61996J0260

Acórdão do Tribunal de 15 de Setembro de 1998. - Ministero delle Finanze contra Spac SpA. - Pedido de decisão prejudicial: Corte d'appello di Venezia - Itália. - Repetição do indevido - Prazos processuais nacionais. - Processo C-260/96.

Colectânea da Jurisprudência 1998 página I-04997


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


1 Direito comunitário - Efeito directo - Imposições nacionais incompatíveis com o direito comunitário - Restituição - Modalidades - Aplicação do direito nacional - Prazos de caducidade - Admissibilidade - Condições - Respeito do princípio da efectividade do direito comunitário - Respeito do princípio da equivalência das condições da acção de repetição com as das reclamações semelhantes de natureza interna

2 Actos das instituições - Directivas - Efeito directo - Consequências - Possibilidade de opor ao particular regras nacionais relativas aos prazos de recurso antes da transposição correcta da directiva - Admissibilidade - Condições

Sumário


3 Na falta de regulamentação comunitária em matéria de restituição de taxas nacionais indevidamente cobradas, compete à ordem jurídica interna de cada Estado-Membro designar os órgãos jurisdicionais competentes e regular as modalidades processuais das acções judiciais destinadas a garantir a salvaguarda dos direitos que decorrem para os cidadãos do direito comunitário, desde que essas modalidades não sejam menos favoráveis do que as das acções análogas de natureza interna (princípio da equivalência), nem tornem praticamente impossível ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica comunitária (princípio da efectividade).

No que se refere ao princípio da efectividade, a fixação de prazos razoáveis de recurso, sob pena de caducidade, no interesse da segurança jurídica que protege simultaneamente o contribuinte e a administração interessada, é compatível com o direito comunitário. Com efeito, esses prazos não são susceptíveis de tornar praticamente impossível ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica comunitária. A este propósito, um prazo nacional de caducidade de três anos a contar da data do pagamento contestado afigura-se razoável.

O respeito do princípio de equivalência pressupõe, por seu lado, que, tratando-se do mesmo tipo de imposição, a modalidade controvertida se aplica indiferentemente às acções baseadas em violação do direito comunitário e às baseadas em violação do direito interno. Este princípio não pode, em contrapartida, ser interpretado no sentido de obrigar um Estado-Membro a alargar ao conjunto das acções para restituição de imposições cobradas em violação do direito comunitário o seu regime interno de repetição mais favorável. Assim, o direito comunitário não obsta a que a legislação de um Estado-Membro inclua, ao lado de um prazo de prescrição de direito comum aplicável às acções de repetição do indevido entre particulares, modalidades específicas de reclamação e de acção judicial menos favoráveis para a contestação das taxas e outras imposições. O mesmo não se verificava se essas modalidades fossem apenas aplicáveis às acções para restituição dessas taxas ou imposições baseadas no direito comunitário.

Segue-se que o direito comunitário não obsta a que um Estado-Membro aplique às acções para restituição de imposições cobradas em violação do direito comunitário um prazo nacional de caducidade de três anos que derroga o regime comum da acção de repetição do indevido entre particulares, sujeita a um prazo mais favorável, desde que esse prazo de caducidade se aplique de igual modo às acções para restituição dessas imposições que se baseiam no direito comunitário e às que se baseiam no direito interno.

4 O direito comunitário não obsta a que um Estado-Membro aplique às acções para restituição de imposições cobradas com violação de uma directiva um prazo nacional de caducidade que comece a contar da data do pagamento das imposições em causa, mesmo que, nessa data, essa directiva ainda não tenha sido correctamente transposta para o direito nacional, desde que esse prazo não seja menos favorável para os recursos baseados no direito comunitário do que para os recursos baseados no direito interno e que não torne praticamente impossível ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica comunitária e que, por outro lado, não se demonstre que o comportamento das autoridades nacionais conjugado com a existência do prazo litigioso conduziu a privar totalmente a recorrente da possibilidade de invocar os seus direitos nos órgãos jurisdicionais nacionais.

Partes


No processo C-260/96,

que tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 177._ do Tratado CE, pela Corte d'appello di Venezia (Itália), destinado a obter, no litígio pendente neste órgão jurisdicional entre

Ministero delle Finanze

e

Spac SpA,

uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação do direito comunitário em matéria de repetição do indevido,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

composto por: G. C. Rodríguez Iglesias, presidente, H. Ragnemalm, M. Wathelet e R. Schintgen, presidentes de secção, G. F. Mancini, J. C. Moitinho de Almeida, P. J. G. Kapteyn, D. A. O. Edward, J.-P. Puissochet (relator), L. Sevón e K. M. Ioannou, juízes,

advogado-geral: D. Ruiz-Jarabo Colomer,

secretário: D. Louterman-Hubeau, administradora principal,

vistas as observações escritas apresentadas:

- em representação da Spac SpA, por Claudio Toniolo, advogado no foro de Vicência,

- em representação do Governo italiano, pelo professor Umberto Leanza, chefe do Serviço do Contencioso Diplomático do Ministério dos Negócios Estrangeiros, na qualidade de agente, assistido por Ivo M. Braguglia, avvocato dello Stato,

- em representação do Governo francês, por Catherine de Salins, subdirectora na Direcção dos Assuntos Jurídicos do Ministério dos Negócios Estrangeiros, e Gautier Mignot, secretário dos Negócios Estrangeiros na mesma direcção, na qualidade de agentes,

- em representação do Governo do Reino Unido, por Stephanie Ridley, do Treasury Solicitor's Department, na qualidade de agente,

- em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por Enrico Traversa, membro do Serviço Jurídico, na qualidade de agente,

visto o relatório para audiência,

ouvidas as alegações da Spac SpA, representada por Claudio Toniolo, do Governo italiano, representado por Ivo M. Braguglia, do Governo francês, representado por Gautier Mignot, do Governo do Reino Unido, representado por Nicholas Paines, barrister, e da Comissão, representada por Enrico Traversa, na audiência de 3 de Fevereiro de 1998,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 26 de Março de 1998,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por despacho de 18 de Abril de 1996, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 24 de Julho seguinte, a Corte d'appello di Venezia submeteu, nos termos do artigo 177._ do Tratado CE, uma questão prejudicial relativa à interpretação do direito comunitário em matéria de repetição do indevido.

2 Esta questão foi suscitada no âmbito de um litígio que opõe o Ministério das Finanças italiano à Spac SpA (a seguir «Spac») a propósito da taxa de concessão governamental pela inscrição das sociedades no registo das empresas (a seguir «taxa de concessão»).

3 A taxa de concessão foi criada pelo Decreto n._ 641 do presidente da República, de 26 de Outubro de 1972 (GURI n._ 292, de 11 de Novembro de 1972, suplemento n._ 3; a seguir «Decreto n._ 641/72»). Foi objecto, na medida em que se aplica à inscrição no registo do acto constitutivo das sociedades, de alterações sucessivas no que toca aos seus montantes e periodicidade.

4 Os montantes da taxa de concessão foram em primeiro lugar substancialmente aumentados pelo Decreto-Lei n._ 853, de 19 de Dezembro de 1984 (GURI n._ 347, de 19 de Dezembro de 1984), convertido em lei pela Lei n._ 17, de 17 de Fevereiro de 1985 (GURI n._ 41-A, de 17 de Fevereiro de 1985), que também previu que a taxa seria doravante devida não apenas no momento da inscrição no registo do acto constitutivo da sociedade, mas também em 30 de Junho de cada ano civil posterior. Os montantes da taxa foram, em seguida, novamente alterados em 1988 e 1989. Neste último ano atingiram 12 milhões de LIT para as sociedades anónimas e em comandita por acções, 3,5 milhões de LIT para as sociedades por quotas e 500 000 LIT para as outras sociedades.

5 No acórdão de 20 de Abril de 1993, Ponente Carni e Cispadana Costruzioni (C-71/91 e C-178/91, Colect., p. I-1915; a seguir «acórdão Ponente Carni»), proferido a propósito da taxa de concessão, o Tribunal de Justiça declarou que o artigo 10._ da Directiva 69/335/CEE do Conselho, de 17 de Julho de 1969, relativa aos impostos indirectos que incidem sobre as reuniões de capitais (JO L 249, p. 25; EE 09 F1 p. 22), deve ser interpretado no sentido de que proíbe, sem prejuízo das excepções previstas no artigo 12._, uma imposição anual devida pelo registo das sociedades de capitais, ainda que o produto dessa imposição contribua para o financiamento do serviço que tem a seu cargo o registo em que as sociedades são inscritas. O Tribunal de Justiça também declarou que o artigo 12._ da Directiva 69/335 deve ser interpretado no sentido de que os direitos com carácter remuneratório, a que se refere a alínea e) do n._ 1 deste artigo, podem ser retribuições cobradas como contrapartida de operações impostas pela lei com um objectivo de interesse geral, como, por exemplo, o registo das sociedades de capitais. Os montantes dessas taxas, que podem variar em função da forma jurídica da sociedade, devem ser calculados com base no custo da operação, podendo esse custo ser avaliado de forma forfetária.

6 Na sequência desse acórdão, o Decreto-Lei n._ 331, de 30 de Agosto de 1993 (GURI n._ 203, de 30 de Agosto de 1993), convertido em lei pela Lei n._ 427, de 29 de Outubro de 1993 (GURI n._ 255, de 29 de Outubro de 1993), reduziu a taxa de concessão para 500 000 LIT para todas as sociedades e suprimiu a sua cobrança anual.

7 Conclui-se do despacho de reenvio que o Ministério das Finanças interpôs recurso de uma sentença do Tribunale di Venezia que o condenou a reembolsar à Spac os montantes da taxa de concessão pagos por essa sociedade em virtude de essa taxa, na modalidade que vigorou até 1993, estar em contradição com a interpretação que o Tribunal de Justiça fez da Directiva 69/335 no acórdão Ponente Carni. Na sua sentença, o Tribunale di Venezia, considerando ser aplicável o prazo de prescrição de dez anos de direito comum, rejeitou a questão prévia de inadmissibilidade fundada na caducidade da acção de reembolso deduzida pelo ministério com base no disposto no artigo 13._ do Decreto n._ 641/72. Nos termos desta disposição, «O contribuinte pode, sob pena de caducidade, solicitar a restituição de taxas erradamente pagas no prazo de três anos a contar da data do pagamento...».

8 O Ministério das Finanças contesta nomeadamente este aspecto da sentença. Sustenta, contrariamente à Spac, que o reembolso da taxa de concessão integra o âmbito de aplicação do artigo 13._ do Decreto n._ 641/72, na medida em que este se aplica a todas as taxas indevidamente pagas, seja qual for a causa do pagamento erróneo.

9 No seu despacho de reenvio, a Corte d'appello considera, remetendo para a jurisprudência do Tribunal de Justiça, que os direitos que as sociedades devedoras da taxa de concessão retiram do direito comunitário ficavam suficientemente protegidos se a acção para restituição dessa taxa devesse ser qualificada de acção de repetição do indevido, sujeita ao prazo de prescrição de dez anos de direito comum. Em contrapartida, duvida que o mesmo se passasse em caso de aplicação do prazo de caducidade previsto no artigo 13._ do Decreto n._ 641/72, dado que esse prazo é mais curto, começa a correr a partir da data do pagamento contestado e não é susceptível de interrupção.

10 O órgão jurisdicional de reenvio refere, no entanto, que, no acórdão n._ 3458, de 23 de Fevereiro de 1996, a Corte suprema di cassazione considerou que o reembolso da taxa de concessão integra o âmbito de aplicação desta última disposição e, assim, admitiu implicitamente a sua compatibilidade com o direito comunitário.

11 Foi nestas condições que a Corte d'appello di Venezia suspendeu a instância e colocou ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«No caso de uma acção proposta perante a autoridade judicial italiana para a restituição de taxas pagas em virtude de disposições legislativas contrárias ao artigo 10._ da Directiva 69/335/CEE do Conselho, de 17 de Julho de 1969, relativa aos impostos indirectos que incidem sobre as reuniões de capitais, conforme a interpretação que lhe foi dada pelo Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias no acórdão de 20 de Abril de 1993 (processos apensos C-71/91 e C-178/91, Colect., p. I-1915), os princípios inerentes à referida directiva e à sua interpretação e os princípios gerais da ordem jurídica comunitária, tal como declarados pelo Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias no acórdão de 25 de Julho de 1991, Emmott (C-208/90, Colect., p. I-4269), são compatíveis com a norma de direito interno que, subtraindo uma acção de reembolso ao regime comum da acção de repetição do indevido e submetendo-a à regulamentação especial prevista para o reembolso de taxas erradamente pagas, impõe o respectivo exercício dentro de um prazo de caducidade que decorre a partir do momento do pagamento em vez do momento em que a directiva comunitária tenha sido correctamente transposta para o direito nacional?»

Quanto à primeira parte da questão

12 A Comissão considera que a primeira parte da questão é relativa à interpretação do direito italiano e que, portanto, se assim for apresentada, é inadmissível. Nestas condições, propõe a sua reformulação. Em seu entender, através desta parte da questão colocada pretender-se-ia saber se o direito comunitário se opõe a uma legislação nacional que sujeita as acções para restituição de uma taxa cobrada em violação da Directiva 69/335 a um prazo de caducidade que pressupõe a existência de um poder para lançar imposições e de um crédito fiscal do Estado, em vez e em substituição de um prazo de prescrição que, de acordo com essa mesma legislação, é aplicável em caso de indevido objectivo resultante da inexistência de um tal poder e de um tal crédito.

13 Importa sublinhar que, através da primeira parte da sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta ao Tribunal de Justiça se o direito comunitário obsta a que um Estado-Membro aplique às acções para restituição de imposições cobradas em violação do direito comunitário um prazo nacional de caducidade de três anos que derroga o regime comum da acção de repetição do indevido entre particulares, sujeita a um prazo mais favorável. O órgão jurisdicional de reenvio convida assim o Tribunal de Justiça a aclarar a sua jurisprudência segundo a qual as modalidades processuais nacionais das acções judiciais destinadas a garantir a protecção dos direitos que os cidadãos retiram do direito comunitário não podem ser menos favoráveis do que as que dizem respeito a acções semelhantes de natureza interna (v., designadamente, acórdãos de 16 de Dezembro de 1976, Rewe, 33/76, Colect., p. 813, e Comet, 45/76, Recueil, p. 2043, Colect., p. 835).

14 Daqui resulta que há que responder à questão.

15 A Spac considera que a jurisprudência do Tribunal de Justiça obsta a que um Estado-Membro subtraia as acções para restituição da taxa de concessão ao regime de direito comum da repetição do indevido para as sujeitar a um regime especial menos favorável, como o previsto pelo artigo 13._ do Decreto n._ 641/72. Sublinha que só o primeiro regime é susceptível de garantir suficientemente o direito das sociedades de capitais de obterem a restituição dos montantes da taxa de concessão indevidamente pagos.

16 Em contrapartida, de acordo com os três governos que apresentaram observações, um Estado-Membro pode prever, em matéria fiscal, um prazo de caducidade diferente do prazo de direito comum, desde que esse prazo se aplique do mesmo modo aos pedidos de restituição baseados no direito comunitário e no direito interno, o que aqui se verificava.

17 Como o Tribunal de Justiça por diversas vezes assinalou, de uma abordagem comparativa dos sistema nacionais conclui-se que o problema da contestação de taxas ilegalmente reclamadas ou da restituição de taxas indevidamente pagas se resolve de modo diferente nos diversos Estados-Membros e mesmo no interior do mesmo Estado, consoante os diversos tipos de imposições em causa. Em certos casos, as contestações ou pedidos deste tipo estão sujeitos pela lei a condições precisas de forma e de prazo no que respeita tanto às reclamações apresentadas à administração fiscal como às acções judiciais. Noutros casos, as acções para restituição de taxas indevidamente pagas devem ser intentadas nos órgãos jurisdicionais ordinários, sob a forma, designadamente, de acções para restituição do indevido, podendo essas acções ser intentadas dentro de prazos mais ou menos longos, em certos casos durante o prazo de prescrição de direito comum (v. acórdãos de 27 de Fevereiro de 1980, Just, 68/79, Recueil, p. 501, n.os 22 e 23; de 27 de Março de 1980, Denkavit italiana, 61/79, Recueil, p. 1205, n.os 23 e 24; de 10 de Julho de 1980, Ariete, 811/79, Recueil, p. 2545, n.os 10 e 11, e Mireco, 826/79, Recueil, p. 2559, n.os 11 e 12).

18 Esta diversidade dos sistemas nacionais resulta nomeadamente da falta de regulamentação comunitária em matéria de restituição de taxas nacionais indevidamente cobradas. Em tal situação, em conformidade com uma jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, compete com efeito à ordem jurídica interna de cada Estado-Membro designar os órgãos jurisdicionais competentes e regular as modalidades processuais das acções judiciais destinadas a garantir a salvaguarda dos direitos que decorrem para os cidadãos do direito comunitário, desde que essas modalidades não sejam menos favoráveis do que as das acções análogas de natureza interna (princípio da equivalência), nem tornem praticamente impossível ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica comunitária (princípio da efectividade) (acórdãos Rewe, n._ 5, e Comet, n.os 13 e 16, já referidos, e, mais recentemente, acórdão de 14 de Dezembro de 1995, Peterbroeck, C-312/93, Colect., p. I-4599, n._ 12).

19 No que se refere a este último princípio, o Tribunal de Justiça reconheceu a compatibilidade com o direito comunitário da fixação de prazos razoáveis de recurso, sob pena de caducidade, no interesse da segurança jurídica que protege simultaneamente o contribuinte e a administração interessada (acórdãos Rewe, n._ 5, Comet, n.os 17 e 18, Denkavit italiana, n._ 23, já referidos; v. igualmente acórdão de 10 de Julho de 1997, Palmisani, C-261/95, Colect., p. I-4025, n._ 28, e de 17 de Julho de 1997, Haahr Petroleum, C-90/94, Colect., p. I-4085, n._ 48). Com efeito, esses prazos não são susceptíveis de tornar praticamente impossível ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica comunitária. Assim, um prazo nacional de caducidade de três anos a contar da data do pagamento contestado afigura-se razoável (v. acórdão deste mesmo dia, Edis, C-231/96, Colect., p. I-0000, n._ 35).

20 O respeito do princípio da equivalência pressupõe, por seu lado, que, tratando-se do mesmo tipo de imposição, a modalidade controvertida se aplica indiferentemente às acções baseadas em violação do direito comunitário e às baseadas em violação do direito interno. Este princípio não pode, em contrapartida, ser interpretado no sentido de obrigar um Estado-Membro a alargar ao conjunto das acções para restituição de imposições cobradas em violação do direito comunitário o seu regime interno de repetição mais favorável (acórdão Edis, já referido, n._ 36).

21 Assim, o direito comunitário não obsta a que a legislação de um Estado-Membro inclua, ao lado de um prazo de prescrição de direito comum aplicável às acções de repetição do indevido entre particulares, modalidades específicas de reclamação e de acção judicial menos favoráveis para a contestação das taxas e outras imposições. O mesmo não se verificava se essas modalidades fossem apenas aplicáveis às acções para restituição dessas taxas ou imposições baseadas no direito comunitário (acórdão Edis, já referido, n._ 37).

22 No caso em apreço, afirma-se que o prazo de caducidade em causa visa não apenas a taxa de concessão controvertida, mas também todas as taxas de concessão governamentais. Além disso, segundo indicações não contestadas do Governo italiano, às acções para restituição de um certo número de direitos indirectos é também aplicável um prazo análogo. Ademais, não se conclui da redacção da disposição controvertida que ela apenas se aplica às acções baseadas no direito comunitário. Aliás, como o advogado-geral salientou no n._ 26 das suas conclusões em relação com os n.os 62 a 64, conclui-se da jurisprudência da Corte suprema di cassazione que os prazos em matéria fiscal se aplicam também às acções para restituição de taxas ou imposições cobradas com base em leis declaradas contrárias à Constituição italiana (acórdão Edis, já referido, n._ 38).

23 Assim, há que responder à primeira parte da questão que o direito comunitário não obsta a que um Estado-Membro aplique às acções para restituição de imposições cobradas em violação do direito comunitário um prazo nacional de caducidade de três anos que derroga o regime comum da acção de repetição do indevido entre particulares, sujeita a um prazo mais favorável, desde que esse prazo de caducidade se aplique de igual modo às acções para restituição dessas imposições que se baseiam no direito comunitário e às que se baseiam no direito interno.

Quanto à segunda parte da questão

24 Através da segunda parte da sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se o direito comunitário obsta a que um Estado-Membro aplique às acções para restituição de imposições cobradas em violação de uma directiva um prazo nacional de caducidade que começa a contar da data do pagamento das imposições em causa, sendo que, nessa data, essa directiva ainda não tinha sido correctamente transposta para o direito nacional.

25 Os três governos que apresentaram observações propõem, contrariamente à Spac, que se responda negativamente a esta questão. Consideram, com efeito, que um Estado-Membro pode invocar um prazo nacional de caducidade, como o prazo em causa, desde que este preencha as condições estabelecidas pelos acórdãos Rewe e Comet, já referidos. Segundo esses governos, o acórdão Emmott, já referido, deve ser lido no quadro das circunstâncias muito especiais desse processo, o que o Tribunal de Justiça confirmou, aliás, nos acórdãos de 27 de Outubro de 1993, Steenhorst-Neerings (C-338/91, Colect., p. I-5475), e de 6 de Dezembro de 1994, Johnson (C-410/92, Colect., p. I-5483).

26 Num primeiro tempo, a Comissão defendeu que os acórdãos Steenhorst-Neerings e Johnson, já referidos, se referiam a reclamações relativas a prestações sociais indevidamente recusadas, não sendo portanto relevantes para o caso em apreço. Considerava assim que a solução do acórdão Emmott se devia aplicar às acções para restituição de taxas cobradas em violação do direito comunitário, excepto se permitir que o Estado-Membro em falta retire benefícios da violação que cometeu. No entanto, na audiência, a Comissão renunciou a defender esta tese que reconheceu ter sido infirmada pelo acórdão de 2 de Dezembro de 1997, Fantask e o. (C-188/95, Colect., p. I-6783).

27 Da resposta dada à primeira parte da questão colocada conclui-se que o direito comunitário não obsta, em princípio, a que um Estado-Membro aplique às acções para restituição de imposições cobradas em violação do direito comunitário um prazo nacional de caducidade de três anos.

28 É contudo verdade que, no acórdão Emmott, já referido, n._ 23, o Tribunal de Justiça declarou que, enquanto uma directiva não estiver correctamente transposta, o Estado-Membro em falta não pode invocar a extemporaneidade de uma acção judicial contra si intentada por um particular com vista à protecção dos direitos que lhe são reconhecidos pelas disposições de uma directiva e que um prazo de recurso de direito nacional só pode começar a correr a partir desse momento.

29 No entanto, como foi confirmado pelo acórdão Johnson, já referido, n._ 26, conclui-se do acórdão Steenhorst-Neerings, já referido, que a solução prevista no acórdão Emmott se justificava pelas circunstâncias próprias desse processo, nas quais a caducidade levava a privar totalmente a recorrente no processo principal da possibilidade de alegar o seu direito à igualdade de tratamento por força de uma directiva comunitária (v., igualmente, acórdãos Haahr Petroleum, já referido, n._ 52, e de 17 de Julho de 1997, Texaco e Olieselskabet Danmark, C-114/95 e C-115/95, Colect., p. I-4263, n._ 48).

30 O Tribunal de Justiça decidiu assim, no acórdão Fantask e o., já referido, que o direito comunitário não proíbe um Estado-Membro, que não transpôs correctamente a Directiva 69/335, de aplicar às acções para restituição dos direitos cobrados em violação dessa directiva um prazo de caducidade nacional de cinco anos a contar da data da exigibilidade desses direitos (v., igualmente, acórdão Edis, já referido, n._ 47).

31 Além disso, à luz dos autos e dos debates que tiveram lugar durante a fase oral, não parece que o comportamento das autoridades italianas conjugado com a existência do prazo litigioso tenha conduzido, no caso em apreço no processo principal, como no processo Emmott, a privar totalmente a sociedade recorrente da possibilidade de invocar os seus direitos nos órgãos jurisdicionais nacionais.

32 Assim, há que responder à segunda parte da questão que, em circunstâncias como as do processo principal, o direito comunitário não obsta a que um Estado-Membro aplique às acções para restituição de imposições cobradas em violação de uma directiva um prazo nacional de caducidade que começa a contar da data do pagamento das imposições em causa, mesmo que, nessa data, essa directiva ainda não tenha sido correctamente transposta para o direito nacional.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

33 As despesas efectuadas pelos Governos italiano, francês e do Reino Unido, e pela Comissão, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

pronunciando-se sobre a questão submetida pela Corte d'appello di Venezia, por despacho de 18 de Abril de 1996, declara:

34 O direito comunitário não obsta a que um Estado-Membro aplique às acções para restituição de imposições cobradas em violação do direito comunitário um prazo nacional de caducidade de três anos que derroga o regime comum da acção de repetição do indevido entre particulares, sujeita a um prazo mais favorável, desde que esse prazo de caducidade se aplique de igual modo às acções para restituição dessas imposições que se baseiam no direito comunitário e às que se baseiam no direito interno.

35 Em circunstâncias como as do processo principal, o direito comunitário não obsta a que um Estado-Membro aplique às acções para restituição de imposições cobradas em violação de uma directiva um prazo nacional de caducidade que começa a contar da data do pagamento das imposições em causa, mesmo que, nessa data, essa directiva ainda não tenha sido correctamente transposta para o direito nacional.