61997J0009

Acórdão do Tribunal (Quinta Secção) de 22 de Outubro de 1998. - Raija-Liisa Jokela e Laura Pitkäranta. - Pedido de decisão prejudicial: Maaseutuelinkeinojen valituslautakunta - Finlândia. - Noção de 'órgão jurisdicional nacional' - Agricultura - Indemnização compensatória de desvantagens naturais permanentes - Condições de concessão. - Processos apensos C-9/97 e C-118/97.

Colectânea da Jurisprudência 1998 página I-06267


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


1 Questões prejudiciais - Reenvio ao Tribunal de Justiça - Órgão jurisdicional nacional na acepção do artigo 177._ do Tratado - Conceito - Instância de recurso em matéria de ajudas agrícolas

(Tratado CE, artigo 177._)

2 Agricultura - Política Agrícola Comum - Reforma das estruturas - Melhoria da eficácia das estruturas - Regime das zonas agrícolas desfavorecidas - Indemnização compensatória das desvantagens naturais permanentes - Concessão não subordinada à condição de residência na exploração - Regulamentação nacional que prevê uma condição adicional de residência e, na falta de cumprimento desta, condições relativas à actividade - Violação dos princípios da igualdade de tratamento e da segurança jurídica - Inexistência

(Regulamento n._ 2328/91 do Conselho, artigos 17._ e 18._; Directiva 75/268 do Conselho, artigo 1._)

Sumário


1 Com o objectivo de averiguar se um organismo possui a qualidade de órgão jurisdicional na acepção do artigo 177._ do Tratado, questão que releva exclusivamente do direito comunitário, há que ter em conta um conjunto de elementos, como a origem legal do órgão, a sua permanência, o carácter obrigatório da sua jurisdição, a natureza contraditória do processo, a aplicação pelo órgão das normas de direito, bem como a sua independência. Satisfaz estes critérios a comissão de recurso das actividades rurais da Finlândia, que foi criada por lei, é formada por membros nomeados pela autoridade pública e que beneficiam da mesma inamovibilidade dos juízes, tem competência legal em matéria de ajudas relativas às actividades rurais, decide em matéria de direito, em conformidade com as normas aplicáveis e segundo as regras gerais de processo, e as suas decisões podem, sob certos pressupostos, ser objecto de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo nacional.

2 Os artigos 17._ e 18._ do Regulamento n._ 2328/91 relativo à melhoria da eficácia das estruturas agrícolas e 1._ da Directiva 75/268 sobre a agricultura de montanha e de certas zonas desfavorecidas não se opõem a que seja concedida uma indemnização compensatória das desvantagens naturais permanentes a um agricultor, quando este não reside, de forma durável, na sua exploração. Com efeito, um agricultor satisfaz o objectivo essencial da regulamentação comunitária, a saber, sustentar a prossecução da actividade agrícola em zonas desfavorecidas, quando mantém a sua exploração em estado de actividade, e o objectivo de povoamento, para cuja realização tende, naturalmente, a contribuir a prossecução da actividade agrícola, não pode, por si só, implicar a obrigação de residência permanente.

Todavia, o artigo 18._, n._ 3, do referido regulamento autoriza expressamente os Estados-Membros a preverem condições complementares ou limitativas para a concessão da indemnização. Tendo em conta esta faculdade de apreciação, nem o princípio da igualdade de tratamento nem o da segurança jurídica se opõem a que se exija a um agricultor, que pede o benefício da indemnização compensatória e que reside fora da sua exploração, a uma distância do seu centro económico superior a doze quilómetros por estrada, que gira ele próprio a exploração e que retire pelo menos 50% dos seus rendimentos duma actividade agrícola ou equiparada, e, além disso, que seja provada a existência de um motivo especial.

Partes


Nos processos apensos C-9/97 e C-118/97,

que têm por objecto pedidos dirigidos ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 177._ do Tratado CE, pelo maaseutuelinkeinojen valituslautakunta (Finlândia), destinado a obter, nos processos instaurados neste órgão jurisdicional por

Raija-Liisa Jokela (C-9/97)

e

Laura Pitkäranta, legalmente representada por Anne Pitkäranta (C-118/97),

uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação dos artigos 17._ e 18._ do Regulamento (CEE) n._ 2328/91 do Conselho, de 15 de Julho de 1991, relativo à melhoria da eficácia das estruturas agrícolas (JO L 218, p. 1), e 1._ da Directiva 75/268/CEE do Conselho, de 28 de Abril de 1975, sobre a agricultura de montanha e de certas zonas desfavorecidas (JO L 128, p. 1; EE 03 F8 p. 153),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA

(Quinta Secção),

composto por: J.-P. Puissochet, presidente de secção, P. Jann (relator), J. C. Moitinho de Almeida, C. Gulmann e M. Wathelet, juízes,

advogado-geral: J. Mischo,

secretário: H. von Holstein, secretário adjunto,

vistas as observações escritas apresentadas:

- por R.-L. Jokela, em seu próprio nome,

- em representação do Governo finlandês, por Holger Rotkirch, embaixador, chefe do Serviço dos Assuntos Jurídicos do Ministério dos Negócios Estrangeiros (C-9/97), e Tuula Pynnä, consultora jurídica no mesmo ministério (C-118/97), na qualidade de agentes,

- em representação do Governo francês (C-9/97), por Kareen Rispal-Bellanger, subdirectora na Direcção dos Assuntos Jurídicos do Ministério dos Negócios Estrangeiros, e Frédéric Pascal, adido de administração central na mesma direcção, na qualidade de agentes,

- em representação da Comissão das Comunidades Europeias (C-9/97 e C-118/97), por Esa Paasivirta e James Macdonald Flett, membros do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes,

visto o relatório para audiência,

ouvidas as alegações de R.-L. Jokela, do Governo finlandês e da Comissão, na audiência de 10 de Fevereiro de 1998,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 24 de Março de 1998,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por despachos de 9 de Janeiro (C-9/97) e 12 de Março de 1997 (C-118/97), que deram entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça, respectivamente, em 16 de Janeiro e 20 de Março seguintes, o maaseutuelinkeinojen valituslautakunta (Finlândia) submeteu, nos termos do artigo 177._ do Tratado CE, duas questões prejudiciais sobre a interpretação dos artigos 17._ e 18._ do Regulamento (CEE) n._ 2328/91 do Conselho, de 15 de Julho de 1991, relativo à melhoria da eficácia das estruturas agrícolas (JO L 218, p. 1), e 1._ da Directiva 75/268/CEE do Conselho, de 28 de Abril de 1975, sobre a agricultura de montanha e de certas zonas desfavorecidas (JO L 128, p. 1; EE 03 F8 p. 153).

2 Estas questões foram suscitadas em dois processos instaurados, respectivamente, por Raija-Liisa Jokela e Laura Pitkäranta, legalmente representada por Anne Pitkäranta, a propósito da recusa da autoridade administrativa em conceder-lhes uma indemnização compensatória destinada a compensar desvantagens resultantes da exploração de zonas agrícolas desfavorecidas.

3 Por despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 4 de Novembro de 1997, os dois processos foram apensados para efeitos de fase oral e do acórdão.

Enquadramento jurídico

A regulamentação comunitária

4 O artigo 1._, primeiro parágrafo, da Directiva 75/268 autoriza os Estados-Membros, «Tendo em vista a prossecução da actividade agrícola bem como a manutenção de um mínimo de povoamento ou a manutenção do espaço natural em certas zonas desfavorecidas...», a instaurar um regime particular de ajudas «... destinado a favorecer as actividades agrícolas e a melhorar o rendimento dos agricultores nestas zonas». Nos termos do segundo parágrafo do mesmo artigo, «A aplicação das medidas previstas por este regime deve ter em conta a situação e os objectivos de desenvolvimento próprios de cada região». O artigo 4._ da directiva precisa que este regime compreende, nomeadamente, «a concessão... de uma indemnização que compense as desvantagens naturais permanentes».

5 Os artigos 17._ a 20._ do Regulamento n._ 2328/91 precisam as condições em que os Estados-Membros podem tomar medidas específicas a favor da agricultura de montanha e de certas zonas desfavorecidas.

6 O artigo 17._, n._ 1, dispõe:

«Nas regiões que figuram na lista comunitária das zonas agrícolas desfavorecidas estabelecida em conformidade com a Directiva 75/268/CEE, os Estados-Membros podem conceder, a favor das actividades agrícolas, uma indemnização compensatória anual, fixada em função das desvantagens naturais permanentes descritas no artigo 3._ da referida directiva, nos limites e condições previstos nos artigos 18._ e 19._ do presente regulamento.»

7 O artigo 18._ precisa:

«1. Quando os Estados-Membros concedam uma indemnização compensatória, os beneficiários são os agricultores que explorem pelo menos três hectares de superfície agrícola útil e se comprometam a prosseguir uma actividade agrícola em conformidade com os objectivos do artigo 1._ da Directiva 75/268/CEE durante pelo menos cinco anos a contar do primeiro pagamento de uma indemnização compensatória...

...

2. ...

3. Os Estados-Membros podem prever condições complementares ou limitativas para a concessão da indemnização compensatória, incluindo a utilização de práticas compatíveis com as exigências da protecção do ambiente e da preservação do espaço natural.»

8 O artigo 29._ do Regulamento n._ 2328/91 impõe aos Estados-Membros a obrigação de comunicarem à Comissão quer os projectos de disposições legislativas, regulamentares ou administrativas que pretendam adoptar para aplicação do referido regulamento quer as disposições já existentes. A Comissão examina em seguida se as disposições preenchem as condições para beneficiar da participação financeira da Comunidade. No caso afirmativo, os Estados-Membros comunicam as disposições adoptadas.

9 Nos termos do artigo 30._ do mesmo regulamento, após a comunicação das disposições adoptadas, a Comissão decidirá se, em função da sua conformidade com o referido regulamento, se encontram preenchidos os requisitos da participação financeira da Comunidade.

A legislação finlandesa

10 As condições para a concessão de indemnização compensatória das desvantagens naturais permanentes (a seguir «indemnização compensatória») foram fixadas pela decisão n._ 861/1995 do Conselho de Ministros finlandês, de 15 de Junho de 1995. Nas condições previstas nos artigos 29._ e 30._ do Regulamento n._ 2328/91, a Comissão declarou, por decisão de 29 de Agosto de 1995, que as disposições adoptadas reuniam as condições para a participação financeira da Comunidade, com excepção do artigo 5._, n._ 3, da decisão n._ 861/1995, que exigia que o beneficiário da indemnização tivesse residência fixa na Finlândia. Pela decisão n._ 1097/1995, de 31 de Agosto de 1995, o Conselho de Ministros finlandês revogou esta disposição.

11 Nos termos do artigo 2._ da decisão n._ 861/1995, a indemnização compensatória visa preservar a continuidade da actividade agrícola e, portanto, manter o nível mínimo da população e preservar a vitalidade do meio rural em certas zonas pouco favoráveis à exploração agrícola. O artigo 6._ da mesma decisão precisa as regras relativas à residência do beneficiário. Segundo o primeiro parágrafo desse artigo, a indemnização compensatória pode ser paga a um agricultor que resida na exploração ou a uma distância de doze quilómetros no máximo, medida segundo um itinerário praticável, do centro económico desta. Todavia, o terceiro parágrafo dessa mesma disposição habilita a autoridade local a decidir, por derrogação e por «motivos especiais», do pagamento da indemnização compensatória a agricultores que não preenchem a condição de residência prevista no primeiro parágrafo. É então exigido ao agricultor que explore ele próprio a sua empresa e retire pelo menos 50% da totalidade dos seus rendimentos da agricultura, da horticultura, da silvicultura ou de outras actividades rurais citadas no parágrafo em causa.

O processo C-9/97

12 R.-L. Jokela é proprietária duma exploração agrícola situada no município de Laihia (Finlândia), em comum com seu marido. Desde 1994, habita em Bona (Alemanha) com seu marido, funcionário no Ministério dos Negócios Estrangeiros da Finlândia. O casal tratou da exploração durante as férias de Verão de 1995, auxiliado por membros da família. Em 10 de Maio de 1995, R.-L. Jokela pediu o benefício da indemnização compensatória.

13 Por decisão de 14 de Dezembro de 1995, a autoridade municipal competente indeferiu o seu pedido, em virtude de ela não ter residência na exploração ou a uma distância até doze quilómetros desta e de não existirem «motivos especiais» para deferir o seu pedido. R.-L. Jokela contestou esta decisão no Etelä-Pohjanmaan maaseutuelinkeinopiiri (comité das actividades rurais da Ostrobotnia meridional), que, por decisão de 10 de Abril de 1996, indeferiu também o seu pedido, e posteriormente no maaseutuelinkeinojen valituslautakunta (comissão de recurso das actividades rurais), que decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça duas questões prejudiciais.

O processo C-118/97

14 L. Pitkäranta, nascida em 1989, herdou uma exploração agrícola situada no município de Nummi-Pusula (Finlândia), classificado como zona desfavorecida. Nunca teve residência habitual nessa localidade, residindo actualmente a cerca de 70 quilómetros da exploração. A actividade agrícola é assegurada pela família paterna, auxiliada por mão-de-obra externa. Em 14 de Maio de 1995, a representante legal de L. Pitkäranta solicitou uma indemnização compensatória.

15 Por decisão de 14 de Dezembro de 1995, a autoridade municipal competente indeferiu o pedido, na medida em que L. Pitkäranta não habitava a uma distância máxima de doze quilómetros do centro da exploração nem exercia pessoalmente a actividade agrícola. A sua representante legal reclamou desta decisão junto da Uudenmaan maaseutuelinkeinopiiri (autoridade distrital para as actividades rurais de Uusimaa), que indeferiu a reclamação por decisão de 3 de Junho de 1996, e posteriormente interpôs recurso desta decisão para o maaseutuelinkeinojen valituslautakunta, que decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça duas questões prejudiciais.

As questões prejudiciais

16 Nos dois processos, a primeira questão prejudicial está redigida em termos idênticos:

«1) É compatível com os objectivos dos artigos 17._ e 18._ do Regulamento (CEE) n._ 2328/91 do Conselho, relativo à melhoria da eficácia das estruturas agrícolas, bem como do artigo 1._ da Directiva 75/268/CEE do Conselho, sobre a agricultura de montanha e de certas zonas desfavorecidas, conceder uma indemnização compensatória devido a desvantagens naturais a um agricultor que não reside numa exploração situada na Finlândia, numa zona desfavorecida na acepção da directiva, de que é proprietário, ou de que assume a direcção, residindo fora dessa zona na maior parte do ano?

Em caso de resposta afirmativa, ainda que parcial ou com reservas,

a) tendo em conta o disposto nos artigos 5._, 40._, n._ 3, segundo parágrafo, e 42._, segundo parágrafo, alínea a), do Tratado CE e, nomeadamente, o princípio da igualdade de tratamento entre os agricultores e o princípio, conexo, da proibição de discriminação, é admissível exigir de um agricultor que deseja receber a indemnização compensatória devido a desvantagens naturais referidas no artigo 6._ da decisão nacional do Conselho de Ministros, e que reside fora da exploração a uma distância por estrada superior a doze quilómetros do seu centro económico, não apenas que retire pelo menos 50% da totalidade dos seus rendimentos da agricultura, da horticultura ou de silvicultura, ou de outras actividades exercidas na exploração, mas também que a exploração seja gerida pelo próprio?

b) é nomeadamente compatível com o princípio da segurança jurídica imposto pela ordem jurídica comunitária exigir sempre, além disso, que existam razões especiais?»

A segunda questão, pelo contrário, apresenta uma variante:

«2) É, em particular, contrário aos princípios da proibição de discriminação e da proporcionalidade, ou a outros princípios aplicáveis do direito comunitário, excluir do benefício da indemnização compensatória

- uma agricultora que reside, na maior parte do ano noutro Estado-Membro, com o seu marido que exerce as funções de diplomata, representante do Estado finlandês, e que é também proprietário parcial da exploração em causa? (processo C-9/97)

- uma menor que reside habitualmente junto da sua tutora, a cerca de 70 quilómetros de distância do centro de actividade da exploração agrícola, e que não exerce directamente a gestão nem a exerce através da sua tutora? (processo C-118/97)»

Quanto à admissibilidade

17 Antes de responder às questões submetidas, interessa apreciar se o maaseutuelinkeinojen valituslautakunta deve ser considerado como órgão jurisdicional na acepção do artigo 177._ do Tratado.

18 Com o objectivo de averiguar se um organismo possui a qualidade de órgão jurisdicional na acepção daquela disposição, questão que releva exclusivamente do direito comunitário, o Tribunal de Justiça tem em conta um conjunto de elementos, como a origem legal do órgão, a sua permanência, o carácter obrigatório da sua jurisdição, a natureza contraditória do processo, a aplicação pelo órgão das normas de direito, bem como a sua independência (v. acórdãos de 30 de Junho de 1966, Vaassen-Göbbels, 61/65, Colect. 1965-1968, p. 401; de 17 de Setembro de 1997, Dorsch Consult, C-54/96, Colect., p. I-4961, n._ 23; e de 16 de Outubro de 1997, Garofalo e o., C-69/96 a C-79/96, Colect., p. I-5603, n._ 19).

19 Convém observar antes de mais que o maaseutuelinkeinojen valituslautakunta foi instituído pela Lei finlandesa n._ 1203/1992, de 4 de Dezembro de 1992.

20 Resulta, além disso, dos autos que o mesmo tribunal é composto por três membros, dois dos quais exercem as suas funções como actividade principal. Nomeados pela autoridade pública por um período de cinco anos, beneficiam da mesma inamovibilidade dos juízes.

21 A competência do maaseutuelinkeinojen valituslautakunta em matéria de ajudas relativas às actividades rurais tem por base legal a Lei finlandesa n._ 1336/1992, de 18 de Dezembro de 1992, relativa ao processo a respeitar nesta matéria. Esta lei prevê que a decisão relativa a um pedido de ajuda tomada pela autoridade municipal encarregada das actividades rurais pode, no caso de indeferimento, ser contestada pela parte interessada para o maaseutuelinkeinopiiri e, sendo caso disso, para o maaseutuelinkeinojen valituslautakunta.

22 O maaseutuelinkeinojen valituslautakunta decide em matéria de direito, em conformidade com as normas aplicáveis e segundo as regras gerais de processo.

23 As suas decisões podem, sob certos pressupostos, ser objecto de recurso para o Korkein hallinto-oikeus (Supremo Tribunal Administrativo).

24 Resulta do que precede que o maaseutuelinkeinojen valituslautakunta deve ser considerado como um órgão jurisdicional na acepção do artigo 177._ do Tratado, de forma que as questões prejudiciais são admissíveis.

Quanto à primeira parte da primeira questão

25 O órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o Regulamento n._ 2328/91 e a Directiva 75/268 se opõem a que seja concedida uma indemnização compensatória a um agricultor quando este não reside, de forma durável, na sua exploração.

26 O Governo finlandês, insistindo embora na importância que reveste o objectivo do povoamento e na margem de apreciação de que dispõem os Estados-Membros para preverem as condições complementares, reconhece que, em certos casos, pode ser conforme com as finalidades da regulamentação comunitária conceder a indemnização compensatória a um agricultor que não reside na exploração que gere.

27 Segundo o Governo francês, resulta da leitura conjugada dos artigos 18._ do Regulamento n._ 2328/91 e 1._ da Directiva 75/268 que a indemnização compensatória tem por objectivo manter na zona desfavorecida a presença de uma população de agricultores a quem se paga um rendimento específico como compensação das dificuldades ligadas à situação da referida zona. Esta interpretação conduz este Governo a sustentar que a regulamentação comunitária subordina implicitamente a concessão da indemnização à condição de o agricultor residir de forma permanente na zona desfavorecida.

28 A Comissão, por seu lado, considera que o objectivo da indemnização compensatória é assegurar a prossecução da actividade agrícola, o que não exige obrigatoriamente a residência permanente na exploração.

29 R.-L. Jokela sustenta que a sua presença temporária na exploração lhe permite assegurar a continuidade da exploração agrícola, que é a finalidade da regulamentação comunitária.

30 A título liminar, deve recordar-se que, no âmbito do artigo 177._ do Tratado, o Tribunal de Justiça não tem competência para aplicar as regras comunitárias a um caso determinado, mas apenas para se pronunciar quanto à interpretação do Tratado e dos actos adoptados pelas instituições da Comunidade (v., nomeadamente, acórdãos de 15 de Julho de 1964, Van der Veen, 100/63, Colect. 1962-1964, p. 531, e de 11 de Julho de 1985, Mutsch, 137/84, Recueil, p. 2681, n._ 6).

31 Quanto à apreciação da presente questão, interessa sublinhar que o artigo 18._ do Regulamento n._ 2328/91 se limita a precisar que os beneficiários da indemnização compensatória são «... os agricultores que... se comprometam a prosseguir uma actividade agrícola em conformidade com os objectivos do artigo 1._ da Directiva 75/268/CEE...», disposição que visa «... a prossecução da actividade agrícola bem como a manutenção de um mínimo de povoamento ou a manutenção do espaço natural em certas zonas desfavorecidas...». O quinto considerando da Directiva 75/268, que o Governo francês também invocou em apoio da sua análise, precisa que o regime de ajudas a pôr em prática deve combater «a deterioração persistente dos rendimentos agrícolas» e «a existência de condições de trabalho particularmente deficientes» nas zonas desfavorecidas, que originam «um êxodo agrícola e rural maciço que se traduz, no final, no abandono de terras anteriormente mantidas e, mais do que isso, em pôr em causa a viabilidade e o povoamento das zonas cuja população depende de forma preponderante da economia agrícola».

32 Resulta destas disposições, tal como observou o advogado-geral no n._ 33 das suas conclusões, que a regulamentação comunitária tem essencialmente por objectivo sustentar a prossecução da actividade agrícola em zonas em que, sem este apoio, esta se revelaria comprometida, com todas as consequências negativas que isso pressupõe para o povoamento e a manutenção das zonas em questão.

33 Daí resulta que o agricultor satisfaz o objectivo essencial da regulamentação comunitária quando mantém a sua exploração em estado de actividade. Pelo contrário, diferentemente do que sustentou o Governo francês, o objectivo de povoamento, para cuja realização tende, naturalmente, a contribuir a prossecução da actividade agrícola, não pode, por si só, implicar a obrigação de residência permanente.

34 Deve, pois, responder-se à primeira parte da primeira questão que os artigos 17._ e 18._ do Regulamento n._ 2328/91 e 1._ da Directiva 75/268 não se opõem a que seja concedida uma indemnização compensatória a um agricultor quando este não reside, de forma durável, na sua exploração.

Quanto à segunda parte da primeira questão, alíneas a) e b)

35 O órgão jurisdicional de reenvio pergunta em seguida se o direito comunitário, nomeadamente os princípios da igualdade de tratamento e da segurança jurídica, se opõem à aplicação de uma regulamentação nacional como a que está em causa no processo principal.

36 A título liminar, convém recordar que o artigo 18._, n._ 3, do Regulamento n._ 2328/91 autoriza expressamente os Estados-Membros a preverem condições complementares ou limitativas para a concessão da indemnização compensatória.

37 É, portanto, tendo em conta esta faculdade de apreciação que se deve averiguar a compatibilidade com o direito comunitário do artigo 6._ da decisão n._ 861/1995 do Conselho de Ministros finlandês. O primeiro parágrafo desta disposição exige, a título de regra geral, que o agricultor que reclama o benefício da indemnização compensatória resida na exploração ou a uma distância máxima de doze quilómetros desta. A título de excepção a esta regra geral, o terceiro parágrafo do mesmo artigo permite à pessoa que não satisfaça a exigência de residência beneficiar, apesar disso, da indemnização compensatória, quando, por outro lado, satisfaça outras exigências que garantam a existência de um vínculo mínimo com a exploração.

Quanto à obrigação geral de residência

38 A este propósito, o Governo finlandês argumentou que as particularidades e a situação geográfica da Finlândia e a fraca densidade da sua população justificam que tivesse incluído nas condições adicionais que o artigo 18._, n._ 3, do Regulamento n._ 2328/91 o autoriza expressamente a estabelecer, para a concessão da indemnização compensatória, uma obrigação geral de residência na exploração ou na proximidade imediata dela.

39 Tal como já foi observado nos n.os 31 a 33 do presente acórdão, o regime de ajudas em questão tem também por objectivo assegurar a manutenção dum mínimo de povoamento em certas zonas desfavorecidas. Além disso, segundo o artigo 1._, segundo parágrafo, da Directiva 75/268, o sistema instituído deve «... ter em conta a situação e os objectivos de desenvolvimento próprios dessa região». Daí resulta que as modalidades respeitantes à condição de residência imposta pela regulamentação finlandesa a fim de poder beneficiar da indemnização compensatória se inscrevem no quadro dos objectivos prosseguidos pelo regime de ajudas e, por conseguinte, nos limites da faculdade de apreciação deixada aos Estados-Membros pelo artigo 18._, n._ 3, do Regulamento n._ 2328/91, na medida em que contribuem para a manutenção de um mínimo de povoamento que, tal como argumentou o Governo finlandês, condiciona a manutenção de serviços essenciais para a população nas zonas que, de outra forma, estariam ameaçadas de desertificação.

40 R.-L. Jokela argumentou todavia que, ao impor, através do artigo 6._, primeiro parágrafo, da decisão n._ 861/1995, uma condição de residência no interior de um perímetro de doze quilómetros, no máximo, da exploração, o Conselho de Ministros finlandês restabeleceu implicitamente a condição de residência fixa na Finlândia, inicialmente prevista pelo artigo 5._, n._ 3, da referida decisão e suprimida na sequência das objecções postas pela Comissão.

41 R.-L. Jokela argumentou também que a condição de residência imposta pela regulamentação finlandesa é contrária ao princípio da livre circulação de pessoas.

42 Esta análise não pode ser acolhida. Com efeito, tal como sublinharam quer o Governo finlandês quer a Comissão, o agricultor residente na Finlândia a mais de doze quilómetros da sua exploração encontra-se na mesma situação que aquele que reside noutro Estado-Membro, devendo ambos preencher, para beneficiar da indemnização compensatória, as condições particulares requeridas pelo artigo 6._, terceiro parágrafo, da decisão n._ 861/1995.

Quanto à excepção à obrigação geral de residência

43 A regulamentação finlandesa dispensa o agricultor que pede o benefício da indemnização compensatória de qualquer obrigação de residência, desde que prove, para além da existência de uma razão particular, que gere ele próprio a exploração e retira pelo menos 50% dos seus rendimentos duma actividade agrícola ou equiparada.

44 O órgão jurisdicional de reenvio manifestou dúvidas quanto à compatibilidade deste regime com o princípio da igualdade de tratamento.

45 Convém recordar que o princípio implica que situações comparáveis não sejam tratadas de forma diferente, a menos que se justifique objectivamente uma diferenciação (acórdão de 15 de Fevereiro de 1996, Duff e o., C-63/93, Colect., p. I-569, n._ 26).

46 A este propósito, basta observar que, tal como declarou o Governo finlandês, entre os agricultores que podem requerer o benefício da indemnização compensatória, isto é, aqueles cuja exploração se situa numa zona desfavorecida na Finlândia, o que reside na exploração ou na proximidade imediata desta contribui sempre e directamente para a realização dos objectivos da indemnização, que incluem a manutenção de um mínimo de povoamento na zona desfavorecida. Não é esse o caso do agricultor que reside durante uma grande parte do ano a uma distância maior, de forma que se justifica impor-lhe condições destinadas a assegurar a existência de um vínculo mínimo entre ele próprio e a sua exploração, como as obrigações de assegurar ele próprio a gestão e de retirar pelo menos 50% dos seus rendimentos duma actividade agrícola ou equiparada.

47 O órgão jurisdicional de reenvio fez referência, a propósito da condição relativa à existência de um motivo especial, a uma eventual violação do princípio da segurança jurídica.

48 A este propósito, deve recordar-se que este princípio exige que as regras de direito sejam claras e precisas, e visa garantir a previsibilidade das situações e das relações jurídicas que relevam do direito comunitário (v. acórdão Duff e o., já referido, n._ 20).

49 É verdade que a noção de motivo especial é imprecisa e as situações jurídicas que pode cobrir não são claramente delimitadas. Todavia, por um lado, esta imprecisão responde à preocupação do legislador finlandês de dar à autoridade competente um instrumento suficientemente flexível para lhe permitir resolver, no termo de uma análise objectiva e completa de cada caso, problemas especiais que a sua diversidade torna impossível de prever antecipadamente. Por outro lado, esta imprecisão tem tendência a reduzir-se sensivelmente, a partir do momento em que se tenha constituído um conjunto de precedentes que permita identificar e sistematizar, e assim prever, os critérios utilizados.

50 Nestas condições, deve responder-se à segunda parte da primeira questão, alíneas a) e b), que nem o princípio da igualdade de tratamento nem o da segurança jurídica se opõem a que se exija a um agricultor, que pede o benefício da indemnização compensatória e que reside fora da sua exploração, a uma distância do seu centro económico superior a doze quilómetros por estrada, que gira ele próprio a exploração e que retire pelo menos 50% dos seus rendimentos duma actividade agrícola ou equiparada, e, além disso, que seja provada a existência de um motivo especial.

Quanto à segunda questão

51 No processo C-9/97, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se o princípio da não discriminação e o da proporcionalidade, ou outros princípios de direito comunitário, impedem que se exclua do benefício da indemnização compensatória uma agricultora que reside a maior parte do ano noutro Estado-Membro em que o seu marido, que é também proprietário de parte da exploração em questão, exerce as funções de diplomata.

52 No processo C-118/97, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se estes mesmos princípios impedem que se exclua do benefício da indemnização compensatória uma pessoa menor que habita permanentemente em casa da sua representante legal, a cerca de 70 quilómetros da exploração, que não é gerida nem por ela própria nem pela sua representante legal.

53 Respeitando esta segunda questão à aplicação, a um caso determinado, das regras comunitárias cuja interpretação foi objecto da primeira questão, compete, tal como o Tribunal de Justiça recordou no n._ 30 do presente acórdão, ao órgão jurisdicional de reenvio apreciar, à luz dos elementos de interpretação que relevam do direito comunitário e que lhe foram fornecidos na resposta a esta questão, os efeitos das disposições do direito nacional que lhe incumbe aplicar.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

54 As despesas efectuadas pelos Governos finlandês e francês, bem como pela Comissão das Comunidades Europeias, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA

(Quinta Secção),

pronunciando-se sobre as questões submetidas pelo maaseutuelinkeinojen valituslautakunta, por despachos de 9 de Janeiro de 1997 e 12 de Março de 1997, declara:

55 Os artigos 17._ e 18._ do Regulamento (CEE) n._ 2328/91 do Conselho, de 15 de Julho de 1991, relativo à melhoria da eficácia das estruturas agrícolas, e 1._ da Directiva 75/268/CEE do Conselho, de 28 de Abril de 1975, sobre a agricultura de montanha e de certas zonas desfavorecidas, não se opõem a que seja concedida uma indemnização compensatória das desvantagens naturais permanentes a um agricultor, quando este não reside, de forma durável, na sua exploração.

56 Nem o princípio da igualdade de tratamento nem o da segurança jurídica se opõem a que se exija a um agricultor, que pede o benefício da indemnização compensatória e que reside fora da sua exploração, a uma distância do seu centro económico superior a doze quilómetros por estrada, que gira ele próprio a exploração e retire pelo menos 50% dos seus rendimentos duma actividade agrícola ou equiparada, e, além disso, que seja provada a existência de um motivo especial.