61997J0106

Acórdão do Tribunal de 21 de Setembro de 1999. - Dutch Antillian Dairy Industry Inc. e Verenigde Douane-Agenten BV contra Rijksdienst voor de keuring van Vee en Vlees. - Pedido de decisão prejudicial: College van Beroep voor het Bedrijfsleven - Países Baixos. - Associação dos países e territórios ultramarinos - Importação de manteiga proveniente das Antilhas neerlandesas - Normas sanitárias relativas aos produtos à base de leite - Artigos 131.º do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 182.º CE), 132.º do Tratado CE (actual artigo 183.º CE), 136.º e 227.º do Tratado CE (que passaram, após alteração, a artigos 187.º CE e 299.º CE) - Directiva 92/46/CEE - Decisão 94/70/CE. - Processo C-106/97.

Colectânea da Jurisprudência 1999 página I-05983


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


1 Agricultura - Aproximação das legislações - Normas sanitárias relativas à produção de leite cru, de leite tratado termicamente e de produtos à base de leite e à sua colocação no mercado - Directiva 92/46 - Disposições relativas às importações provenientes de países terceiros - Aplicação aos produtos provenientes de países e territórios ultramarinos - Restrições às importações - Justificação - Protecção da saúde pública - Princípio da proporcionalidade - Violação - Inexistência

(Directiva 92/46 do Conselho, artigo 23._)

2 Agricultura - Aproximação das legislações - Normas sanitárias relativas à produção de leite cru, de leite tratado termicamente e de produtos à base de leite e à sua colocação no mercado - Directiva 92/46 - Disposições relativas às importações provenientes de países terceiros - Aplicação aos produtos provenientes de países e territórios ultramarinos - Lista provisória de países exportadores de leite ou de produtos à base de leite aprovada pela Comissão com base numa lista estabelecida para outros produtos - Decisão 94/70 - Invalidade

(Directiva 92/46 do Conselho, artigo 23._; Decisão 94/70 da Comissão)

Sumário


1 As disposições do capítulo III da Directiva 92/46, que adopta as normas sanitárias relativas à produção de leite cru, de leite tratado termicamente e de produtos à base de leite e à sua colocação no mercado, que impõem o respeito de normas sanitárias para as importações de produtos à base de leite provenientes de países terceiros, devem ser interpretadas no sentido de que se aplicam à comercialização no mercado comunitário de tais produtos provenientes de países e territórios ultramarinos (PTU), como as Antilhas Neerlandesas.

Aliás, os meios a que o referido capítulo, nomeadamente o seu artigo 23._, recorre, a saber, a inscrição numa lista de países que exportam para a Comunidade e a exigência de um certificado sanitário assinado pela autoridade competente do país exportador, que certifique que o leite ou os produtos à base de leite satisfazem as exigências do capítulo II da referida directiva, são aptos para atingir o objectivo do capítulo III já referido, que consiste em exigir dos produtos importados na Comunidade garantias de protecção da saúde pública equivalentes às dadas pelos produtos de origem comunitária. Exigir destes produtos tais garantias não excede os limites que o respeito do princípio da proporcionalidade implica. Com efeito, não pode aceitar-se, sem qualquer controlo, que a situação regulamentar e sanitária de um país terceiro, incluindo a de um PTU que exporta para a Comunidade, seja tal que a autoridade competente possa fornecer, no que diz respeito à protecção da saúde pública, garantias equivalentes às dadas pela autoridade competente de um Estado-Membro.

2 O artigo 23._ da Directiva 92/46, que adopta as normas sanitárias relativas à produção de leite cru, de leite tratado termicamente e de produtos à base de leite e à sua colocação no mercado, deve ser interpretado no sentido de que se aplica às importações provenientes de países e territórios ultramarinos, não obstante o regime previsto por esta directiva para as trocas comerciais entre Estados-Membros não ter sido efectivamente instituído antes e de também não terem sido elaboradas, em conformidade com a metodologia indicada pela referida disposição, as listas dos países exportadores e dos estabelecimentos aprovados.

No entanto, dado que as referidas listas não foram validamente estabelecidas em conformidade com a metodologia prescrita no artigo 23._, n._ 3, alínea a), segundo parágrafo, da directiva, ou seja, a partir das listas dos estabelecimentos que produzem leite ou produtos à base de leite aprovados e inspeccionados pelas autoridades competentes, mas com base numa lista estabelecida para outros produtos, a Decisão 94/70, pela qual a Comissão estabeleceu a lista provisória de países terceiros a partir dos quais os Estados-Membros autorizam as importações dos produtos lácteos em causa, é inválida.

Partes


No processo C-106/97,

que tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 177._ do Tratado CE (actual artigo 234._ CE), pelo College van Beroep voor het Bedrijfsleven (Países Baixos), destinado a obter, no litígio pendente neste órgão jurisdicional entre

Dutch Antillian Dairy Industry Inc.,

Verenigde Douane-Agenten BV

e

Rijksdienst voor de keuring van Vee en Vlees,

sendo interveniente:

Nederlandse Antillen,

" uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação e a validade do capítulo III da Directiva 92/46/CEE do Conselho, de 16 de Junho de 1992, que adopta as normas sanitárias relativas à produção de leite cru, de leite tratado termicamente e de produtos à base de leite e à sua colocação no mercado (JO L 268, p. 1), e nomeadamente do seu artigo 23._, bem como sobre a validade da Decisão 94/70/CE da Comissão, de 31 de Janeiro de 1994, que estabelece a lista provisória de países terceiros a partir dos quais os Estados-Membros autorizam as importações de leite cru, de leite tratado termicamente e de produtos à base de leite (JO L 36, p. 5),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

composto por: G. C. Rodríguez Iglesias, presidente, P. J. G. Kapteyn, presidente de secção, J. C. Moitinho de Almeida, C. Gulmann, J. L. Murray, D. A. O. Edward, H. Ragnemalm, L. Sevón (relator) e M. Wathelet, juízes,

advogado-geral: A. La Pergola,

secretário: D. Louterman-Hubeau, administrador principal,

vistas as observações escritas apresentadas:

- em representação da Dutch Antillian Dairy Industry Inc., por W. Knibbeler, advogado no foro de Amesterdão,

- em representação das Nederlandse Antillen, por R. S. J. Martha, ministro plenipotenciário na Representação Permanente dos Países Baixos, na qualidade de agente,

- em representação do Governo neerlandês, por A. Bos, consultor jurídico no Ministério dos Negócios Estrangeiros, na qualidade de agente,

- em representação do Governo francês, por Kareen Rispal-Bellanger, subdirectora do direito económico internacional e do direito comunitário na Direcção dos Assuntos Jurídicos do Ministério dos Negócios Estrangeiros, e Anne de Bourgoing, encarregada de missão na mesma direcção, na qualidade de agentes,

- em representação do Conselho da União Europeia, por J. Carbery, J. Huber e G. Houttuin, membros do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes,

- em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por P. J. Kuijper e T. van Rijn, consultores jurídicos, na qualidade de agentes,

visto o relatório para audiência,

ouvidas as alegações das Nederlandse Antillen, representadas por M. M. Slotboom, advogado no foro de Roterdão, do Governo neerlandês, representado por M. A. Fierstra, consultor jurídico adjunto no Ministério dos Negócios Estrangeiros, na qualidade de agente, do Governo francês, representado por A. de Bourgoing, do Conselho da União Europeia, representado por J. Carbery, J. Huber e G. Houttuin, e da Comissão, representada por P. J. Kuijper e T. van Rijn, na audiência de 16 de Junho de 1998,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 15 de Setembro de 1998,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por despacho de 15 de Janeiro de 1997, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 13 de Março seguinte, o College van Beroep voor het Bedrijfsleven submeteu ao Tribunal, nos termos do artigo 177._ do Tratado CE (actual artigo 234._ CE), três questões prejudiciais sobre a interpretação e a validade do capítulo III da Directiva 92/46/CEE do Conselho, de 16 de Junho de 1992, que adopta as normas sanitárias relativas à produção de leite cru, de leite tratado termicamente e de produtos à base de leite e à sua colocação no mercado (JO L 268, p. 1), e nomeadamente do seu artigo 23._, bem como sobre a validade da Decisão 94/70/CE da Comissão, de 31 de Janeiro de 1994, que estabelece a lista provisória de países terceiros a partir dos quais os Estados-Membros autorizam as importações de leite cru, de leite tratado termicamente e de produtos à base de leite (JO L 36, p. 5).

2 Estas questões foram suscitadas no quadro de um litígio que opõe, por um lado, a sociedade Dutch Antillian Dairy Industry Inc. (a seguir «DADI») e, por outro, a sociedade Verenigde Douane-Agenten BV (a seguir «Douane-Agenten») ao Rijksdienst voor de Keuring van Vee en Vlees (Serviço nacional de inspecção dos animais e dos produtos de origem animal, a seguir «Serviço») de Voorburg, a propósito da recusa deste último em autorizar a importação nos Países Baixos de um lote de manteiga proveniente das Antilhas Neerlandesas que fazem parte dos países e territórios ultramarinos (a seguir «PTU»).

3 Resulta do processo que a DADI, empresa com sede em Curaçau (Antilhas Neerlandesas), que tem por objecto a produção e a exportação de manteiga, expediu das Antilhas Neerlandesas para os Países Baixos um lote de manteiga com o peso líquido de 25 850 quilos.

4 A Douane-Agenten, com sede em Roterdão, submeteu o referido lote à inspecção do Serviço que, em 31 de Janeiro de 1995, recusou a respectiva importação e enviou à Douane-Agenten um certificado relativo aos controlos veterinários dos produtos importados de países terceiros na Comunidade. Este certificado justificava a recusa com a seguinte indicação: «Curaçau não aceite em conformidade com a Decisão 94/70/CE».

5 Em 8 de Fevereiro de 1995, a DADI e a Douane-Agenten apresentaram uma reclamação contra a decisão do Serviço. Esta reclamação foi indeferida por uma nova decisão do Serviço, de 21 de Junho de 1995, confirmando a recusa inicial de 31 de Janeiro de 1995.

6 Nestas condições, a DADI e a Douane-Agenten interpuseram, em 10 de Julho de 1995, no College van Beroep voor het Bedrijfsleven um recurso destinado a obter, por uma lado, a anulação da decisão de 21 de Junho de 1995 do Serviço e, por outro, a indemnização do prejuízo que alegavam ter sofrido.

7 Com o seu recurso, em apoio do qual interveio o Governo das Antilhas Neerlandesas, a DADI e a Douane-Agenten contestaram a legalidade da decisão de recusa do Serviço invocando uma série de fundamentos e argumentos respeitantes à inaplicabilidade da Directiva 92/46, que constitui a base jurídica da Decisão 94/70, e à validade da referida directiva à luz do artigo 132._, n._ 1, do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 183._, n._ 1, CE), bem como dos artigos 102._ e 103._ da Decisão 91/482/CEE do Conselho, de 25 de Julho de 1991, relativa à associação dos países e territórios ultramarinos à Comunidade Económica Europeia (JO L 263, p. 1, a seguir «decisão PTU»). Além disso, puseram em causa a validade tanto da Directiva 92/46 como da Decisão 94/70. Em particular, quanto à directiva, contestaram a sua validade à luz do princípio da proporcionalidade e dos artigos 2._, 4._ e 5._ do acordo relativo à aplicação de medidas sanitárias e fitossanitárias que constitui o anexo 1 A do acordo que institui a Organização Mundial do Comércio (JO 1994, L 336, p. 40).

8 Em contrapartida, o Serviço, que contesta estes argumentos, alega, invocando o artigo 277._ do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 299._ CE), que as Antilhas Neerlandesas têm um estatuto de país terceiro perante a Comunidade, e que o direito comunitário não lhes é plenamente aplicável. Segundo o Serviço, os PTU têm uma posição especial que se exprime no quadro de um regime de associação.

9 Face aos fundamentos e argumentos contrapostos e partindo do princípio de que o lote de manteiga importado na Comunidade responde às condições que permitem equipará-la à manteiga originária das Antilhas Neerlandesas, o College van Beroep voor het Bedrijfsleven, que tem dúvidas sobre a interpretação e a validade da Directiva 92/46, bem como sobre a validade da Decisão 94/70, decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as questões prejudiciais seguintes:

«1) a) As disposições constantes do capítulo III da Directiva 92/46/CEE, em especial à luz dos artigos 227._, bem como dos artigos 131_ a 136._, do Tratado CE, devem ser interpretadas no sentido de que devem levar, nos termos do disposto no artigo 189._, terceiro parágrafo, do Tratado CE, à adopção de disposições de execução nacionais aplicáveis à importação, na Comunidade, de manteiga originária de países e territórios ultramarinos constantes do Anexo IV do Tratado CE, tais como as Antilhas Neerlandesas?

No caso de resposta afirmativa à questão 1 a),

1) b) As disposições do capítulo III da referida directiva, em especial atento o disposto no n._ 1 do artigo 132._ do Tratado CE e nos artigos 102._ e 103._ da Decisão 91/482/CEE do Conselho, de 25 de Julho de 1991, relativa à associação dos países e territórios ultramarinos à Comunidade Económica Europeia, são válidas relativamente às importações referidas na questão 1 a)?

No caso de resposta afirmativa às questões 1 a) e 1 b),

2) O artigo 23._ da referida directiva deve ser interpretado no sentido de que normas nacionais de execução deste artigo aplicáveis às importações nos termos referidos na questão 1 a) apenas são de ter em conta

a) após o regime de circulação dentro da Comunidade das referidas mercadorias, ao qual o regime para os países terceiros deve, nos termos do artigo 22._ da directiva, ser no mínimo equivalente, ter entrado completamente em vigor e

b) após ter sido proferida decisão juridicamente válida relativa à inclusão do país em causa na lista prevista na primeira parte do n._ 3 do artigo 23._, bem como na lista das instalações reconhecidas nesse país?

3) A Decisão 94/70/CE da Comissão, de 31 de Janeiro de 1994, é válida?»

A regulamentação aplicável

O Tratado

10 O artigo 227._ do Tratado CE, que define o campo de aplicação territorial deste último, prevê, no seu n._ 3, que «O regime especial de associação definido na parte IV do presente Tratado é aplicável aos países e territórios ultramarinos cuja lista consta do Anexo IV deste Tratado.»

11 A parte IV do Tratado CE, intitulada «A associação dos países e territórios ultramarinos», agrupa nomeadamente os artigos 131._ (que passou, após alteração, a artigo 182._ CE), 132._ (actual artigo 183._ CE), 133._ (que passou, após alteração, a artigo 184._ CE), 134._ e 135._ (actuais artigos 185._ CE e 186._ CE), bem como o artigo 136._ (que passou, após alteração, a artigo 187._ CE).

12 Nos termos do artigo 131._, primeiro parágrafo, do Tratado, «Os Estados-Membros acordam em associar à Comunidade os países e territórios não europeus que mantêm relações especiais com a Bélgica, a Dinamarca, a França, a Itália, os Países Baixos e o Reino Unido. Estes países e territórios... vêm enumerados na lista constante do Anexo IV do presente Tratado.»

13 As Antilhas Neerlandesas foram inscritas na lista mencionada no artigo 131._ do Tratado pela Convenção 64/533/CEE, de 13 de Novembro de 1962, que alterou o Tratado que institui a Comunidade Económica Europeia tendo em vista tornar aplicável às Antilhas Neerlandesas o regime especial de associação definido na parte IV deste Tratado (JO 1964, 150, p. 2414).

14 A finalidade da associação está definida no artigo 131._, segundo parágrafo, do Tratado, como sendo «promover o desenvolvimento económico e social dos países e territórios e estabelecer relações económicas estreitas entre eles e a Comunidade no seu conjunto».

15 O artigo 132._ do Tratado enumera os objectivos da associação e fixa certas regras de base. Comporta duas categorias de disposições relativas ao regime das trocas comerciais e aos investimentos destinados ao desenvolvimento dos PTU.

16 No que diz respeito ao regime das trocas comerciais, o artigo 132._, n._ 1, do Tratado dispõe que «Os Estados-Membros aplicarão às suas trocas comerciais com os países e territórios o mesmo regime que aplicam entre si por força do presente Tratado.»

17 O artigo 136._ do Tratado prevê que, num primeiro período de cinco anos a contar da sua entrada em vigor, uma convenção de aplicação anexa ao Tratado fixará as modalidades e o processo de associação entre os PTU e a Comunidade e que, seguidamente, as disposições serão adoptadas pelo Conselho deliberando por unanimidade.

18 Assim, ao abrigo do artigo 136._, segundo parágrafo, do Tratado, o Conselho adoptou por diversas vezes regras precisas para concretizar o regime especial de associação entre a Comunidade e os PTU e prosseguir os objectivos da associação. Por último, adoptou a decisão PTU, que constitui a sexta decisão deste tipo.

A decisão PTU

19 Na terceira parte da decisão PTU, intitulada «Instrumentos da cooperação PTU-CEE», o título I trata da cooperação comercial, sendo o regime geral das trocas comerciais regulado pelo capítulo 1 deste título, nomeadamente os artigos 101._ a 103._

20 Por um lado, o artigo 101._, n._ 1, precisa que os produtos originários dos PTU podem ser importados na Comunidade com isenção de direitos aduaneiros e de encargos de efeito equivalente. Por outro lado, o artigo 102._ prevê que a Comunidade não aplicará à importação de produtos originários dos PTU nem restrições quantitativas nem medidas de efeito equivalente.

21 O artigo 103._ prevê:

«1. O disposto no artigo 102._ é aplicável sem prejuízo das proibições ou restrições à importação, exportação ou trânsito justificadas por razões de moralidade pública, ordem pública, protecção da saúde e da vida das pessoas e animais ou de preservação das plantas...

2. Estas proibições ou restrições não devem constituir, em caso algum, nem um meio de discriminação arbitrária nem qualquer restrição dissimulada do comércio em geral.

...»

A Directiva 92/46

22 A Directiva 92/46, baseada no artigo 43._ do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 37._ CE), contém, por um lado, prescrições relativas à produção comunitária destinada ao fabrico, nomeadamente, de produtos à base de leite que são comercializados no mercado comunitário (capítulo II) e, por outro, disposições que garantem que as importações de tais produtos provenientes de países terceiros, a fim de serem comercializados no mercado comunitário, satisfazem as mesmas exigências de protecção sanitária (capítulo III).

23 Para este efeito, o artigo 22._ da referida directiva, que figura no capítulo III desta, prevê que «As condições aplicáveis às importações provenientes de países terceiros de leite cru, de leite tratado termicamente e de produtos à base de leite abrangidos pela presente directiva devem ser pelo menos equivalentes às previstas no capítulo II para a produção comunitária.»

24 Quanto à importação de produtos lácteos provenientes de países terceiros, referidos no artigo 22._ da Directiva 92/46, o artigo 23._ desta última dispõe:

«1. Para efeitos de execução uniforme do artigo 22._, serão aplicáveis as disposições dos números seguintes.

2. Só poderão ser importados para a Comunidade leite ou produtos à base de leite:

a) Provenientes de um país terceiro que conste de uma lista a elaborar nos termos da alínea a) do n._ 3;

b) Acompanhados de um certificado sanitário, conforme a um modelo a elaborar de acordo com o processo previsto no artigo 31._, assinado pela autoridade competente do país exportador, que certifique que esse leite e esses produtos à base de leite satisfazem as exigências do capítulo II, preenchem eventuais condições suplementares ou oferecem garantias equivalentes às referidas no n._ 3 e provêm de estabelecimentos que ofereçam as garantias previstas no anexo B.

3. De acordo com o processo previsto no artigo 31._, serão elaboradas:

a) Uma lista provisória de países terceiros ou de partes de países terceiros que estão em condições de fornecer aos Estados-Membros e à Comissão garantias equivalentes às previstas no capítulo II, bem como a lista dos estabelecimentos em relação aos quais estão em condições de oferecer essas garantias;

Esta lista provisória será elaborada a partir das listas dos estabelecimentos aprovados e inspeccionados pelas autoridades competentes depois de a Comissão se ter certificado previamente de que esses estabelecimentos cumprem os princípios e regras gerais contidos na presente directiva;

...

4. Peritos da Comissão e dos Estados-Membros efectuarão controlos no local para verificar se as garantias oferecidas pelo país terceiro quanto às condições de produção e de colocação no mercado podem ser consideradas equivalentes às aplicadas na Comunidade.

...

5. Na pendência da organização dos controlos referidos no n._ 4, continuarão a aplicar-se as disposições nacionais aplicáveis em matéria de inspecção nos países terceiros, sob reserva de informação, no seio do comité veterinário permanente, da inobservância das normas de higiene verificadas durante as referidas inspecções.

...»

25 A lista provisória mencionada no artigo 23._, n._ 3, alínea a), da Directiva 92/46, estabelecida pela Decisão 94/70 aplicável à data dos factos do processo principal, entrou em vigor em 1 de Julho de 1994. As Antilhas Neerlandesas não constam desta lista.

A regulamentação nacional

26 Nos Países Baixos, o artigo 23._ da Directiva 92/46 foi executado pelo artigo 16._ da Warenwetregeling zuivelbereiding (regulamentação relativa ao fabrico dos produtos lácteos adoptada ao abrigo da lei sobre os géneros alimentícios, Staatscourant 1994, n._ 243). Esta regulamentação, que se baseia no artigo 4._, segundo parágrafo, alínea c), do Warenwetbesluit Zuivel (decreto sobre os produtos lácteos adoptado ao abrigo da lei sobre os géneros alimentícios) e no artigo 19._, primeiro parágrafo, da Landbouwwet (lei sobre a agricultura), entrou em vigor em 1 de Janeiro de 1995.

27 A Decisão 94/70 está transposta pela remissão feita pelo artigo 16._ da Warenwetregeling zuivelbereiding para a lista estabelecida nos termos do artigo 23._ da Directiva 92/46.

Quanto à primeira questão

28 A primeira questão comporta duas vertentes.

29 Com a primeira vertente desta questão, o órgão jurisdicional nacional pergunta, no essencial, se as disposições do capítulo III da Directiva 92/46, que impõem o respeito de normas sanitárias para as importações de produtos à base de leite provenientes de países terceiros, devem ser interpretadas no sentido de que se aplicam à comercialização no mercado comunitário desses produtos provenientes de PTU, como as Antilhas Neerlandesas.

30 A fim de responder a esta primeira vertente, deve observar-se que, nos termos do seu quarto considerando, o objectivo da Directiva 92/46 consiste em estabelecer, nomeadamente para os produtos à base de leite, normas sanitárias destinadas a assegurar um nível elevado de protecção da saúde pública.

31 É com vista a atingir este objectivo que a referida directiva visa simultaneamente a produção comunitária, para a qual estabelece no seu capítulo II normas sanitárias específicas e detalhadas (artigos 3._ a 21._), e as importações na Comunidade de produtos provenientes de países terceiros, para as quais, além de impor no seu capítulo III outras normas, exige também que satisfaçam condições sanitárias pelo menos equivalentes às previstas no capítulo II para a produção comunitária (artigos 22._ a 26._).

32 Esta exigência de equivalência implica que a protecção sanitária prosseguida pela Directiva 92/46 não pode variar em função da origem comunitária ou não dos produtos. Com efeito, como resulta do oitavo considerando desta directiva, os produtos que ela visa devem apresentar o mesmo nível de protecção do ponto de vista da saúde humana, independentemente do facto de serem originários da Comunidade ou de terem sido objecto de importação.

33 Resulta igualmente da economia geral da Directiva 92/46, bem como da natureza dos objectivos de saúde pública prosseguidos pela mesma, que as disposições nela estabelecidas se destinam a ser aplicadas ao conjunto dos produtos abrangidos que sejam objecto de produção ou de comercialização na Comunidade.

34 Por outro lado, as prescrições sanitárias enunciadas no capítulo II da Directiva 92/46 para a produção dos Estados-Membros não são aplicáveis à produção dos PTU.

35 Decorre do acima exposto que as disposições do capítulo III da Directiva 92/46 cobrem o conjunto dos produtos à base leite comercializados no mercado comunitário, incluindo os provenientes de um PTU, devendo a noção de «importações provenientes de países terceiros» entender-se como visando qualquer introdução desses produtos no território comunitário.

36 Não obstante, a DADI, o Governo das Antilhas Neerlandesas e o Governo francês alegam, por um lado, que a instituição pelos artigos 131._ a 136._ do Tratado e pela decisão PTU de um regime favorável aos PTU obsta a que o capítulo III da Directiva 92/46, que estabelece regras para as importações na Comunidade provenientes de países terceiros, seja aplicável às trocas comerciais entre os PTU e a Comunidade. Assim, não podendo estes últimos ficar abrangidos pelo regime instituído pela directiva para os países terceiros, deviam por conseguinte ser tratados da mesma maneira que os Estados-Membros.

37 A este respeito, deve salientar-se que as importações na Comunidade podem ser efectuadas não somente provenientes de países terceiros propriamente ditos, mas também de países associados àquela. O facto de um produto ser introduzido no território comunitário proveniente de um PTU, que, com base nos artigos 227._, n._ 3, e 131._ a 136._ do Tratado, bem como na decisão PTU, goza de um regime especial de associação à Comunidade, não retira o carácter de importação dessa operação.

38 Com efeito, as trocas comerciais entre os PTU e a Comunidade não podem necessariamente beneficiar de um regime idêntico ao que regula as trocas comerciais entre os Estados-Membros, na medida em que, embora a associação dos PTU à Comunidade obedeça a um regime especial, não é menos verdade que se trata de um regime de associação que, como o Tribunal de Justiça declarou no seu acórdão de 22 de Abril de 1997, Road Air (C-310/95, Colect., p. I-2229, n._ 40), deve realizar-se de acordo com um processo dinâmico e progressivo. A existência de um tal processo, desprovido de automaticidade, implica uma diferença fundamental entre o regime que regula as trocas comerciais dos PTU com a Comunidade e o que foi instituído pelo Tratado para as trocas comerciais entre os Estados-Membros. Com efeito, estas trocas constituem operações efectuadas no quadro do mercado interno, contrariamente às trocas entre os PTU e a Comunidade que estão abrangidas pelo regime das importações.

39 Em apoio da sua argumentação segundo a qual o capítulo III da Directiva 92/46 não era aplicável aos produtos à base de leite provenientes dos PTU, a DADI, o Governo das Antilhas Neerlandesas e o Governo francês invocam, por outro lado, dois outros argumentos assentes, respectivamente, na base jurídica da referida directiva e no acervo da associação.

40 Em primeiro lugar, no que respeita à base jurídica da Directiva 92/46, a DADI e o Governo das Antilhas Neerlandesas, apoiados pelo Governo francês, argumentam que a referida directiva, que apenas se baseia no artigo 43._ do Tratado constante da terceira parte deste, não pode ser aplicada às importações provenientes dos PTU, uma vez que, em virtude do regime especial de associação previsto no artigo 227._, n._ 3, do Tratado, não foi também declarada expressamente aplicável às trocas comerciais com os PTU com base nos artigos 131._ a 136._ do mesmo Tratado, que figuram na quarta parte deste último. Em apoio desta argumentação, invocam o acórdão de 12 de Fevereiro de 1992, Leplat (C-260/90, Colect., p. I-643, n._ 10), no qual o Tribunal de Justiça declarou que as disposições gerais do Tratado não são aplicáveis aos PTU sem uma referência expressa.

41 A este respeito, deve recordar-se que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o artigo 43._ do Tratado constitui a base jurídica adequada para toda e qualquer regulamentação relativa à produção e à comercialização dos produtos agrícolas enumerados no anexo II do Tratado, que contribua para a realização de um ou mais objectivos da política agrícola comum enunciados no artigo 39._ do mesmo Tratado (actual artigo 33._ CE). Por conseguinte, mesmo que essas regulamentações visem simultaneamente objectivos da política agrícola e outros objectivos prosseguidos com base noutras disposições do Tratado, não se pode argumentar com a existência dessas disposições para restringir o âmbito de aplicação do artigo 43._ do Tratado (v. acórdãos de 23 de Fevereiro de 1988, Reino Unido/Conselho, 68/86, Colect., p. 855, n.os 14 e 16; de 16 de Novembro de 1989, Comissão/Conselho, C-131/87, Colect., p. 3743, n.os 10 e 11, e de 5 de Outubro de 1994, Alemanha/Conselho, C-280/93, Colect., p. I-4973, n._ 54).

42 Quanto ao argumento baseado no acórdão Leplat, já referido, deve sublinhar-se que a Directiva 92/46 não exige que os PTU respeitem as mesmas normas sanitárias que as previstas para a produção comunitária; exige apenas, estabelecendo outras normas específicas, que os produtos importados na Comunidade ofereçam o mesmo nível de protecção que o oferecido pelos produtos de origem comunitária. Daqui decorre que a referida directiva não estende aos PTU a aplicação das normas sanitárias estabelecidas para os Estados-Membros.

43 Consequentemente, para regular as importações na Comunidade provenientes dos PTU, não é necessário que a Directiva 92/46 preveja expressamente, nos termos da parte IV do Tratado, a respectiva aplicação aos PTU.

44 Em segundo lugar, o Governo das Antilhas Neerlandesas defende que as exigências impostas ao Conselho pelo artigo 136._, segundo parágrafo, do Tratado de respeitar os resultados conseguidos e as decisões sucessivas relativas aos PTU, bem como pelo artigo 132._, n._ 1, do Tratado, segundo o qual os Estados-Membros aplicarão às suas trocas comerciais com os PTU o regime acordado entre eles ao abrigo do Tratado, formam um acervo da associação, de modo que essas disposições impedem as instituições de equiparar o regime aplicável aos PTU ao que é aplicável aos países terceiros e, desse modo, de alterar os referidos resultados conseguidos.

45 A este respeito, sem que seja necessário pronunciarmo-nos acerca do alcance das obrigações impostas ao Conselho relativamente aos resultados conseguidos com a associação, basta verificar que o respeito de tais obrigações não pode em qualquer caso justificar que o regime das trocas comerciais dos PTU com a Comunidade seja automaticamente idêntico ao instituído pelo Tratado para as trocas entre os Estados-Membros. Com efeito, como foi declarado no n._ 38 do presente acórdão, este regime não pode ser em todos os casos idêntico àquele de que os Estados-Membros beneficiam entre si.

46 Resulta das considerações precedentes que as disposições do capítulo III da Directiva 92/46, que impõem o respeito de normas sanitárias para as importações de produtos à base de leite provenientes de países terceiros, devem ser interpretadas no sentido de que se aplicam à comercialização no mercado comunitário de tais produtos provenientes de PTU, como as Antilhas Neerlandesas.

47 Com a segunda vertente da primeira questão, o órgão jurisdicional nacional pergunta, no essencial, se as exigências do capítulo III da Directiva 92/46, nomeadamente do seu artigo 23._, são válidas à luz dos artigos 132._, n._ 1, do Tratado e 102._ e 103._ da decisão PTU, quando essas exigências se aplicam às importações de produtos à base de leite provenientes de um PTU, como as Antilhas Neerlandesas.

48 A DADI e o Governo das Antilhas Neerlandesas contestam a validade do capítulo III da referida directiva, nomeadamente do seu artigo 23._, com o fundamento de que, não sendo demonstrado qualquer risco para a saúde pública, a sua aplicação às importações de produtos à base de leite provenientes dos PTU constitui uma proibição de tais importações e uma discriminação arbitrária contra as mesmas ou uma restrição comercial dissimulada, contrárias aos artigos 132._, n._ 1, do Tratado e 102._ da Decisão PTU. Daqui resulta uma invalidade do capítulo III da Directiva 92/46 que deveria ter conduzido à aplicação a essas importações do capítulo II desta directiva.

49 A DADI e Governo das Antilhas Neerlandesas alegam igualmente que a aplicação às importações provenientes dos PTU de outras condições para além das do capítulo II da Directiva 92/46, no caso concreto as do capítulo III, nomeadamente do seu artigo 23._, excede o que é necessário para proteger a saúde pública e, por conseguinte, tal aplicação é contrária ao princípio da proporcionalidade decorrente do artigo 103._, n._ 2, da decisão PTU.

50 A este respeito, há que sublinhar que, quando aplicadas aos PTU, as exigências do artigo 23._ da Directiva 92/46 conduzem, à luz do artigo 132._, n._ 1, do Tratado e do artigo 102._ da decisão PTU, a restrições às importações na Comunidade.

51 Todavia, nem o artigo 132._, n._ 1, do Tratado, que remete implicitamente para o artigo 36._ do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 30._ CE), nem o artigo 102._ da decisão PTU, que deve ser lido em conjugação com o seu artigo 103._, n._ 1, constituem um obstáculo às proibições ou restrições de importação justificadas por razões de protecção da saúde pública.

52 A fim de determinar se uma disposição de direito comunitário é justificada por razões de protecção da saúde pública, deve verificar-se se os meios a que recorre são aptos para concretizar o objectivo visado e se não vão além do necessário para o atingir.

53 A este respeito, a proporcionalidade das exigências sanitárias e do sistema instituído pelo capítulo II da Directiva 92/46 para as trocas comerciais no mercado interno não é contestada. Com efeito, este sistema garante ao Estado-Membro de destino que a autoridade competente para a inspecção e o controlo tanto dos estabelecimentos como dos produtos no Estado-Membro de origem cumpriu efectivamente a sua missão em conformidade com a directiva.

54 Relativamente ao objectivo do capítulo III da Directiva 92/46, que consiste, como indica o seu oitavo considerando, em exigir dos produtos importados na Comunidade garantias de protecção da saúde pública equivalentes às dadas pelos produtos de origem comunitária, os meios a que o referido capítulo, nomeadamente o artigo 23._, recorre, a saber, a inscrição numa lista de países que exportam para a Comunidade e a exigência de um certificado sanitário assinado pela autoridade competente do país exportador, que certifique que os produtos à base de leite satisfazem as exigências do capítulo II da referida directiva, são aptos para atingir esse objectivo.

55 Exigir dos produtos importados na Comunidade garantias de protecção da saúde pública equivalentes às oferecidas pela produção comunitária também não excede os limites que o respeito do princípio da proporcionalidade implica. Com efeito, não pode aceitar-se, sem qualquer controlo, que a situação regulamentar e sanitária de um país terceiro, incluindo a de um PTU que exporta para a Comunidade, seja tal que a autoridade competente possa fornecer, no que diz respeito à protecção da saúde pública, garantias equivalentes às dadas pela autoridade competente de um Estado-Membro.

56 Deve, por conseguinte, responder-se à segunda vertente da primeira questão que a análise das exigências do capítulo III da Directiva 92/46, nomeadamente do seu artigo 23._, não revelou, à luz dos artigos 132._, n._ 1, do Tratado e 102._ e 103._ da decisão PTU, elementos que afectem a sua validade.

57 A DADI alega, além disso, que o capítulo III da referida directiva é contrário aos artigos 2._, 4._ e 5._ do acordo sobre a aplicação de medidas sanitárias e fitossanitárias, que constitui o anexo 1 A do acordo que institui a Organização Mundial do Comércio.

58 A este respeito, basta verificar que, embora este problema tenha sido suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, este não colocou qualquer questão relativa à validade do capítulo III da directiva à luz das disposições acima mencionadas do acordo sobre a aplicação de medidas sanitárias e fitossanitárias. Daqui resulta que não há que proceder à apreciação da validade do referido capítulo à luz deste acordo.

Quanto às segunda e terceira questões

59 Com as suas segunda e terceira questões, que devem ser examinadas conjuntamente, o órgão jurisdicional nacional pergunta, no essencial, por um lado, se o artigo 23._ da Directiva 92/46 deve ser interpretado no sentido de que é aplicável às importações provenientes dos PTU, não obstante o regime previsto por esta directiva para as trocas comerciais entre Estados-Membros não ter sido efectivamente implementado antes e de também não terem sido elaboradas, em conformidade com a metodologia indicada pela referida disposição, as listas dos países exportadores e dos estabelecimentos aprovados e, por outro, se a Decisão 94/70 é válida.

60 Em primeiro lugar, no que respeita à implementação prévia do regime do capítulo II da Directiva 92/46, a DADI e o Governo das Antilhas Neerlandesas alegam que a Directiva 92/47/CEE do Conselho, de 16 de Junho de 1992, relativa às condições de concessão de derrogações temporárias e limitadas às normas comunitárias sanitárias específicas para a produção de leite e de produtos à base de leite e a respectiva colocação no mercado (JO L 268, p. 33), adoptada no mesmo dia que a Directiva 92/46, previu um período de derrogação para o cumprimento das exigências desta última por parte dos estabelecimentos comunitários, de modo que estes foram dispensados de aplicar o regime previsto no seu capítulo II até 1 de Janeiro de 1998. Daqui decorre que, enquanto este regime não for efectivamente implementado nas relações entre os Estados-Membros, o artigo 23._ da Directiva 92/46 também não é aplicável às importações provenientes dos PTU.

61 A este respeito, deve, por um lado, sublinhar-se que a Directiva 92/47, embora instaure um regime de derrogações temporárias e limitadas relativas ao cumprimento por determinados estabelecimentos comunitários das normas específicas estabelecidas pela Directiva 92/46, exige, no entanto, como resulta do quarto considerando, que o referido regime não prejudique a sujeição do conjunto das operações de produção e de colocação no mercado às normas de higiene fixadas pela Directiva 92/46.

62 Por outro lado, deve recordar-se que a diferença, referida no n._ 31 do presente acórdão, entre o capítulo III da Directiva 92/46, que comporta as regras aplicáveis às importações na Comunidade, e o capítulo II, que contém as disposições aplicáveis às trocas intracomunitárias, tem como consequência que a aplicação de cada capítulo está circunscrita às trocas comerciais por ele abrangidas. Daqui decorre que, à luz do objectivo da referida directiva, a aplicação do capítulo III desta, nomeadamente do seu artigo 23._, não pode depender da implementação prévia do regime, previsto no capítulo II, aplicável às trocas comerciais entre os Estados-Membros.

63 Por conseguinte, embora, como foi referido no n._ 54 do presente acórdão, o objectivo da capítulo III da Directiva 92/46 seja garantir que os produtos à base de leite importados na Comunidade satisfaçam exigências de saúde pública pelo menos equivalentes às previstas no capítulo II para a produção comunitária, não resulta da Directiva 92/47 nem do artigo 23._ da Directiva 92/46 que a aplicação do regime respeitante às importações na Comunidade esteja subordinada à implementação prévia do regime aplicável às trocas comerciais entre os Estados-Membros.

64 A DADI e o Governo das Antilhas Neerlandesas contestam, em segundo lugar, que o artigo 23._ da Directiva 92/46 seja aplicável às importações provenientes dos PTU sem que tenham sido previamente adoptadas, em conformidade com a metodologia indicada nessa disposição, as medidas que pressupõem a sua aplicação. Invocam duas séries de argumentos. Por um lado, alegam que os documentos previstos pelo artigo 23._ da directiva, nomeadamente a lista dos países terceiros, a dos estabelecimentos aprovados e o modelo de certificado sanitário que deve acompanhar os produtos, não foram elaborados e que as outras operações necessárias, tais como a inspecção prévia dos estabelecimentos dos países terceiros, também não foram efectuadas pelos peritos comunitários. Por outro lado, pretendem que, embora a Decisão 94/70 contenha uma lista de países terceiros, a mesma não é válida, uma vez que foi elaborada, contrariamente às exigências do artigo 23._, n._ 3, alínea a), da directiva, não a partir das listas dos estabelecimentos aprovados e inspeccionados pelas autoridades competentes, mas a partir de uma lista relativa a outros produtos, a saber, a estabelecida pela Decisão 79/542/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1976, que estabelece uma lista de países terceiros de onde os Estados-Membros autorizam a importação de animais das espécies bovina e suína e de carne fresca (JO 1979, L 146, p. 15; EE 03 F16 p. 136). Daqui decorria que, enquanto estas medidas não fossem cumpridas e adoptadas de forma válida, a aplicação do artigo 23._ da directiva devia ser suspensa.

65 Deve recordar-se que o artigo 23._, n._ 2, da Directiva 92/46 exige, sob pena de proibição de toda e qualquer importação na Comunidade, que os países exportadores de produtos à base de leite estejam inscritos na lista provisória visada no mesmo artigo 23._, n._ 3, alínea a), e que os produtos importados sejam acompanhados de um certificado sanitário, conforme a um modelo a elaborar e assinado pela autoridade competente do país exportador. O artigo 23._, n._ 3, alínea a), segundo parágrafo, prevê, além disso, a metodologia segundo a qual a lista de países terceiros exportadores deve ser elaborada e indica que esta deve sê-lo com base nas listas dos estabelecimentos inspeccionados e aprovados pelas autoridades competentes.

66 A este respeito, importa assinalar que a lista provisória de países terceiros foi efectivamente estabelecida pela Decisão 94/70, mas não foi elaborada a partir das listas dos estabelecimentos que produzem leite ou produtos à base de leite aprovados e inspeccionados pelas autoridades competentes. Como afirmam a DADI e o Governo das Antilhas Neerlandesas, resulta dos termos da Decisão 94/70, nomeadamente do seu terceiro considerando, que a referida lista foi elaborada a partir da que figura em anexo à Decisão 79/542 e, portanto, com base numa lista estabelecida para outros produtos.

67 Para justificar a metodologia que escolheu, a Comissão alega que a lista de países terceiros exportadores elaborada a partir da lista dos estabelecimentos aprovados e inspeccionados pelas autoridades competentes apresenta apenas um interesse secundário e constitui unicamente um meio de controlo suplementar, sendo o essencial constituído pelas garantias oferecidas pelo sistema legislativo e pelo sistema de controlo das referidas autoridades dos países exportadores. Segundo a Comissão, o recurso à lista de países terceiros que figura em anexo à Decisão 79/542 permitia certificar que esses países ofereciam tais garantias, incluindo as relativas às exigências sanitárias respeitantes ao leite e aos produtos à base de leite.

68 Em resposta a esta argumentação, deve desde logo sublinhar-se que o artigo 23._, n._ 3, alínea a), segundo parágrafo, da Directiva 92/46 não prevê que a lista de países terceiros possa ser elaborada segundo uma metodologia diferente da que consiste em fazê-lo a partir dos estabelecimentos aprovados e inspeccionados pelas autoridades competentes. Daqui decorre que a Comissão não pode adoptar uma metodologia diferente da que é indicada pela directiva.

69 Por outro lado, esta interpretação é corroborada pelo artigo 23._, n._ 4, da Directiva 92/46 que exige que os peritos da Comissão e dos Estados-Membros efectuem os controlos in loco a fim de verificar se as garantias oferecidas pelos países terceiros são equivalentes às previstas para a produção comunitária.

70 Por último, há que acrescentar que, se é verdade que a lista de países terceiros que figura em anexo à Decisão 79/542 é susceptível de oferecer garantias no que respeita aos animais das espécies bovina e suína e às carnes frescas, o recurso a esta lista não pode garantir a protecção da saúde pública no que respeita a outros produtos, como o leite e os produtos à base de leite, para os quais o artigo 23._, n._ 4, da directiva exige inspecções a efectuar in loco nos estabelecimentos dos países terceiros. Ora, a lista de países terceiros que figura em anexo à Decisão 79/542 não foi elaborada com base nos controlos efectuados nos estabelecimentos produtores de leite ou de produtos à base de leite.

71 Consequentemente, deve concluir-se que, atendendo ao facto de a Comissão não ter respeitado a metodologia prevista pela Directiva 92/46 para a elaboração da lista de países terceiros mencionada no seu artigo 23._, n._ 3, alínea a), a Decisão 94/70 não foi validamente adoptada.

72 A Comissão alega, além disso, que foi levada a recorrer à Decisão 79/452 em razão da morosidade dos controlos e da complexidade das verificações a que devia proceder para assegurar-se, como exige o artigo 23._, n._ 3, alínea a), segundo parágrafo, da Directiva 92/46, que esses estabelecimentos respeitam os princípios e as regras gerais contidas nesta última. Alega, a este respeito, que não era materialmente possível organizar, antes da entrada em vigor da referida directiva, inspecções em todos os países em causa e que, por conseguinte, tornou-se necessário recorrer à lista anexa à Decisão 79/452 a fim de instituir rapidamente um sistema transitório que, não obstante o seu carácter incompleto, tinha condições para atingir plenamente o objectivo de protecção da saúde pública visado pela directiva.

73 Quanto à declaração da invalidade da Directiva 94/70, deve salientar-se que a mesma não é afectada por alegadas dificuldades práticas com que a Comissão se teria confrontado em razão da morosidade dos procedimentos de controlo e da complexidade das verificações a efectuar (v. acórdão de 10 de Março de 1992, Lomas e o., C-38/90 e C-151/90, Colect., p. I-1781, n._ 21). Com efeito, tais dificuldades práticas não podem dispensar a Comissão de aplicar as disposições vinculativas do direito comunitário.

74 No que diz respeito à necessidade de recorrer à lista que figura em anexo à Decisão 79/542 a fim de instituir um sistema transitório destinado a atingir o objectivo de protecção da saúde pública visado pela Directiva 92/46, deve concluir-se que tal necessidade não existia uma vez que a própria directiva colocou em vigor esse sistema transitório.

75 Com efeito, o artigo 23._, n._ 5, da Directiva 92/46 prevê, em conformidade com o seu décimo quinto considerando e para atender aos prazos necessários à realização da inspecção comunitária, a manutenção, a título transitório, das regras de controlo nacionais em relação aos países terceiros. Além disso, embora o artigo 25._ da mesma directiva exija, no seu n._ 1, entre as condições de importação dos produtos lácteos na Comunidade, que o certificado emitido pelas autoridades competentes do país exportador que deve acompanhar estes produtos seja elaborado de acordo com o processo previsto no artigo 31._ da directiva, o mesmo artigo prevê, no seu n._ 2, que, «Na pendência da fixação das regras de execução do presente artigo, continuarão a aplicar-se as regras nacionais aplicáveis às importações provenientes de países terceiros em relação aos quais estas exigências não tenham sido adoptadas a nível comunitário, desde que essas regras não sejam mais favoráveis que as previstas no capítulo II.»

76 Resulta destas disposições que, mesmo não se referindo expressamente à elaboração da lista de países terceiros, confirmam contudo a intenção do legislador comunitária segundo a qual, enquanto não existirem medidas comunitárias de controlo das importações de produtos lácteos, estes controlos serão assegurados pelos Estados-Membros ao abrigo das disposições nacionais aplicáveis em matéria de inspecção, na condição de estas respeitarem o objectivo de protecção da saúde pública tal como está estabelecido para a produção comunitária no capítulo II da Directiva 92/46.

77 Resulta do conjunto das considerações precedentes que deve responder-se às segunda e terceira questões que o artigo 23._ da Directiva 92/96 deve ser interpretado no sentido de que se aplica às importações provenientes de PTU, não obstante o regime previsto por esta directiva para as trocas comerciais entre Estados-Membros não ter sido efectivamente instituído antes e de também não terem sido elaboradas, em conformidade com a metodologia indicada pela referida disposição, as listas dos países exportadores e dos estabelecimentos aprovados; no dado que as referidas listas não foram validamente estabelecidas em conformidade com a metodologia indicada na referida disposição, a Decisão 94/70 é inválida.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

78 As despesas efectuadas pelos Governos francês e neerlandês, bem como pelo Conselho e pela Comissão, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

pronunciando-se sobre as questões submetidas pelo College van Beroep voor het Bedrijfsleven, por despacho de 15 de Janeiro de 1997, declara:

1) As disposições do capítulo III da Directiva 92/46/CEE do Conselho, de 16 de Junho de 1992, que adopta as normas sanitárias relativas à produção de leite cru, de leite tratado termicamente e de produtos à base de leite e à sua colocação no mercado, que impõem o respeito de normas sanitárias para as importações de produtos à base de leite provenientes de países terceiros, devem ser interpretadas no sentido de que se aplicam à comercialização no mercado comunitário de tais produtos provenientes de países e territórios ultramarinos, como as Antilhas Neerlandesas.

2) A análise das exigências do capítulo III da Directiva 92/46, nomeadamente do seu artigo 23._, não revelou, à luz dos artigos 132._, n._ 1, do Tratado CE (actual artigo 183._, n._ 1, CE) e 102._ e 103._ da Decisão 91/482/CEE do Conselho, de 25 de Julho de 1991, relativa à associação dos países e territórios ultramarinos à Comunidade Económica Europeia, elementos que afectem a sua validade.

3) O artigo 23._ da Directiva 92/46 deve ser interpretado no sentido de que se aplica às importações provenientes de países e territórios ultramarinos, não obstante o regime previsto por esta directiva para as trocas comerciais entre Estados-Membros não ter sido efectivamente instituído antes e de também não terem sido elaboradas, em conformidade com a metodologia indicada pela referida disposição, as listas dos países exportadores e dos estabelecimentos aprovados; dado que as referidas listas não foram validamente estabelecidas em conformidade com a metodologia indicada na referida disposição, a Decisão 94/70/CE da Comissão, de 31 de Janeiro de 1994, que estabelece a lista provisória de países terceiros a partir dos quais os Estados-Membros autorizam as importações de leite cru, de leite tratado termicamente e de produtos à base de leite, é inválida.