Acórdão do Tribunal de 18 de Abril de 2002. - Reino de Espanha contra Conselho da União Europeia. - Pesca - Regulamento relativo à limitação e repartição entre Estados-Membros das possibilidades de pesca - Exigência de estabilidade relativa - Troca de quotas de pesca - Quota de pesca do biqueirão - Anulação. - Processos apensos C-61/96, C-132/97, C-45/98, C-27/99, C-81/00 e C-22/01.
Colectânea da Jurisprudência 2002 página I-03439
Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória
Pesca Conservação dos recursos do mar Regime de quotas de pesca Princípio da estabilidade relativa Manutenção de uma percentagem fixa do volume das capturas disponíveis para cada uma das unidades populacionais consideradas Autorização de pescar numa zona uma parte de um total admissível de capturas fixado para a mesma espécie para outra zona Violação do princípio da estabilidade relativa
[Regulamentos do Conselho n.° 170/83, artigo 4.° , n.° 1, e n.° 3760/92, artigo 8.° , n.° 4, ii)]
$$O princípio da estabilidade relativa foi consagrado pelo Regulamento n.° 170/83, cujo artigo 4.° , n.° 1, dispunha que «[o] volume das capturas disponíveis» é repartido entre os Estados-Membros de modo a assegurar a cada Estado-Membro uma estabilidade relativa das actividades exercidas em relação a cada um dos stocks considerados, e, em seguida, retomado no Regulamento n.° 3760/92, cujo artigo 8.° , n.° 4, ii), prevê que o Conselho reparte as oportunidades de pesca entre os Estados-Membros de modo a assegurar, em relação a cada Estado-Membro, uma estabilidade relativa das actividades de pesca para cada stock considerado. Não obstante as diferenças de redacção, estas duas disposições não podem ser interpretadas diferentemente, de modo que as «oportunidades de pesca», cuja repartição pelo Conselho deve ser feita no respeito do princípio da estabilidade relativa, devem ser entendidas como englobando a totalidade do volume das capturas disponíveis. Para efeitos da aplicação do princípio da estabilidade relativa, as possibilidades de pesca de cada stock de peixes, definido como sendo os peixes de uma espécie determinada evoluindo numa dada zona geográfica, devem ser apreciadas separadamente. Resulta, com efeito, do artigo 8.° , n.° 4, ii), do Regulamento n.° 3760/92 que a estabilidade relativa das actividades de pesca deve ser assegurada em relação a cada Estado-Membro «para cada stock considerado». A estabilidade das actividades de pesca é relativa no sentido de que significa a manutenção de uma percentagem fixa do volume das capturas disponíveis para cada um dos stocks em causa, volume que é ele próprio susceptível de evoluir, e não a garantia de uma quantidade fixa de capturas. O princípio da estabilidade relativa seria contornado se fosse possível aumentar as possibilidades de pesca efectivas numa zona geográfica determinada, relativamente à qual foi fixado um total admissível de capturas (TAC), através de uma autorização de pescar nesta zona uma parte de um TAC fixado para a mesma espécie para outra zona. Tal implicaria que, em relação à primeira zona, a repartição das possibilidades de pesca seria diferente da repartição do TAC fixado para esta zona. Ao autorizar um primeiro Estado-Membro, titular de uma quota de biqueirão na zona CIEM IX, tendo em vista uma cessão ulterior a um segundo Estado-Membro, a pescar uma parte desta quota nas águas da zona CIEM VIII, as possibilidades de pesca do biqueirão na zona CIEM VIII foram aumentadas, em detrimento de um terceiro Estado-Membro que, embora lhe tenham efectivamente sido atribuídas percentagens do TAC de biqueirão fixado para a zona CIEM VIII, não recebeu em contrapartida essas percentagens das possibilidades de pesca de biqueirão nesta zona.
( cf. n.os 38-42 )
Nos processos apensos C-61/96, C-132/97, C-45/98, C-27/99, C-81/00 e C-22/01,
Reino de Espanha, representado por R. Silva de Lapuerta, na qualidade de agente, com domicílio escolhido no Luxemburgo,
recorrente,
contra
Conselho da União Europeia, representado por J. Carbery e G.-L. Ramos Ruano, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,
recorrido,
apoiado por
Comissão das Comunidades Europeias, representada por T. van Rijn e J. Guerra Fernández, na qualidade de agentes, e em seguida por T. van Rijn, assistido por J. Guerra Fernández, abogado, com domicílio escolhido no Luxemburgo,
interveniente,
que têm por objecto
- no processo C-61/96, a anulação do ponto relativo ao biqueirão do anexo do Regulamento (CE) n._ 3074/95 do Conselho, de 22 de Dezembro de 1995, que fixa os totais admissíveis de capturas para 1996 e certas condições em que podem ser pescadas determinadas unidades populacionais ou grupos de unidades populacionais de peixes (JO L 330, p. 1);
- no processo C-132/97, a anulação do ponto relativo ao biqueirão do Anexo I do Regulamento (CE) n._ 390/97 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1996, que fixa os totais admissíveis de capturas para 1997 e certas condições em que podem ser pescadas determinadas unidades populacionais ou grupos de unidades populacionais de peixes (JO 1997, L 66, p. 1);
- no processo C-45/98, a anulação do ponto relativo ao biqueirão do Anexo I do Regulamento (CE) n._ 45/98 do Conselho, de 19 de Dezembro de 1997, que fixa os totais admissíveis de capturas para 1998 e certas condições em que podem ser pescadas determinadas unidades populacionais ou grupos de unidades populacionais de peixes (JO 1998, L 12, p. 1);
- no processo C-27/99, a anulação do ponto relativo ao biqueirão do Anexo I do Regulamento (CE) n._ 48/1999 do Conselho, de 18 de Dezembro de 1998, que fixa os totais admissíveis de capturas para 1999 e certas condições em que podem ser pescadas determinadas unidades populacionais ou grupos de unidades populacionais de peixes (JO 1999, L 13, p. 1);
- no processo C-81/00, a anulação do ponto relativo ao biqueirão no que respeita à nota (2) da espécie «Biqueirão, zonas IX, X, CCEAF 34.1.1» do Anexo I D do Regulamento (CE) n._ 2742/1999 do Conselho, de 17 de Dezembro de 1999, que fixa, para 2000, em relação a determinadas unidades populacionais de peixes ou grupos de unidades populacionais de peixes, as possibilidades de pesca e as respectivas condições aplicáveis nas águas comunitárias e, para os navios de pesca comunitários, nas águas em que são necessárias limitações das capturas, e que altera o Regulamento (CE) n._ 66/98 (JO L 341, p. 1); e
- no processo C-22/01, a anulação do ponto relativo ao biqueirão no que respeita à nota (2) da espécie «Biqueirão, zona IX, X, CECAF 34.1.1» (águas comunitárias) do Anexo I D do Regulamento (CE) n._ 2848/2000 do Conselho, de 15 de Dezembro 2000, que fixa, para 2001, em relação a determinadas unidades populacionais de peixes ou grupos de unidades populacionais de peixes, as possibilidades de pesca e as respectivas condições aplicáveis nas águas comunitárias e, para os navios de pesca comunitários, nas águas em que são necessárias limitações das capturas (JO L 334, p. 1),
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,
composto por: G. C. Rodríguez Iglesias, presidente, P. Jann, F. Macken e N. Colneric (relatora), presidentes de secção, D. A. O. Edward, M. Wathelet, R. Schintgen, V. Skouris e J. N. Cunha Rodrigues, juízes,
advogado-geral: S. Alber,
secretário: H. von Holstein, secretário adjunto,
visto o relatório para audiência,
ouvidas as alegações das partes na audiência de 25 de Setembro de 2001,
ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 13 de Novembro de 2001,
profere o presente
Acórdão
1 Por petições apresentadas na Secretaria do Tribunal de Justiça, respectivamente, em 6 de Março de 1996, no processo C-61/96, em 27 de Março de 1997, no processo C-132/97, em 24 de Fevereiro de 1998, no processo C-45/98, em 5 de Fevereiro de 1999, no processo C-27/99, em 7 de Março de 2000, no processo C-81/00, e em 18 de Janeiro de 2001, no processo C-22/01, o Reino de Espanha pediu, nos termos do artigo 173._, primeiro parágrafo, do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 230._, primeiro parágrafo, CE),
- no processo C-61/96, a anulação do ponto relativo ao biqueirão do anexo do Regulamento (CE) n._ 3074/95 do Conselho, de 22 de Dezembro de 1995, que fixa os totais admissíveis de capturas para 1996 e certas condições em que podem ser pescadas determinadas unidades populacionais ou grupos de unidades populacionais de peixes (JO L 330, p. 1);
- no processo C-132/97, a anulação do ponto relativo ao biqueirão do Anexo I do Regulamento (CE) n._ 390/97 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1996, que fixa os totais admissíveis de capturas para 1997 e certas condições em que podem ser pescadas determinadas unidades populacionais ou grupos de unidades populacionais de peixes (JO 1997, L 66, p. 1);
- no processo C-45/98, a anulação do ponto relativo ao biqueirão do Anexo I do Regulamento (CE) n._ 45/98 do Conselho, de 19 de Dezembro de 1997, que fixa os totais admissíveis de capturas para 1998 e certas condições em que podem ser pescadas determinadas unidades populacionais ou grupos de unidades populacionais de peixes (JO 1998, L 12, p. 1);
- no processo C-27/99, a anulação do ponto relativo ao biqueirão do Anexo I do Regulamento (CE) n._ 48/1999 do Conselho, de 18 de Dezembro de 1998, que fixa os totais admissíveis de capturas para 1999 e certas condições em que podem ser pescadas determinadas unidades populacionais ou grupos de unidades populacionais de peixes (JO 1999, L 13, p. 1);
- no processo C-81/00, a anulação do ponto relativo ao biqueirão no que respeita à nota (2) da espécie «Biqueirão, zonas IX, X, CCEAF 34.1.1» do Anexo I D do Regulamento (CE) n._ 2742/1999 do Conselho, de 17 de Dezembro de 1999, que fixa, para 2000, em relação a determinadas unidades populacionais de peixes ou grupos de unidades populacionais de peixes, as possibilidades de pesca e as respectivas condições aplicáveis nas águas comunitárias e, para os navios de pesca comunitários, nas águas em que são necessárias limitações das capturas, e que altera o Regulamento (CE) n._ 66/98 (JO L 341, p. 1); e
- no processo C-22/01, a anulação do ponto relativo ao biqueirão no que respeita à nota (2) da espécie «Biqueirão, zona IX, X, CECAF 34.1.1» (águas comunitárias) do Anexo I D do Regulamento (CE) n._ 2848/2000 do Conselho, de 15 de Dezembro 2000, que fixa, para 2001, em relação a determinadas unidades populacionais de peixes ou grupos de unidades populacionais de peixes, as possibilidades de pesca e as respectivas condições aplicáveis nas águas comunitárias e, para os navios de pesca comunitários, nas águas em que são necessárias limitações das capturas (JO L 334, p. 1).
2 Por despachos do presidente do Tribunal de Justiça de 12 de Setembro de 1996, 15 de Setembro de 1997, 13 de Julho de 1998, 10 de Junho de 1999 e 6 de Julho de 2000, a Comissão das Comunidades Europeias foi autorizada a intervir em apoio dos pedidos do Conselho da União Europeia nos processos C-61/96, C-132/97, C-45/98, C-27/99 e C-81/00.
3 Por decisões de 2 de Maio de 1996, 12 de Maio de 1997, 16 de Março de 1998 e 8 de Março de 1999, o presidente do Tribunal de Justiça ordenou a suspensão da instância nos processos C-61/96, C-132/97, C-45/98 e C-27/99, na pendência da decisão do Tribunal de Justiça no processo C-179/95. Em 5 de Outubro de 1999, o Tribunal de Justiça proferiu o seu acórdão Espanha/Conselho (C-179/95, Colect., p. I-6475). Convidado por carta a precisar se, à luz deste acórdão, mantinha os seus recursos, o Reino de Espanha respondeu, por carta apresentada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 21 de Outubro de 1999, que os mantinha.
4 Por despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 13 de Dezembro de 1999, os processos C-61/96, C-132/97, C-45/98 e C-27/99 foram apensos para efeitos da fase escrita e oral e do acórdão. Por despachos do presidente do Tribunal de Justiça de 26 de Janeiro e 25 de Junho de 2001, os processos apensos C-61/96, C-132/97, C-45/98 e C-27/99, o processo C-81/00 e o processo C-22/01 foram apensos para efeitos da fase oral e do acórdão.
Enquadramento jurídico
Os totais admissíveis de capturas
5 O artigo 161._, n._ 1, alínea f), do Acto relativo às condições de adesão do Reino de Espanha e da República Portuguesa e às adaptações dos Tratados (JO 1985, L 302, p. 23, a seguir «acto de adesão»), atribuiu ao Reino de Espanha 90% do total admissível de capturas (a seguir «TAC») de biqueirão da zona VIII do Conselho Internacional para a Exploração do Mar (a seguir «CIEM»), sendo 10% atribuídos à República Francesa. Além disso, em conformidade com o princípio da estabilidade relativa das actividades de pesca de cada Estado-Membro para cada uma das unidades populacionais consideradas (a seguir «princípio da estabilidade relativa»), consagrado no artigo 4._, n._ 1, do Regulamento (CEE) n._ 170/83 do Conselho, de 25 de Janeiro de 1983, que institui um regime comunitário de conservação e de gestão dos recursos da pesca (JO L 24, p. 1; EE 04 F2 p. 56), retomado, no essencial, no artigo 8._, n._ 4, do Regulamento (CEE) n._ 3760/92 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1992, que institui um regime comunitário da pesca e da aquicultura (JO L 389, p. 1), o TAC de biqueirão das zonas CIEM IX e X e da zona 34.1.1 do Comité das Pescas do Atlântico Centro-Este (a seguir «Copace») foi distribuído entre o Reino de Espanha e a República Portuguesa, na proporção de, aproximadamente, 48% para o Reino de Espanha e 52% para a República Portuguesa.
6 O Regulamento n._ 3760/92 foi adoptado com base no artigo 43._ do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 37._ CE). O seu artigo 4._ prevê:
«1. Com o objectivo de garantir uma exploração racional e responsável dos recursos numa base sustentável, o Conselho, deliberando, salvo disposição em contrário, de acordo com o processo previsto no artigo 43._ do Tratado, estabelecerá as medidas comunitárias que estipulem as condições de acesso às águas e aos recursos e de exercício das actividades de exploração. Essas medidas serão elaboradas em função das análises biológicas, socioeconómicas e técnicas disponíveis, e, especialmente, dos relatórios elaborados pelo comité previsto no artigo 16._
2. Essas disposições podem incluir, nomeadamente, medidas relativas a cada pescaria ou grupo de pescarias destinadas a:
[...]
b) limitar as taxas de exploração;
c) fixar limites de captura quantitativos;
[...]»
7 O artigo 8._, n._ 1, do Regulamento n._ 3760/92 dispõe que, nos termos do artigo 4._, a taxa de exploração pode ser regulada pela limitação do volume de capturas autorizadas e, se necessário, do esforço de pesca no período em causa.
8 Nos termos do artigo 8._, n._ 4, i) e ii), do mesmo regulamento, o Conselho, deliberando por maioria qualificada sob proposta da Comissão, determinará, para cada pescaria ou grupo de pescarias, e caso a caso, o TAC e/ou o esforço de pesca total admissível, se necessário, numa base plurianual e repartirá as oportunidades de pesca entre os Estados-Membros, de modo a assegurar, em relação a cada Estado-Membro, uma estabilidade relativa das actividades de pesca para cada stock considerado; contudo, na sequência de pedidos formulados pelos Estados-Membros directamente interessados, poderá ser tomado em consideração o estabelecimento de miniquotas e as trocas regulares de quotas feitas desde 1983, tendo na devida atenção o equilíbrio global dos contingentes.
9 Foi com fundamento no artigo 8._, n._ 4, do Regulamento n._ 3760/92 que os Regulamentos n.os 3074/95, 390/97, 45/98, 48/1999, 2742/1999 e 2848/2000 fixaram os TAC de certos stocks haliêuticos, respectivamente, para os anos de 1996, 1997, 1998, 1999, 2000 e 2001.
10 Quanto à zona CIEM VIII, cada um destes regulamentos fixou um TAC de biqueirão de 33 000 toneladas repartidas em 29 700 toneladas para o Reino de Espanha e 3 300 toneladas para a República Francesa, independentemente do local onde são efectuadas as capturas. Com efeito, há que assinalar que, se, na sua versão inicial, o Regulamento n._ 2742/1999 previa um TAC de 16 000 toneladas, repartidas em 14 400 toneladas para o Reino de Espanha e 1 600 toneladas para a República Francesa, este regulamento, na redacção dada pelo Regulamento (CE) n._ 1446/2000 do Conselho, de 16 de Junho de 2000 (JO L 163, p. 3), fixou igualmente um TAC de 33 000 toneladas.
11 Quanto à zona CIEM IX, X, Copace 34.1.1, para os anos de 1996 a 1998, a décima terceira rubrica do anexo do Regulamento n._ 3074/95, a décima quarta rubrica do Anexo I do Regulamento n._ 390/97 e a décima quinta rubrica do Anexo I do Regulamento n._ 45/98 fixaram todas um TAC de biqueirão de 12 000 toneladas repartidas em 5 740 toneladas para o Reino de Espanha e 6 260 toneladas para a República Portuguesa. Para o ano de 1999, a décima quinta rubrica do Anexo I do Regulamento n._ 48/1999 fixou um TAC de biqueirão de 13 000 toneladas repartidas em 6 220 toneladas para o Reino de Espanha e 6 780 toneladas para a República Portuguesa. Por fim, para os anos de 2000 e 2001, a nona rubrica do Anexo I D do Regulamento n._ 2742/1999 e a nona rubrica do Anexo I D do Regulamento n._ 2848/2000 fixaram ambas um TAC de biqueirão de 10 000 toneladas repartidas em 4 780 toneladas para o Reino de Espanha e 5 220 toneladas para a República Portuguesa.
12 Era precisado que as quotas de biqueirão atribuídas ao Reino de Espanha e à República Portuguesa na zona CIEM IX, X, Copace 34.1.1 só podiam ser pescadas nas águas sob a soberania ou jurisdição do Estado-Membro em causa ou nas águas internacionais da zona considerada, sob reserva, todavia, das disposições quanto à troca das quotas, ou seja, a excepção prevista na nota 3 das disposições dos Regulamentos n.os 3074/95, 390/97, 45/98 e 48/1999 mencionadas no número anterior, bem como na nota 2 das disposições dos Regulamentos n.os 2742/1999 e 2848/2000 mencionadas no número anterior.
As trocas de quotas
13 Nos termos do artigo 9._, n._ 1, do Regulamento n._ 3760/92, os Estados-Membros podem, após notificação da Comissão, trocar entre si a totalidade ou parte das disponibilidades de pesca que lhes tenham sido atribuídas.
14 O Regulamento (CE) n._ 685/95 do Conselho, de 27 de Março de 1975, relativo à gestão dos esforços de pesca no que respeita a determinadas zonas e recursos de pesca comunitários (JO L 71, p. 5), que foi adoptado com base no artigo 43._ do Tratado, dispõe, no seu artigo 11._, n._ 1, que os Estados-Membros em causa procederão a uma troca das possibilidades de pesca que lhes são atribuídas, de acordo com as condições referidas no ponto 1 do Anexo IV.
15 Nos termos do ponto 1, 1.1, do referido anexo:
«O intercâmbio entre a França e Portugal é tacitamente renovável durante o período compreendido entre 1995 e 2002, sob reserva da possibilidade de cada Estado-Membro alterar anualmente as suas condições aquando da fixação anual dos TAC e quotas.
Os seguintes TAC são abrangidos pelo referido intercâmbio:
i) logo que seja fixado um TAC comum de biqueirão para as zonas CIEM VIII e IX, 80% das possibilidades de pesca de Portugal serão anualmente cedidas à França, percentagem que deverá ser pescada exclusivamente nas águas sob soberania ou jurisdição da França;
[...]»
16 No que respeita ao TAC de biqueirão para a zona CIEM IX, X, Copace 34.1.1, a décima terceira rubrica do anexo do Regulamento n._ 3074/95, a décima quarta rubrica do Anexo I do Regulamento n._ 390/97 e a décima quinta rubrica do Anexo I dos Regulamentos n.os 45/98 e 48/1999 precisam, na sua nota 3, que, em derrogação da regra segundo a qual as quotas de biqueirão atribuídas nessa zona só podem ser pescadas nas águas sob a soberania ou jurisdição do Estado-Membro em causa ou nas águas internacionais da zona considerada, da quota da República Portuguesa «5 008 toneladas, no máximo, podem ser pescadas nas águas da subárea CIEM VIII sob a soberania ou a jurisdição da França».
17 De igual modo, a nona rubrica do Anexo I D do Regulamento n._ 2742/1999 precisa, na sua nota 2, que da quota da República Portuguesa «3 000 toneladas podem ser pescadas nas águas da subárea CIEM VIII sob a soberania ou jurisdição da França».
18 Por fim, a nona rubrica do Anexo I D do Regulamento n._ 2848/2000 precisa, na sua nota 2, que da quota da República Portuguesa «até 80% [das toneladas] podem ser pescadas nas águas da subzona CIEM VIII sob a soberania ou jurisdição da França», o que representa 4 176 toneladas.
19 Os pedidos do Reino de Espanha nos processos C-61/96, C-132/97, C-45/98 e C-27/99 devem, atendendo à sua fundamentação, entender-se como destinados a obter a anulação da nota 3 das décima terceira rubrica do anexo do Regulamento n._ 3074/95, décima quarta rubrica do Anexo I do Regulamento n._ 390/97 e décima quinta rubrica do Anexo I dos Regulamentos n.os 45/98 e 48/1999. Quanto aos seus pedidos nos processos C-81/00 e C-22/01, os mesmos destinam-se a obter a anulação da nota 2 da nona rubrica do Anexo I D dos Regulamentos n.os 2742/1999 e 2848/2000. Tais notas serão a seguir designadas sob a qualificação global de «disposições impugnadas».
Quanto à admissibilidade
20 O Conselho aduz a inadmissibilidade dos recursos do Reino de Espanha nos processos C-61/96, C-132/97, C-45/98 e C-27/99 porque estes recursos e o recurso no processo C-179/95, ao qual foi negado provimento pelo acórdão Espanha/Conselho, já referido, opõem as mesmas partes, têm o mesmo objecto e assentam nos mesmos fundamentos. Tal análise seria corroborada pelas decisões do presidente do Tribunal de Justiça, ordenando, por força do artigo 82._-A, n._ 1, primeiro parágrafo, alínea b), do Regulamento de Processo, a suspensão da instância nos processos C-61/96, C-132/97, C-45/98 e C-27/99 até que o Tribunal de Justiça decidisse no processo C-179/95. Na audiência, o Conselho pediu igualmente que os recursos do Reino de Espanha nos processos C-81/00 e C-22/01 fossem julgados inadmissíveis pela mesma razão.
21 A Comissão sustenta que o único acto que produz efeitos jurídicos obrigatórios quanto à troca de quotas entre a República Francesa e a República Portuguesa é o Regulamento n._ 685/95, que decidiu a gestão comum das unidades populacionais de biqueirão nas zonas CIEM VIII e IX e fixou as modalidades, o alcance e a duração no tempo do acordo de troca entre estes dois Estados-Membros. Os regulamentos posteriores ter-se-iam limitado a fixar anualmente os TAC e as quotas em aplicação da gestão comum das unidades populacionais e das trocas decididas pelo legislador comunitário no Regulamento n._ 685/95. São portanto actos confirmativos relativamente aos quais a jurisprudência do Tribunal de Justiça não admite que sejam susceptíveis de recurso quando já terminou o prazo para interpor um recurso contra o acto inicial ou quando a legalidade deste último já foi confirmada.
22 Dado que o único acto verdadeiramente susceptível de recurso é, segundo a Comissão, o Regulamento n._ 685/95 e que o Tribunal de Justiça, no seu acórdão Espanha/Conselho, já referido, não acolheu os fundamentos assentes na invalidade deste regulamento, os recursos do Reino de Espanha seriam inadmissíveis.
23 Assim, no que respeita, em primeiro lugar, à questão prévia de inadmissibilidade suscitada pelo Conselho, recorde-se que, no âmbito de um recurso de anulação ex artigo 173._ do Tratado, a admissibilidade do recurso deve ser apreciada por referência à situação existente no momento em que a petição é apresentada (v. acórdão de 27 de Novembro de 1984, Bensider e o./Comissão, 50/84, Recueil, p. 3991, n._ 8). Uma vez que os recursos nos processos C-61/96, C-132/97, C-45/98 e C-27/99 foram interpostos antes da prolação do acórdão Espanha/Conselho, já referido, os mesmos não podem ser julgados inadmissíveis pelo motivo de que afectariam a força de caso julgado do mesmo.
24 Quanto aos recursos nos processos C-81/00 e C-22/01, assinale-se que, como se trata de um recurso ex artigo 173._ do Tratado, o acto cuja anulação é pedida constitui um elemento essencial que permite caracterizar o objecto do recurso. Ora, os recursos nos processos C-81/00 e C-22/01 têm por objecto a anulação de outros regulamentos diferentes daqueles cuja validade foi examinada no acórdão Espanha/Conselho, já referido. É aqui indiferente que a tonelagem de um TAC seja a mesma de um ano para o outro, porque, nos termos do artigo 4._ do Regulamento n._ 3760/92, os TAC são, todos os anos, objecto de uma nova fixação à luz dos pareceres científicos disponíveis, e em especial do relatório elaborado pelo Comité Científico, Técnico e Económico das Pescas. O argumento assente numa pretensa identidade de objecto deve, portanto, ser rejeitado.
25 É assim improcedente a questão prévia de inadmissibilidade suscitada pelo Conselho.
26 No que diz respeito, em segundo lugar, à questão prévia de inadmissibilidade suscitada pela Comissão, há que assinalar que as disposições impugnadas se destinam à execução do Anexo IV, ponto 1, 1.1, do Regulamento n._ 685/95. Se bem que o referido anexo preveja a renovação das trocas para o período compreendido entre 1995 e 2002, os regulamentos que englobam as disposições impugnadas fixam de novo, cada ano, os TAC e as quotas de biqueirão aplicáveis nas zonas CIEM VIII e IX. Assim, sem prejuízo da questão de saber se a jurisprudência do Tribunal de Justiça em matéria de actos confirmativos se aplica igualmente aos regulamentos, os Regulamentos n.os 3074/95, 390/97, 45/98, 48/1999, 2742/1999 e 2848/2000 não podem, de qualquer forma, ser considerados actos confirmativos.
27 Do que precede resulta que todos os recursos do Reino de Espanha são admissíveis.
Quanto ao mérito
28 Nos processos C-61/96, C-132/97, C-45/98 e C-27/99, o Governo espanhol adiantou vários fundamentos em apoio dos seus recursos. Na sequência do acórdão Espanha/Conselho, já referido, este governo desistiu expressamente de todos os seus fundamentos, com excepção do relativo à violação do princípio da estabilidade relativa, constitutiva de uma violação do Regulamento n._ 3760/92. Em contrapartida, nos processos C-81/00 e C-22/01, o Governo espanhol avança, além deste primeiro fundamento, um segundo fundamento relativo à violação da obrigação de garantir a exploração racional e responsável dos recursos, igualmente constitutiva de uma violação do Regulamento n._ 3760/92.
Quanto ao fundamento assente na violação do princípio da estabilidade relativa
Argumentos das partes
29 O Governo espanhol recorda que um dos mecanismos instituídos pelo Regulamento n._ 3760/92 para garantir a conservação dos recursos da pesca consiste em limitar as capturas das espécies ameaçadas e em repartir os volumes de capturas autorizados entre os Estados-Membros tendo em conta o princípio da estabilidade relativa.
30 A estabilidade relativa deve ser assegurada, em relação a cada Estado-Membro, para cada uma das unidades populacionais consideradas, ou seja, para os peixes de uma determinada espécie, que se encontrem numa dada zona geográfica. Deste modo, o princípio da estabilidade relativa garantiria ao Reino de Espanha a manutenção da sua percentagem de 90% na unidade populacional de biqueirão que se encontre na zona CIEM VIII.
31 Ora, segundo o Governo espanhol, ao adoptar as disposições impugnadas, o Conselho procedeu a um aumento do TAC e a uma nova repartição da quota de biqueirão da zona CIEM VIII, sem ter em conta o princípio da estabilidade relativa. Com efeito, uma nova quota de biqueirão, de 5 008 toneladas, entre 1996 e 1999, de 3 000 toneladas, em 2000, e de 4 176 toneladas, em 2001, teria sido atribuída na zona CIEM VIII a um Estado-Membro, a República Portuguesa, que até então não tinha aí tido qualquer quota, violando a obrigação de manter a percentagem fixada para cada um dos Estados-Membros, o Reino de Espanha e a República Francesa, entre os quais esta unidade populacional foi repartida.
32 Se o Conselho tivesse aumentado a quota de biqueirão da zona CIEM VIII pela via normal, ou seja, adoptando um novo TAC com base em novos estudos científicos e técnicos, a repartição do novo TAC teria sido efectuada com base nas percentagens garantidas a cada Estado-Membro no respeito do princípio da estabilidade relativa, de modo que o Reino de Espanha teria obtido no novo TAC a quota a que teria tido direito se a sua percentagem tivesse sido mantida.
33 O Governo espanhol sustenta que as disposições impugnadas não são susceptíveis de nenhuma justificação. Contrariamente ao que o Tribunal de Justiça decidiu no n._ 51 do acórdão Espanha/Conselho, já referido, não existe um TAC comum às zonas CIEM VIII e IX, mas dois TAC distintos, um para a zona CIEM VIII, outro para a zona CIEM IX. Basta, para o verificar, examinar os anexos dos regulamentos controvertidos.
34 O Conselho replica que o Tribunal de Justiça já rejeitou, no acórdão Espanha/Conselho, já referido, o fundamento assente na violação do princípio da estabilidade relativa. Com efeito, nos n.os 53 e 54 desse acórdão, o Tribunal de Justiça afirmou que o Conselho, ao atribuir ao Reino de Espanha 90% do TAC de biqueirão da zona CIEM VIII, respeitou o referido princípio.
35 O Conselho recorda que o artigo 9._ do Regulamento n._ 3760/92 autoriza os Estados-Membros a trocarem as suas quotas. A República Portuguesa e a República Francesa teriam acordado nessa troca. Além disso, o Regulamento n._ 685/95 prevê, no seu artigo 11._, n._ 1, que os Estados-Membros em causa procederão a uma troca das possibilidades de pesca que lhes são atribuídas, de acordo com as condições referidas no ponto 1 do Anexo IV do mesmo regulamento, que dispõe que o intercâmbio entre a República Francesa e a República Portuguesa é tacitamente renovável durante o período compreendido entre 1995 e 2002. Por esta razão, o Regulamento n._ 685/95 não teria cessado de produzir os seus efeitos.
36 O Conselho explica que foi obrigado a fixar um TAC de biqueirão para a zona CIEM VIII, a fim de atribuir 90% do mesmo ao Reino de Espanha, e um outro TAC de biqueirão para as zonas CIEM IX e X, a fim de o repartir entre o Reino de Espanha e a República Portuguesa em conformidade com o princípio da estabilidade relativa. Uma junção dos dois TAC não teria permitido respeitar os direitos conferidos ao Reino de Espanha por força do artigo 161._, n._ 1, alínea f), do acto de adesão. O Conselho afirma que não era possível modificar o acordo constante do acto de adesão, a não ser que o Reino de Espanha estivesse disposto a sacrificar uma parte dos seus direitos para que fosse concedida uma quota superior à República Francesa. Assim, trata-se de dois TAC separados, mas que são geridos conjuntamente.
37 A Comissão sublinha, antes de mais, que a gestão comum dos TAC de biqueirão das zonas CIEM VIII e IX não modificou a repartição das quotas dos Estados-Membros em causa, podendo cada um deles continuar a pescar exactamente a mesma coisa. Em seguida, estaria prevista pelos artigos 8._, n._ 4, ii), e 9._ do Regulamento n._ 3760/92 a possibilidade de conclusão de acordos relativos a trocas de quotas. Por fim, a mitigação do princípio da estabilidade relativa não poderia ser ilegal, atendendo a que resultaria do Regulamento n._ 685/95. Este regulamento foi adoptado com fundamento no artigo 43._ do Tratado, ou seja, a mesma base jurídica que a dos Regulamentos n.os 170/83 e 3760/92 que consagram o referido princípio. Gozaria assim do primado das disposições especiais sobre as disposições gerais. Através do Regulamento n._ 685/95, o Conselho decidiu com pleno conhecimento de causa mitigar em certa medida o princípio da estabilidade relativa.
Apreciação do Tribunal de Justiça
38 A título preliminar, recorde-se que o princípio da estabilidade relativa foi consagrado pelo Regulamento n._ 170/83, e em seguida retomado no Regulamento n._ 3760/92. O artigo 4._, n._ 1, do Regulamento n._ 170/83 dispunha que «[o] volume das capturas disponíveis [...] é repartido entre os Estados-Membros de modo a assegurar a cada Estado-Membro uma estabilidade relativa das actividades exercidas em relação a cada uma das unidades populacionais (`stocks') consideradas.» O artigo 8._, n._ 4, ii), do Regulamento n._ 3760/92, por seu turno, prevê que o Conselho «repartirá as oportunidades de pesca entre os Estados-Membros de modo a assegurar, em relação a cada Estado-Membro, uma estabilidade relativa das actividades de pesca para cada stock considerado». Não obstante as diferenças de redacção, estas duas disposições não podem ser interpretadas diferentemente, de modo que as «oportunidades de pesca», cuja repartição pelo Conselho deve ser feita no princípio da estabilidade relativa, devem ser entendidas como englobando a totalidade do volume das capturas disponíveis.
39 Para efeitos da aplicação do princípio da estabilidade relativa, as possibilidades de pesca de cada unidade populacional de peixes, definida como sendo os peixes de uma espécie determinada evoluindo numa dada zona geográfica (v. acórdão de 13 de Outubro de 1992, Portugal e Espanha/Conselho, C-63/90 e C-67/90, Colect., p. I-5073, n._ 28), devem ser apreciadas separadamente. Resulta, com efeito, do artigo 8._, n._ 4, ii), do Regulamento n._ 3760/92 que a estabilidade relativa das actividades de pesca deve ser assegurada em relação a cada Estado-Membro «para cada stock considerado».
40 A estabilidade das actividades de pesca é relativa no sentido de que significa a manutenção de uma percentagem fixa do volume das capturas disponíveis para cada um dos stocks em causa, volume que é ele próprio susceptível de evoluir, e não a garantia de uma quantidade fixa de capturas (v., nomeadamente, acórdãos de 16 de Junho de 1987, Romkes, 46/86, Colect., p. 2671, n._ 17, e Portugal e Espanha/Conselho, já referido, n._ 28).
41 O princípio da estabilidade relativa seria contornado se fosse possível aumentar as possibilidades de pesca efectivas numa zona geográfica determinada, relativamente à qual foi fixado um TAC, através de uma autorização de pescar nesta zona uma parte de um TAC fixado para a mesma espécie para outra zona. Tal implicaria que, em relação à primeira zona, a repartição das possibilidades de pesca seria diferente da repartição do TAC fixado para esta zona.
42 No caso vertente, a República Portuguesa, titular de uma quota de biqueirão na zona CIEM IX, foi autorizada, tendo em vista uma cessão ulterior à República Francesa, a pescar uma parte desta quota nas águas da zona CIEM VIII que se encontram sob a soberania ou jurisdição da República Francesa, ou seja, 5 008 toneladas, de 1996 a 1999, 3 000 toneladas, em 2000, e 4 176 toneladas, em 2001. Esta prática aumentou as possibilidades de pesca do biqueirão na zona CIEM VIII. Deste modo, durante todos estes anos, o Reino de Espanha, embora lhe tenham efectivamente sido atribuídos 90% do TAC de biqueirão fixado para a zona CIEM VIII, não recebeu em contrapartida 90% das possibilidades de pesca de biqueirão nesta zona.
43 O argumento da Comissão, segundo o qual cada Estado-Membro pode continuar a pescar exactamente a mesma coisa, não é pertinente porque, em termos de repartição das possibilidades de pesca efectivas, esta foi modificada na zona CIEM VIII em detrimento do Reino de Espanha.
44 As disposições impugnadas não podem ser justificadas pelo artigo 11._, n._ 1, conjugado com o ponto 1, 1.1, segundo parágrafo, i), do Anexo IV do Regulamento n._ 685/95, prevendo esta última disposição que, logo que seja fixado «um TAC comum» de biqueirão para as zonas CIEM VIII e IX, «80% das possibilidades de pesca de Portugal serão anualmente cedidas à França, percentagem que deverá ser pescada exclusivamente nas águas sob soberania ou jurisdição da França».
45 A afirmação segundo a qual a cessão, à República Francesa, das possibilidades de pesca da República Portuguesa foi efectuada no quadro de um TAC comum cobrindo as zonas CIEM VIII e IX, constante dos n.os 51 e 52 do acórdão Espanha/Conselho, já referido, é inexacta. Para que fosse satisfeita a condição da fixação de um TAC comum de biqueirão para as zonas CIEM VIII e IX, à qual o ponto 1, 1.1, segundo parágrafo, i), do Anexo IV do Regulamento n._ 685/95 subordina o intercâmbio das possibilidades de pesca entre a República Portuguesa e a República Francesa, era necessário que o Conselho fixasse um TAC de biqueirão único para as zonas CIEM VIII e CIEM IX, X, Copace 34.1.1, o que não fez, conforme reconheceu nos seus articulados. A pretensa gestão comum de dois TAC distintos, alegada pelo Conselho, não satisfaz, com efeito, essa condição. Além disso, não é aqui contestado que os dois TAC respeitam a duas unidades populacionais biologicamente diferenciadas.
46 Uma vez que a condição exigida pelo ponto 1, 1.1, segundo parágrafo, i), do Anexo IV do Regulamento n._ 685/95, ou seja, a fixação de um TAC comum, não se encontra satisfeita, o argumento segundo o qual a mitigação do princípio da estabilidade relativa não seria ilegal porque resultante de um regulamento - o Regulamento n._ 685/95 - que tem a mesma base jurídica que o regulamento que consagra o princípio da estabilidade relativa - o Regulamento n._ 3760/92 - é irrelevante.
47 As disposições impugnadas também não podem ser justificadas pelos artigos 8._, n._ 4, ii), e 9._, n._ 1, do Regulamento n._ 3760/92, que prevêem a conclusão de acordos relativos a trocas de quotas. Com efeito, o artigo 8._, n._ 4, ii), dispõe expressamente que é necessário um pedido dos Estados-Membros directamente interessados, para que tal troca seja tida em conta pelo Conselho. Ora, no caso vertente, tal pedido não foi feito pelo Reino de Espanha, que era, no entanto, directamente interessado, já que a troca de quotas implicou um aumento das possibilidades de pesca do biqueirão na zona CIEM VIII. Quanto ao artigo 9._, n._ 1, verifica-se que uma troca das disponibilidades de pesca, conforme prevista nesse artigo, pressupõe que estas tenham sido previamente atribuídas em conformidade com o princípio da estabilidade relativa. Ora, não foi isso que aconteceu em relação aos anos de 1996 a 2001, como resulta do n._ 42 do presente acórdão.
48 Verifica-se, portanto, que as disposições impugnadas violam o princípio da estabilidade relativa e devem, por conseguinte, ser anuladas.
Quanto ao fundamento assente na violação do princípio da exploração racional e responsável dos recursos aquáticos marinhos vivos
49 Tendo em conta que o fundamento, deduzido pelo recorrente, assente na violação do princípio da estabilidade relativa, é procedente, não há que examinar o fundamento assente na violação do princípio da exploração racional e responsável dos recursos aquáticos marinhos vivos.
Quanto às despesas
50 Por força do disposto no artigo 69._, n._ 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo o Reino de Espanha pedido a condenação do Conselho e tendo este sido vencido, há que condená-lo nas despesas. De acordo com o artigo 69._, n._ 4, primeiro parágrafo, do mesmo regulamento, a Comissão, que interveio nas instâncias, suportará as suas próprias despesas.
Pelos fundamentos expostos,
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA
decide:
1) A nota 3 da décima terceira rubrica, relativa ao biqueirão, do anexo do Regulamento (CE) n._ 3074/95 do Conselho, de 22 de Dezembro de 1995, que fixa os totais admissíveis de capturas para 1996 e certas condições em que podem ser pescadas determinadas unidades populacionais ou grupos de unidades populacionais de peixes, é anulada.
2) A nota 3 da décima quarta rubrica, relativa ao biqueirão, do Anexo I do Regulamento (CE) n._ 390/97 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1996, que fixa os totais admissíveis de capturas para 1997 e certas condições em que podem ser pescadas determinadas unidades populacionais ou grupos de unidades populacionais de peixes, é anulada.
3) A nota 3 da décima quinta rubrica, relativa ao biqueirão, do Anexo I do Regulamento (CE) n._ 45/98 do Conselho, de 19 de Dezembro de 1997, que fixa os totais admissíveis de capturas para 1998 e certas condições em que podem ser pescadas determinadas unidades populacionais ou grupos de unidades populacionais de peixes, é anulada.
4) A nota 3 da décima quinta rubrica, relativa ao biqueirão, do Anexo I do Regulamento (CE) n._ 48/1999 do Conselho, de 18 de Dezembro de 1998, que fixa os totais admissíveis de capturas para 1999 e certas condições em que podem ser pescadas determinadas unidades populacionais ou grupos de unidades populacionais de peixes, é anulada.
5) A nota 2 da nona rubrica, relativa ao biqueirão, do Anexo I D do Regulamento (CE) n._ 2742/1999 do Conselho, de 17 de Dezembro de 1999, que fixa, para 2000, em relação a determinadas unidades populacionais de peixes ou grupos de unidades populacionais de peixes, as possibilidades de pesca e as respectivas condições aplicáveis nas águas comunitárias e, para os navios de pesca comunitários, nas águas em que são necessárias limitações das capturas, e que altera o Regulamento (CE) n._ 66/98, é anulada.
6) A nota 2 da nona rubrica, relativa ao biqueirão, do Anexo I D do Regulamento (CE) n._ 2848/2000 do Conselho, de 15 de Dezembro 2000, que fixa, para 2001, em relação a determinadas unidades populacionais de peixes ou grupos de unidades populacionais de peixes, as possibilidades de pesca e as respectivas condições aplicáveis nas águas comunitárias e, para os navios de pesca comunitários, nas águas em que são necessárias limitações das capturas, é anulada.
7) O Conselho da União Europeia é condenado nas despesas.
8) A Comissão das Comunidades Europeias suportará as suas próprias despesas.