61997C0159

Conclusões do advogado-geral Léger apresentadas em 22 de Septembro de 1998. - Trasporti Castelletti Spedizioni Internazionali SpA contra Hugo Trumpy SpA. - Pedido de decisão prejudicial: Corte suprema di cassazione - Itália. - Convenção de Bruxelas - Artigo 17. - Pacto atributivo de jurisdição - Forma admitida pelos usos do comércio internacional. - Processo C-159/97.

Colectânea da Jurisprudência 1999 página I-01597


Conclusões do Advogado-Geral


1 Com as catorze questões colocadas ao Tribunal de Justiça (1), a Corte Suprema di Cassazione solicita que sejam esclarecidas as condições de aplicação do artigo 17._ da Convenção de Bruxelas de 27 de Setembro de 1968 relativa à competência judiciária e à execução de decisões em matéria civil e comercial, na redacção que lhe foi dada pela convenção de adesão de 1978 (2) (a seguir «convenção»), na parte em que ele se refere aos usos no comércio internacional, a fim de apreciar a validade de uma cláusula atributiva de jurisdição constante do verso de um conhecimento de carga (3) de que só a frente está assinada.

Enquadramento jurídico

2 No âmbito do sistema unificado de determinação da competência judiciária tido em vista pelo título II da convenção, o artigo 17._ prevê um critério de competência exclusiva, derrogatório tanto do critério de princípio, constante do artigo 2._, do tribunal do Estado contratante do domicílio do réu como das competências especiais dos artigos 5._ e 6._ O Tribunal de Justiça considera, a este propósito, segundo jurisprudência constante, que «as disposições do artigo 17._ da convenção, em virtude de excluírem quer a competência determinada pelo princípio geral do foro do demandado consagrado no artigo 2._ quer as competências especiais dos artigos 5._ e 6._, são de interpretação estrita quanto às condições nela estabelecidas» (4).

3 Constando da secção VI relativa à «Extensão de competência», que consagra igualmente, ao abrigo do artigo 18._, a competência do órgão jurisdicional perante o qual o requerido compareça, o artigo 17._ permite que, tão-somente mediante uma manifestação de vontade, as partes, das quais pelo menos uma se encontra domiciliada no território de um Estado contratante, atribuam competência a um órgão jurisdicional de um Estado contratante, normalmente incompetente.

4 O artigo 17._, ora em causa, «é provavelmente o artigo da convenção que mais foi alterado por altura das adesões sucessivas de novos Estados» (5). Não é, pois, inútil recordar com brevidade a evolução seguida por este texto.

5 Na sua versão inicial, esta disposição estava redigida da seguinte maneira:

«Se, mediante pacto escrito ou pacto verbal confirmado por escrito, as partes, das quais pelo menos uma se encontre domiciliada no território de um Estado contratante, tiverem designado um tribunal ou os tribunais de um Estado contratante competentes para decidir quaisquer litígios que tenham surgido ou que possam surgir de uma determinada relação jurídica, esse tribunal ou esses tribunais terão competência exclusiva.»

6 Pela adopção da convenção de adesão de 1978, as partes contratantes acordaram, em especial, que as cláusulas atributivas de jurisdição podem ser celebradas de uma terceira maneira: ao lado da referência a um pacto escrito ou a um pacto verbal confirmado por escrito, é acrescentada a que é relativa aos usos no comércio internacional. Esta versão, a que se reporta o presente reenvio prejudicial, reza assim:

«Se as partes, das quais pelo menos uma se encontre domiciliada no território de um Estado contratante, tiverem convencionado que um tribunal ou os tribunais de um Estado contratante têm competência para decidir quaisquer litígios que tenham surgido ou que possam surgir de uma determinada relação jurídica, esse tribunal ou esses tribunais terão competência exclusiva. Este pacto atributivo de jurisdição deve ser celebrado por escrito ou verbalmente com confirmação escrita, no comércio internacional, mediante forma reconhecida pelos usos nesse domínio, que as partes conheçam ou devam conhecer. Sempre que tal pacto atributivo de jurisdição for celebrado por partes das quais nenhuma tenha domicílio num Estado contratante, os tribunais dos outros Estados contratantes não podem conhecer do litígio, a menos que o tribunal ou os tribunais escolhidos se tenham declarado incompetentes» (6).

7 Mencionemos, finalmente, a última redacção do artigo 17._, resultante da convenção de San Sebastián de 26 de Maio de 1989 (7), que esclarece qual é a natureza do uso ao qual a forma da cláusula se deve conformar e consagra, nomeadamente, uma quarta forma susceptível de ser adoptada pelas partes, a fim de ter em conta certos «hábitos» que as mesmas tenham podido estabelecer entre si:

«Se as partes, das quais pelo menos uma se encontre domiciliada no território de um Estado contratante, tiverem convencionado que um tribunal ou os tribunais de um Estado contratante têm competência para decidir quaisquer litígios que tenham surgido ou que possam surgir de uma determinada relação jurídica, esse tribunal ou esses tribunais terão competência exclusiva. Esse pacto atributivo de jurisdição deve ser celebrado:

a) Por escrito ou verbalmente com confirmação escrita; ou

b) Em conformidade com os usos que as partes estabeleceram entre si; ou

c) No comércio internacional, em conformidade com os usos que as partes conheçam ou devam conhecer e que, em tal comércio, sejam amplamente conhecidos e regularmente observados pelas partes em contratos do mesmo tipo, no ramo comercial considerado.

...» (8). Matéria de facto

8 As questões que foram submetidas ao Tribunal de Justiça têm origem nos seguintes factos.

9 Determinadas partidas de fruta tinham sido embarcadas por diferentes carregadores argentinos, com base em 22 conhecimentos de carga emitidos em Buenos Aires em 14 de Março de 1987, a bordo de um navio explorado pelo armador Lauritzen Reefers A/S, com sede social em Copenhaga, a fim de serem transportadas para Savona (Itália), onde deviam ser entregues à sociedade Trasporti Castelletti Spedizioni Internazionali SpA (a seguir «Castelletti» ou «demandante no processo principal»).

10 Na sequência de dificuldades surgidas aquando da descarga das mercadorias, a Castelletti intentou uma acção no Tribunale di Genova contra o agente consignatário do navio e do transportador dinamarquês (9), a SpA Hugo Trumpy (a seguir «demandada no processo principal»), com sede social em Génova (Itália), tendo em vista obter a sua condenação no pagamento de uma indemnização por perdas e danos.

11 A demandada no processo principal alegou imediatamente a excepção de incompetência do órgão jurisdicional italiano ao qual a causa foi submetida, invocando o artigo 17._ da convenção de Bruxelas, na redacção resultante da convenção de adesão do Luxemburgo de 1978, e a cláusula n._ 37 dos conhecimentos de carga, que atribuía competência à High Court of Justice, London.

12 Esta cláusula, redigida, como todo o conhecimento de carga em que se insere, em inglês, e em caracteres reduzidos mas legíveis, constitui a última menção constante do verso do documento impresso. Está redigida nos seguintes termos: «The contract evidenced by this Bill of Lading shall be governed by English Law and any disputes thereunder shall be determined in England by the High Court of Justice in London according to English Law to the exclusion of the Courts of any other country» (10).

Da frente do conhecimento de carga constam, designadamente, um quadro que se destina a ser completado com indicações relativas às características das mercadorias carregadas, bem como uma menção, redigida em maiúsculas, em caracteres normandos e maiores do que os que foram utilizados para as cláusulas, que remete para as condições inscritas no verso: «Continued on reverse side» (11). Sob esta indicação, estão apostas a data e o lugar de emissão do conhecimento de carga bem como a assinatura do transportador; a do carregador inicial, que consta imediatamente por baixo das menções relativas às características das mercadorias carregadas, está aposta ao lado da menção «above particulars declared by shipper» (12).

13 O Tribunale acolheu favoravelmente a excepção de incompetência assim suscitada, considerando válida a cláusula controvertida - se bem que constasse de um formulário não assinado pelo carregador -, tendo em conta os usos no comércio internacional. Por acórdão de 7 de Dezembro de 1994, a Corte d'appello di Genova confirmou a primeira sentença, mas procedeu a uma alteração da fundamentação. Com efeito, a Corte d'appello decidiu que a assinatura, no recto do conhecimento de carga, pelo carregador inicial, importava a aceitação de todas as cláusulas pela Castelletti, inclusive as que constavam do verso.

14 A Castelletti interpôs então recurso de cassação, invocando uma violação do artigo 17._ da convenção e, em especial, do requisito relativo ao consentimento das partes, já que a assinatura do carregador inicial não podia importar a aceitação por este de todas as cláusulas, mas tão-só das cláusulas que precediam a assinatura, as quais diziam respeito às características das mercadorias transportadas.

15 O supremo tribunal decidiu que «a tese da recorrente deve ser acolhida» (13). Ao mesmo tempo que considerava aplicável a convenção na sua versão alterada em 1978, entende, no entanto, que continua a haver uma dúvida no que respeita à interpretação correcta do (novo) texto do artigo 17._, que impõe que um pacto atributivo de jurisdição deve ser celebrado, «no comércio internacional, mediante forma reconhecida pelos usos nesse domínio, que as partes conheçam ou devam conhecer», já que, segundo ela, está excluído que o pacto tenha sido celebrado por escrito ou mesmo verbalmente com confirmação escrita.

16 Por conseguinte, suspendeu a instância e submeteu ao Tribunal de Justiça catorze questões, que estão reproduzidas em anexo, as quais podem ser agrupadas em diferentes rubricas, que examinarei sucessivamente.

Observações prévias

17 A extrema minúcia das questões colocadas ao Tribunal de Justiça deixa-me, antes de mais, um tanto perplexo.

18 O órgão jurisdicional italiano parece, com efeito, pedir ao Tribunal de Justiça que reveja toda a sua jurisprudência, no entanto já vasta, relativa ao artigo 17._ da convenção (14), em especial, a anterior à alteração operada em 1978, de modo a certificar-se de que esta continua a ser relevante desde essa data. Ora, por um lado, não resulta do relatório Schlosser (15) que a vontade das partes contratantes tenha sido a de subverter, de modo acentuado, o sentido e o alcance desta disposição: tratou-se, antes, de resolver uma série de dificuldades encontradas na prática e de prever as particularidades próprias dos novos países aderentes. Por outro lado, poderia haver dúvidas quanto ao interesse de algumas das questões colocadas para a solução do litígio no processo principal, tanto mais que a exiguidade dos elementos constantes do despacho de reenvio não ajuda em nada a detectar as preocupações do juiz que estão na origem das questões.

19 É igualmente verdade, como se verá, que algumas das questões formuladas perderam algum interesse, desde que foram proferidos os acórdãos mais recentes do Tribunal de Justiça, em especial os acórdãos MSG, já referido, e de 3 de Julho de 1997, Benincasa (16).

20 Esforçar-me-ei, no entanto, por sugerir ao Tribunal de Justiça uma via que, tendo embora em conta as questões que foram colocadas, seja susceptível de esclarecer eficazmente o órgão jurisdicional de reenvio sobre a aplicação do artigo 17._ da convenção, que lhe cabe fazer, em última análise.

21 A este propósito, considero útil salientar, antes de mais, que é justamente a Corte Suprema di Cassazione que considera aplicável, no presente caso, o artigo 17._ da convenção de Bruxelas, na versão resultante da alteração ocorrida em 1978.

22 Por um lado, com efeito, o conhecimento de carga controvertido foi emitido em 14 de Março de 1987, ou seja, posteriormente à entrada em vigor da convenção, com as alterações, em cada um dos Estados contratantes susceptíveis de ter um elemento de conexão com as circunstâncias do caso (isto é, a República Italiana, o Reino da Dinamarca e o Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte) (17).

Por outro lado, nem a convenção de adesão de 25 de Outubro de 1982 (18) nem - a fortiori - a de San Sebastián tinham entrado em vigor na altura dos factos da causa.

23 Não há, por conseguinte, qualquer dúvida de que a convenção, com as alterações que lhe foram introduzidas pela convenção de adesão de 1978, é efectivamente aplicável ratione temporis.

24 O elemento de estraneidade introduzido, no caso vertente, pela nacionalidade argentina dos carregadores iniciais não é, aliás, de molde a levar à exclusão da aplicação do artigo 17._, como faz notar a alta jurisdição italiana (19).

25 Ao exigir que pelo menos uma das partes «se encontre domiciliada no território de um Estado contratante», os redactores da convenção pretenderam, na realidade, referir-se a três tipos de situações, como foi salientado por P. Jenard (20): «Em caso de cláusula atributiva de competência acordada entre uma pessoa domiciliada num Estado contratante e uma pessoa domiciliada num outro Estado contratante, ou entre uma pessoa domiciliada num Estado contratante e uma pessoa domiciliada fora da Comunidade, o artigo 17._ intervirá em caso de extensão de competência a favor de um tribunal de um Estado contratante, ou ainda se duas pessoas domiciliadas num Estado contratante acordarem na extensão da competência de um tribunal de outro Estado contratante» (21). O relatório Schlosser (22) lembra, pelo seu lado, que «O artigo 17._... só é aplicável quando a operação em causa envolve relações internacionais...».

26 Basta salientar que é exactamente isso que acontece nas circunstâncias que nos ocupam.

27 Sem querer decidir, nesta fase, a questão - que será examinada posteriormente - da identificação das «partes» mencionadas no artigo 17._ da convenção, pode desde já notar-se que, tanto nas relações entre as partes iniciais como nas que ligam a demandante no processo principal à demandada no processo principal, a condição de que pelo menos uma das partes «se encontre domiciliada no território de um Estado contratante» está preenchida.

28 Antes de mais, no âmbito das relações iniciais, a cláusula litigiosa é uma das que foram tidas em vista, em segundo lugar, no relatório Jenard, uma vez que ela foi celebrada entre «uma pessoa domiciliada num Estado contratante» (o transportador dinamarquês) e «uma pessoa domiciliada fora da Comunidade» (os carregadores argentinos) (23) e que estipula «extensão de competência a favor de um tribunal de um Estado contratante» (a High Court of Justice, London).

29 O segundo âmbito de relações não suscita qualquer dificuldade, já que ambas as partes estão domiciliadas no território de um Estado contratante (no presente caso, a Itália).

30 Finalmente, se a matéria do transporte marítimo, em especial na medida em que diz respeito ao conhecimento de carga, é especificamente objecto de convenções internacionais, aliás abundantemente citadas no processo perante o Tribunal de Justiça (24), tal não significa obviamente que ela esteja excluída do âmbito de aplicação material do artigo 17._ da convenção.

31 Recorde-se a este propósito que, sem prejuízo das restrições mencionadas, na convenção, nos artigos 12._ (competência em matéria de seguros), 15._ (competência em matéria de contratos celebrados pelos consumidores) e 16._ (competências exclusivas em certas matérias, tal como os direitos reais sobre imóveis), a eleição de foro é autorizada em todas as matérias abrangidas pela convenção.

Tomada de posição

32 As questões formuladas, apesar do seu número, pretendem, na realidade, que o Tribunal de Justiça esclareça cada um dos três elementos que condicionam a validade de um pacto atributivo de jurisdição, em relação ao artigo 17._, primeiro parágrafo, segunda frase, terceira hipótese, da convenção, na sua versão de 1978. Pressupõem que se identifique previamente o juiz competente para se pronunciar sobre os critérios de aplicação desse texto.

33 Proponho-me, por conseguinte, examiná-las, na medida em que tratam do consentimento das partes quanto ao pacto (II); da noção de forma reconhecida pelos usos no comércio internacional (III); bem como do conhecimento deste uso pelas partes (IV). Algumas questões formuladas incidem igualmente sobre a competência jurisdicional para conhecer desses pactos (I); na medida em que condicionam a competência do juiz de reenvio, é por elas que dou início às minhas reflexões.

I - Quanto à competência jurisdicional (terceira e sétima questões)

34 Com a sua terceira questão, o juiz de reenvio pergunta ao Tribunal de Justiça se, para efeitos de aplicação do artigo 17._ da convenção, o juiz designado pelo pacto atributivo de jurisdição deve necessariamente ter uma qualquer conexão com o litígio. Está redigida do seguinte modo:

«[a Corte Suprema di Cassazione pergunta] se o tribunal designado deve ter alguma relação com a nacionalidade e/ou o domicílio dos contratantes ou com os lugares de execução e/ou de elaboração do contrato, respeitando a necessidade de que seja um tribunal de um Estado contratante, ou se esta última condição é suficiente, sem qualquer outra ligação com a relação substancial».

35 Parece-me que a jurisprudência do Tribunal de Justiça permite desde já responder claramente pela negativa à primeira parte da alternativa assim formulada.

36 O Tribunal de Justiça julgou, com efeito, no acórdão Zelger (25), que, diferentemente do que acontece com o artigo 5._, n._ 1, da convenção, que prevê um critério de competência - tribunal do lugar onde a obrigação contratual foi ou deva ser cumprida - que é justificado pela existência de uma ligação directa entre o litígio e o tribunal chamado a dirimi-lo, o artigo 17._ «... abstrai de qualquer elemento objectivo de conexão entre a relação controvertida e o tribunal designado» (26).

37 O Tribunal de Justiça confirmou esta apreciação nos acórdãos mais recentes, que salientam que a disposição controvertida «... favorece a vontade das partes contratantes e introduz uma competência exclusiva abstraindo de qualquer elemento objectivo de conexão entre a relação controvertida e o tribunal designado...» (27).

38 Trata-se, como notou a doutrina (28), de uma rejeição da teoria do forum conveniens, cujas dificuldades práticas de aplicação, nascidas da determinação do vínculo entre o processo e o tribunal designado, são facilmente imagináveis. É, pelo contrário, privilegiada a possibilidade de se deixar às partes a escolha de um tribunal que eventualmente seja completamente estranho ao litígio, isto é, que seja o mais neutro possível. Como faz notar um autor, «Se se tivesse antecipadamente eliminado qualquer possibilidade de neutralidade absoluta, ter-se-ia incitado as partes a recorrer à arbitragem, em que a falta de ligação objectiva entre o litígio e os árbitros é, em matéria internacional, as mais das vezes, a regra» (29).

39 Deve deduzir-se disto que, no que diz respeito ao juiz designado no pacto atributivo de jurisdição, é deixada inteira liberdade à vontade das partes, a qual não é limitada, conforme a própria letra do preceito, senão pela exigência de pertença do foro a um Estado contratante.

40 Em resposta à terceira questão, basta portanto salientar que, para a aplicação do artigo 17._, não é necessário que o foro escolhido tenha qualquer relação com as partes ou com o contrato (30).

41 O foro escolhido não coincide sempre necessariamente, no entanto, com o órgão jurisdicional ao qual é submetido o litígio. A existência de um pacto atributivo de jurisdição pode dar origem a dificuldades para aquele tribunal, como no caso vertente, em que esta circunstância levou o juiz de reenvio a colocar ao Tribunal de Justiça a sétima questão, que incide sobre a questão de saber:

«[se] o tribunal (diferente do designado) escolhido, para efeitos da apreciação da validade da cláusula, [pode] averiguar a razoabilidade desta, ou seja, o objectivo visado pelo transportador na escolha do tribunal designado, diferente do que seria competente segundo os critérios normais estabelecidos pela convenção de Bruxelas ou pela lei do foro».

42 Assim sendo, o Tribunal de Justiça é solicitado a tomar posição sobre a dupla questão da competência do juiz ao qual o processo é submetido para verificar a validade do pacto que atribui competência a outro órgão jurisdicional e, se for caso disso, do alcance desse controlo.

43 Se a competência do juiz designado no pacto atributivo de jurisdição para se pronunciar sobre a validade deste não suscita qualquer dúvida, a do juiz a quem o processo é submetido dá azo a algumas interrogações (31). É certo que lhe poderia ser oposto o carácter exclusivo da competência reconhecida ao juiz designado pelas partes, ao abrigo do artigo 17._, nos termos do qual o «tribunal ou [os] tribunais [designados pelas partes] terão competência exclusiva».

44 Não me parece, porém, que nos devamos ater a esta consideração. A jurisprudência do Tribunal de Justiça, tal como o relatório Schlosser, parece-me, com efeito, não conter qualquer ambiguidade a este respeito.

45 Nos acórdãos Estasis Salotti e Segoura, já referidos (32), o Tribunal de Justiça fez notar que «... o artigo 17._ impõe ao juiz chamado a decidir a obrigação de verificar, em primeiro lugar, se o pacto que lhe atribui competência foi, efectivamente, objecto de acordo entre as partes...», acordo este que, como se verá, condiciona a validade do pacto.

46 É certo que, nos dois processos, o juiz chamado a decidir coincidia com o juiz designado no pacto. O raciocínio feito deve, porém, valer, ainda que assim não seja.

47 Com efeito, se se negasse que o juiz chamado a decidir tem competência para se pronunciar em primeiro lugar sobre a validade do pacto de eleição de um foro estrangeiro, deveria admitir-se que, sistematicamente, ele suspende a instância logo que for chamado a decidir, para remeter as partes para o juiz designado, de modo a deixar a este último o cuidado de verificar a validade do pacto que lhe atribui competência, ainda que, no termo de um exame negativo sobre esta questão, este último remeta de novo o processo para o juiz a quem ele havia sido inicialmente submetido. Verifica-se imediatamente a incoerência deste mecanismo no sistema da convenção, que tem como um dos seus objectivos facilitar a designação rápida e imediata de um foro competente.

48 O recente acórdão Benincasa do Tribunal de Justiça, já referido, sem entrar especificamente neste aspecto, decide, no entanto, a questão, que é afim desta, do juiz competente para determinar se o litígio está ou não abrangido pelo âmbito de aplicação da cláusula atributiva de jurisdição, a favor do «... órgão jurisdicional nacional onde foi invocada...» (33). Esta formulação ampla parece-me designar, de uma maneira geral, o juiz chamado a decidir, quer coincida quer não com o tribunal escolhido.

49 O critério que sugiro ao Tribunal de Justiça não é, além disso, de modo algum, prejudicial à segurança jurídica pretendida pela convenção no que toca à designação dos foros competentes. Com efeito, ao reconhecer ao juiz chamado a decidir competência para se pronunciar sobre a validade do pacto e, portanto, sobre a sua própria competência, quer ele seja quer não o juiz designado, a sua competência para decidir do mérito do litígio não está em causa. Trata-se, tão-somente, de admitir, por uma questão de economia processual, que o juiz chamado a decidir está em condições de ser ele mesmo a verificar a sua própria competência.

50 O relatório Schlosser não diz, na realidade, outra coisa, quando afirma que «... a existência de um pacto atributivo de jurisdição que se opõe à competência do tribunal a que a questão foi submetida constitui motivo para que o juiz se declare oficiosamente incompetente» (34). Uma vez, com efeito, que se tem como adquirido que o juiz chamado a decidir deve assegurar-se de que as partes não tinham convencionado outro foro, é necessário admitir que lhe cabe igualmente, de certo modo em paralelo, verificar a validade de uma tal escolha do foro.

51 Note-se, finalmente, que negar competência ao juiz chamado a decidir para se pronunciar sobre a validade do pacto faria correr o risco de favorecer a prática de manobras dilatórias que as partes pouco escrupulosas não deixariam de tentar. Sabendo que o juiz chamado a decidir deve assinalar oficiosamente a existência de um pacto atributivo de jurisdição, se se considerasse que, no entanto, ele não se poderia pronunciar sobre a sua validade, seria então muito fácil a uma parte, desejosa, por exemplo, de afrouxar o ritmo do procedimento, invocar artificialmente a existência de uma tal escolha de foro, para alcançar sem dificuldade os seus fins. É evidente que o sistema instaurado pela convenção não pode levar a favorecer tais práticas.

52 Considero, portanto, que o juiz chamado a decidir, quer ele seja quer não o juiz designado no pacto atributivo de jurisdição, é competente para se pronunciar sobre a respectiva validade.

53 Quanto ao aspecto, igualmente equacionado na sétima questão, relativo à amplitude do controlo deste pacto pelo juiz chamado a decidir, não me parece merecer profundas reflexões. Basta admitir que, sendo o juiz chamado a decidir competente para se pronunciar sobre a validade do pacto, este controlo pode incidir sobre todos os aspectos que condicionam esta validade e que estão previstos no artigo 17._ Trata-se, na realidade, dos aspectos que são objecto das questões seguintes, relativas ao consentimento das partes quanto ao pacto, à existência de um uso no comércio internacional e ao conhecimento deste uso pelas partes.

54 Em resposta à sétima questão, considero que se deve, portanto, dizer que o juiz chamado a decidir, quer ele seja quer não o juiz designado no pacto atributivo de jurisdição, é competente para se pronunciar sobre a validade deste pacto, no que toca aos requisitos previstos no artigo 17._

II - Quanto ao consentimento das partes no que respeita ao pacto atributivo de jurisdição (primeira e décima primeira questões e primeiro aspecto da segunda questão)

55 Uma das preocupações essenciais da suprema jurisdição italiana pareceu incidir na questão de saber se, tal como antes da alteração introduzida em 1978, a aplicação do artigo 17._, na medida em que doravante se refere aos usos, continua a pressupor a necessidade de comprovar a existência de um acordo de vontades das partes quanto ao pacto atributivo de jurisdição.

56 É este o objecto da - muito pormenorizada - primeira questão, à qual o Tribunal de Justiça, como se verá, já deu logicamente, desde então, uma resposta positiva. Examinarei a seguir, através do primeiro aspecto da segunda questão, bem como da décima primeira questão, quais são as «partes» das quais este consentimento é exigido, numa hipótese tal como a que ora nos ocupa, em que as partes que celebraram inicialmente e/ou assinaram o conhecimento de carga não são necessariamente as que o invocam ou contra as quais ele é invocado posteriormente.

57 A primeira questão está redigida nestes termos:

«Na jurisprudência do Tribunal de Justiça, relativamente ao texto original do artigo 17._, exigiu-se, ao determinar os requisitos estabelecidos por essa norma para a validade do pacto atributivo de jurisdição, que fosse apurada e tutelada a efectiva vontade das partes de que a cláusula que contém o pacto seja prorrogada; essa exigência persiste mesmo em caso de reconhecida validade da cláusula, quando o conhecimento de carga que a contém se inclua no âmbito das relações comerciais correntes entre as partes, e esteja assim provado que as referidas relações são reguladas pelas condições gerais (previamente estabelecidas por um dos contratantes, a saber, pelo transportador) que contêm essa cláusula (v. acórdão de 19 de Junho de 1984, Tilly Russ/Nova, 71/83, Recueil, p. 2417, que cita os acórdãos anteriores que evidenciam a exigência de manifestação clara e precisa do acordo entre as partes).

Porém, face à introdução, no novo texto da norma, de um elemento que são os usos, o qual tem carácter `normativo' (portanto, desligado da vontade das partes, pelo menos por referência específica a um contrato concreto), pergunta-se se é suficiente o requisito do conhecimento (efectivo), ou do desconhecimento decorrente de ignorância culposa e indesculpável, para que se considere repetidamente prorrogada a cláusula (em todas as relações similares à aqui em questão). Pergunta-se, portanto, se já não é necessário fazer referência à determinação da vontade das partes, apesar de o artigo 17._ usar a palavra `celebrado', que está associada à manifestação de vontade e, portanto, aos usos negociais (cláusulas relativas aos usos).»

58 Recorde-se, antes de mais, que o objecto da disposição litigiosa consiste em prever um critério de extensão voluntária de competência: os autores da convenção desejaram que a simples vontade das partes pudesse permitir derrogar o disposto nos artigos 2._, 4._ e 5._ A exigência do seu consentimento para esta atribuição derrogatória de competência é, portanto, inerente ao espírito do artigo 17._

59 É, aliás, o que resulta do relatório Jenard, que enuncia que «... [as cláusulas atributivas de jurisdição] apenas serão tomadas em consideração se forem objecto de uma convenção, o que pressupõe o consentimento de ambas as partes...» (35), termos estes que foram reproduzidos pelo Tribunal de Justiça, que afirmou: «Ao subordinar [a validade das cláusulas atributivas de jurisdição] à existência de uma `convenção' entre as partes, o artigo 17._ impõe ao juiz chamado a decidir a obrigação de verificar, em primeiro lugar, se o pacto que lhe atribui competência foi, efectivamente, objecto de acordo entre as partes...» (36).

60 Em conformidade com a ratio desta disposição, o Tribunal de Justiça, nos acórdãos proferidos no âmbito de processos aos quais a convenção, na sua versão anterior à alteração introduzida em 1978, era aplicável, considerava que «as condições a que o artigo 17._ subordina a validade das cláusulas atributivas de jurisdição são de interpretação estrita, no sentido de que o artigo 17._ tem por missão garantir que o acordo das partes quanto a essa cláusula - a qual, mediante uma extensão de competência, derroga o disposto nas regras gerais da determinação da competência constante dos artigos 2._, 5._ e 6._ da convenção - foi efectivamente comprovado e de que ele se deve manifestar de forma clara e precisa» (37). Para tal, ou seja, «A fim de apreciar se as condições previstas no artigo 17._ estão preenchidas», o Tribunal de Justiça, empenhava-se, de cada vez, em verificar, «em separado, se foi sob a forma de uma convenção escrita ou sob a forma de uma convenção verbal confirmada por escrito que o acordo das partes sobre a atribuição de competência tinha sido expresso» (38).

61 A exigência do acordo das partes relativamente ao pacto atributivo de jurisdição parece-me continuar a condicionar a validade deste no que toca ao artigo 17._, após a alteração introduzida em 1978. A referência aos usos não pode significar que, doravante, é possível opor às partes um pacto com que elas não concordaram.

62 É verdade, porém, como resulta do relatório Schlosser, que os autores da convenção de adesão de 1978 pretenderam atenuar o formalismo exagerado que a antiga versão do artigo 17._, ao exigir em todos os casos um escrito confirmativo do acordo, tendia a favorecer.

63 Ao proceder desta maneira, não se tratou senão de «tornar mais flexíveis os requisitos de natureza formal», de modo a adaptar o artigo 17._ às condições do comércio internacional, já que «... não se afigura aceitável, na prática comercial internacional, exigir que o co-contratante do utilizador das condições gerais de venda confirme por escrito a inclusão destas últimas no contrato para que uma cláusula atributiva de jurisdição constante dessas condições possa produzir efeito. O comércio internacional encontra-se, em grande parte, sujeito a condições-tipo de que constam cláusulas atributivas de jurisdição. Aliás, essas condições não são, de um modo geral, impostas unilateralmente por um dos operadores do mercado, mas negociadas pelos representantes dos diferentes operadores» (39).

64 É por esta razão que a referência aos usos da nova versão do artigo 17._ deve ser entendida, segundo os termos desta mesma disposição, «no comércio internacional», «mediante forma... que as partes conheçam ou devam conhecer». Assim, se já não se faz referência a um acordo escrito das partes, é porque se pressupõe que, na sua qualidade de profissionais no ramo comercial em causa, estas têm conhecimento dos usos que aí são acatados e aceitam-nos tacitamente (40). Para facilitar a rapidez das transacções, é pois um acordo tácito das partes relativamente a esses usos que é reconhecido na nova redacção do artigo 17._, ou, segundo os termos do advogado-geral G. Tesauro, a «presunção de consentimento efectivo» (41).

65 O Tribunal de Justiça veio a perfilhar esta análise no acórdão MSG, já referido, ao considerar que a «flexibilidade introduzida no artigo 17._ da convenção de adesão de 1978 não significa... que não deva necessariamente existir um acordo de vontades entre as partes, relativamente a uma cláusula de prorrogação de competência, continuando a ser um dos objectivos desta disposição que o consenso dos interessados exista realmente...» (42), para daqui deduzir que, «... à luz da alteração introduzida no artigo 17._ pela convenção de adesão de 1978, o acordo de vontades das partes contratantes sobre uma cláusula atributiva de jurisdição presume-se provado quando existem a esse respeito usos comerciais no ramo do comércio internacional em causa, usos que essas mesmas partes conhecem ou devem conhecer» (43).

66 Em resposta à primeira questão, deve, portanto, indicar-se ao juiz de reenvio que, não obstante a flexibilidade das condições de forma introduzida em 1978, a verdade é que a realidade do acordo das partes quanto ao pacto atributivo de jurisdição continua a ser exigida para efeitos da validade desta cláusula relativamente ao artigo 17._ da convenção. Presume-se que este acordo existe quando tal pacto constituir um uso, no ramo comercial considerado, que foi adoptado sob uma forma que as partes conhecem ou devem conhecer.

67 Antes de esclarecer as noções de «uso» e de «conhecimento pelas partes», como é sugerido por algumas outras questões do órgão jurisdicional de reenvio, é conveniente determinar quais são as «partes» cujo consentimento para a cláusula é assim presumido. É este, segundo julgo, o objecto do primeiro aspecto da segunda questão bem como da décima primeira questão.

68 A décima primeira questão «é relativa às condições perante as quais a inserção da cláusula em questão num impresso já preparado e não assinado pela parte que não o preparou pode ser considerada excessivamente gravosa, ou mesmo abusiva, para esta última».

69 «A segunda questão relativa ao significado da expressão `em conformidade', sob vários aspectos. O primeiro prende-se com a manifestação da cláusula, ou seja, se tem necessariamente que estar incluída num documento escrito assinado pela parte que a preparou, e que, portanto, manifestou a intenção de a invocar, mediante - por exemplo - a assinatura do conhecimento de carga referindo-se especificamente a uma cláusula que remete para outra atributiva da competência exclusiva, ainda que não haja assinatura análoga da contraparte (carregador).»

70 Voltarei a tratar do aspecto relativo à forma do pacto, que foi igualmente equacionado pelo juiz nessas questões, mas concentrar-me-ei, por enquanto, na análise da oponibilidade do pacto a partes que, como no presente caso, não são as que tinham celebrado inicialmente o conhecimento de carga em que ele se insere.

71 Por outras palavras, a noção de «partes», na acepção do artigo 17._, refere-se apenas às partes «originárias», isto é, às que estão na origem desta cláusula, ou também tem em vista as «partes» no litígio, eventualmente terceiros em relação ao acordo inicial (44), que são susceptíveis de ficar vinculados a um acordo em que não tomaram parte?

72 Sentir-me-ia tentado a afirmar, a priori, como princípio, que o pacto atributivo de jurisdição, como qualquer outra estipulação contratual, só vincula as partes que o celebraram e apenas elas. Este princípio, aliás, vale talvez mais no que diz respeito às cláusulas compromissórias e atributivas de jurisdição, na medida em que são exorbitantes do direito comum.

73 Há, todavia, hipóteses em que tal cláusula vai produzir efeitos em relação a pessoas que não a assinaram (45). Há uma série de acórdãos que ilustram esta consideração.

74 Penso, antes de mais, no acórdão do Tribunal de Justiça, Gerling e o. (46), o qual, se bem que tivesse sido proferido num contexto específico (47), reconheceu que o beneficiário de uma estipulação a favor de outrem, apesar de não ser parte no contrato inicial, pode invocá-la com base no artigo 17._ da convenção, na sua versão inicial (48).

75 Mais esclarecedor ainda é o acórdão do Tribunal de Justiça, Powell Duffryn, já referido (49), do qual resulta que o pacto atributivo de jurisdição constante dos estatutos de uma sociedade anónima é oponível a todos os accionistas: os que participaram no voto dos estatutos, quer se tenham pronunciado a favor da cláusula quer lhe tenham sido desfavoráveis, mas também todos os accionistas posteriores, independentemente do modo de aquisição das acções.

76 Finalmente, deve admitir-se que, se o contrato que contém a cláusula foi objecto de uma cessão, esta cláusula poderá ser invocada a favor de ou contra um sucessor que, por definição, não deu o seu acordo aquando da celebração do contrato.

77 Foi assim que o Tribunal de Justiça julgou, no acórdão Tilly Russ, já referido, que uma cláusula constante de um conhecimento de carga e reconhecida como válida nas relações entre o carregador e o transportador era oponível ao terceiro portador do conhecimento de carga, desde que, por força do direito nacional aplicável, o portador do conhecimento de carga sucedesse nos direitos e obrigações do carregador.

78 O Tribunal de Justiça considerou, com efeito, que o terceiro portador não se pode furtar à obrigação, em matéria de foro, resultante do conhecimento de carga, em virtude de não ter dado o seu acordo no que toca a este último, já que, nesta hipótese, «a aquisição do conhecimento de carga não pode conferir ao terceiro portador mais direitos dos que os que tinha o carregador. O terceiro portador torna-se assim titular, simultaneamente, de todos os direitos e de todas as obrigações constantes do conhecimento de carga, inclusive das que são relativas à extensão de competência» (50).

79 A circunstância de se estar, como no presente caso, em presença não de uma parte (tão-somente o terceiro portador) mas sim de duas partes estranhas ao contrato inicial - recorde-se que o processo principal opõe o terceiro portador do conhecimento de carga ao consignatário do navio e do transportador, a propósito de uma cláusula que foi estipulada entre um carregador argentino e um transportador dinamarquês -, não é de molde a alterar a solução de princípio assim obtida (51).

80 O raciocínio que terá de ser adoptado pelo juiz de reenvio, de acordo com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, deverá, portanto, ser decomposta em dois momentos.

81 A fim de garantir que o pacto atributivo de jurisdição vincule o terceiro portador do conhecimento de carga perante o consignatário do navio, o juiz nacional deve, antes de mais, certificar-se do acordo, no que toca a este pacto, das duas partes iniciais: o carregador e o transportador. Já se viu, na realidade, que, no âmbito da redacção do artigo 17._ resultante da alteração introduzida em 1978, a referência aos «usos no comércio internacional», conhecidos das partes, permite presumir o acordo destas relativamente ao pacto.

82 O órgão jurisdicional escolhido deve em seguida assegurar-se de que o terceiro no contrato inicial que invoca o pacto, ou contra o qual este é invocado, sucedeu, por força do direito aplicável, a uma das partes iniciais nos seus direitos e obrigações. Se assim for na realidade, o seu acordo quanto ao pacto não tem de ser verificado nem presumido, no que respeita ao disposto no artigo 17._

83 Cabe, no presente caso, ao juiz italiano assegurar-se, em especial, do respeito deste último requisito, antes de considerar aplicável o pacto controvertido nas relações entre a demandante e a demandada no processo principal.

84 Considero, portanto, que as partes cujo acordo quanto ao pacto atributivo de jurisdição é presumido, no âmbito do artigo 17._, na parte em que este se refere aos usos, são as partes que celebraram inicialmente o contrato no âmbito do qual esse pacto foi adoptado.

85 No que respeita à relação entre o consignatário do navio e do transportador e o terceiro portador do conhecimento de carga, dá-se cumprimento ao disposto no artigo 17._ da convenção, desde que a cláusula atributiva de competência tenha sido considerada válida entre o carregador e o transportador e que, em virtude do direito nacional aplicável, o terceiro portador, ao adquirir o conhecimento de carga, e o consignatário, enquanto tal, tiverem sucedido, respectivamente, ao carregador e ao transportador, no que toca aos seus direitos e obrigações.

III - Quanto ao conceito de «forma reconhecida pelos usos no comércio internacional» (segunda questão, segundo e terceiro aspectos, quarta, oitava, décima e nona questões)

86 À luz da alteração introduzida no artigo 17._ pela convenção de adesão de 1978, o acordo de vontades das partes contratantes, susceptível de vincular, como já se viu, terceiros ao contrato, presume-se estar comprovado quando existam neste domínio usos comerciais no ramo comercial em causa do comércio internacional em causa, usos esses que as partes conheçam ou devam conhecer. A Corte Suprema di Cassazione solicita que o Tribunal de Justiça delimite com maior exactidão o sentido e o alcance da remissão para os «usos» no comércio internacional assim efectuada, por meio de cinco questões que irei examinar sucessivamente.

87 Note-se, a título preliminar, que o acórdão do Tribunal de Justiça, MSG, já referido, que foi proferido após o despacho de reenvio, vem esclarecer vários aspectos das questões que foram submetidas.

88 Note-se igualmente que não me cabe a mim nem ao Tribunal de Justiça determinar se, no caso vertente, o facto de fazer constar do verso de um conhecimento de carga previamente impresso uma cláusula atributiva de jurisdição a favor da High Court of Justice constitui um uso, na acepção do artigo 17._ da convenção. O nosso papel não pode consistir senão em esclarecer o juiz de reenvio, a quem compete, em última instância, perante os elementos de interpretação que lhe são proporcionados, julgar se está ou não em presença de um uso, na acepção desta disposição.

Quanto às formas reconhecidas

89 O sentido do conceito de «forma reconhecida», antes de mais, é objecto dos segundo e terceiro parágrafos da segunda questão, que «é relativa ao significado da expressão `em conformidade', sob vários aspectos... O segundo aspecto consiste em determinar se é necessário que a cláusula relativa à competência tenha relevo autónomo no conjunto do texto do contrato, ou se é suficiente (e, portanto, indiferente para efeitos de validade da cláusula) que esteja inserida no contexto de outras numerosíssimas cláusulas, elaboradas para regular todo o conteúdo e efeitos do contrato de transporte.

O terceiro aspecto é relativo à língua em que a cláusula está redigida, isto é, se deve ter alguma relação com a nacionalidade das partes contratantes, ou se basta que se trate de uma língua normalmente usada no comércio internacional».

90 Quanto a este último aspecto, o Tribunal de Justiça já afirmou, no acórdão Elefanten Schuh (52), que a validade de um pacto atributivo de jurisdição não pode ser posta em causa pela única razão de a língua em que está formulado não ser a prescrita pela lei nacional de um Estado contratante.

91 Deve acrescentar-se que, em conformidade com a liberdade que é deixada pelo texto do artigo 17._ à expressão da vontade das partes, não se pode considerar que ele prescreva quer o uso de uma determinada língua em especial quer até o uso de uma língua que apresente qualquer elemento de conexão com as partes. Cabe, a este propósito, em meu entender, ao juiz reportar-se aos usos vigentes no ramo comercial considerado (53), para determinar se, no caso em apreço, a redacção de uma cláusula atributiva de jurisdição em inglês, tal como todo o conhecimento de carga em que ela se insere, constitui ou não uma forma que seja conforme com os usos na matéria.

92 Não me parece que eu possa fornecer mais elementos de resposta quanto ao segundo aspecto desta segunda questão. Com efeito, a questão do relevo autónomo da cláusula atributiva de jurisdição em relação às outras cláusulas depende, também ela, dos usos vigentes na matéria.

93 É certo que, como resulta do relatório Schlosser, se deve proteger o co-contratante «... contra o risco de se ver inadvertidamente vinculado a cláusulas-padrão de que consta uma atribuição de jurisdição, sem que de tal facto o co-contratante se tenha apercebido» (54).

94 Note-se, no entanto, por um lado, que a cláusula controvertida, no presente caso, está impressa com os mesmos caracteres tipográficos que as outras cláusulas, depois das quais vem inserida. Se não tem, portanto, um relevo autónomo especial, também não está dissimulada.

95 Note-se, além disso, que o artigo 17._, n._ 1, segunda frase, terceira hipótese, pretende reger as relações de profissionais experimentados, que conhecem ou «devem conhecer» o uso em causa, como se verá. Se, por conseguinte, o supremo tribunal italiano devesse considerar que a forma da cláusula controvertida corresponde à que é reconhecida pelo uso no domínio em causa, o conhecimento deste uso pelas partes bastaria para tornar a forma litigiosa conforme com as prescrições do artigo 17._

96 Estes diversos elementos constituem precisamente o objecto das questões que vou examinar a seguir.

97 Em resposta à segunda questão, relativa às «formas reconhecidas» na acepção do artigo 17._, limito-me a remeter o juiz para os usos vigentes no ramo do comércio internacional relevante, sem que ele possa, a priori, prescrever o acatamento de formas previstas pelas disposições do direito aplicável.

Quanto ao uso

98 Pela quarta questão, pergunta-se ao Tribunal de Justiça, no que diz respeito ao modo de formação do uso, «... se a repetição constante da cláusula nos conhecimentos de carga emitidos por associações profissionais ou por um número importante de empresas de transporte marítimo é suficiente ou se é necessário provar que os utilizadores (sejam ou não profissionais) desses transportes, não fazendo observações nem opondo reservas a essa repetição constante, manifestam uma adesão tácita ao comportamento das contrapartes, de modo que já não se pode considerar que existe um conflito entre as duas categorias».

99 O que se pede ao Tribunal de Justiça é, pois, que esclareça qual é o modo de formação do uso, na acepção do artigo 17._

100 Se as razões determinantes para a alteração introduzida em 1978 são conhecidas - o relatório Schlosser salientava que «... a interpretação do artigo 17._, que inúmeros tribunais nacionais têm tendência para subscrever, não corresponde nem aos usos nem às exigências do comércio internacional... É por isso que, na sua nova versão, o artigo 17._ torna mais flexíveis as exigências formais no que se refere às transacções comerciais internacionais...» (55) -, do texto do relatório não consta qualquer definição ou descrição da noção de uso, à qual se irá fazer referência daqui para a frente.

101 Foi só em 1989, com a alteração introduzida pela aprovação da convenção de San Sebastián, que o texto do artigo 17._ veio esclarecer que estes usos devem ser «... amplamente conhecidos e regularmente observados pelas partes em contratos do mesmo tipo, no ramo comercial considerado...» (56). O relatório relativo à convenção de Lugano (57), a qual está redigida, neste aspecto, nos mesmos termos, esclarece assim esta nova redacção: «... mesmo no comércio internacional não basta que um pacto atributivo de jurisdição seja celebrado em conformidade com os costumes (ou usos) em vigor neste tipo de comércio, que as partes conheçam ou devam conhecer. É necessário, além disso, que este uso seja, por um lado, largamente conhecido no comércio internacional e, por outro lado, regularmente observado pelas partes em contratos do mesmo tipo, do ramo comercial considerado...» (58).

102 Se a leitura dos relatórios não esclarece mais no que toca à compreensão do conceito de uso, ela permite, no entanto, notar, antes de mais, que a tomada em consideração dos usos, que foi introduzida em 1978, não pode dizer respeito senão aos contratos celebrados entre profissionais do comércio internacional. A referência sistemática à «prática comercial internacional» e às outras «transacções comerciais», em especial no relatório Schlosser, não pode ser entendida de outro modo. Assim sendo, a alusão constante do enunciado da quarta questão aos «utilizadores (sejam ou não profissionais)» não pode ser considerada relevante: só os «operadores do comércio internacional» são beneficiários desta flexibilização nas formas das cláusulas atributivas de jurisdição (59).

103 Deve salientar-se igualmente que a compreensão do conceito de uso não pode ficar dependente da apreciação de cada direito nacional. Recorde-se, com efeito, «... o princípio, consagrado pela jurisprudência..., segundo o qual, com vista a assegurar a aplicação uniforme da convenção em todos os Estados contratantes, os conceitos utilizados por esta, que podem ter um conteúdo diferente consoante o direito interno dos Estados contratantes, devem ser interpretados de forma autónoma, por referência principalmente ao sistema e aos objectivos da convenção» (60). Deve ser assim, nomeadamente, no que respeita à noção de «uso», na acepção do artigo 17._ ora em causa.

104 Na realidade, porém, a questão da determinação da noção de «uso» já não é nova para o Tribunal de Justiça. No acórdão MSG, já referido, estava em causa uma cláusula atributiva de jurisdição inserida numa carta de confirmação comercial bem como numa série de facturas pagas sem qualquer contestação. Solicitado a pronunciar-se sobre a validade desta cláusula em relação ao artigo 17._ da convenção, o Tribunal de Justiça fez notar, antes de mais, que: «Embora seja da competência de um órgão jurisdicional nacional... verificar a existência de um uso..., compete, todavia, ao Tribunal de Justiça fornecer-lhe os elementos objectivos e necessários para tal apreciação» (61).

105 O Tribunal de Justiça prosseguiu indicando que «... Existirá um uso no ramo comercial considerado, quando, designadamente, um certo comportamento é geral e regularmente seguido pelos operadores nesse ramo no momento da celebração de contratos de um certo tipo» (62).

106 Ao proceder assim, o Tribunal de Justiça inspirou-se grandemente - pode mesmo dizer-se de modo antecipado, já que ela não era aplicável na altura dos factos da causa - nos termos da convenção de San Sebastián, esclarecendo, em 1989, que o uso a que se faz referência deve ser «amplamente conhecido e regularmente observado nesse tipo de comércio [internacional] pelas partes em contratos do mesmo tipo, no ramo comercial considerado».

107 Trata-se da resposta à quarta questão que nos ocupa, para a qual se deve portanto considerar que um uso se forma quando um certo comportamento for geral e regularmente seguido pelos operadores num ramo comercial considerado aquando da celebração de contratos de um certo tipo.

108 Com a oitava questão, solicita-se que o Tribunal de Justiça esclareça, além disso:

«... se o facto de numerosos carregadores e/ou portadores de conhecimentos de carga terem contestado a validade da cláusula, em acções propostas em tribunais diferentes do indicado na própria cláusula, é um indício de que não está consolidado um uso conforme com a inclusão da cláusula em impressos ou formulários».

109 Ao interrogar-se assim sobre as consequências a deduzir de acções intentadas para pôr em causa uma prática (a inserção de cláusulas atributivas de jurisdição nos conhecimentos de carga), o juiz italiano reconhece necessariamente que esta prática é regularmente seguida, já que é necessário ir a tribunal para contestar a respectiva aplicação. Admite, por conseguinte, que essa prática é bem constitutiva de um uso.

110 Ainda que este uso seja depois objecto de contestações quer quanto à sua aplicação quer quanto à sua própria existência, numa maior ou menor extensão, a nível local, nacional ou internacional (elementos estes que o despacho de reenvio não permite determinar), tal não lhe faz perder a sua natureza de uso, se ele continuar a ser regularmente seguido num determinado ramo comercial.

111 Pode efectivamente notar-se que o próprio princípio das cláusulas atributivas de jurisdição nos conhecimentos de carga é objecto de vivas controvérsias nos meios do comércio marítimo, de modo que as já referidas regras de Hamburgo vão até ao ponto de as suprimir (63). No entanto, enquanto estas controvérsias não estiverem clarificadas, ou seja, de certo modo, enquanto - apesar das críticas que lhes são movidas - as cláusulas atributivas de jurisdição controvertidas continuarem a constituir a prática geral e regularmente seguida pelos operadores no ramo comercial considerado aquando da celebração de contratos do mesmo tipo, elas mantêm a sua qualidade de uso.

112 Sugiro portanto que o Tribunal de Justiça responda à oitava questão no sentido de que a mera contestação de uma prática constitutiva de um uso na acepção do artigo 17._ da convenção não é susceptível de lhe fazer perder a sua qualidade de uso.

113 Relativamente ainda à compreensão do conceito de uso na acepção do artigo 17._, a décima questão tem em vista determinar «se o referido uso pode derrogar disposições legais imperativas de um Estado, como é o caso, em Itália, do artigo 1341._ do Código Civil, o qual, em matéria de condições gerais do contrato previamente estabelecidas por um dos contratantes, impõe, por razões de eficácia, o necessário conhecimento ou a possibilidade de conhecimento por parte do outro contratante e prevê que sejam especificamente assinadas as cláusulas que estabelecem determinadas limitações ou derrogações à competência da autoridade judicial».

114 Parece-me que esta questão compreende dois aspectos.

115 O primeiro tem em vista determinar se se pode admitir, no âmbito da aplicação do artigo 17._ da convenção, a invocação de um uso que derrogue disposições legislativas, aplicáveis em princípio, relativas à forma das cláusulas atributivas de jurisdição. Em meu entender, a resposta não pode deixar de ser afirmativa, já que se trata da própria razão de ser do artigo 17._ da convenção: dar à vontade das partes um valor superior a quaisquer outras regras aplicáveis em princípio, que são, em especial, as disposições legislativas do direito comum.

116 O artigo 1341._ do Código Civil italiano não pode, portanto, ser invocado para subordinar a validade da cláusula litigiosa a condições imperativas do direito nacional que acresçam às que estão previstas no artigo 17._: «Os Estados contratantes não... têm a liberdade de prescrever outras exigências de forma para além das previstas na convenção» (64).

117 O segundo aspecto tratado nesta questão liga-se ao que será examinado a seguir - quando forem analisadas a décima segunda, a quinta, a décima terceira e a décima quarta questões - e que é relativo ao conhecimento pelas partes do uso controvertido.

Quanto ao comércio internacional

118 O acórdão MSG, já referido, contém igualmente a resposta à nona questão do órgão jurisdicional supremo italiano, relativa à delimitação do território geográfico do uso a que o artigo 17._ faz referência. Com esta questão, com efeito, solicita-se ao Tribunal de Justiça que esclareça:

«... se o uso deve formar-se em todos os países da Comunidade Europeia ou se a expressão `comércio internacional' significa que basta que aquele se forme nos países que, no âmbito do comércio internacional, têm, por tradição, uma posição predominante».

119 A referência às formas reconhecidas pelos usos «no comércio internacional» não abrange, na realidade, nenhuma das duas partes da alternativa sugerida pelo juiz de reenvio.

120 Com efeito, desde que «... a existência de um uso não tem de ser determinada por referência à lei de um dos Estados contratantes...» (65), a referência ao «comércio internacional» não pode ser entendida no sentido de que remete para determinados países, tais como os que têm uma posição dominante no comércio internacional, ou no sentido de que exige uma prática convergente em todos os Estados partes na convenção.

121 O Tribunal de Justiça considera que a existência de um uso «... deve ser verificada não em relação ao comércio internacional em geral, mas no ramo comercial em que as partes contratantes exercem a sua actividade» (66).

122 Parece-me que esta consideração é suficiente para afastar qualquer conexão nacional.

123 Assim sendo, o problema não me parece ser o de saber se o órgão jurisdicional nacional deve tomar em consideração um uso reconhecido em certos Estados, em vez do Estado do foro, por exemplo, ou em certos Estados, em vez daqueles que têm uma conexão objectiva com o litígio (67).

124 Na medida em que a aplicação do artigo 17._ pressupõe necessariamente um contexto fáctico internacional (68), seria, antes de mais, manifestamente inadequado fazer referência àquilo que constitui um uso num ou noutro Estado parte, já que, precisamente, se têm em vista situações transnacionais. Se se procurasse, no entanto, uma «lei de conexão» para determinar se se está, em relação a ela, na presença ou não de um uso, aceitar-se-ia um modo de proceder que foi rejeitado pelo Tribunal de Justiça a propósito do juiz escolhido, para o qual, como já recordei, o Tribunal de Justiça não exige qualquer conexão com as partes ou com o contrato (69).

125 É por esta razão que considero que a referência feita pelo Tribunal de Justiça diz respeito decididamente a um sector de actividade, o do «ramo comercial em que as partes contratantes exercem a sua actividade», e não a uma prática nacional. Em circunstâncias tais como as do presente caso, por exemplo, isso equivale a uma referência aos usos seguidos em matéria de transportes marítimos, ou mais exactamente, se for caso disso, em matéria de transportes marítimos de partidas de fruta.

126 Por outras palavras, o juiz de reenvio não terá, em princípio, que indagar, como a sua questão faz crer, se constitui uso, no Reino Unido, por exemplo, ou em certos Estados partes na convenção, mandar inserir cláusulas atributivas de jurisdição no verso de conhecimentos de carga previamente impressos. Em compensação, deverá esforçar-se por verificar que tais cláusulas são de uso no ramo comercial do transporte marítimo internacional de partidas de fruta.

127 É pouco provável que, ao proceder a esta indagação, o juiz se venha a confrontar com usos diferentes no mesmo ramo comercial considerado. Se, porém, tal viesse a acontecer, o critério do «uso no ramo comercial considerado» deveria ser conjugado com o do conhecimento deste uso pelas partes, a fim de privilegiar evidentemente o do uso que não fosse desconhecido dos co-contratantes. Voltarei a este aspecto quando examinar as questões relativas ao conhecimento, pelas partes, do uso considerado.

128 Por conseguinte, deve dizer-se, em resposta à nona questão, que a referência aos usos, feita pelo artigo 17._ da convenção, não tem, de modo algum, qualquer carácter geográfico ou territorial, mas reporta-se, pelo contrário, a um sector, a uma matéria do comércio considerado: o «ramo comercial em que as partes exercem a sua actividade». Cabe, a este propósito, ao juiz de reenvio certificar-se de que a forma da cláusula atributiva de jurisdição controvertida corresponde a um uso que rege o ramo do comércio internacional em que operam as partes contratantes.

129 Cabe ao órgão jurisdicional nacional, com base nas respostas dadas a fim de delimitar o conceito de uso na acepção do artigo 17._, determinar se, nas circunstâncias do presente caso, a inserção de uma cláusula atributiva de jurisdição, tal como aquela de que tem de conhecer, no verso de um conhecimento de carga, corresponde ou não a uma «forma reconhecida pelos usos no comércio internacional».

130 Se o órgão jurisdicional nacional considerar que não se está em presença de um uso desse tipo, as outras questões que foram colocadas já não apresentam qualquer interesse, visto que o artigo 17._ da convenção, no que respeita aos usos, não será aplicável. Compete ao juiz interrogar-se, então, se for caso disso, sobre o respeito, no caso vertente, dos outros requisitos de forma das cláusulas atributivas de jurisdição reconhecidos pela referida disposição da convenção. Parece, no entanto, que a Corte Suprema di Cassazione já excluiu a existência de um pacto celebrado por escrito ou verbalmente com confirmação escrita (70).

131 Se o órgão jurisdicional nacional considerar, pelo contrário, que se está em presença de tal uso, é mister tratar das outras questões, relativas ao conhecimento que as partes têm dele.

IV - Quanto ao conhecimento pelas partes do uso controvertido (décima terceira, décima quarta, décima segunda, quinta e sexta questões)

132 Cinco das questões que foram submetidas ao Tribunal de Justiça dizem respeito ao último requisito de validade de uma cláusula atributiva de jurisdição na acepção do artigo 17._ da convenção: a expressão do conhecimento pelas partes do uso considerado.

133 Vou procurar, antes de tudo, identificar a parte a quem o conhecimento deste uso é exigido (décima terceira questão), antes de delimitar com maior exactidão o grau de conhecimento que dela é assim exigido (décima quarta, décima segunda e quinta questões), para examinar, por fim, se o facto de a cláusula litigiosa se traduzir numa cláusula de exoneração não é um índice susceptível de comprovar o desconhecimento do uso considerado (sexta questão).

134 A décima terceira questão «é relativa à identificação da pessoa que deve possuir o conhecimento ou a possibilidade do conhecimento do uso: se deve ser o carregador inicial, ainda que não pertença a um Estado contratante (que, no caso em apreço, é a Argentina) ou se basta que se trate do portador do conhecimento de carga, pertencente a um Estado contratante (no caso, a Itália)».

135 A questão da identificação da parte a quem o conhecimento do uso é exigido prende-se, na realidade, com o problema, já estudado, da identificação da parte cujo acordo com a cláusula condiciona a validade desta última.

136 Já sugeri ao Tribunal de Justiça, no seguimento da jurisprudência Tilly Russ, já referida (71), que considerasse que a cláusula litigiosa é oponível às partes que sucederam, segundo o direito nacional aplicável, nos direitos e nas obrigações das partes originárias, desde que o acordo destas últimas quanto à cláusula se possa presumir.

137 Da mesma maneira, as partes a quem o conhecimento do uso é exigido parece-me que devem ser necessariamente aquelas que celebraram originariamente a cláusula litigiosa. Essa exigência não pode, em meu entender, pesar sobre cada um dos titulares que poderiam suceder-se, eventualmente em grande número, já que o conhecimento de carga é susceptível de passar de mão em mão.

138 Com efeito, tal como é salientado por alguns autores, «é difícil admitir que as regras relativas à forma do primeiro parágrafo do artigo 17._ sejam de tal modo essenciais que devam ser respeitadas não só aquando da celebração do acordo de eleição de foro mas também na altura de qualquer cessão, por uma das partes a um terceiro, do benefício do contrato que contenha uma cláusula atributiva de jurisdição» (72).

139 Uma vez mais, sempre que um terceiro suceda nos direitos e nas obrigações de uma das partes originárias no acordo que contém a cláusula de eleição de foro, por força do direito aplicável, os efeitos desta cláusula são transferidos para este sucessor, sem que seja necessário certificar-se sistematicamente do respeito de cada um dos elementos que condicionam a validade da cláusula relativamente à convenção.

140 É ainda necessário que o juiz verifique assim a transferência efectiva dos direitos e das obrigações da parte originária para a parte que os invoca, segundo as disposições nacionais relevantes.

141 Assim sendo, basta fazer notar que as partes a quem o conhecimento do uso é exigido são as mesmas que aquelas cujo acordo com a cláusula condiciona a respectiva validade. Isto resulta, aliás, expressamente do acórdão do Tribunal de Justiça, MSG, já referido, que esclarece que «... o acordo de vontades das partes contratantes sobre uma cláusula atributiva de jurisdição presume-se provado quando existem a esse respeito usos comerciais no ramo do comércio internacional em causa, usos que essas mesmas partes conhecem ou devem conhecer» (73).

142 Quanto à circunstância de uma das partes originárias no acordo não ser nacional de um Estado parte na convenção, não tem qualquer relevância para a questão que nos ocupa. A convenção não faz qualquer referência à nacionalidade das pessoas às quais se aplica. Sabe-se, pelo contrário, a importância atribuída ao critério do domicílio para a determinação da sua aplicação e das competências que estabelece. Ora, é precisamente este critério do domicílio no território de um Estado contratante que é determinante, como já recordei, para a aplicação do artigo 17._ ora em discussão (74). Já que o transportador, dinamarquês, estava domiciliado no território de um Estado parte, a nacionalidade, argentina, da outra parte não impede que se comprove, para efeitos da aplicação do artigo 17._, o conhecimento que ela tem do uso controvertido, tal como acontece em relação ao transportador dinamarquês.

143 Poderia criticar-se esta análise pela sua falta de realismo. Não descarto, no entanto, a dificuldade de o juiz escolhido vir a deparar eventualmente com um contratante, como no presente caso, que seja nacional de um Estado terceiro e, em seguida, ter de verificar o conhecimento que ele tem do uso controvertido. Tal modo de proceder pode ser susceptível de atrasar grandemente o processo. Parece-me, no entanto, que a própria redacção do artigo 17._ sugere que este tipo de dificuldade pode ser facilmente evitado desde que não se exija que o uso seja sempre conhecido das partes contratantes, bastando tão-somente que ele «deva ser» conhecido.

144 A décima quarta questão do órgão jurisdicional italiano pretende precisamente que seja esclarecida esta parte da redacção do artigo 17._ Com efeito, com ela «pretende-se saber se a expressão `devam conhecer' se refere a um critério de boa fé e de correcção objectiva na formação de cada contrato, ou a um critério de diligência média subjectiva, a saber, aquele que se tem o direito de esperar tendo em atenção a natureza da actividade exercida, tendo em conta a exigência de que cada parte conheça perfeitamente a prática corrente do comércio internacional no sentido que terá sido definido na acepção da questão 9».

145 O recente acórdão do Tribunal de Justiça, MSG, já referido, dá uma resposta a esta questão. Com efeito, o Tribunal de Justiça considerou aí que «... o conhecimento efectivo ou presumido [do] uso pelas partes contratantes» pode ser provado por dois métodos alternativos: quer pela demonstração de que as partes «tinham anteriormente estabelecido relações comerciais entre si ou com outras partes que operam no sector em questão»; quer «quando, neste sector, um certo comportamento é suficientemente conhecido, pelo facto de ser geral e regularmente seguido no momento de celebração de um certo tipo de contratos, para poder ser considerado como uma prática consolidada» (75).

146 Em especial, esta última parte da alternativa, tornando claro que o conhecimento do uso controvertido é presumido para os operadores económicos activos num sector considerado em que este uso é geral e regularmente seguido, deveria permitir que o juiz de reenvio determinasse se o uso controvertido é suposto ser conhecido pelas partes originárias. Esse conhecimento pode incontestavelmente ser cotejado com a noção de «diligência média subjectiva», tal como foi sugerida pelo juiz de reenvio, que se pode esperar de um operador que esteja familiarizado com este ramo específico do comércio internacional. Note-se, aliás, que é precisamente ao conceito de «diligência normal» que o Tribunal de Justiça se referia nos seus acórdãos anteriores, nos casos de cláusulas que a parte interessada teria podido ou devido conhecer se procedesse com uma diligência normal, ou de usos que ela teria podido ou devido conhecer (76).

147 Por conseguinte, as questões relativas à verificação do conhecimento do uso pelas partes perdem algum interesse, já que o artigo 17._ estabelece uma verdadeira presunção de conhecimento, a qual não tem, portanto, por hipótese, de ser verificada.

148 Trata-se, antes de mais, da décima segunda questão, a qual «prende-se com a verificação do conhecimento ou da possibilidade de conhecimento do uso, independentemente da condição exposta na questão 5, supra, quanto ao conhecimento de carga em concreto, articulado em numerosas cláusulas constantes do verso (supra, questão 2)».

149 Além da segunda questão, para a qual também se remete (77), a quinta questão «prende-se com as formas de publicidade da prática corrente; isto é, se o formulário do conhecimento de carga que contém a cláusula de extensão deve ser depositado em algum serviço (associação profissional, Câmaras de Comércio, serviços portuários, etc.) para ser consultado ou se se deve dar dele conhecimento de outro modo».

7C0159.1

150 Na falta de indicações específicas, suponho que o órgão jurisdicional italiano pretende referir-se implicitamente ao acórdão Powell Duffryn, já referido, em que o Tribunal de Justiça considerou que, «quando os estatutos [de uma] sociedade contenham uma cláusula atributiva de jurisdição, qualquer accionista é suposto ter conhecimento desta cláusula e consentir efectivamente na atribuição da jurisdição que ela prevê, desde que os estatutos da sociedade estejam depositados num local a que o accionista possa ter acesso, tal como a sede da sociedade, ou constem de um registo público» (78).

151 A referência ao depósito dos estatutos da sociedade num lugar acessível aos accionistas, ou a sua menção num registo público, explica-se facilmente nas circunstâncias do presente caso, em que aos accionistas, independentemente do modo de aquisição das acções, poderia ser oposta a cláusula litigiosa.

152 O artigo 17._, na parte em que se refere aos usos, não pode, porém, ser lido no sentido de que exige sistematicamente, para que um uso invocado seja tomado em consideração, a publicidade, sob uma forma escrita, desta prática regularmente seguida no sector considerado, junto de associações ou de organismos especializados.

153 É verdade que, habitualmente, a forma dos conhecimentos de carga utilizados pelos armadores acata as recomendações emitidas por organismos internacionais, como a Bimco (Baltic and International Maritime Conference), a ICS (International Chamber of Shipping) ou por associações nacionais, como o Simprofrance (Comité français pour la simplification des procédures du commerce international) (79).

154 Esta eventual publicidade não pode, todavia, constituir mais do que um meio de fazer a prova da existência de um uso. Ora, a convenção não impõe qualquer limitação quanto aos meios de prova susceptíveis de serem utilizados para comprovar a existência de um uso. É, aliás, evidente que a menção do uso invocado em tais listas pode contribuir para facilitar a prova da sua existência.

155 A décima segunda questão refere-se igualmente a uma questão de prova, estranha ao artigo 17._, que apenas ao juiz nacional cabe decidir com base no direito aplicável.

156 Resta-me examinar a sexta questão, a qual «é relativa à validade da cláusula, mesmo no caso de (por força do regime jurídico substantivo aplicável no foro previamente escolhido) ela se traduzir numa cláusula de exoneração ou de limitação de responsabilidade do transportador».

157 Na falta de indicações específicas no despacho de reenvio, sou obrigado a pressupor que o juiz de reenvio tem em vista a hipótese de, para justificar a inoponibilidade da cláusula no que lhe diz respeito, uma parte invocar o seu desconhecimento do uso considerado, alegando que não poderia ter aderido a um uso que lhe fosse desfavorável.

158 Todavia, ainda que esta questão fosse entendida neste sentido, ela parece remeter para o direito aplicável no caso vertente por força da cláusula litigiosa, a qual estipula, com efeito, que: «The contract evidenced by this Bill of Lading shall be governed by English Law...» (80). Ora, se for efectivamente assim, este aspecto do litígio não pode ser resolvido com fundamento na convenção, a qual não tem qualquer vocação para resolver os conflitos de leis. Cabe ao órgão jurisdicional nacional determinar se, por força do direito aplicável, o facto de a aplicação do direito inglês designado na cláusula redundar numa cláusula de exoneração ou de limitação da responsabilidade do transportador é de molde a indicar que o carregador inicial não quis aderir a ela.

159 Em resposta a esta questão, concluo, por conseguinte, no sentido da inaplicabilidade da convenção para resolver os problemas de conflitos de leis.

Conclusão

160 Com base nas considerações acima expostas, sugiro que o Tribunal de Justiça responda da seguinte maneira às questões que lhe foram submetidas pela Corte Suprema di Cassazione:

«1) O artigo 17._, primeiro parágrafo, segunda frase, terceira hipótese, da Convenção de Bruxelas de 27 de Setembro de 1968 relativa à competência judiciária e à execução de decisões em matéria civil e comercial, na redacção que lhe foi dada pela Convenção de 9 de Outubro de 1978 relativa à adesão do Reino da Dinamarca, da Irlanda e do Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, deve ser interpretado no sentido de que satisfaz os respectivos requisitos a cláusula atributiva de jurisdição impressa no verso de um conhecimento de carga de que apenas a frente está assinada pelas partes contratantes, pela qual se escolhe um foro, sem qualquer elemento de conexão específico ou qualquer elemento objectivo de conexão com essas partes ou com o conhecimento de carga em que está inserida. O órgão jurisdicional escolhido, quer seja ou não o órgão jurisdicional designado, é competente para se pronunciar sobre a validade, em relação aos requisitos fixados no artigo 17._, já referido, de tal cláusula atributiva de jurisdição.

2) O referido artigo 17._ deve ser interpretado no sentido de que a oponibilidade de uma cláusula atributiva de jurisdição em relação às partes, que, nos termos do direito nacional aplicável, ao adquirirem o conhecimento de carga, sucederam às partes iniciais nos seus direitos e obrigações, está subordinada à validade da referida cláusula nas relações entre as partes iniciais, a qual pressupõe o seu acordo. Presume-se que este acordo existe quando a menção de tal cláusula constituir uma forma reconhecida pelos usos no ramo considerado do comércio internacional, usos esses que as mesmas partes conhecem ou devem conhecer.

3) Cabe ao juiz nacional verificar a existência de tal uso bem como o conhecimento deste pelas partes contratantes. A menção de uma cláusula atributiva de jurisdição, inserida, sem relevo especial, entre as outras cláusulas que dele constam, no verso de um conhecimento de carga impresso previamente em língua inglesa, de que só a frente está assinada, constitui uma forma reconhecida pelos usos no ramo do transporte marítimo internacional de partidas de fruta, se tal menção constituir um comportamento geralmente seguido pelas partes contratantes que operam no ramo considerado do comércio internacional aquando da celebração de contratos do mesmo tipo. A mera contestação de tal prática, se ela for constitutiva de um uso na acepção do artigo 17._, já referido, não é susceptível de lhe fazer perder a sua qualidade de uso. O uso a que se faz assim referência não pode ser afastado pela aplicação de disposições nacionais contrárias.

4) Há conhecimento efectivo ou presumido deste uso pelas partes contratantes, profissionais do ramo do comércio internacional considerado, sempre que, neste ramo, um determinado comportamento for suficientemente conhecido, pelo facto de ser geral e regularmente seguido no momento da celebração de um certo tipo de contratos, para poder ser considerado como uma prática consolidada. Os meios de prova deste conhecimento ou desta presunção de conhecimento susceptíveis de serem acolhidos pelo órgão jurisdicional nacional são os que forem admitidos pelo direito nacional aplicável.»

Anexo: as questões prejudiciais submetidas pela Corte Suprema di Cassazione

«1) A primeira questão a submeter ao Tribunal de Justiça é a seguinte:

Na jurisprudência do Tribunal de Justiça, relativamente ao texto original do artigo 17._, exigiu-se, ao determinar os requisitos estabelecidos por essa norma para a validade do pacto atributivo de jurisdição, que fosse apurada e tutelada a efectiva vontade das partes de que a cláusula que contém o pacto seja prorrogada; essa exigência persiste mesmo em caso de reconhecida validade da cláusula, quando o conhecimento de carga que a contém se inclua no âmbito das relações comerciais correntes entre as partes, e esteja assim provado que as referidas relações são reguladas pelas condições gerais (previamente estabelecidas por um dos contratantes, a saber, pelo transportador) que contêm essa cláusula (v. acórdão de 19 de Junho de 1984, Tilly Russ/Nova, 71/83, Recueil, p. 2417, que cita os acórdãos anteriores que evidenciam a exigência de manifestação clara e precisa do acordo entre as partes).

Porém, face à introdução, no novo texto da norma, de um elemento que são os usos, o qual tem carácter `normativo' (portanto, desligado da vontade das partes, pelo menos por referência específica a um contrato concreto), pergunta-se se é suficiente o requisito do conhecimento (efectivo), ou do desconhecimento decorrente de ignorância culposa e indesculpável, para que se considere repetidamente prorrogada a cláusula (em todas as relações similares à aqui em questão). Pergunta-se, portanto, se já não é necessário fazer referência à determinação da vontade das partes, apesar de o artigo 17._ usar a palavra `celebrado', que está associada à manifestação de vontade e, portanto, aos usos negociais (cláusulas relativas aos usos).

2) A segunda questão é relativa ao significado da expressão `em conformidade', sob vários aspectos. O primeiro prende-se com a manifestação da cláusula, ou seja, se tem necessariamente que estar incluída num documento escrito assinado pela parte que a preparou, e que, portanto, manifestou a intenção de a invocar, mediante - por exemplo - a assinatura do conhecimento de carga referindo-se especificamente a uma cláusula que remete para outra atributiva da competência exclusiva, ainda que não haja assinatura análoga da contraparte (carregador).

O segundo aspecto consiste em determinar se é necessário que a cláusula relativa à competência tenha relevo autónomo no conjunto do texto do contrato, ou se é suficiente (e, portanto, indiferente para efeitos de validade da cláusula) que esteja inserida no contexto de outras numerosíssimas cláusulas, elaboradas para regular todo o conteúdo e efeitos do contrato de transporte.

O terceiro aspecto é relativo à língua em que a cláusula está redigida, isto é, se deve ter alguma relação com a nacionalidade das partes contratantes, ou se basta que se trate de uma língua normalmente usada no comércio internacional.

3) A terceira questão prende-se com a questão de saber se o tribunal designado deve ter alguma relação com a nacionalidade e/ou o domicílio dos contratantes ou com os lugares de execução e/ou de elaboração do contrato, respeitando a necessidade de que seja um tribunal de um Estado contratante, ou se esta última condição é suficiente, sem qualquer outra ligação com a relação substancial.

4) A quarta questão é relativa ao modo de formação do uso; isto é, se a repetição constante da cláusula nos conhecimentos de carga emitidos por associações profissionais ou por um número importante de empresas de transporte marítimo é suficiente ou se é necessário provar que os utilizadores (sejam ou não profissionais) desses transportes, não fazendo observações nem opondo reservas a essa repetição constante, manifestam uma adesão tácita ao comportamento das contrapartes, de modo que já não se pode considerar que existe um conflito entre as duas categorias.

5) A quinta questão prende-se com as formas de publicidade da prática corrente; isto é, se o formulário do conhecimento de carga que contém a cláusula de extensão deve ser depositado em algum serviço (associação profissional, Câmaras de Comércio, serviços portuários, etc.) para ser consultado ou se se deve dar dele conhecimento de outro modo.

6) A sexta questão é relativa à validade da cláusula, mesmo no caso de (por força do regime jurídico substantivo aplicável no foro previamente escolhido) ela se traduzir numa cláusula de exoneração ou de limitação de responsabilidade do transportador.

7) A sétima questão é respeitante à possibilidade de o tribunal (diferente do designado) escolhido, para efeitos da apreciação da validade da cláusula, averiguar a razoabilidade desta, ou seja, o objectivo visado pelo transportador na escolha do tribunal designado, diferente do que seria competente segundo os critérios normais estabelecidos pela convenção de Bruxelas ou pela lei do foro.

8) A oitava questão consiste em determinar se o facto de numerosos carregadores e/ou portadores de conhecimentos de carga terem contestado a validade da cláusula, em acções propostas em tribunais diferentes do indicado na própria cláusula, é um indício de que não está consolidado um uso conforme com a inclusão da cláusula em impressos ou formulários.

9) A nona questão consiste em determinar se o uso deve formar-se em todos os países da Comunidade Europeia ou se a expressão `comércio internacional' significa que basta que aquele se forme nos países que, no âmbito do comércio internacional, têm, por tradição, uma posição predominante.

10) A décima questão consiste em determinar se o referido uso pode derrogar disposições legais imperativas de um Estado, como é o caso, em Itália, do artigo 1341._ do Código Civil, o qual, em matéria de condições gerais do contrato previamente estabelecidas por um dos contratantes, impõe, por razões de eficácia, o necessário conhecimento ou a possibilidade de conhecimento por parte do outro contratante e prevê que sejam especificamente assinadas as cláusulas que estabelecem determinadas limitações ou derrogações à competência da autoridade judicial.

11) A décima primeira questão é relativa às condições perante as quais a inserção da cláusula em questão num impresso já preparado e não assinado pela parte que não o preparou pode ser considerada excessivamente gravosa, ou mesmo abusiva, para esta última.

12) A décima segunda questão prende-se com a verificação do conhecimento ou da possibilidade de conhecimento do uso, independentemente da condição exposta na questão 5, supra, quanto ao conhecimento de carga em concreto, articulado em numerosas cláusulas constantes do verso (supra, questão 2).

13) A décima terceira questão é relativa à identificação da pessoa que deve possuir o conhecimento ou a possibilidade do conhecimento do uso: se deve ser o carregador inicial, ainda que não pertença a um Estado contratante (que, no caso em apreço, é a Argentina) ou se basta que se trate do portador do conhecimento de carga, pertencente a um Estado contratante (no caso, a Itália).

14) Com a décima quarta questão pretende-se saber se a expressão `devam conhecer' se refere a um critério de boa fé e de correcção objectiva na formação de cada contrato, ou a um critério de diligência média subjectiva, quanto ao dever de informação completa da prática vigente no comércio internacional, na acepção da questão 9.»

(1) - Por razões de comodidade de leitura, o texto integral das questões está reproduzido em anexo.

(2) - Convenção de 27 de Setembro de 1968 relativa à competência judiciária e à execução de decisões em matéria civil e comercial (JO 1972, L 299, p. 32; EE 01 F1 p. 186), na redacção que lhe foi dada pela Convenção de 9 de Outubro de 1978 relativa à adesão do Reino da Dinamarca, da Irlanda e do Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, bem como ao Protocolo relativo à sua interpretação pelo Tribunal de Justiça (JO L 304, p. 1, e texto com alterações, p. 77; EE 01 F2 p. 131).

(3) - O conhecimento de carga (bill of lading) está definido no artigo 1._, n._ 7, da Convenção das Nações Unidas sobre o Transporte de Mercadorias por Mar, de 31 de Março de 1978, mais conhecida como «regras de Hamburgo» - na qual não parecem ser partes, no que ora interessa, nem a República Italiana nem a República Argentina -, adoptada no âmbito da Comissão das Nações Unidas para o Direito Comercial Internacional (Cnudci): «O termo `conhecimento' designa um documento que faz prova de um contrato de transporte e que comprova que o transportador tomou conta ou carregou as mercadorias a bordo, bem como o compromisso de este entregar a mercadoria mediante a apresentação desse documento. Este compromisso resulta de uma menção constante do documento que estipula que as mercadorias devem ser entregues à ordem de uma pessoa designada pelo nome ou à ordem ou ao portador.» A natureza do conhecimento de carga é, no entanto, discutida. Para nos convencermos de tal, é possível reportarmo-nos às conclusões do advogado-geral Sir Gordon Slynn apresentadas no processo Tilly Russ (acórdão de 19 de Junho de 1984, 71/83, Recueil, pp. 2417, 2438).

(4) - Acórdão de 20 de Fevereiro de 1997, MSG (C-106/95, Colect., p. I-911, n._ 14), que faz referência aos acórdãos de 14 de Dezembro de 1976, Estasis Salotti (24/76, Colect., p. 717, n._ 7) e Segoura (25/76, Colect., p. 731, n._ 6).

(5) - Gaudemet-Tallon, H.: Les conventions de Bruxelles et de Lugano, Paris, LGDJ, 1996, n._ 104.

(6) - Sublinhado nosso.

(7) - Convenção relativa à adesão do Reino de Espanha e da República Portuguesa à Convenção relativa à competência judiciária e à execução de decisões em matéria civil e comercial, bem como ao Protocolo relativo à sua interpretação pelo Tribunal de Justiça, com as adaptações que lhes foram introduzidas pela Convenção relativa à adesão do Reino da Dinamarca, da Irlanda e do Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte e as adaptações que lhes foram introduzidas pela convenção relativa à adesão da República Helénica (JO L 285, p. 1).

(8) - Sublinhado nosso.

(9) - Em matéria marítima, o consignatário do navio é um mandatário do transportador (armador), ligado ao seu mandante por um contrato de consignação, encarregado de receber e de entregar mercadorias por conta deste e, de um modo mais geral, de levar a cabo todas as operações que o capitão não efectua ele próprio. Distingue-se do consignatário da carga, que é, pelo contrário, um mandatário que tem por missão receber a mercadoria por conta do destinatário (Lamy Transport, tomo 2, quarta parte, Transports maritimes, n.os 631 e 637).

(10) - «O contrato constante deste conhecimento de carga rege-se pela lei inglesa e quaisquer litígios emergentes do mesmo serão dirimidos em Inglaterra pela High Court of Justice, em Londres, de acordo com a lei inglesa, com exclusão dos tribunais de qualquer outro país» (tradução livre).

(11) - «Continua no verso» (tradução livre).

(12) - «As precisões acima referidas foram dadas pelo carregador» (tradução livre).

(13) - N._ 1, segundo parágrafo, do despacho de reenvio.

(14) - Conto, até à data de hoje, nada menos do que catorze acórdãos relativos a esta disposição.

(15) - Relatório sobre a Convenção de 9 de Outubro de 1978 relativa à adesão do Reino da Dinamarca, da Irlanda e do Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte à Convenção relativa à competência judiciária e à execução de decisões em matéria civil e comercial, bem como ao Protocolo relativo à sua interpretação pelo Tribunal de Justiça (JO 1979, C 59, p. 71; JO 1990, C 189, p. 184), chamado «relatório Schlosser», n.os 174 a 179.

(16) - C-269/95, Colect., p. I-3767.

(17) - A convenção de adesão, assinada em 9 de Outubro de 1978, no Luxemburgo, entrou em vigor entre os seis Estados originários e o Reino da Dinamarca, em 1 de Outubro de 1986, e depois, entre esses sete Estados e o Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, em 1 de Janeiro de 1987.

(18) - Convenção relativa à adesão da República Helénica à Convenção relativa à competência judiciária e à execução de decisões em matéria civil e comercial, bem como ao Protocolo relativo à sua interpretação pelo Tribunal de Justiça, com as adaptações que lhes foram introduzidas pela Convenção relativa à adesão do Reino da Dinamarca, da Irlanda e do Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte (JO L 388, p. 1; JO 1989, L 285, p. 54). Esta segunda convenção de adesão entrou em vigor em 1 de Abril de 1989, nas relações entre as partes contratantes, salvo nas relações com o Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, para as quais entrou em vigor em 1 de Outubro de 1989.

(19) - N._ 2, primeiro parágrafo, do despacho de reenvio.

(20) - Relatório sobre a Convenção de 27 de Setembro de 1968 relativa à competência judiciária e à execução de decisões em matéria civil e comercial (JO 1979, C 59, p. 1; JO 1990, C 189, p. 122), chamado «relatório Jenard».

(21) - Ibidem, p. 38, e, respectivamente, p. 156.

(22) - N._ 174.

(23) - A indicação de que o transportador dinamarquês tem a sua sede na Dinamarca consta do n._ 2, primeiro parágrafo, do despacho de reenvio. Não há, pelo contrário, qualquer indicação quanto ao «domicílio» dos carregadores argentinos; suponho, no entanto, que ele se situa fora do território de um Estado parte na convenção.

(24) - Para além da Convenção das Nações Unidas sobre o Transporte de Mercadorias por Mar, já referida, recorde-se a Convenção internacional relativa à unificação de regras em matéria de conhecimentos, assinada em Bruxelas, em 25 de Agosto de 1924 (designada, por vezes impropriamente, pelo nome de «regras da Haia»), e os protocolos de alteração desta convenção, assinados igualmente em Bruxelas, um, em 23 de Fevereiro de 1968 (chamado «regras de Visby»), e o outro, em 21 de Dezembro de 1979.

(25) - Acórdão de 17 de Janeiro de 1980 (56/79, Recueil, p. 89).

(26) - Ibidem (n._ 4).

(27) - Acórdão Benincasa (já referido, n._ 28). Pode igualmente remeter-se para o acórdão MSG (já referido, n._ 34).

(28) - V., por exemplo, Alexandre, D.: «Convention de Bruxelles (Compétence»), em Répertoire de droit communautaire, Encyclopédie Dalloz, volume I, n._ 264; Droz, G. A. L.: Compétence judiciaire et effets des jugements dans le Marché Commun (Étude de la Convention de Bruxelles du 27 septembre 1968), Paris, Dalloz, 1972, n._ 206; Gaudemet-Tallon, H., já citado (n._ 130).

(29) - Droz, G. A. L., já citado (n._ 206).

(30) - V., já neste sentido, as conclusões do advogado-geral F. Capotorti apresentadas no processo Meeth (acórdão de 9 de Novembro de 1978, 23/78, Colect., pp. 689, 705).

(31) - V., por exemplo, Watté, N.; Nuyts, A.; Boularbah, H.: «Chronique - La convention de Bruxelles (deuxième partie)», Journal des Tribunaux de Droit Européen, Abril de 1998, n._ 21, que se pronunciam a favor da competência do juiz a quem o processo é submetido para conhecer da validade do pacto. São citadas nesta crónica (nota de pé de página n._ 15) as opiniões contrárias expressas sobre esta questão por Beraudo, J.-P., Blanchin, C. e Alexandre, A.

(32) - N.os 7 e 6, respectivamente.

(33) - Acórdão Benincasa (já referido, n._ 31), que faz referência ao acórdão de 10 de Março de 1992, Powell Duffryn (C-214/89, Colect., p. I-1745, n._ 37), no qual este princípio já tinha sido afirmado.

(34) - N._ 174.

(35) - Relatório Jenard, p. 155.

(36) - Acórdão Estasis Salotti (já referido, n._ 7).

(37) - Acórdão Tilly Russ (já referido, n._ 14), que remete para os acórdãos Estasis Salotti e Segoura, já referidos, e para o acórdão de 6 de Maio de 1980, Porta-Leasing (784/79, Recueil, p. 1517).

(38) - Ibidem (n._ 15).

(39) - Relatório Schlosser (n._ 179).

(40) - A falta de referência expressa a uma forma escrita permite admitir igualmente a validade de formas não escritas, consagradas, eventualmente, pelas práticas do comércio internacional, tais como um simples acordo verbal, ou até um gesto ritual, como um aperto de mão.

(41) - Conclusões do advogado-geral G. Tesauro apresentadas no processo MSG, já referido, (n._ 25).

(42) - Acórdão MSG (já referido, n._ 17).

(43) - Ibidem (n._ 19); sublinhado nosso.

(44) - Nas circunstâncias do caso vertente, uma das partes no processo principal é o mandatário de uma das partes originárias. O consignatário do navio e do transportador, demandado no processo principal, não pode, assim, ser considerado terceiro em relação ao conhecimento de carga inicial. A situação da demandante no processo principal, como portadora do conhecimento de carga, é diferente. Pode tratar-se, conforme o direito aplicável, de um terceiro relativamente à convenção inicial (v., a este propósito, o acórdão Tilly Russ, já referido).

(45) - V., a favor desta extensão dos efeitos de uma cláusula atributiva de jurisdição a certas categorias de terceiros, Gothot, P. e Holleaux, D., já citados (n._ 186).

(46) - Acórdão de 14 de Julho de 1983 (201/82, Recueil, p. 2503, n._ 20).

(47) - Este acórdão dizia respeito à possibilidade de um terceiro num contrato de seguro, que beneficiava de uma estipulação a favor de outrem por parte do tomador de seguro, invocar um pacto atributivo de jurisdição relativamente ao segurador, pacto esse inspirado pela preocupação de protecção do segurado, enquanto pessoa economicamente mais débil.

(48) - A favor de uma extensão generalizada da possibilidade de invocar a cláusula estipulada em seu proveito por qualquer beneficiário de uma estipulação a favor de outrem, v. Gaudemet-Tallon, H., já citado (n._ 141).

(49) - Em especial, n.os 27 a 29.

(50) - Acórdão Tilly Russ (já referido, n._ 25).

(51) - Note-se que, na realidade, sem que tal tenha sido especificado no despacho de reenvio, é provável que o consignatário, que é demandado no processo principal, seja considerado pelo juiz nacional como o mandatário do transportador. Nesse caso, não pode ser considerado terceiro em relação ao conhecimento de carga e a situação factual seria totalmente idêntica à que deu azo ao acórdão Tilly Russ, já referido: só uma das duas partes no processo principal deveria ser considerada como um terceiro em relação ao conhecimento de carga.

(52) - Acórdão de 24 de Junho de 1981 (150/80, Recueil, p. 1671, n._ 29).

(53) - Os conceitos de «usos» e de «ramo do comércio internacional» são objecto de questões que serão examinadas a seguir.

(54) - Relatório Schlosser (n._ 179).

(55) - N._ 179.

(56) - Esta redacção inspirou-se no artigo 9._, n._ 2, da Convenção de Viena de 11 de Abril de 1980, sobre os contratos de venda internacional de mercadorias. V. o relatório de Almeida Cruz, Desantes Real e Jenard relativo à Convenção de adesão do Reino de Espanha e da República Portuguesa à Convenção de Bruxelas relativa à competência judiciária e à execução de decisões em matéria civil e comercial de 1968 (JO 1990, C 189, p. 35, n._ 26).

(57) - Relatório de P. Jenard e G. Möller sobre a Convenção relativa à competência judiciária e à execução de decisões em matéria civil e comercial, celebrada em Lugano em 16 de Setembro de 1988 (JO 1990, C 189, p. 57, n.os 55 a 61).

(58) - Ibidem (n._ 58).

(59) - Igualmente neste sentido, v., por exemplo, Gothot, P., Holleaux, D., Béraudo, J.-P., citados por Alexandre, D., já citado (n._ 257).

(60) - Acórdão Benincasa (já referido, n._ 12), que remete, nomeadamente, para os acórdãos de 21 de Junho de 1978, Bertrand (150/77, Colect., p. 487, n.os 14 a 16 e 19), e de 19 de Janeiro de 1993, Shearson Lehman Hutton (C-89/91, Colect., p. I-139, n._ 13).

(61) - Acórdão MSG (já referido, n._ 21).

(62) - Ibidem (n._ 23).

(63) - O artigo 21._ desta convenção - que tem precedência sobre as regras da convenção de Bruxelas para as partes que sejam nacionais de Estados que aderiram a esta convenção das Nações Unidas - prevê, com efeito, um regime específico de competência judiciária e não admite, no seu n._ 5, os acordos de eleição de foro senão depois da ocorrência de um litígio nascido do contrato de transporte marítimo.

(64) - V., por exemplo, o acórdão Elefanten Schuh (já referido, n._ 26).

(65) - Acórdão MSG (já referido, n._ 23).

(66) - Ibidem (n._ 23).

(67) - V., no entanto, o comentário de Gaudemet-Tallon, H. ao acórdão MSG, já referido, Revue critique de droit international privé, 1997, pp. 572, 573, para quem a rejeição da determinação do uso por referência à lei de um Estado contratante «faz correr o risco de colocar o juiz nacional em situações difíceis».

(68) - V. o n._ 25, in fine, das presentes conclusões.

(69) - Ibidem (n._ 40).

(70) - N._ 15 das presentes conclusões. Recorde-se simplesmente, a este propósito, que o Tribunal de Justiça considera efectivamente que a mera impressão de uma cláusula atributiva de jurisdição no verso do formulário do conhecimento de carga não satisfaz o requisito de um pacto «celebrado por escrito», na acepção do artigo 17._ da convenção (acórdão Tilly Russ, já referido, n._ 16). Em contrapartida, essa cláusula pode ser válida se foi celebrada verbalmente com confirmação escrita (ibidem, n._ 17). Será ainda válida na hipótese de haver relações comerciais correntes entre as partes (ibidem, n._ 18).

(71) - V. n.os 68 a 85 das presentes conclusões.

(72) - Gothot, P., Holleaux, D., já citados (n._ 186).

(73) - N._ 19; sublinhado nosso.

(74) - V. o n._ 25 das presentes conclusões.

(75) - Acórdão MSG (já referido, n._ 24).

(76) - Acórdãos Estasis Salotti, Segoura e Tilly Russ, já referidos, e de 11 de Novembro de 1986, Iveco Fiat (313/85, Colect., p. 3337).

(77) - V., a este respeito, os n.os 89 a 97 das presentes conclusões.

(78) - Acórdão Powell Duffryn (já referido, n._ 28).

(79) - Lamy Transport, tomo 2 (já referido, n._ 447).

(80) - «O contrato constante deste conhecimento de carga rege-se pela lei inglesa...».