir o objecto da diferença de tratamento, assim como a extensão e as modalidades do mecanismo que conduz a esta.
85 Todavia, deve assinalar-se que, se o Tribunal de Justiça entender que a diferença de tratamento e, por consequência, a discriminação são imputáveis ao quadro legal e regulamentar mais geral do Grão-Ducado do Luxemburgo (48), então já não importa esclarecer, mais especificamente, exactamente em relação a que tabelas e com base em que decisões, convenções ou práticas, precisando o quadro legal e regulamentar, esta discriminação é exercida. Há discriminação se se admitir a possibilidade de diferença de tratamento contrária ao direito comunitário, que existe a nível do quadro legal e regulamentar supramencionado, independentemente de saber se quem o aplica, seja qual for a razão, explora ou não esta possibilidade a um dado momento.
bb) Similitude dos casos tratados de modo diferente
86 Tendo em vista os factos do processo principal, coloca-se a questão de saber se as duas categorias de pessoas, isto é, por um lado, os filiados no regime luxemburguês de segurança social e, por outro, os não filiados, entre os quais os funcionários das Comunidades, filiados no RCSD, se encontram em situações similares, de modo que a aplicação, a cada uma destas categorias, de tabelas diferentes para os cuidados hospitalares dispensados em caso de parto constitui uma discriminação. Pensamos que se deve responder afirmativamente a esta questão, apesar dos argumentos do Governo luxemburguês e do CHL, recorrido no processo principal.
87 Em primeiro lugar, o facto de estas duas categorias de pessoas estarem filiadas em regimes legais de segurança social diferentes não justificar a afirmação de que se trata de dois casos que devem ser diferenciados, na perspectiva do direito comunitário, no que diz respeito às tabelas de cuidados médicos e hospitalares dispensados em caso de parto. Apesar da sua autonomia, tanto o regime luxemburguês de segurança social como o RCSD não podem violar os princípios e regras que regem o direito comunitário. Como o Tribunal de Justiça considerou, mesmo se, «na falta de harmonização a nível comunitário, compete à legislação de cada Estado-Membro determinar, por um lado, as condições do direito ou da obrigação de inscrição num regime de segurança social... e, por outro, as condições que dão direito a prestações... no exercício das suas competências, os Estados-Membros devem respeitar o direito comunitário» (49). De resto, uma discriminação quanto às tabelas dos cuidados médicos e hospitalares dispensados em caso de maternidade poderia dificilmente ser considerada referente à organização do regime de segurança social, na acepção supracitada. Paralelamente, o facto de o artigo 9._, n._ 2, da regulamentação do RCSD prever que «as instituições esforçam-se, na medida do possível, por negociar com os representantes do corpo médico e/ou autoridades, associações e estabelecimentos competentes, acordos que fixem percentagens aplicáveis aos beneficiários tendo em conta as condições locais e, se as houver, as tabelas já em vigor, tanto relativamente aos serviços médicos como aos serviços hospitalares» não significa que, no quadro desses acordos, estas instituições possam violar o direito comunitário primário e, mais particularmente, o princípio que proíbe as discriminações em razão da nacionalidade entre os trabalhadores nacionais da Comunidade.
88 Além disso, não se pode considerar convincente o argumento de que os funcionários das Comunidades não têm necessidade de invocar as regras do direito comunitário para circular livremente no território dos Estados-Membros, visto que eles beneficiam dos direitos previsto pelo protocolo sobre os privilégios e imunidades das Comunidades Europeias. Estes direitos são acordados no interesse das Comunidades, para lhes permitir cumprir a sua missão (50), fazem referência, em regra geral, ao tratamento de que beneficiam as missões diplomáticas (51) e a sua extensão e a sua dinâmica não são as mesmas dos direitos que o direito comunitário confere aos nacionais da Comunidade - agora cidadãos da União. Assim, enquanto o argumento supramencionado poderia eventualmente ser invocado no caso dos funcionários das Comunidades que não têm a nacionalidade de um Estado-Membro (52), isto não seria possível no caso de funcionários possuindo esta nacionalidade. Como resulta dos acórdãos Echternach e Moritz (já citado na nota 22), Schmid (já citado na nota 18) e Forcheri (já citado na nota 34), estes últimos continuam a ter a qualidade de trabalhador, na acepção do artigo 48._ do Tratado, e a gozar do conjunto de benefícios concedidos pelo direito comunitário, independentemente da sua função específica. Se se encarasse a sua situação jurídica apenas no quadro do protocolo sobre os privilégios e imunidades das Comunidades Europeias, violar-se-ia, portanto, o direito comunitário e os direitos que nele têm origem.
89 Em segundo lugar, o facto de, à data dos factos objecto do processo principal, não haver qualquer acordo entre o RCSD e o EHL, embora existissem tais acordos com a UCM, não parece decisivo quanto à existência de discriminação entre casos similares. Como a Comissão e A. Ferlini indicam, trata-se, no caso em apreço, de tabelas de cuidados que não resultam de convenções, mas dizem respeito ao conjunto dos cuidados dispensados em caso de parto que são definidos pelas disposições legais e regulamentares. Em todo o caso, deve sublinhar-se que, pelo facto do seu carácter obrigatório, no quadro do sistema luxemburguês, os acordos supracitados constituem, em substância, uma forma de regulamentação uniforme que emana do Estado e diferem muito do que se deve considerar como convenções de direito privado que exprimem a liberdade contratual das pessoas que fornecem os serviços.
90 Em terceiro lugar, não se pode considerar convincente a argumentação de que os não filiados no regime luxemburguês de cuidados de saúde, por um lado, têm rendimentos elevados e beneficiam de taxas elevadas de cobertura e de reembolso das despesas no quadro do seu regime de seguro e, por outro lado, não pagam impostos no Luxemburgo nem contribuem para o regime nacional de segurança social.
91 Antes de mais, segundo a decisão de reenvio, as tabelas aplicadas aos actos médicos no quadro do regime de segurança social luxemburguês são uniformes. Elas são fixadas exclusivamente segundo a natureza da prestação e não variam nem em função do rendimento dos doentes nem das competências do prestador de cuidados.
92 Além disso, no que diz respeito à circunstância de os não filiados no regime nacional de segurança social não pagarem impostos, o Tribunal de Justiça considerou, para a situação particular de um funcionário das Comunidades e da sua família, que «se, em virtude do artigo 13._, segundo período, do protocolo relativo aos privilégios e imunidades das Comunidades Europeias, tal funcionário está isento dos impostos nacionais que incidem sobre os vencimentos, salários e emolumentos pagos pelas Comunidades, em contrapartida, e nos termos do primeiro período do mesmo artigo, o funcionário fica sujeito a um imposto que incidirá sobre vencimentos, salários e emolumentos que reverte em benefício da Comunidade e do qual beneficia indirectamente, enquanto Estado-Membro, o Estado de acolhimento. O facto do funcionário não pagar ao Tesouro nacional um imposto sobre o seu vencimento não constitui assim um motivo válido para que se diferencie o seu caso e o da sua família do do trabalhador migrante, cujos rendimentos estão sujeitos ao regime fiscal do Estado de residência» (53).
93 Para mais, também não se poderia justificar a diferença de tratamentos aplicados às duas categorias com o argumento de que os funcionários das Comunidades Europeias, e mais geralmente os não filiados no regime nacional de segurança social, não pagam contribuições para este último sistema. Em primeiro lugar, como já indicámos, no quadro do regime luxemburguês, as tabelas são calculadas segundo a natureza e o custo da prestação e não em função da contribuição paga. Para mais, as despesas que resultam dos cuidados dispensados em caso de parto são cobertas directamente pelo Estado e não pelas caixas de seguro, caso em que a falta de pagamento de contribuições sociais poderia eventualmente ter uma certa importância.
94 Como a Comissão observa, com razão, se concordarmos com o argumento supracitado, combinado com a afirmação do CHL, recorrido no processo principal, de que as tabelas aplicadas aos funcionários das Comunidades Europeias correspondem ao valor real das prestações dispensadas, isto significaria que as tabelas que são aplicadas aos filiados no regime nacional são inferiores ao custo - facto que cabe, em todo o caso, ao juiz nacional verificar - e que se poderia exigir um pagamento suplementar aos nacionais dos outros Estados-Membros uma vez que eles não pagam impostos nem cotizações neste Estado. No entanto, um tal resultado seria contrário ao princípio comunitário da livre circulação das pessoas, que impõe a concessão aos nacionais dos outros Estados-Membros dos mesmos direitos atribuídos aos nacionais, mesmo se isso der origem a um custo suplementar para o Estado-Membro no qual esses nacionais não pagam impostos nem cotizações (54).
95 Enfim, como a Comissão sublinha com razão, ainda que todos os argumentos que precedem, relativos à situação financeira dos funcionários das Comunidades e à circunstância de não pagarem impostos nem contribuições para a segurança social, pudessem eventualmente ser utilizados para tentar justificar a não cobertura e reembolso das despesas de saúde pelas caixas de seguro luxemburguesas, não parecem, em qualquer caso, apropriados para justificar simplesmente uma majoração das tabelas dos cuidados.
c) Quanto à justificação da diferença de tratamento
96 A diferença de tratamento quanto às tabelas de cuidados médicos e hospitalares de que são objecto os não filiados no regime luxemburguês de segurança social não parece justificada objectivamente, elemento que, entre outros, prova que esta diferença de tratamento é contrária ao direito comunitário (55).
97 Além do facto de não serem invocadas pelo CHL nem pelo Governo luxemburguês, nenhuma das excepções previstas no artigo 48._, n._ 3, do Tratado, nem mesmo a que visa a saúde pública, parece poder aplicar-se no caso em apreço. Como a Comissão assinala com razão, não se poderia razoavelmente imaginar que a saúde pública dependesse de uma diferenciação de tabelas de cuidados médicos dispensados, por um lado, aos filiados no regime nacional e, por outro, aos funcionários das Comunidades nem, naturalmente, que a aplicação das mesmas tabelas constitui uma ameaça para a saúde pública.
98 Visto que a diferença de tratamento em litígio respeita a um problema puramente económico, poder-se-ia eventualmente afirmar que entra no âmbito da jurisprudência Decker, de que «objectivos de natureza puramente económica não podem justificar um entrave ao princípio fundamental da livre circulação de mercadorias. Não pode excluir-se, no entanto, que um risco grave para o equilíbrio financeiro do sistema de segurança social possa constituir uma razão imperiosa de interesse geral susceptível de justificar esse entrave» (56).
99 Além do facto de ninguém invocar nem provar «um risco grave para o equilíbrio financeiro do sistema de segurança social» luxemburguês, não parece que esse risco exista na prática.
100 Deve recordar-se que nem o Estado luxemburguês nem as caixas de seguro desse Estado cobrem as despesas que resultam dos cuidados médicos e hospitalares dispensados em caso de maternidade aos não filiados no regime nacional, e em particular aos funcionários das Comunidades, ao passo que, no caso dos filiados, aquelas despesas são cobertas pelo Estado e não pelas caixas de seguro. Em consequência, apesar do número talvez importante de funcionários das Comunidades que residem no Luxemburgo, os cuidados médicos e hospitalares dispensados em caso de maternidade a esses funcionários não sobrecarregam especialmente o regime de segurança social deste Estado.
101 Se se demonstrasse que as tabelas aplicadas aos filiados no regime nacional são inferiores ao custo das prestações, poder-se-ia eventualmente sustentar que a aplicação dessas tabelas aos funcionários das Comunidades, que não estão filiados no regime nacional, sobrecarregaria o orçamento afectado ao financiamento, pelo Estado, dos cuidados médicos e hospitalares dispensados em caso de maternidade. No entanto, como já indicámos, por um lado, isto não é contrário ao espírito da protecção da livre circulação de pessoas no interior da Comunidade (57) e, por outro, não se pode objectar aos funcionários das Comunidades que devem pagar mais caro os mesmos serviços porque não pagam impostos ao Estado luxemburguês (58).
102 Em última análise, nada permite afirmar que, devido aos seus rendimentos - eventualmente - em comparação elevados ou devido aos limites máximos - eventualmente - também em comparação elevados, até aos quais a sua caixa de doença cobre e reembolsa as despesas, os funcionários das Comunidades e o seu organismo de seguro devem financiar o regime luxemburguês de segurança social.
d) Conclusão quanto à proibição de discriminações em razão da nacionalidade
103 Tendo em vista as observações que precedem, pensamos portanto que o artigo 7._, n._ 2, do Regulamento n._ 1612/68 significa que exclui a aplicação, aos nacionais dos Estados-Membros que trabalham no território de um outro Estado-Membro, como no caso em apreço, o Luxemburgo, mas não estão filiados no regime nacional de segurança social deste Estado e entre os quais figuram os funcionários das Comunidades, que estão filiados no RCSD, de tabelas mais elevadas, pelos cuidados médicos e hospitalares dispensados em caso de maternidade, que os em vigor para as pessoas residentes neste Estado que estão filiadas no regime nacional de segurança social.
104 Como a Comissão assinala, é preciso admitir, em consequência do que precede, que «os membros do grupo desfavorecido devem ser tratados do mesmo modo e segundo o mesmo regime que os outros interessados, regime este que, na falta da aplicação correcta do direito comunitário, é o único sistema de referência válido» (59).
C - Quanto à protecção da concorrência
105 No caso em apreço, a eventual violação do artigo 85._, n._ 1, do Tratado diz respeito principalmente ao facto de um acordo entre hospitais, como no caso em apreço, a EHL, aplicar a pessoas e organismos não filiados no regime nacional de segurança social e entre os quais figuram os funcionários das Comunidades, filiados no RCSD, tabelas mais elevadas para os cuidados hospitalares dispensados em caso de maternidade que as em vigor para os filiados no regime nacional de segurança social.
106 Deve assinalar-se, preliminarmente, que a violação supracitada, na medida em que exista, pode ser atribuída ao próprio Estado-Membro, cujo quadro legal e regulamentar permite violações deste tipo (60). Como o Tribunal de Justiça declarou, embora seja verdade que, por si só, o artigo 85._ do Tratado diz unicamente respeito ao comportamento das empresas e não visa medidas legislativas ou regulamentares adoptadas pelos Estados-Membros, é igualmente verdade que este artigo, lido em conjugação com o artigo 5._ do Tratado, impõe aos Estados-Membros que não tomem ou mantenham em vigor medidas, mesmo de natureza legislativa ou regulamentar, susceptíveis de eliminar o efeito útil das regras da concorrência aplicáveis às empresas. Tal é o caso quer quando um Estado-Membro impõe ou favorece a celebração de acordos contrários ao artigo 85._ ou reforça os efeitos de tais acordos, quer quando retira à sua regulamentação o carácter estatal delegando em operadores privados a responsabilidade de tomar decisões de intervenção em matéria económica (61).
107 Portanto, para decidir se existe, no caso em apreço, um acordo entre empresas, uma decisão de associação de empresas ou uma prática concertada proibidos, na acepção do artigo 85._, n._ 1, do Tratado (f), examinaremos a seguir se as condições necessárias estão preenchidas e, precisamente, se existe uma empresa e uma associação de empresas (a), um acordo entre empresas, uma decisão de associação de empresas ou uma prática concertada (b), que tem por objecto ou por efeito impedir, restringir ou falsear a concorrência no mercado comum (c) e é susceptível de afectar o comércio entre os Estados-Membros (d) de maneira sensível (e).
a) Quanto à existência de uma empresa e de uma associação de empresas
108 O artigo 85._, n._ 1, do Tratado visa os acordos entre empresas, as decisões de associação e as práticas concertadas. Em consequência, convém examinar, em primeiro lugar, se os hospitais são empresas e se uma associação entre hospitais, tal como a EHL, é uma associação de empresas, na acepção da disposição em questão.
109 Segundo a jurisprudência, a noção de empresa «abrange qualquer entidade que exerça uma actividade económica, independentemente do seu estatuto jurídico e do seu modo de financiamento» (62).
110 Em nossa opinião, não existe qualquer dúvida de que, nas relações com os não filiados no regime nacional de segurança social e, em particular, com os funcionários das Comunidades, relações que nos interessam directamente no caso em apreço, os hospitais luxemburgueses, independentemente do seu carácter público ou privado, são empresas no sentido definido acima.
111 O CHL e os outros hospitais luxemburgueses exercem uma actividade económica na medida em que dispensam serviços - no caso em apreço, os cuidados médicos em caso de maternidade - contra remuneração (63). Pensamos que, tendo em conta a interpretação extensiva que o Tribunal de Justiça faz da noção de actividade económica e, por consequência, da noção de «empresa», não se pode objectar que actividades profissionais tais como as ligadas à profissão médica são reguladas por regras particulares quanto à deontologia e à determinação dos honorários, em princípio, são desprovidas de carácter comercial e não podem, por esses únicos motivos, constituir uma actividade económica submetida às regras da concorrência (64). Isto é ainda mais verdadeiro quando, como explicaremos a seguir, o elo de ligação concreto do objecto da actividade em causa com o acordo entre empresas, a decisão de associação de empresas ou a prática concertada não justifica que se invoquem os motivos supracitados, que, à primeira vista, com efeito, dão uma especificidade às actividades de prestação de cuidados médicos e hospitalares.
112 Além disso, em princípio, é indiferente que um hospital seja público ou privado, embora o carácter público de um hospital possa, em certas condições, que indicaremos a seguir, suscitar dúvidas quanto à sua qualificação enquanto empresa.
113 Como a Comissão assinala com razão, não se poderia sustentar que, nas suas relações com os não filiados no regime nacional de segurança social, os hospitais, mesmo se os pudéssemos qualificar como públicos, exerciam uma actividade que se insere no quadro do serviço de segurança social. Visto que os próprios hospitais invocam o facto de os funcionários das Comunidades não entrarem neste quadro, as suas relações com estes últimos, apesar de dizerem respeito aos cuidados médicos e hospitalares, só podem ser, em princípio, qualificadas como económicas e estranhas a qualquer noção de solidariedade nacional no quadro da segurança social. Em consequência, não se deve aplicar a jurisprudência que decorre do acórdão Poucet e Pistre, supracitado, em que o Tribunal de Justiça considerou que «as caixas de doença ou os organismos que contribuem para a gestão do serviço público de segurança social desempenham uma função de carácter exclusivamente social. Essa actividade é, com efeito, baseada no princípio da solidariedade nacional e desprovida de qualquer fim lucrativo. As prestações pagas são prestações legais independentemente do montante das contribuições. Daqui resulta que essa actividade não é uma actividade económica e que, por isso, os organismos que dela são encarregados não constituem empresas, na acepção dos artigos 85._ e 86._ do Tratado» (65). Para mais, no caso em apreço, o acordo presumido diz respeito simplesmente aos hospitais e não às caixas de doença ou aos organismos de seguro. Além disso, como resulta dos próprios dados da questão prejudicial, a EHL, enquanto associação entre estes hospitais, tem a possibilidade de fixar o nível da contrapartida exigível pelos serviços dispensados aos não filiados no regime nacional de segurança social e mesmo de a fixar unilateralmente, sem dever concluir previamente um acordo com os organismos de seguro em questão.
114 Quanto a este último ponto, que é também o ponto em litígio no que diz respeito à eventual violação das regras da concorrência, deve assinalar-se que, como o Tribunal de Justiça indicou, «a noção de empresa, entendida no contexto de direito da concorrência, deve ser considerada como designando uma unidade económica do ponto de vista do objecto do acordo» (66). Por outras palavras, em cada processo, a noção de «empresa» deve ser entendida num sentido funcional, tendo em conta a actividade ligada ao objecto do acordo entre empresas, da decisão de associação de empresas ou da prática concertada em questão.
115 No caso em apreço, esta aproximação funcional do problema incita a considerar que a relação entre os hospitais e os não filiados no regime nacional de segurança social depende do sector privado da economia e constitui um obstáculo a que se encare, mesmo para os hospitais públicos, uma actividade ligada ao exercício de privilégios ligados ao poder público, que servem o interesse público ou protegem a saúde pública. Na realidade, como indicámos no número precedente das presentes conclusões, seria muito difícil sustentar que a fixação unilateral de tabelas mais elevadas para os não filiados no regime nacional de segurança social é necessária por razões de interesse público ou de protecção da saúde pública.
116 Uma vez que, nas suas relações com os não filiados no regime nacional de segurança social, os hospitais podem ser qualificados como empresas, parece que a associação existente entre eles, no caso em apreço a EHL, possa constituir uma associação de empresas no quadro das relações supracitadas. No entanto, visto que a decisão de reenvio não menciona em pormenor as regras que regem a organização e o funcionamento da EHL, não parece que o Tribunal de Justiça possa apreciar os elementos invocados principalmente por A. Ferlini, segundo os quais a EHL é uma associação sem fim lucrativo com personalidade jurídica, mas deve ser considerada uma associação de empresas, na acepção do artigo 85._, n._ 1. Cabe ao juiz nacional, que conhece o direito nacional, apreciar estes elementos e aplicar os critérios definidos pela jurisprudência do Tribunal de Justiça quanto à existência de uma «associação de empresas» (67); de qualquer modo, ele pode, se julgar necessário, apresentar sobre este ponto uma questão prejudicial ao Tribunal de Justiça. No entanto, deve assinalar-se que as observações que seguem referentes à existência ou não de um acordo de empresas, de uma decisão de associação de empresas ou de uma prática concertada correm o risco de tornar supérflua a elucidação da questão de saber se existe ou não uma «associação de empresas».
b) Quanto à existência de um acordo de empresas, de uma decisão de associação de empresas ou de uma prática concertada
117 Como a Comissão observa, a questão prejudicial apresentada parece partir da hipótese, se não da certeza, de que existe entre os hospitais luxemburgueses um acordo que tem por fim aplicar às pessoas e organismos que não estão filiados no regime nacional de segurança social e aos funcionários das Comunidades, que estão filiados no RCSD, tabelas uniformes pelos cuidados dispensados em caso de maternidade. É no quadro deste acordo que parece inscrever-se a fixação pela EHL das tabelas hospitalares aplicáveis, a partir de 1 de Janeiro de 1989, às pessoas e organismos não filiados no regime nacional de segurança social. Estas tabelas parecem ter sido respeitadas pelos hospitais que aderem à EHL, entre os quais o CHL.
118 Visto que o artigo 85._, n._ 1, do Tratado visa três formas eventuais de cooperação (acordo entre empresas, decisão de associação de empresas e prática concertada), não parece que seja muito importante fazer uma distinção precisa entre elas para responder à presente questão prejudicial. No entanto, resulta do que precede que, no caso em apreço, se trata, segundo toda a probabilidade, de uma decisão de associação de empresas, sem que se possa, bem entendido, excluir a existência de um acordo entre empresas ou uma simples prática concertada. Em todo o caso, cabe aqui também ao juiz nacional, que conhece melhor os aspectos jurídicos e os factos do processo principal, proceder à qualificação apropriada, aplicando as conclusões da jurisprudência do Tribunal de Justiça e colocando, eventualmente, se necessário, uma nova questão prejudicial ao Tribunal de Justiça sobre esta qualificação.
c) Quanto a saber se o jogo da concorrência é entravado, restringido ou falseado
119 O artigo 85._, n._ 1, do Tratado proíbe todos os acordos de empresas, todas as decisões de associação de empresas e todas as práticas concertadas que tenham por objecto ou por efeito impedir, restringir ou falsear a concorrência.
120 Além disso, «segundo uma jurisprudência constante do Tribunal, é desnecessária a tomada em consideração dos efeitos concretos de um acordo, desde que se verifique que o seu objectivo é o de restringir, impedir ou falsear a concorrência. Esta conclusão é aplicável às decisões das associações de empresas» (68).
121 Para mais, o acordo horizontal, a prática concertada ou a decisão de associação de empresas de um mesmo sector que visa fixar uma tabela uniforme das prestações fornecidas constituem, como indicam tanto a Comissão como A. Ferlini, um exemplo clássico de acordo que tem por objecto restringir a concorrência no mercado de serviços em questão. É por esta razão que o artigo 85._, n._ 1, alínea a), do Tratado menciona expressamente, entre as formas de violação das regras da livre concorrência, a fixação directa ou indirecta de preços de compra ou de venda de bens ou de serviços (69).
122 No caso em apreço, não parece duvidoso que a fixação de tabelas uniformes para os cuidados hospitalares dispensados em caso de maternidade, aplicáveis às pessoas e organismos não filiados no regime luxemburguês de segurança social, entre no âmbito da regra que proíbe todos os acordos entre empresas, todas as decisões de associação de empresas e todas as práticas concertadas que têm por objecto restringir a concorrência no quadro da prestação dos serviços supracitados.
d) Quanto à incidência sobre o comércio intracomunitário
123 É preciso recordar que, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, o artigo 85._, n._ 1, do Tratado não exige que os acordos visados por esta disposição tenham afectado as trocas comerciais intracomunitárias, prova que, de resto, na maioria dos casos, só dificilmente poderia ser feita, mas exige o apuramento de que estes acordos são de natureza a produzir tal efeito (70). Do mesmo modo, segundo jurisprudência constante, «para que uma decisão, um acordo ou uma prática concertada possa afectar o comércio entre Estados-Membros, deve, com base num conjunto de elementos de direito ou de facto, deixar prever, com suficiente grau de probabilidade, que pode exercer uma influência directa ou indirecta, actual ou potencial, sobre o desenrolar das trocas comerciais entre os Estados-Membros, de modo a fazer recear a criação de entraves à realização de um mercado único entre os Estados-Membros» (71).
124 Além disso, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, «o facto de um acordo de preços do tipo do que está aqui em causa só ter por objecto a comercialização de produtos num único Estado-Membro não é suficiente para excluir que o comércio entre Estados-Membros possa ser afectado. Com efeito, um acordo que abrange a totalidade do território de um Estado-Membro é, por sua própria natureza, susceptível de produzir o efeito de consolidar compartimentações de carácter nacional, criando assim um obstáculo à interpenetração económica pretendida pelo Tratado e assegurando uma protecção à produção nacional. A este respeito, torna-se necessário averiguar ao mesmo tempo quais os meios de que dispõem os membros de um acordo, decisão ou prática concertada para garantir a fidelidade da clientela, a importância relativa do acordo no mercado do produto em causa bem como o contexto económico em que se integra» (72).
125 No caso em apreço, a incidência sobre o comércio intracomunitário pode resultar do facto de a aplicação de tabelas mais elevadas aos cuidados hospitalares dispensados em caso de maternidade poder, com toda a probabilidade, conduzir os não filiados no regime luxemburguês a desejarem ser hospitalizados fora do Luxemburgo. Por outras palavras, é provável que a decisão em litígio do EHL, que fixou tabelas mais elevadas para os não filiados no regime nacional de segurança social e para os funcionários das Comunidades que trabalham no Luxemburgo, que estão filiados no RCSD, desvie da sua orientação esperada o comércio relativo aos cuidados hospitalares dispensados em caso de maternidade existente no mercado em questão.
126 Embora caiba ao juiz nacional, que conhece melhor o direito nacional e os factos do processo principal, examinar com pormenor os parâmetros jurídicos e factuais com base nos quais a incidência em questão sobre o comércio intracomunitário poderá ser estabelecida com uma certa probabilidade, devem assinalar-se certos elementos que, tendo em vista os critérios definidos pela jurisprudência, deveriam conduzir de modo positivo à conclusão em questão.
127 Por um lado, a fixação de tabelas mais elevadas para os cuidados hospitalares dispensados em caso de maternidade, relativas ao conjunto do território e dos hospitais de um Estado-Membro pode, de uma maneira geral, pelo facto da sua própria natureza, ter por resultado reforçar a impermeabilidade do mercado nacional, constituindo assim um obstáculo à interpenetração económica a que visa o Tratado. O facto de, no caso em apreço, se tratar do Estado luxemburguês e, principalmente, dos funcionários das Comunidades que trabalham no território deste último, advoga amplamente em favor da probabilidade supramencionada. Devido à pequena extensão deste Estado e à vizinhança com três outros Estados-Membros (Bélgica, França e Alemanha), pode considerar-se que é muito provável que uma grande parte dos funcionários das Comunidades, que trabalham no Luxemburgo, desejem receber os cuidados hospitalares necessários nos hospitais destes Estados vizinhos, do mesmo modo que é muito provável que os funcionários das Comunidades que trabalham nestes Estados evitem ser hospitalizados nos hospitais luxemburgueses devido às tabelas elevadas que estes lhes aplicam. Para mais, não se pode excluir a eventualidade, que invoca A. Ferlini nas suas observações, de os hospitais dos Estados vizinhos tentarem adaptar as suas tabelas às tabelas mais elevadas fixadas pela EHL, nem a eventualidade, que invoca a Comissão, de os organismos junto dos quais estão segurados os não filiados no regime nacional de segurança social celebrarem convenções de preferência com os hospitais ou clínicas que se encontram num outro Estado-Membro.
128 Por outro lado, a natureza dos cuidados hospitalares em litígio, dispensados em caso de maternidade, reforça ainda a probabilidade evocada acima (73). A possibilidade de prever a evolução da gravidez permite habitualmente programar o lugar do parto. Além disso, poder-se-ia sustentar que as distâncias similares entre os hospitais belgas, franceses, alemães e luxemburgueses permitem escolher um hospital em função da tabela dos serviços dispensados, mesmo em caso de circunstâncias relativamente excepcionais.
129 Quanto a este ponto, deve salientar-se que o juiz nacional pode bem chegar à conclusão de que as restrições prováveis às trocas comerciais intracomunitárias de que acabamos de falar não foram observadas na prática até ao presente - sobretudo com o carácter sensível que exige a jurisprudência (74), porque as tabelas majoradas dos cuidados hospitalares dispensados em caso de maternidade, que são aplicadas particularmente aos funcionários das Comunidades, estão cobertas numa medida muito larga pelo RCSD, o que reduz a importância que tem para eles o nível das tabelas em questão quando devem escolher um hospital. No entanto, esta constatação eventual não deve levar a concluir que não há qualquer incidência no comércio intracomunitário, na acepção das disposições do direito comunitário. Por um lado, é preciso recordar que basta que esta incidência seja provável e que não é exigido que ela já se tenha concretizado. Por outro lado, a cobertura das tabelas elevadas pelo RCSD constitui um factor exterior e susceptível de modificação que contribui para que a incidência supramencionada não se manifeste na prática, factor que não é de natureza a afastar duravelmente e de maneira geral a possibilidade que a fixação em litígio de tabelas mais elevadas tenha, pela sua própria natureza, incidência no comércio intracomunitário (75). A este respeito, na medida em que se considera que a fixação das tabelas mencionadas implica uma discriminação em razão da nacionalidade e é contrária ao direito comunitário, é muito provável que o RCSD venha a deixar de cobrir estas tabelas elevadas supramencionadas, o que, no caso dos hospitais luxemburgueses manterem estas tabelas, fará aparecer na prática a sua incidência sobre o comércio intracomunitário.
e) Quanto ao carácter sensível da restrição da concorrência e da incidência sobre o comércio intracomunitário
130 Para que caiam sob a alçada da proibição enunciada no artigo 85._ do Tratado, um acordo entre empresas, uma decisão de associações de empresas ou uma prática concertada devem ser susceptíveis (76) de afectar sensivelmente o comércio entre os Estados-Membros e a concorrência. Quanto a este ponto, o Tribunal de Justiça considerou que «a influência que um acordo pode exercer sobre o comércio entre Estados-Membros aprecia-se tendo nomeadamente em consideração a posição e a importância das quotas no mercado dos produtos em causa... Assim, mesmo um acordo que contém uma protecção territorial absoluta escapa à proibição do artigo 85._ do Tratado quando só afecta o mercado de modo insignificante, tendo em conta a débil posição que os interessados ocupam no mercado dos produtos em causa...» (77).
131 No caso em apreço, cabe ao juiz nacional, que conhece melhor a matéria jurídica e de facto do processo principal, apreciar se o comércio intracomunitário é afectado sensivelmente pela decisão do EHL, tendo em consideração o lugar que os hospitais luxemburgueses ocupam no mercado em questão. Todavia, convém delimitar previamente o mercado em questão.
132 Do ponto de vista do objecto, parece que o mercado em questão é o mercado dos serviços hospitalares fornecidos em caso de maternidade às pessoas que trabalham no Luxemburgo não filiadas no regime nacional de segurança social deste Estado. O mercado dos serviços em questão parece gozar, de facto, de um autonomia relativa, porque, como a Comissão sublinha, diferencia-se do mercado de serviços correspondentes que visa os filiados no regime nacional, para os quais foram fixadas tabelas de modo uniforme, quer por via regulamentar, quer com base em convenções colectivas tornadas obrigatórias para todos. Para mais, deve assinalar-se que, do ponto de vista da procura, isto é, das pessoas que não estão filiadas no regime nacional de segurança social e têm necessidade de cuidados hospitalares dispensados em caso de maternidade, os cuidados em questão não têm substituto, circunstância que reforça ainda mais a autonomia do mercado em questão.
133 No plano geográfico, o mercado em questão parece ser mais penoso a delimitar. A sua definição depende do lugar de residência das pessoas que trabalham no Luxemburgo não filiadas no regime nacional de segurança social e que, na maior parte, parece serem funcionários das Comunidades. Em particular, é preciso ter em conta a extensão geográfica do lugar em que estão situados os estabelecimentos hospitalares que oferecem os cuidados dispensados em caso de maternidade e, tendo em conta a natureza desses cuidados, se encontram a uma distância apropriada do lugar de residência dos destinatários supramencionados destes cuidados. Poder-se-ia sustentar que, em grandes linhas, estes critérios delimitam, do ponto de vista geográfico, o mercado em questão que se estende, no caso em apreço, pelo território do Luxemburgo e por parte do território dos Estados vizinhos.
134 Com base nas considerações que precedem, cabe ao juiz nacional determinar se, no interior do mercado assim definido geograficamente, a parte de mercado detida pelos hospitais que participam na EHL no que diz respeito aos cuidados supramencionados dispensados às pessoas que trabalham no Luxemburgo não filiadas no regime nacional de segurança social é significativa ou não.
f) Conclusão quanto à protecção da concorrência
135 Tendo em conta as observações que precedem, pensamos que o artigo 85._, n._ 1, do Tratado deve ser interpretado no sentido de proibir uma decisão de associação dos hospitais, tal como, no caso em apreço, a decisão da EHL, que fixa, para os nacionais dos Estados-Membros que trabalham no território de um outro Estado-Membro, como, no caso em apreço, o Grão-Ducado do Luxemburgo, mas não estão filiados no regime nacional de segurança social deste Estado e entre os quais figuram os funcionários das Comunidades, que estão filiados no RCSD, tabelas relativas aos cuidados hospitalares dispensados em caso de maternidade mais elevadas que as em vigor para os residentes deste Estado filiados no regime nacional de segurança social, se o juiz nacional considerar que a decisão supracitada é de natureza a afectar sensivelmente o comércio intracomunitário (78).
VI - Conclusão
136 Propomos ao Tribunal de Justiça que responda nos seguintes termos à questão prejudicial apresentada pelo Tribunal d'arrondissement de Luxembourg (8.° Secção):
«1) O artigo 7._, n._ 2, do Regulamento (CEE) n._ 1612/68 do Conselho, de 15 de Outubro de 1968, relativo à livre circulação dos trabalhadores na Comunidade, deve ser interpretado no sentido de que não permite a aplicação aos nacionais dos Estados-Membros que trabalham no território de um outro Estado-Membro, como no caso em apreço, o Grão-Ducado do Luxemburgo, mas não estão filiados no regime nacional de segurança social deste Estado, e entre os quais figuram os funcionários das Comunidades Europeias, que estão filiados no RCSD, tabelas mais elevadas relativas aos cuidados médicos e hospitalares dispensados em caso de maternidade do que aquelas em vigor para os residentes deste Estado que estão filiados no regime nacional de segurança social.
2) O artigo 85._, n._ 1, do Tratado CEE deve ser interpretado no sentido de proibir uma decisão de associação de hospitais, como no caso em apreço, a decisão da EHL, que fixa, para os nacionais dos Estados-Membros que trabalham no território de um outro Estado-Membro, como, no caso em apreço, o Grão-Ducado do Luxemburgo, mas que não estão filiados no regime nacional de segurança social deste Estado, e entre os quais figuram os funcionários das Comunidades Europeias, que estão filiados no RCSD, tabelas mais elevadas relativas aos cuidados hospitalares dispensados em caso de maternidade do que as em vigor para os residentes deste Estado filiados no regime nacional de segurança social se se considerar que a decisão supracitada é de natureza a afectar sensivelmente o comércio intracomunitário.»
(1) - O órgão jurisdicional de reenvio refere-se aos artigos correspondentes do Tratado CE. No entanto, tendo em consideração a data dos factos objecto do processo principal, deve considerar-se que a resposta à questão prejudicial se refere à interpretação dos artigos do Tratado CEE.
(2) - JO L 257, p. 2; EE 05 F1 p. 77.
(3) - JO L 39, p. 2; EE 05 F2 p. 69.
(4) - JO L 230, p. 6; EE 05 F3 p. 53.
(5) - Segundo A. Ferlini, as Comunidades Europeias reivindicavam a mesma nomenclatura de actos médicos, as mesmas tabelas de cotização e as mesmas tarifas das aplicadas aos filiados no regime luxemburguês de segurança social. Todavia, os meios profissionais luxemburgueses opunham-se a estas reivindicações, desejando tabelar as prestações médicas em função dos rendimentos, presumidos importantes, dos funcionários das Comunidades e da natureza das prestações.
(6) - Mais precisamente, como o juiz nacional indica, antes de 1925, a legislação relativa à segurança social não previa a livre escolha do médico. Recomendava, mas não impunha, convenções entre as caixas de doença e os prestadores de serviços médicos. Se existiam convenções eram portanto de natureza puramente convencional. A lei de 17 de Dezembro de 1925 previa uma regulamentação geral das tabelas médicas, mas com uma grande margem de variação (do simples ao triplo). De resto, visto que fixava as contribuições máximas que podiam ser pedidas pelas caixas aos filiados, que podiam doravante escolher livremente o médico, eram necessárias convenções, apesar de continuarem a não ser obrigatórias. Para mais, a própria natureza da segurança social exige tabelas uniformes para todos os filiados que pertençam a uma mesma categoria profissional.
A lei de 6 de Setembro de 1933 introduziu no código da segurança social um artigo 308._ bis segundo o qual, na falta de convenção, um organismo paritário tomaria uma decisão que seria tornada obrigatória pelo governo. As convenções colectivas e as decisões da comissão tornavam-se obrigatórias depois de homologadas pelo governo. A partir de 1951, o benefício do seguro de doença foi estendido a toda a população. A associação dos médicos reivindicou uma certa liberdade de fixar as suas tabelas em função do rendimento do doente. Esta reivindicação foi satisfeita, numa certa medida, com a lei de reforma de 24 de Abril de 1954. Com a lei de reforma de 2 de Maio de 1974, o Governo impôs uma nomenclatura e uma tabela uniformes por actos médicos, qualquer que seja o rendimento do beneficiário e o nível de qualificação do prestador.
Depois desta lei, de facto, existem quatro tipos de normas: as convenções colectivas tornadas obrigatórias pelas portarias ministeriais, as decisões da comissão de conciliação e de arbitragem na falta de convenções colectivas, do mesmo modo tornadas obrigatórias pelas portarias ministeriais, as normas puramente convencionais e, por fim, as normas puramente regulamentares ou legais.
As prestações médicas susceptíveis de tabelas negociadas colectivamente ou fixadas por decisão da comissão paritária são em princípio apenas as que figuram numa nomenclatura fixada por portaria ministerial, que faz parte do estatuto das caixas de doença luxemburguesas.
A partir da lei orçamental de 20 de Dezembro de 1982, o legislador interveio directamente para fixar as tabelas de certas prestações. Pode-se constatar a mesma prática em todas as leis orçamentais desde essa data.
(7) - A Comissão indica que o sistema não mudou substancialmente a sua natureza, apenas com a diferença de que, agora, para o sector hospitalar e para o sector não hospitalar são celebradas convenções separadas.
(8) - Mémorial A n._ 95, de 31 de Dezembro de 1974, p. 2398.
(9) - O texto desta circular está em anexo às observações escritas de A. Ferlini.
(10) - Em referência à circular UCM, A. Ferlini afirma que o primeiro destes três componentes era determinado segundo a convenção entre a UCM e a Associação dos Médicos e dos Médicos Dentistas (a seguir «AMMD»), o segundo e o terceiro segundo a convenção entre a UCM e o EHL.
Além disso, A. Ferlini sublinha que, actualmente, o novo regime legal foi adaptado a esta prática, que consiste em fazer referência às tabelas determinadas convencionalmente para todos os componentes do montante fixo previsto.
(11) - As observações apresentadas por A. Ferlini indicam que este último possui a nacionalidade italiana.
(12) - V., a título indicativo, os acórdãos de 22 de Outubro de 1974, Demag (27/74. Colect., p. 459, n._ 8); de 28 de Janeiro de 1992, Bachmann (C-204/90, Colect., p. I-249, n._ 6); de 29 de Outubro de 1980, Boussac (22/80, Recueil, p. 3427, n._ 5), e de 7 de Março de 1990, Krantz (C-69/88, Colect., p. I-583, n._ 7).
(13) - Quanto à diferença entre discriminação formal e discriminação material, v., a título indicativo, o acórdão de 17 de Julho de 1963, Itália/Comissão [13/63, Colect. 1962-1964, p. 305, principalmente o n._ 4 a)].
(14) - No que diz respeito ao artigo 7._ do Tratado, v., a título indicativo, o acórdão de 10 de Fevereiro de 1994, Mund & Fester (C-398/92, Colect., p. I-467, n._ 17). No que diz respeito ao artigo 48._ do Tratado e ao artigo 7._ do Regulamento n._ 1612/68, v., a título indicativo, o acórdão de 27 de Novembro de 1997, Meints (C-57/96, Colect., p. I-6689, n._ 45).
(15) - V., a título indicativo, os acórdãos de 23 de Fevereiro de 1994, Scholz (C-419/92, Colect., p. I-505, n._ 7), e de 24 de Setembro de 1998, Comissão/França (C-35/97, Colect., p. I-5325, n._ 37).
(16) - V., a título indicativo, o acórdão Meints (já citado na nota 14 supra, n.os 45 e 46). De resto, como sublinha a Comissão, a circunstância de, na categoria favorecida, poderem figurar nacionais de outros Estados-Membros ou de, na categoria desfavorecida, poderem figurar nacionais do Luxemburgo não impede que exista uma discriminação indirecta. V., a título indicativo, o acórdão de 7 de Junho de 1988, Roviello (20/85, Colect., p. 2805, n._ 16).
(17) - V. o acórdão de 12 de Maio de 1998, Martínez Sala (C-85/96, Colect., p. I-2691, n._ 36).
(18) - Acórdão de 27 de Maio de 1993 (C-310/91, Colect., p. I-3011).
(19) - N._ 44.
(20) - A este respeito, deve assinalar-se que o artigo 16._, n._ 3 do Regulamento n._ 1408/71 prevê, especialmente para os agentes auxiliares das Comunidades Europeias, a possibilidade de escolher entre certos regimes nacionais de segurança social. Da limitação desta possibilidade de escolha, tal como sobressai da disposição supracitada, resulta indirectamente que o próprio regulamento admite que os funcionários permanentes das Comunidades não estão submetidos aos regimes nacionais nem, por conseguinte, dependem do seu âmbito de aplicação.
Segundo o Governo luxemburguês, o RCSD, que tem por base os direitos estatutários dos funcionários das Comunidades, não entra no âmbito de aplicação do Regulamento n._ 1408/71, na medida em que prevê um nível de protecção pelo menos equivalente às medidas de coordenação adoptadas localmente com base no artigo 51._ do Tratado.
(21) - V. o acórdão Martínez Sala (já referido na nota 17, supra, n._ 31).
(22) - V., de modo característico, o acórdão de 15 de Março de 1989, Echternach e Moritz (389/87 e 390/87, Colect., p. 723), em que o Tribunal de Justiça declarou que «um nacional de um Estado-Membro que ocupa, noutro Estado-Membro, um emprego regido por um estatuto especial de direito internacional, como por exemplo um emprego na Agência Espacial Europeia, deve ser considerado trabalhador de um Estado-Membro na acepção dos n.os 1 e 2 do artigo 48._ do Tratado e beneficia portanto, como os membros da sua família, dos direitos e privilégios previstos por estas disposições e pelas disposições do Regulamento n._ 1612/68 do Conselho» (n._ 15). V. também o acórdão Schmid (já referido na nota 18, n._ 20, supra).
(23) - Sobre a questão - diferente - do efeito directo horizontal do artigo 48._, v. a seguir o n._ 77 das presentes conclusões.
(24) - V. o acórdão de 14 de Março de 1996, De Vos (C-315/94, Colect., p. I-1417, n._ 18).
(25) - V., a título indicativo, os acórdãos de 14 de Janeiro de 1982, Reina (65/81, Recueil, p. 33, n._ 12); de 27 de Março de 1985, Hoeckx (249/83, Recueil, p. 973, n._ 20); de 6 de Junho de 1985, Frascogna (157/84, Recueil, p. 1739, n._ 30), assim como os acórdãos Schmid (já referidos supra na nota 18, n._ 18) e Meints (já referido na nota 14, supra, n._ 39).
(26) - V. o acórdão de 10 de Março de 1993, Comissão/Luxemburgo (C-111/91, Colect., p. I-817).
(27) - V., a título indicativo, os acórdãos de 15 de Outubro de 1969, Ugiola (15/69, Colect. 1969-1970, p. 131), relativo à protecção contra as desvantagens que resultam do cumprimento das obrigações militares; de 13 de Dezembro de 1972, Marsman (44/72, Colect., p. 429), relativo às medidas de protecção contra o despedimento; de 12 de Fevereiro de 1974, Sotgiu (152/73, Colect., p. 91), relativo à «compensação por separação» atribuída aos trabalhadores afectados a um lugar diferente do seu domicílio; de 30 de Setembro de 1975, Cristini (32/75, Colect., p. 359) relativo ao cartão de redução emitido por um organismo nacional de caminho-de-ferro; de 12 de Julho de 1984, Prodest (237/83, Recueil, p. 3153), relativo ao direito a conservar a inscrição no regime de segurança social do Estado-Membro onde a empresa está estabelecida, e de 11 de Julho de 1985, Mutsch (137/84, Recueil, p. 2681), relativo à possibilidade de um trabalhador utilizar a sua língua materna no quadro de um processo nos órgãos jurisdicionais do Estado-Membro onde reside.
(28) - V. o acórdão de 26 de Janeiro de 1999, Terhoeve (C-18/95, Colect., p. I-345, n._ 41).
(29) - V. o acórdão Terhoeve (já referido na nota 28, n._ 40).
(30) - V., a título indicativo, os acórdão de 30 de Maio de 1989, Comissão/Grécia (305/87, Colect., p. 1461, n._ 13), e de 17 de Maio de 1994, Corsica Ferries (C-18/93, Colect., p. I-1783, n._ 19). Quanto ao carácter dito subsidiário do artigo 6._ do Tratado CE, v. também as conclusões do advogado-geral La Pergola (n.os 10 e segs.) no processo Data Delecta e Forsberg (acórdão de 26 de Setembro de 1996, C-43/95, Colect., p. I-4661).
(31) - V., de modo característico, o acórdão Data Delecta e Forsberg (já referido supra, na nota 30, n.os 14 e 15), relativo às disposições legais nacionais que entram no âmbito de aplicação do Tratado em virtude da sua incidência, mesmo indirecta, no comércio intracomunitário de produtos e serviços.
(32) - Sobre a formação profissional, v., a título indicativo, os acórdãos de 13 de Fevereiro de 1985, Gravier (293/83, Recueil, p. 593), e de 2 de Fevereiro de 1988, Blaizot e o. (24/86, Colect., p. 379).
(33) - A esposa de Forcheri tinha incontestavelmente a nacionalidade italiana.
(34) - Acórdão de 13 de Julho de 1983 (152/82, Recueil, p. 2323, n._ 9).
(35) - N._ 18.
(36) - V. Starkle, G., «Extensão do princípio da não discriminação em direito comunitário ao nacional de um Estado-Membro legalmente instalado num outro Estado-Membro» [observações sobre o acórdão Forcheri, supracitado], em Cahiers de droit européen, 1984, pp. 672 e segs. Também, segundo o advogado-geral Darmon, no acórdão Forcheri, o Tribunal de Justiça consagra «aparentemente o direito de todo o nacional comunitário, independentemente do seu vínculo de trabalho com as instituições comunitárias, a beneficiar da `totalidade das vantagens que decorrem do direito comunitário', nomeadamente em matéria de livre circulação dos trabalhadores» (conclusões no acórdão Echternach e Moritz, já referido na nota 22, n._ 37).
(37) - O artigo 8._ está formulado do seguinte modo: «1. É instituída a cidadania da União.
É cidadão da União qualquer pessoa que tenha a nacionalidade de um Estado-Membro.
2. Os cidadãos da União gozam dos direitos e estão sujeitos aos deveres previstos no presente Tratado.»
Além disso, nos termos do artigo 8._-A, n._ 1, «Qualquer cidadão da União goza do direito de circular e permanecer livremente no território dos Estados-Membros, sem prejuízo das limitações e condições previstas no presente Tratado e nas disposições adoptadas em sua aplicação».
(38) - V. o acórdão Martínez Sala, já referido na nota 17, n.os 62 e 63.
(39) - Quanto aos cuidados médicos, a Comissão faz referência ao acórdão de 31 de Janeiro de 1984, Luisi e Carbone (286/82 e 26/83, Recueil, p. 377), onde o Tribunal de Justiça considerou que «os turistas, os beneficiários dos tratamentos médicos... devem ser considerados como destinatários dos serviços» (n._ 16).
(40) - V. supra, n.os 52 e segs. das presentes conclusões.
(41) - Os principais argumentos que justificavam estas hesitações eram os seguintes: a) a economia geral do Tratado é fundamentada nas obrigações dos Estados-Membros, salvo em alguns casos poucos numerosos em que o Tratado impõe expressamente obrigações a particulares, sobretudo às empresas, por motivos de protecção da concorrência; b) outras disposições do Tratado cuja formulação é vaga, como o artigo 48._, n._ 2, do Tratado não tinham efeito directo horizontal; c) cabe à Comissão, em primeiro lugar, controlar o cumprimento das obrigações que decorrem do Tratado, podendo apenas agir no Tribunal de Justiça contra actos imputados a um Estado-Membro. V., sobre este assunto, Durand, C.-F., «Les principes», em Commentaire Mégret. Le droit de la CEE, t.1 Préambule. Principes. Libre circulation des marchandises, Éditions de l'Université de Bruxelles, Études européennes, 2.° edição, 1992, p. 60.
(42) - V. o acórdão de 12 de Dezembro de 1974, Walrave e Koch (36/74, Colect., p. 595, n.os 16 e 17). V. também o acórdão de 14 de Julho de 1976, Donà (13/76, Colect., p. 545, n.os 17 e segs.).
(43) - V. o acórdão de 15 de Dezembro de 1995, Bosman (C-415/93, Colect., p. I-4921, n.os 83 e 84).
(44) - V., a seguir, os n.os 113 a 115 das presentes conclusões.
(45) - V. o acórdão de 9 de Dezembro de 1997, Comissão/França (C-265/95, Colect., p. I-6959, n.os 30 a 32), que diz respeito mais particularmente à livre circulação de mercadorias.
(46) - V., a título indicativo, o acórdão de 31 de Maio de 1995, Royal Copenhagen (C-400/93, Colect., p. I-1275, n._ 45).
(47) - Como o juiz nacional indica, «no momento em que a Sr.° Ferlini esteve hospitalizada, o montante fixo reembolsável pela Caixa de Doença luxemburguesa era de 36 854 francos, ou seja, 4 645 francos por assistência médica, 29 949 francos por despesas de maternidade e 2 260 francos para produtos dietéticos, enquanto o recorrente e o RCSD tinham de pagar 59 306 francos pelos mesmos serviços, ou seja, um acréscimo de 71,43% em relação à tabela nacional».
(48) - V. supra, n._ 77 das presentes conclusões.
(49) - V. o acórdão de 28 de Abril de 1998, Kohll (C-158/96, Colect., p. I-1931, n.os 18 e 19).
(50) - V. o artigo 18._ do protocolo.
(51) - V. o artigo 6._ do protocolo.
(52) - A nomeação na qualidade de funcionário das Comunidades de uma pessoa que não tem a qualidade de nacional de um Estado-Membro é possível no caso de derrogação como previsto no artigo 28._, alínea a), do EF.
(53) - V. o acórdão Forcheri (já referido supra, na nota 34, n._ 19).
(54) - V. os acórdãos de 2 de Fevereiro de 1989, Cowan (186/87, Colect., p. 195, n.os 15 a 17), e de 15 de Março de 1994, Comissão/Espanha (C-45/93, Colect., p. I-911), relativos ao direito dos turistas nacionais de um Estado-Membro da Comunidade se deslocarem para outro Estado-Membro e aí beneficiarem de serviços nas mesmas condições que os nacionais e as pessoas que aí residem em permanência.
(55) - V., a título indicativo, o acórdão Meints (já referido supra na nota 14, n._ 45).
(56) - V. o acórdão de 28 Abril de 1998 (C-120/95, Colect., p. I-1831, n._ 39).
(57) - V. supra o n._ 94 das presentes conclusões.
(58) - V. supra o n._ 92 das presentes conclusões.
(59) - V. o acórdão Terhoeve (já referido supra na nota 28, n._ 57).
(60) - V. supra o n._ 77 das presentes conclusões.
(61) - V., a título indicativo, o acórdão de 17 de Novembro de 1993, Meng (C-2/91, Colect., p. I-5751, n._ 14), e de 17 de Junho de 1997, Sodemare e o. (C-70/95, Colect., p. I-3395, n._ 41).
(62) - V., a título indicativo, os acórdãos de 23 de Abril de 1991, Höfner e Elser (C-41/90, Colect., p. I-1979, n._ 21), e de 17 de Fevereiro de 1993, Poucet e Pistre (C-159/91 e C-160/91, Colect., p. I-637, n._ 17).
(63) - V., sobre a noção de actividade económica, o acórdão de 18 de Junho de 1998, Comissão/Itália (C-35/96, Colect., p. I-3851, n._ 36).
(64) - V. Commentaire J. Mégret. Le droit de la CE. 4. Concurrence; Waelbroeck, M. et Frignani, A., Études européenes, colecção dirigida pelo Institut d'Études européennes, 2.° edição, 1997, pp. 37 e 38.
(65) - V. o acórdão Poucet e Pistre (já referido na nota 62, n.os 18 e 19).
(66) - V., sobre este ponto, o acórdão de 12 de Julho de 1984, Hydrotherm Gerätebau (170/83, Recueil, p. 2999, n._ 11).
(67) - Deve assinalar-se que se considera estar na presença de uma «associação de empresas» se existir um órgão de coordenação, mesmo não existindo personalidade jurídica (v., sobre este ponto, Commentaire J. Mégret, op. cit., pp. 133 e 134). Do mesmo modo, o Tribunal de Justiça considerou que o fim lucrativo ou não da associação era indiferente (v. o acórdão de 29 de Outubro de 1980, Van Landewyck e o./Comissão, 209/78 a 215/78 e 218/78, Recueil, p. 3125, n._ 88).
Além disso, deve assinalar-se que, no que diz respeito à existência de uma «associação de empresas», o Tribunal de Justiça repetiu várias vezes a ideia de uma representação imediata ou directa dos interesses dos operadores de um dado sector e definiu as condições em que os membros de certas comissões encarregadas de elaborar a tabela aplicável ao conjunto das empresas que exercem uma actividade determinada não podem ser considerados como representantes dos meios profissionais em questão. Tal é o caso, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, quando: a) Os membros das comissões em questão (comissões das tabelas) não estão obrigados por ordens ou instruções da parte das empresas ou associações que propuseram a sua designação; as comissões não podem ser consideradas como reuniões de representantes de empresas do sector em questão; os membros das comissões podem, por conseguinte, ser qualificados como peritos independentes; e b) A lei obriga os membros destas comissões de tabelas a fixar as tabelas em função não apenas dos interesses das empresas ou associações de empresas do sector que os designaram, mas também do interesse geral e dos interesses das empresas de outros sectores ou dos destinatários destes serviços. V., a título indicativo, os acórdãos de 17 de Novembro de 1993, Reiff (C-185/91, Colect., p. I-5801); de 9 de Junho de 1994, Delta Schiffahrts- und Speditionsgesellshaft (C-153/93, Colect., p. I-2517); de 5 de Outubro de 1995, Centro Servizi Spediporto (C-96/94, Colect., p. I-2883), e de 17 de Outubro de 1995, DIP e o. (C-140/94 a C-142/94, Colect., p. I-3257).
(68) - V. o acórdão de 27 de Janeiro de 1987, Verband der Sachversicherer/Comissão (45/85, Colect., p. 405, n._ 39).
(69) - V. os acórdão de 3 de Julho de 1985, Binon (243/83, Recueil, p. 2015, n._ 44), e Verband der Sachversicherer/Comissão (já referido na nota 68, n._ 41).
(70) - V., a título indicativo, os acórdãos de 30 de Janeiro de 1985, BNIC (123/83, Recueil, p. 391, n._ 22), e de 17 de Julho de 1997, Ferriere Nord/Comissão (C-219/95 P, Colect., p. I-4411, n._ 19).
(71) - V., a título indicativo, os acórdãos Ferriere Nord/Comissão (já referido na nota 70, n._ 20); de 12 de Dezembro de 1995, Oude Luttikhuis e o. (C-399/93, Colect., p. I-4515, n._ 18), e Van Landewyck e o./Comissão (já referido na nota 67, n._ 170).
(72) - V. o acórdão de 26 de Novembro de 1975, Groupement des fabricants de papiers peints de Belgique e o./Comissão (73/74, Colect., p. 503, n.os 25 a 27).
Deve-se assinalar que, nos outros acórdãos, o Tribunal de Justiça parece utilizar uma fórmula mais absoluta, quando indica simplesmente que «um acordo que se estende a todo o território de um Estado-Membro tem, pela sua própria natureza, por efeito consolidar barreiras de carácter nacional, entravando assim a interpenetração económica pretendida pelo Tratado.» V., a título indicativo, os acórdãos de 17 de Outubro de 1972, Vereniging van Cementhandelaren/Comissão (8/72, Colect., p. 333, n._ 29), e de 11 de Julho de 1985, Remia e o./Comissão (42/84, Recueil, p. 2545, n._ 22).
(73) - No entanto, como a Comissão assinala, se as tabelas mais elevadas em litígio compreendem o conjunto dos cuidados hospitalares e não só as despesas de maternidade (v. supra o n._ 83 das presentes conclusões), será preciso ter isso em conta para apreciar, na sua globalidade, a incidência provável sobre o comércio intracomunitário.
(74) - V. a seguir, os n.os 130 e segs. das presentes conclusões.
(75) - Deve assinalar-se que o Tribunal de Justiça, no seu acórdão de 25 de Outubro de 1983, AEG/Comissão (107/82, Recueil, p. 3151, n._ 60), considerou que, no que diz respeito aos acordos que, pela sua natureza, são susceptíveis de influenciar o comércio intracomunitário, «o facto de, num determinado momento, os comerciantes que pretendem ser admitidos numa rede de distribuição ou que nela já foram admitidos, não efectuarem trocas intracomunitárias não basta, por si só, para excluir a possibilidade de as restrições à sua liberdade de acção poderem prejudicar o comércio intracomunitário, uma vez que a situação se pode modificar de um ano para outro devido a alterações nas condições ou na composição do mercado, quer no mercado comum no seu conjunto, quer nos diferentes mercados nacionais» (sublinhado nosso).
(76) - V. o acórdão de 25 de Novembro de 1971, Béguelin (22/71, Colect., p. 355, n._ 16).
(77) - V. o acórdão de 28 de Abril de 1998, Javico (C-306/96, Colect., p. I-1983, n._ 17).
Deve assinalar-se que a Comissão, ao tentar fixar um limite para os acordos de importância menor, que não são visados pelas disposições do artigo 85._, n._ 1, considerou que os acordos horizontais eram acordos deste tipo quando a parte de mercado que detinham as sociedades que neles participavam não ultrapassa 5% da parte do mercado comum onde se aplicam esses acordos ou quando o volume de vendas total realizado durante um exercício pelas empresas que nele participavam não ultrapassa 200 milhões de ecus (v. a comunicação da Comissão, de 3 de Setembro de 1986, relativa aos acordos de importância menor que não são visados pelas disposições do artigo 85._, n._ 1, do Tratado que institui a Comunidade Económica Europeia; JO C 231, p. 2). No entanto, como a própria Comissão indica nas suas observações, numa comunicação recente, ela não parece excluir o caso em que, mesmo se as partes do mercado são limitadas, isto é inferiores ao número citado acima, se possa admitir a aplicação da proibição enunciada no artigo 85._, n._ 1, para certas categorias de acordos, tais como os que têm por objectivo fixar os preços (v. a comunicação relativa aos acordos de importância menor que não são visados pelas disposições do artigo 85._, n._ 1, do Tratado que institui a Comunidade Europeia; JO 1997, C 372, p. 13).
(78) - No quadro do presente processo, não é necessário examinar se uma tal decisão de associação de hospitais pode estar isenta nos termos do artigo 85._, n._ 3, do Tratado. Apenas a Comissão é competente para conceder isenções e não resulta de qualquer elemento do processo que tenha havido exercício desta competência exclusiva - nem, portanto, do controlo exercido neste caso pelo Tribunal de Justiça.