61996C0067

Conclusões apensas do advogado-geral Jacobs apresentadas em 28 de Janeiro de 1999. - Albany International BV contra Stichting Bedrijfspensioenfonds Textielindustrie. - Pedido de decisão prejudicial: Kantongerecht Arnhem - Países Baixos. - Processo C-67/96. - Brentjens' Handelsonderneming BV contra Stichting Bedrijfspensioenfonds voor de Handel in Bouwmaterialen. - Pedido de decisão prejudicial: Kantongerecht Roermond - Países Baixos. - Processos apensos C-115/97 a C-117/97. - Maatschappij Drijvende Bokken BV contra Stichting Pensioenfonds voor de Vervoer- en Havenbedrijven. - Pedido de decisão prejudicial: Hoge Raad - Países Baixos. - Processo C-219/97. - Inscrição obrigatória num fundo de pensões sectorial - Compatibilidade com as regras da concorrência - Qualificação dum fundo de pensões sectorial como empresa.

Colectânea da Jurisprudência 1999 página I-05751


Conclusões do Advogado-Geral


I - Introdução

1 Nos casos em apreço, submetidos ao Tribunal de Justiça pelo Hoge Raad der Nederlanden, pelo Kantongerecht te Roermond e pelo Kantongerecht te Arnhem, o Tribunal é chamado a pronunciar-se, a título prejudicial, sobre uma série de questões relacionadas com a compatibilidade de um sistema de participação obrigatória em fundos sectoriais de pensões com as regras de concorrência previstas no Tratado CE. Tais questões são suscitadas no âmbito de processos judiciais instaurados por três empresas, que se opõem às injunções emitidas por diferentes fundos sectoriais de pensões que exigem o pagamento de contribuições para os respectivos regimes.

2 Estes casos colocam várias questões de interesse geral, que convém abordar antes de me debruçar sobre as questões de mérito, que revestem maior especificidade. Em causa, nos três processos, está a questão de saber se um sistema nacional de pensões no qual, a pedido dos representantes das entidades patronais e dos trabalhadores de um determinado sector da economia, a participação num fundo sectorial de pensões se tornou obrigatória para todas as empresas desse sector infringe as disposições conjugadas dos artigos 5._ e 85._ do Tratado CE, ou as disposições conjugadas dos artigos 90._, n._ 1, e 86._ do mesmo Tratado. Os referidos casos levantam igualmente a questão de saber se, no contexto dos artigos 5._ e 85._ do Tratado, se aplica a uma convenção colectiva entre entidades patronais e trabalhadores pertencentes a um determinado sector, que estabeleça um regime sectorial de pensões, o disposto no artigo 85._, n._ 1, do Tratado. O Tribunal de Justiça é, assim, e pela primeira vez, chamado a pronunciar-se sobre a relação entre as regras de concorrência previstas no Tratado e os acordos concluídos por negociação colectiva entre os parceiros sociais da indústria. Uma questão adicional, relevante para a aplicação dos artigos 90._, n._1, e 86._ do Tratado, consiste em determinar se os fundos sectoriais de pensões neerlandeses que operam no quadro das normas que impõem a participação obrigatória num fundo sectorial de pensões constituem empresas para efeitos da aplicação das regras do Tratado em matéria de concorrência.

II - O quadro legal nacional

3 Constata-se que o sistema de pensões de reforma nos Países Baixos assenta em três pilares:

- primeiro, uma pensão-base legal, concedida pelo Estado em conformidade com a Algemene Ouderdomswet (1) (lei geral neerlandesa sobre a protecção na velhice, a seguir «AOW») e com a Algemene Nabestaanddenwet (lei do regime geral das pensões de sobrevivência), que confere a toda a população o direito a um subsídio de montante fixo, correspondente a determinada percentagem do salário mínimo. O subsídio é reduzido em função do número de anos durante os quais o beneficiário não tenha estado inscrito, sendo a contribuição para este regime obrigatória;

- segundo, na maioria dos casos a pensão-base é acrescida de pensões complementares de reforma, atribuídas no contexto de uma relação de trabalho assalariado ou de uma profissão liberal. Estas pensões complementares são normalmente geridas por sistemas colectivos que abrangem um determinado sector industrial, um grupo profissional ou o conjunto dos trabalhadores de uma empresa;

- e, por último, existe a possibilidade da subscrição voluntária de contratos individuais de seguro de reforma ou de vida.

4 Os casos vertentes estão todos relacionados com regimes de pensão sectoriais do «segundo pilar», do tipo dos que atribuem pensões complementares de reforma aos trabalhadores. Nesse aspecto diferem do regime de pensões complementares em litígio no caso Van Schijndel e Van Veen (2), que concedia pensões aos membros de uma profissão.

5 De acordo com a legislação neerlandesa, as entidades patronais são, em princípio, livres de decidir oferecer ou não pensões complementares de reforma aos seus trabalhadores. Se assim o desejarem, poderão estabelecer um regime próprio de pensões, quer sob a forma de um fundo de pensões da empresa quer mediante a contratação de um seguro de pensões de grupo com uma seguradora. Podem, igualmente, aliar-se a outros empregadores para criarem um regime de pensões sectorial, ou aderir a um regime sectorial já existente.

6 Contudo, na prática, as entidades patronais são muitas vezes obrigadas a inscreverem os seus trabalhadores num fundo sectorial de pensões de inscrição obrigatória. Tais fundos são instituídos por convenções colectivas de trabalho entre as administrações e os trabalhadores de um dado sector da indústria, após o que o Estado passa a impor a participação obrigatória nos regimes oferecidos por esses fundos.

7 O primeiro conjunto de regras aplicável a tais regimes é constituído pela Wet betreffende verplichte deelneming in een bedrijfspensioenfonds, de 17 de Março de 1949 (3) (lei que estabelece as regras relativas à inscrição obrigatória num fundo de pensões sectorial, a seguir «BPW», na redacção resultante de diversas alterações).

8 A disposição principal é o seu artigo 3._, n._ 1. Este artigo confere poderes ao ministro dos Assuntos Sociais para, a pedido de um grupo de organizações patronais e sindicais que este considere serem suficientemente representativas, emitir uma portaria que obrigue todas as pessoas integradas em determinado sector da economia a participarem num fundo sectorial de pensões. Na falta de pedido expresso nesse sentido o ministro não tem competência para tal. Antes de decidir, o ministro deve consultar, inter alia, o Sociaal-Economische Raad (Conselho Económico e Social) e a Câmara dos Seguros (Câmara dos Seguros), que fiscaliza a actividade seguradora e os fundos de pensões.

9 Por força do artigo 3._, n._ 2, da BPW, todas as pessoas abrangidas pela portaria, bem como as respectivas entidades patronais, ficam obrigadas ao cumprimento das regras do fundo sectorial de pensões em causa. As obrigações resultantes destas regras, incluindo a de pagar as contribuições, têm carácter executório. O artigo 18._ habilita o fundo de pensões a emitir injunções para cobrança coerciva dos prémios não pagos.

10 Nos debates parlamentares que precederam a adopção da BPW, o Governo neerlandês forneceu a seguinte explicação sobre os objectivos visados pelas regras referentes à participação obrigatória (4):

«... O presente projecto tem por objectivo criar um regime no domínio dos regimes privados de pensões similar ao da Wet op het Algemeen verbindend Verklaren van Bepalingen van Collectieve Arbeidsoevereenkomsten (Lei que atribui força obrigatória geral às normas constantes de convenções colectivas) a respeito das condições de trabalho. Trata-se, assim, de impedir que alguns empregadores dum sector, através da não concessão de pensão, ganhem vantagens sobre outros do mesmo sector.»

O então ministro dos Assuntos Sociais declarou:

«... o seguro profissional de pensão que esta proposta visa instituir é especialmente útil, porque tem subjacente a ideia do seguro colectivo, ou seja, que os parceiros dum determinado sector, e, em primeiro lugar os empregadores e os trabalhadores... devem, como colectividade, assumir a responsabilidade de reunir os fundos necessários a fim de providenciarem no sentido de que todos os que trabalham no sector um número suficiente de anos e que tenham atingido uma determinada idade possam aceder aos benefícios de que necessitam. Quando isto é feito de modo individual - o que acontece em certos casos - e se tal assim continuar, a consequência será que os que se encontram nas melhores condições podem facilmente garantir a sua própria previdência, ao contrário dos que se encontram em condições menos favoráveis» (5).

11 O artigo 5._, n._ 2, da BPW exige o preenchimento de um certo de número de condições para o ministro poder declarar obrigatória a participação. Por exemplo, segundo o disposto no artigo 5._, n._ 2, ponto IV, os representantes das associações patronais e sindicais têm de ter assento no conselho de administração em número igual e, nos termos do ponto V, o fundo de pensões deve ser dotado de personalidade jurídica.

12 O artigo 5._, n._ 2, ponto II, enumera várias questões que devem ser resolvidas pelos estatutos e regulamentos do fundo de pensões. Mais especificamente, por força do 5._, n._ 2, ponto II, alínea l), os estatutos e regulamentos do fundo de pensões devem prever a possibilidade de dispensa da participação obrigatória em determinadas circunstâncias ou, pelo menos, da dispensa de certas obrigações decorrentes da inscrição.

13 O artigo 5._, n._ 3, confere poderes ao ministro dos Assuntos Sociais para adoptar «directrizes» («richtlijnen») quanto à dispensa da participação obrigatória. Com base nesta disposição o ministro competente emitiu a Beschikking van 29 december 1952 betreffende de vaststelling van de richtlijnen voor de vrijstelling van deelneming in een bedrijfspensioenfonds wegen een bijzondere pensionsvoorziening (Portaria de 29 de Dezembro de 1952 relativa à adopção de directrizes quanto à dispensa de participação num fundo sectorial de pensões em caso de regimes especiais de pensões), a seguir «directrizes em matéria de dispensas» ou «directrizes», que já por diversas vezes foram objecto de alteração) (6).

14 Nos termos do artigo 1._ das referidas directrizes, na versão aplicável aos factos do processo principal, é o próprio fundo sectorial de pensões que concede as dispensas. Estas devem ser solicitadas quer pelo trabalhador, a título individual quer, como acontece no processo principal, pela entidade patronal, para todos os seus trabalhadores.

15 O artigo 1._ confere ao fundo poderes discricionários para conceder dispensa da obrigação de participação, quando a empresa em causa disponha do seu próprio regime de pensões e desde que se encontrem preenchidos os requisitos enunciados nas alíneas a) a d) do artigo 1._ O artigo 1._, alínea a), enumera os tipos de regimes de pensões alternativos admitidos, designadamente um fundo de pensões da própria empresa, um fundo sectorial de pensões diferente ou um contrato de seguro de grupo celebrado com uma seguradora privada. O artigo 1._, alínea b), estabelece que os benefícios dos regimes especiais de pensões próprios da empresa devem ser, no mínimo, equivalentes aos concedidos pelo fundo sectorial de pensões. O artigo 1._, alínea c), exige que o regime alternativo forneça garantias suficientes de cumprimento dos seus compromissos em matéria de pensões. O artigo 1._, alínea d), prevê o pagamento de uma compensação razoável pela perda actuarial sofrida, se a dispensa implicar o abandono do fundo por parte dos trabalhadores.

16 Por força do artigo 5._ das directrizes, o fundo deve conceder a dispensa sempre que o regime próprio de pensões da empresa em causa satisfaça os três primeiros requisitos acima mencionados e já esteja em vigor seis meses antes da apresentação do pedido em resultado do qual foi declarada a obrigatoriedade da participação no mesmo.

17 Nos termos do artigo 8._ das directrizes, qualquer decisão relativa a um pedido de dispensa deve ser fundamentada e enviada cópia da mesma à Câmara dos Seguros.

18 O artigo 9._ das directrizes prevê a possibilidade de reclamação («bezwaar») da decisão de recusa de um fundo de pensões em conceder a dispensa, sendo o reclamante ouvido pela Câmara dos Seguros. Segundo o Governo neerlandês, a decisão da Câmara dos Seguros constitui uma mera proposta de conciliação, desprovida de força legal. Da decisão da Câmara dos Seguros não cabe recurso.

19 De acordo com o Governo neerlandês, no passado podem ter sido concedidas dispensas a empresas que faziam parte de um grupo de empresas com uma política própria em matéria de condições de trabalho, ou nos casos em que um empregador apenas temporariamente esteve sujeito à obrigação de participação. Em contrapartida, as empresas demandantes no processo principal sustentaram na audiência que, na realidade, tais dispensas nunca foram concedidas ou, se isso aconteceu, foram-no muito raramente. Referir-me-ei, mais à frente, às recentes alterações relativas às dispensas.

20 O artigo 3._, n._ 4, da BPW permite ao ministro competente pôr termo à obrigação de participação relativamente à totalidade de um sector. Por força do artigo 3._, n._ 5, da BPW, sempre que as disposições que regem um fundo de pensões forem modificadas, o ministro competente deve fazer cessar a participação obrigatória, a menos que declare não ter objecções às modificações operadas.

21 O segundo conjunto de disposições aplicáveis aos fundos sectoriais de pensões está contido na Wet van 15 mei 1962 houdende regelen betreffende pensionen- en spaarvoorzieningen (Lei de 15 de Maio de 1962 relativa aos fundos de pensões e aos fundos de poupança, modificada várias vezes em seguida, a seguir «PSW»). Esta lei estabelece um enquadramento geral para todas as categorias de fundos de pensões e de poupanças, e visa proteger os segurados, quando a entidade patronal instituir esses sistemas de fundos procurando garantir que os fundos destinados a pensões são efectivamente utilizados para esse fim.

22 Com esse propósito, o artigo 2._, n._ 1, da PSW obriga as entidades patronais a optarem por um dos três regimes destinados a apartar os fundos recolhidos para efeitos de pensões do restante património social. A entidade patronal poderá aderir a um fundo sectorial de pensões, constituir um fundo de pensões próprio da empresa ou, ainda, contratar seguros de vida, de grupo ou individuais, com uma companhia de seguros.

23 O artigo 1._, n._ 6, da PSW especifica que o mesmo diploma também se aplica aos fundos sectoriais de pensões nos quais a BPW veio tornar a participação obrigatória.

24 Ao abrigo dos artigos 6._-A e 6._-B da PSW, aditados em 1990, o órgão de gestão de cada fundo fica obrigado a instituir, a pedido de um número determinado de participantes, um «deelnemersraad» (conselho de participantes) com funções consultivas no tocante à gestão do fundo.

25 No interesse dos participantes no regime, os artigos 9._ e 10._ da PSW definem o modo como os fundos recolhidos devem ser geridos. A regra geral é a do artigo 9._, que obriga os fundos de pensões a transferirem o risco associado aos compromissos de pensões, ou a procederem ao seu resseguro. Assim, para eliminar o risco de má gestão ou de maus investimentos por parte do fundo, este só poderá empregar o capital recolhido na celebração de contratos com companhias de seguros.

26 A título de excepção a esta regra, o artigo 10._ confere poderes aos fundos para, por sua conta e risco, gerirem e investirem eles próprios os capitais recolhidos. Antes, porém, de o poder fazer, o fundo deve submeter às autoridades competentes um plano de gestão explicando em detalhe o modo como se propõe actuar para gerir o risco actuarial e financeiro. Este plano deve ser aprovado pela Câmara dos Seguros e, além disso, o fundo fica sujeito a fiscalização permanente. As contas de resultados actuariais devem ser submetidas periodicamente à Câmara dos Seguros para aprovação. Aparentemente, na prática, todos os fundos sectoriais existentes gerem eles próprios, por sua conta e risco, as contribuições recolhidas pelo fundo e, portanto, a excepção transformou-se em regra geral (7).

27 Os artigos 13._ a 16._ da PSW estabelecem as regras para o investimento das importâncias recolhidas. Por força do artigo 13._, os activos do regime, acrescidos das receitas previstas, devem ser suficientes para cobrir os seus compromissos em matéria de pensões. Nos termos do artigo 14._, os investimentos devem ser efectuados «op solide wijze» (de maneira prudente).

28 As normas fiscais neerlandesas revestem-se igualmente de alguma importância para os casos em análise. Segundo a Comissão, os benefícios fiscais concedidos pela legislação fiscal neerlandesa relativamente às pensões limitam-se aos casos em que o montante total da pensão não exceda um limite «razoável». Na prática esse limite é fixado em 70% do nível do último salário auferido por um trabalhador ao fim de 40 anos de carreira. Assim sendo, tais disposições condicionam efectivamente o valor das prestações oferecidas pelos regimes de pensão.

29 Segundo o Governo neerlandês, existem actualmente nos Países Baixos 81 fundos sectoriais de pensões, sendo a participação obrigatória no caso de 66 deles. De acordo com os fundos demandados no processo principal, 91,6% das pessoas inscritas em fundos sectoriais de pensões participam em fundos em que a sua inscrição é obrigatória. 80% da população activa empregada dos Países Baixos está obrigatoriamente inscrita num fundo sectorial de pensões.

30 Dos 15 fundos sectoriais de pensões nos quais o Estado não tornou a participação obrigatória, diz o Governo neerlandês que tal intervenção por parte do Estado não é necessária porque, na maior parte dos casos, existem convenções colectivas que obrigam de facto todos os empregadores do sector a inscreverem os seus trabalhadores ou porque só existe um número reduzido de grandes empregadores no sector em causa os quais, de qualquer modo, optaram pela filiação dos seus trabalhadores no competente fundo sectorial. O Governo neerlandês afirma que os restantes fundos sectoriais nos quais a inscrição continuou a ser puramente voluntária cobrem apenas um número limitado de pequenos sectores ou sectores já sem actividade económica significativa.

III - Matéria de facto no processo principal

A - Processo C-67/96: Albany International

31 A ré no processo principal, Stichting Bedriffspensioenfonds Textilindustrie (a seguir «Fundo da Indústria Têxtil» ou «Fundo») é um fundo sectorial de pensões na acepção da BPW, cobrindo a indústria têxtil. A autora no processo principal, Albany International BV (a seguir «Albany»), é uma empresa que opera, inter alia, nesse sector industrial.

32 De acordo com as partes no processo principal e com o Governo neerlandês, um decreto ministerial emitido em 1952 instituiu, a pedido das associações patronais e sindicais do sector têxtil, a obrigação de inscrição em diversos fundos de pensões cobrindo, cada um, uma parcela diferente do dito sector. Entretanto, registaram-se várias fusões e, em 1975, a fusão dos dois últimos fundos da indústria têxtil, de que resultou um fundo único para toda a indústria, tornou necessária a adopção de um novo decreto que declarou obrigatória a participação no Fundo demandado. A Albany cumpriu a partir de 1975 a sua obrigação de participação neste regime.

33 De 1975 em diante o Fundo funcionou com base naquilo que se poderá chamar sistema forfetário. As prestações de pensão não eram calculadas em função do valor dos salários auferidos pelos trabalhadores, consistindo antes num montante fixo por cada ano de serviço. Segundo a Albany, o máximo que um trabalhador poderia esperar receber de pensão, ao fim de 50 anos de serviço, seriam uns meros 200 HFL por mês.

34 Foi essa a razão que levou a Albany a instituir, em 1981, um regime complementar de pensões de reforma, gerido por uma companhia de seguros. Este regime concedia prestações aos seus trabalhadores que, quando combinadas com a pensão-base recebida ao abrigo da AOW e com a pensão complementar concedida pelo Fundo, perfaziam um montante global de pensão equivalente a 70% do montante do salário final, após 40 anos de serviço.

35 No dia 1 de Janeiro de 1989, na sequência de negociações entre os parceiros sociais do sector, o Fundo modificou as regras aplicáveis ao seu regime complementar de pensões e introduziu um regime de pensões baseadas nos salários. O objecto deste plano é semelhante ao do regime complementar da Albany: conseguir que os trabalhadores recebessem, no total, o equivalente a 70% do seu último salário, se tivessem trabalhado 40 anos.

36 A Albany considerou que o seu próprio regime de pensões de reforma continuava a ser mais generoso do que o novo regime, e que as mudanças a introduzir no seu regime especial em consequência da modificação do regime sectorial eram desproporcionadas e demasiado onerosas. Por esse motivo, solicitou ao Fundo a dispensa de participação.

37 Este pedido foi rejeitado pelo Fundo por decisão de 28 de Dezembro de 1990. Este alegou, inter alia, que ao abrigo das directrizes em matéria de dispensas, não se via obrigado a conceder tal isenção, uma vez que o regime especial da Albany não estava em vigor seis meses antes da apresentação do pedido pelo qual foi pedida a declaração de obrigatoriedade de participação no fundo de pensões. Por conseguinte, a Albany só teria direito à dispensa se tivesse instituído o seu próprio regime antes de 1975.

38 A Albany reclamou de tal decisão para a Câmara dos Seguros. Por carta de 18 de Março de 1992 endereçada às partes, a Câmara dos Seguros declarava que, em face do disposto nas directrizes em matéria de dispensas, o Fundo tivera razão em não se considerar obrigado a conceder a dispensa.

39 No entanto, prosseguia:

«Dado que a reclamante, ao tempo da introdução desta alteração (a alteração de 1 de Janeiro de 1989), já tinha há vários anos um regime complementar de pensões para os seus trabalhadores, que é, no mínimo, comparável ao regime introduzido na referida data pelo Fundo sectorial de pensões, a Câmara considera razoável que se solicite ao fundo de pensões que faça uso da sua faculdade de conceder uma dispensa ou, se o fundo puder demonstrar à Câmara, o que até agora ainda não se verificou, que não existe qualquer motivo para adoptar uma atitude flexível neste caso, que, de qualquer modo, conceda um prazo de pré-aviso.»

40 Não obstante tal decisão, o Fundo não reconsiderou a sua decisão e, a pedido deste, em 11 de Novembro de 1992 foi notificada à Albany uma injunção de pagamento, nos termos do artigo 18._ da BPW, na qual lhe era ordenado que pagasse as contribuições obrigatórias referentes a 1989, acrescidas de juros sobre o montante das mesmas e das despesas de cobrança.

41 A Albany recorreu de tal injunção para o Kantongerecht te Arnhem, contrapondo, entre outros argumentos, que o sistema de participação obrigatória em vigor nos Países Baixos violava as regras de concorrência do Tratado.

42 O Kantongerecht adoptou o ponto de vista da Câmara dos Seguros, segundo o qual o regime da Albany era, no mínimo, comparável ao regime de pensões introduzido pelo Fundo em 1 de Janeiro de 1989. O Kantongerecht considerou também que as relações entre o Fundo e os seus participantes são regidas por «princípios de razoabilidade e de equidade e/ou por princípios gerais de boa administração». Assim sendo, um fundo sectorial de pensões, na sua decisão de conceder ou não uma dispensa, deveria cuidadosamente ter em conta a apreciação feita pela Câmara dos Seguros, na sua qualidade de instância independente instituída por lei.

43 No que se refere à alegada violação da legislação comunitária, o Kantongerecht decidiu, em 4 de Março de 1996, solicitar ao Tribunal de Justiça que se pronuncie, a título prejudicial, sobre as seguintes questões:

«1) Um fundo sectorial de pensões, como o contemplado no artigo 1._, n._ 1, alínea b), da [BPW] é uma empresa na acepção dos artigos 85._, 86._ ou 90._ do Tratado CE?

2) Em caso de resposta afirmativa à questão 1), a obrigação de filiação imposta às empresas industriais constitui uma medida tomada por um Estado-Membro, que anula o efeito útil das normas de concorrência aplicáveis às empresas?

3) No caso de se dever responder de modo negativo à questão 2), podem outras circunstâncias fazer com que a referida obrigatoriedade seja incompatível com o disposto no artigo 90._ do Tratado e, em caso afirmativo, quais?»

B - Processos apensos C-115/97, C-116/97 e C-117/97: Brentjens' Handelsonderneming

44 Na sequência do pedido que lhe foi apresentado em 8 de Março de 1958 pelas associações patronais e sindicais do sector do comércio de materiais de construção, o Secretário de Estado dos Assuntos Sociais, por meio de portaria de 28 de Junho de 1958 (a seguir «portaria de 1958», ou «portaria») declarou obrigatória a participação no Stichting Bedrijfspensioenfonds voor de Handel in Bowmaterialen (a seguir «fundo de pensões do comércio de materiais de construção» ou «Fundo»). Esta portaria, que tinha por base a BPW, foi posteriormente alterada por diversas vezes. Por força da referida portaria, a inscrição é obrigatória para os trabalhadores de 23 a 64 anos, inclusive, que trabalhem numa empresa que se dedique exclusiva ou principalmente ao comércio grossista de materiais de construção.

45 De acordo com as partes no processo principal, o Fundo funciona segundo um sistema forfetário. As prestações de pensão não são calculadas em função dos salários auferidos pelos trabalhadores, antes consistindo num montante fixo, igual para todos, por cada ano de serviço. Segundo o Fundo, a pensão máxima, em função do tempo de serviço, é de 5 300 HFL por ano. Na prática, a maioria dos trabalhadores empregados neste sector atinge uma pensão total de montante equivalente a 70% da última remuneração que auferiram.

46 A Brentjens' Handelsonderneming BV (a seguir «Brentjens») iniciou a sua actividade empresarial em 1963. Em 1 de Janeiro de 1968, a Brentjens contratou, em benefício dos seus trabalhadores, um seguro de pensões com a companhia de seguros De NV Levensverzekerings Maatschappij de Nederlanden van 1870, que posteriormente se transformou na Generali Levensverzekeringsmaatschappij n.v. (a seguir «Generali»), uma empresa neerlandesa subordinada ao regime da Wet toezichtverzekeringsbedrijf, de 1993 (lei sobre a fiscalização da actividade seguradora, de 1993), pertencente ao Grupo italiano Assicurazioni Generali.

47 Em 1989 o Fundo tomou conhecimento da existência da Brentjens e, com efeitos a contar de 1 de Janeiro de 1990, inscreveu-a no seu regime, isentando-a do pagamento das contribuições referentes aos anos anteriores. Assim, o Fundo comprometeu-se a respeitar o seguro de pensões da Brentjens já existente, no tocante ao período de 1963 a 1 de Janeiro de 1990.

48 A Brentjens considerou que o regime de pensões contratado com a Generali era mais vantajoso do que o oferecido pelo Fundo, tanto no que respeita ao nível das contribuições como ao das prestações, e solicitou a dispensa da participação obrigatória. Por decisão de 23 de Agosto de 1994, o Fundo indeferiu o pedido da Brentjens. A Brentjens reclamou dessa decisão para a Câmara dos Seguros. Esta rejeitou as objecções da Brentjens e, por decisão de 18 de Maio de 1995, considerou que a decisão do Fundo era correcta.

49 Posteriormente, em 13 de Maio de 1996, o Fundo notificou à Brentjens três injunções distintas, exigindo o pagamento das contribuições em dívida nos termos do seu regulamento de pensões e referentes aos períodos 1990 a 1994, 1995 e 1996.

50 A Brentjens instaurou três acções diferentes no Kantongerecht te Roermond, pedindo a anulação dessas injunções. Verifica-se que a Brentjens e a Generali, agindo conjuntamente, apresentaram paralelamente à Comissão uma queixa contra os Países Baixos e contra o Fundo, por violação dos artigos 3._, alínea g), e ainda dos artigos 5._ e 85._, 90._ e 86._, 52._ e 59._ do Tratado CE.

51 Em 18 de Março de 1997 o Kantongerecht proferiu quatro sentenças idênticas, pelas quais julgou improcedentes três dos quatro fundamentos aduzidos pela Brentjens. Quanto ao quarto fundamento, em que esta alegava que a participação obrigatória no Fundo era contrária ao direito comunitário, o Kantongerecht submeteu ao Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias as seguintes questões prejudiciais:

«1) Deve o n._ 1 do artigo 85._ do Tratado CE ser interpretado no sentido de que se está perante um acordo ou uma decisão de uma associação de empresas ou de uma empresa e que restringe o jogo da concorrência ou afecta o comércio entre Estados-Membros, na acepção do n._ 1 do artigo 85._ do Tratado CE, quando num determinado sector económico os parceiros sociais celebram acordos sobre pensões nos termos dos quais é criado para todo o sector económico um fundo de pensões no qual, em princípio, serão inscritos obrigatoriamente todos os trabalhadores que exerçam a sua actividade no referido sector e que obterá o direito exclusivo da gestão dos fundos colectados no referido sector económico?

2) Devem o artigo 3._, alínea g), e os artigos 5._ e 85._ do Tratado CE, conjugados, ser interpretados no sentido de que são estes artigos infringidos quando as autoridades públicas impõem a empresas de determinado sector económico a participação obrigatória num fundo profissional de pensões como o descrito na questão 1?

3) Deve o conceito de `empresa', a que se referem as disposições do Tratado CE em matéria de concorrência (artigos 85._ a 94._), ser interpretado no sentido de que nele se insere um fundo profissional de pensões, na acepção da `Wet betreffeende verplichte deelneming in een bedrijfspensioenfonds'?

4) Devem os artigos 86._ e 90._ do Tratado CE, conjugados, ser interpretados no sentido de que são estas disposições infringidas quando as autoridades públicas atribuem a um fundo profissional de pensões um direito exclusivo através do qual se restringe a liberdade de contratar um regime de pensões com uma seguradora privada?»

C - Processo C-219/97: Maatschappij Drijvende Bokken

52 A recorrente no processo principal, BV Maatschappij Drijvende Bokken ( a seguir «Drijvende Bokken»), dedica-se à locação de gruas flutuantes, habitualmente em conjunto com rebocadores, destinados a serem utilizados na indústria offshore, nas actividades de construção, na construção e reparação de navios, na indústria química e ainda para içar mercadorias pesadas para pontões e navios.

53 A recorrida no processo principal, Stichting Pensioenfonds voor de Vervoer- en Havenbedrijven (a seguir «Fundo da doca» ou «Fundo») é um fundo sectorial de pensões na acepção da BPW. Por portaria de 9 de Setembro de 1959, (a seguir «portaria de 1959» ou «portaria»), o Secretário de Estado dos Assuntos Sociais e da Saúde Pública - agindo por delegação do ministro para esse efeito - tornou obrigatória a inscrição no Fundo dos trabalhadores do sexo masculino, de idade igual ou superior a 18 anos, empregados em empresas portuárias na área portuária de Roterdão. Por despacho de 17 de Dezembro de 1991, esta portaria foi tornada extensiva a todos os trabalhadores que habitualmente desempenham a sua profissão em empresas portuárias ou equiparadas.

54 De acordo com a Drijvende Bokken, o Fundo opera com base num «sistema forfetário», no qual as prestações de pensão não estão relacionadas com os salários.

55 A Drijvende Bokken considerou que não era abrangida pelo âmbito de aplicação da portaria e, portanto, aderiu a um outro fundo de pensões. No seguimento da extensão do âmbito de aplicação da portaria, em 1991, o Fundo continuou a entender que a Drijvende Bokken ficava sob a alçada da mesma e que a participação no fundo era obrigatória para os trabalhadores da Drijvende Bokken. Assim sendo, o Fundo notificou à Drijvende Bokken uma injunção de pagamento de 132 000 HFL a título de contribuições, acrescida de juros e despesas.

56 A Drijvende Bokken impugnou no Kantongerecht a referida injunção de pagamento. Alegou, em primeiro lugar, que não estava abrangida pelo âmbito de aplicação da portaria e, em segundo lugar, que a participação obrigatória era incompatível com as regras de concorrência da Comunidade.

57 O Kantongerecht entendeu que os trabalhadores da Drijvende Bokken não estavam a trabalhar para uma empresa portuária, na acepção da portaria e que, por conseguinte, a impugnação da Drijvende Bokken procedia.

58 Na sequência do recurso dessa decisão interposto pelo Fundo, o Rechtbank considerou que os trabalhadores da Drijvende Bokken estavam a trabalhar para uma empresa portuária ou equiparada e que, por conseguinte, a portaria lhes era aplicável. O Rechtbank também não acolheu a alegação da Drijvende Bokken de que a exigência de participação obrigatória no Fundo era incompatível com as regras de concorrência da Comunidade, sustentando que o Fundo não devia ser considerado como uma empresa, na acepção dos artigos 85._ e 86._ do Tratado CE mas, pelo contrário, como uma instituição de carácter social.

59 O recurso para o Hoge Raad interposto pela Drijvende Bokken baseou-se unicamente no fundamento de que a norma da participação obrigatória era incompatível com o direito comunitário. O Hoge Raad decidiu então submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1) Deve um fundo profissional de pensões, como o PVH, no qual, por força e em conformidade com a WBPF, existe uma obrigação de participação para todos ou para um ou mais grupos definidos de parceiros sociais, ser considerado uma empresa na acepção dos artigos 85._, 86._ e 90._ do Tratado CE?

2) Quando um certo número de organizações, que segundo o ministro são consideradas suficientemente representativas da actividade económica organizada na acepção do artigo 3._, n._ 1, da WBPF, solicitam ao ministro, com fundamento nessa disposição, que torne obrigatória a participação num determinado fundo de pensões na acepção desta lei, o comportamento colectivo dessas organizações deve então ser considerado um acordo entre empresas, uma decisão de associação de empresas ou uma prática concertada na acepção do artigo 85._, n._ 1, do Tratado CE que - na acepção desta disposição do Tratado - (1._) é susceptível de afectar o comércio entre os Estados-Membros e (2._) tem ou pode ter por objectivo ou efeito impedir, restringir ou falsear a concorrência no mercado comum?

3) A referida obrigatoriedade deve ser considerada uma medida que pode anular o efeito útil das regras de concorrência aplicáveis às empresas, ou uma medida pela qual um Estado-Membro impõe ou favorece a adopção de acordos incompatíveis com o artigo 85._, ou reforça os seus efeitos, ou tal verifica-se apenas em determinadas circunstâncias e, assim sendo, em quais?

4) Se for dada uma resposta negativa à última questão, podem então outras circunstâncias dar origem a que a obrigatoriedade seja incompatível com o disposto no artigo 90._ do Tratado CE e, em caso afirmativo, quais?

5) Pode a obrigatoriedade ser considerada a concessão a um fundo profissional de pensões de um direito exclusivo na acepção do artigo 90._, n._ 1, do Tratado CE, sendo assim dada a tal fundo de pensões uma posição dominante, que pode ser explorada abusivamente pelo simples exercício do direito exclusivo concedido, designadamente porque devido à obrigatoriedade o comércio entre os Estados-Membros é susceptível de ser afectado e porque em violação do disposto no artigo 86._, segundo parágrafo, alínea b), a prestação de serviços é limitada em detrimento das empresas casu quo dos trabalhadores obrigados a participar? Ou essa obrigatoriedade pode criar uma situação em que um fundo de pensões seja levado a uma tal prática abusiva, ou seja colocado numa situação em que não se poderia colocar sem para tal violar o artigo 86._, quando, em consequência dessa obrigatoriedade não é, de qualquer modo, garantida a existência de um sistema de concorrência não falseada?

6) Se a obrigatoriedade é incompatível com o direito comunitário tal implica que a mesma não é válida?»

IV - Admissibilidade

60 No processo Albany (C-67/96), os Governos francês e neerlandês, citando os acórdãos Meilicke (8) e Telemarsicabruzzo e o. (9), e ainda o despacho proferido no caso Max Mara (10), sugerem que as questões podem ser inadmissíveis porque o órgão jurisdicional de reenvio não descreve com suficiente detalhe o quadro factual e legal em que se inscrevem as questões que coloca. A Comissão exprimiu igualmente a suas dúvidas a este respeito. Nos processos apensos Brentjens (C-115/96, C-116/97 e C-117/97), o Governo francês levanta uma objecção análoga.

61 Da jurisprudência constante do Tribunal de Justiça decorre que as informações sobre o quadro factual e legal fornecidas em pedidos prejudiciais visam, essencialmente, dois objectivos:

62 Em primeiro lugar, possibilitam ao Tribunal de Justiça efectuar uma interpretação do direito comunitário que seja útil ao órgão jurisdicional nacional (11). Como observou o Tribunal, a exigência de informação adequada é particularmente válida no sector da concorrência, que se caracteriza por complexas situações de facto e de direito (12). A esse respeito, tanto as partes no processo principal como o Governo neerlandês e a Comissão forneceram ao Tribunal de Justiça, nas respectivas observações escritas, uma quantidade apreciável de informações sobre as circunstâncias que deram origem aos litígios e sobre a legislação neerlandesa. Não obstante quaisquer lacunas que possam subsistir nas decisões dos órgãos jurisdicionais de reenvio considero, portanto, que o Tribunal de Justiça está em posição de poder fornecer uma resposta útil às questões colocadas pelo órgão jurisdicional nacional.

63 A exigência de prestação de informações apropriadas sobre o quadro factual e legal serve ainda um segundo propósito, designadamente o de dar aos Governos dos Estados-Membros, bem como às outras partes interessadas, a possibilidade de apresentarem observações nos termos do artigo 20._ do Estatuto (CE) do Tribunal de Justiça. Incumbe ao Tribunal garantir essa possibilidade (13). A esse respeito deve ter-se em conta que apenas as decisões de reenvio são notificadas às partes interessadas (14).

64 No que se refere, em primeiro lugar, ao quadro legal, concordo com os dois Governos e com a Comissão de que no processo Albany o Kantongerecht fornece informações relativamente escassas, limitando-se a mencionar determinadas normas da BPW aplicáveis ao caso. No entanto, as duas decisões de reenvio paralelas nos processos Brentjens e Drijvende Bokken foram notificadas aos Governos e à Comissão quatro e três meses, respectivamente, antes do final da fase escrita do processo Albany, em virtude de o processo referente a este litígio ter estado suspenso. O reenvio prejudicial do Hoge Raad no processo Drijvende Bokken, em especial, contém uma descrição detalhada do quadro legal nos Países Baixos. Os Governos francês e neerlandês e a Comissão apresentaram as respectivas observações escritas relativas ao processo Albany depois de o terem feito no processo Brentjens e ao mesmo tempo que as relativas ao processo Drijvende Bokken. Das observações apresentadas no processo Albany decorre que tinham conhecimento das outras duas decisões de reenvio. Assim sendo, é óbvio que quem quis apresentar observações estava suficientemente informado do enquadramento jurídico vigente nos Países Baixos a tempo de tomar posição sobre as questões suscitadas.

65 No que respeita, em seguida, ao quadro factual, discordo da alegação de que os despachos de reenvio nos processos Albany e Brentjens não são suficientemente explícitos. Estes despachos explicam claramente a razão pela qual os órgãos nacionais de reenvio necessitam de uma interpretação do direito comunitário para poderem proferir uma sentença nos casos que estão a julgar, assim como o raciocínio subjacente às questões que colocam.

66 Considero, portanto, que os pedidos prejudiciais são admissíveis nos três processos.

V - Alcance das questões suscitadas

67 Estou de acordo com a Comissão quanto ao facto de os pedidos prejudiciais dos órgãos jurisdicionais de reenvio levantarem as cinco questões distintas seguintes.

68 A primeira consiste em saber se há violação do artigo 85._, n._ 1, do Tratado CE quando, em determinado sector económico, as associações patronais e sindicais acordam colectivamente em criar para todo o sector económico um fundo de pensões com direito exclusivo de gerir as contribuições recolhidas, bem como em requerer conjuntamente às autoridades competentes que declarem a obrigatoriedade de participação nesse fundo para todos aqueles que pertençam a esse sector (15). A segunda questão, consiste em saber se um Estado-Membro infringe as disposições conjugadas dos artigos 5._ e 85._ do Tratado CE quando, a pedido das associações patronais e sindicais de um dado sector, torna obrigatória a participação num regime sectorial de pensões para todas as empresas a ele pertencentes (16). A terceira questão visa determinar se os fundos sectoriais de pensões neerlandeses cabem no conceito de «empresa», na acepção das regras de concorrência previstas no Tratado (17). A quarta questão tem por objecto saber se um Estado-Membro infringe as disposições dos artigos 86._ e 90._ do Tratado CE, interpretadas em conjugação, quando impõe a participação obrigatória num fundo sectorial de pensões e concede a esse fundo o direito exclusivo de gerir as contribuições recolhidas (18). E, por último, a quinta questão consiste em saber, no caso de tal participação obrigatória vir a ser declarada incompatível com o direito comunitário, qual será a consequência legal de uma decisão nesse sentido (19).

69 A título de sexta questão, as sociedades Albany, Brentjens e Drijvende Bokken pedem ao Tribunal de Justiça que se debruce sobre a compatibilidade da legislação neerlandesa com as disposições do artigo 90._, conjugadas com as dos artigos 52._ ou 59._ do Tratado CE. Argumentam que o Kantongerecht te Arnhem coloca indirectamente o problema na terceira questão suscitada no processo Albany, ao perguntar se «outras circunstâncias» podem fazer com que a participação obrigatória se torne incompatível com o disposto no artigo 90._ do Tratado.

70 Está patente no despacho de reenvio do processo Albany que o Kantongerecht, ao redigir as suas questões, seguiu o modelo das três últimas questões suscitadas pelo Hoge Raad no processo Van Schijndel e Van Veen (20), às quais, por razões processuais, o Tribunal de Justiça não teve de responder. É igualmente evidente que o Kantongerecht entendeu as três questões como unicamente respeitantes às regras de concorrência comunitárias. Nada nos autos do processo principal revela que as partes ou o órgão jurisdicional nacional hajam debatido a questão da aplicabilidade do artigo 52._ ou do artigo 59._ do Tratado CE, que impõem a supressão das restrições à liberdade de estabelecimento e à livre prestação de serviços na Comunidade. Ao contrário da situação verificada no processo Brentjens, que envolve uma companhia seguradora estrangeira actuando através da sua sucursal neerlandesa, no processo Albany parece não existir nenhum elemento transnacional. Entendo, por conseguinte, que a questão colocada pelo Kantongerecht não pode ser interpretada como abrangendo a questão da aplicabilidade dos artigos 52._ ou 59._ do Tratado CE, não obstante a aparente amplitude dos termos em que está redigida.

VI - Artigo 85._, n._ 1, do Tratado CE

71 Examinarei agora a primeira questão, ou seja, a de saber se há violação do artigo 85._, n._ 1, do Tratado CE quando, em determinado sector da economia, as associações patronais e sindicais acordam a criação de um fundo de pensões comum a todo o sector, com o direito exclusivo de gerir as contribuições recolhidas, e em requerer conjuntamente às autoridades competentes que declarem a obrigatoriedade de participação nesse fundo para todos os que a ele pertençam.

72 A Albany, a Brentjens e a Drijvende Bokken alegam que, nessas circunstâncias, os empregadores de um dado sector violam o disposto no artigo 85._, n._ 1, do Tratado. A sua argumentação é a seguinte:

73 Em primeiro lugar, porque se trata de «acordos entre empresas», na acepção do artigo 85._, n._ 1, do Tratado. A celebração de convenções colectivas entre entidades patronais e trabalhadores implica que os empregadores concordem em negociar em conjunto e em se vincularem ao resultado das negociações. Nos casos vertentes, todos os empregadores se comprometeram a inscrever os respectivos trabalhadores num único fundo de pensões e a observar as regras desse fundo.

74 Em segundo lugar, porque esses acordos «restringem a concorrência». A concorrência relativamente às empresas empregadoras sofre limitações, porque um factor de custo importante passa a ser objecto de harmonização em todo o sector, a liberdade de escolher o regime de pensão mais favorável fica cerceada e as entidades patronais ficam impossibilitadas de atrair trabalhadores mediante a oferta de regimes de pensões mais vantajosos. No que toca aos seguros de vida, as companhias de seguros vêm-se excluídas de uma parte importante do mercado.

75 Em terceiro lugar, os ditos acordos também «afectam o comércio entre os Estados-Membros», porque os empregadores envolvidos exercem actividades transnacionais. Além disso, as companhias de seguros também se vêem impedidas, na prática, de oferecerem serviços além-fronteiras e de se estabelecerem nos Países Baixos por meio de sucursais.

76 Por fim, os referidos acordos têm um impacto apreciável na concorrência e no comércio entre os Estados-Membros. Cada fundo de pensões cobre um sector inteiro da economia. E, como existem acordos desses em virtualmente todos os sectores da economia dos Países Baixos, há que tomar em conta o seu efeito cumulativo.

77 A Comissão, os três Governos que apresentaram observações escritas ao Tribunal de Justiça sobre este ponto e os Fundos que são partes nos processos principais são unânimes em considerar que não há violação do artigo 85._, n._ 1, do Tratado, adiantando uma série de argumentos a favor desta conclusão.

78 Alegam, para começar, que o artigo 85._, n._ 1, do Tratado não é aplicável ratione materiae às convenções colectivas celebradas entre entidades patronais e trabalhadores. Afirmam, a título subsidiário, e segundo o caso, que não há acordo entre «empresas», ou que a concorrência não sofre restrições ou que o comércio entre os Estados-Membros não é afectado ou que, em qualquer caso, atento o princípio de minimis, as referidas convenções não são abrangidas pelo disposto no artigo 85._, n._ 1, do Tratado, porque o seu efeito na concorrência ou nas trocas comerciais é negligenciável.

79 Estes argumentos colocam a questão fundamental da relação entre a proibição contida no artigo 81._, n._ 1, do Tratado e as convenções colectivas firmadas entre entidades patronais e trabalhadores, uma questão que, até à data, o Tribunal de Justiça ainda não teve o ensejo de examinar (21). Em face da relativa novidade desta questão e do potencialmente grande impacto da resposta do Tribunal, poderá ser conveniente analisar a forma como a legislação anti-monopolista dos diferentes Estados-Membros e dos Estados Unidos lidam com o problema.

A - Síntese comparativa

80 Em França, a proibição de formação de cartéis (22) é aplicável às convenções colectivas celebradas entre patrões e trabalhadores. De acordo com o Conseil de la concurrence (Conselho da Concorrência) as convenções colectivas não estão excluídas pela sua natureza do âmbito de aplicação das regras da concorrência. A liberdade de negociação colectiva é encarada como uma mera variação da liberdade contratual, estando sujeita às mesmas limitações gerais que esta, incluindo a proibição de formação de cartéis (23). Os sindicatos dos trabalhadores são vistos como operadores económicos capazes de, em acção concertada com as entidades patronais, influenciarem o jogo da concorrência (24). Contudo, após proceder à análise dos efeitos restritivos, ou à comparação dos elementos anticoncorrenciais que comportavam com os benefícios que representavam no plano social, o Conseil de la concurrence acabou por considerar a maior parte das cláusulas das convenções submetidas à sua apreciação como sendo compatíveis com as regras de concorrência francesas (25).

81 Um bom exemplo dessa linha de raciocínio é um avis (parecer) do Conseil de la concurrence num caso semelhante aos presentes, respeitante ao sistema francês de «prévoyance colective» (26). Este sistema oferece prestações sociais complementares às do sistema estatal de segurança social, e cobre três tipos de riscos: em primeiro lugar, a doença e a maternidade; em segundo lugar, a incapacidade para o trabalho e a invalidez e, em terceiro lugar, a morte. O sistema foi instaurado - pelo menos em parte - por força de convenções colectivas sectoriais celebradas entre os parceiros sociais. Tais convenções designam, inter alia, um «organisme de prévoyance» incumbido, a título exclusivo, da administração dos fundos. Frequentemente, a participação é declarada obrigatória para todo o sector, mediante solicitação conjunta dos parceiros sociais, por decisão do ministro competente.

82 Uma associação de «assureurs-conseils» que desejava oferecer serviços no mercado da «prévoyance» (previdência) reclamou junto da alta autoridade para concorrência das duas últimas características do sistema, ou seja, da exclusividade da parte contratante e da obrigatoriedade de participação de empregadores que não haviam tomado parte no processo de negociação colectiva. O Conseil de la concurrence considerou que os «organismes de prévoyance» eram fornecedores de serviços e, por conseguinte, estavam sujeitos às regras da concorrência. E que, quanto ao teor das convenções colectivas por eles celebradas, tanto o patronato como os trabalhadores estavam, directa ou indirectamente (através dos respectivos representantes) igualmente sujeitos às regras da concorrência. Não obstante, ao designarem um parceiro contratual único, os órgãos representativos das entidades patronais e dos trabalhadores limitaram-se a exercer normalmente o seu direito de escolher o prestador de serviços com o qual desejavam contratar. Quanto ao alargamento da convenção a todo o sector, o Conseil considerou que o mesmo promovia a equiparação das condições de concorrência no sector, contribuindo, simultaneamente, para o progresso económico e social. Logo, não havia infracção às regras de concorrência.

83 Na Finlândia, o artigo 2._, n._ 1, da Laki kilpailunrajoituksista 480/1992 (lei da concorrência) exclui do seu âmbito de aplicação os acordos respeitantes ao mercado de trabalho. De acordo com os trabalhos preparatórios da referida lei, as convenções colectivas em matéria de condições de trabalho escapam, portanto, às regras da concorrência. Ressalva-se, no entanto, a possibilidade de as normas de concorrência serem aplicáveis às convenções colectivas que não versem sobre condições de trabalho mas se refiram, por exemplo, às relações comerciais entre o empregador e os seus clientes (27).

84 O Supremo Tribunal Administrativo finlandês decidiu quanto ao alcance dessa excepção num processo (28) relativo a uma convenção colectiva da indústria do papel que limitava a possibilidade de os empregadores subcontratarem com fornecedores de serviços externos a execução de determinadas tarefas (como, por exemplo, a limpeza) que eram tradicionalmente desempenhadas pelos seus trabalhadores. O Supremo Tribunal Administrativo considerou que somente as cláusulas que afectassem directamente as condições de trabalho, como, por exemplo, as referentes aos salários, duração do trabalho e protecção contra o despedimento, estavam excluídas do campo de aplicação da proibição de formação de cartéis. Por conseguinte, as limitações em questão não se encontravam ao abrigo da excepção. Os trabalhadores já estavam suficientemente protegidos por uma norma legal que proibia o despedimento de trabalhadores em caso de recurso à subcontratação.

85 Na Dinamarca, o artigo 2._, n._ 1, da lei da concorrência (29), recentemente aprovada, estabelece a sua aplicabilidade a todos os tipos de actividade económica. De acordo com os trabalhos preparatórios, a noção de «actividade económica» deve ser entendida em sentido lato, abarcando todas as formas de actividade económica nos mercados de bens ou de serviços. Nem a existência de fins lucrativos, nem uma forma jurídica concreta constituem requisitos para a aplicação da lei.

86 O artigo 3._ dispõe que a lei em causa não é aplicável aos salários e às condições de trabalho. De harmonia com os trabalhos preparatórios, essa excepção fica circunscrita às relações entre empregadores e trabalhadores.

87 Decorre igualmente dos trabalhos preparatórios que a excepção prevista na nova lei deve ser interpretada de acordo com a interpretação dada às leis anteriores sobre os monopólios. Por essa razão, é ainda importante referir um aresto do Supremo Tribunal dinamarquês, proferido em 1965 (30). O Supremo Tribunal foi chamado a pronunciar-se sobre algumas disposições incluídas numa convenção colectiva, de cuja aplicação resultava a exclusão de determinados grupos de consumidores do fornecimento de vestuário fabricado de forma menos onerosa. O Supremo Tribunal entendeu que a excepção em causa não era aplicável, porque a convenção não se limitava a regulamentar salários e condições de trabalho. Além disso, a lei era também aplicável ratione personae aos «parceiros sociais», na medida em que estes lidavam com «interesses económicos deste género». Assim sendo, na Dinamarca a proibição de formação de cartéis aplica-se às regras inseridas em convenções colectivas que «se relacionem com uma actividade económica» e que «não se refiram a salários ou a condições de trabalho».

88 Na Alemanha, a Gesetz gegen Wettbewerbsbeschränkungen (lei federal de protecção contra as restrições à concorrência, a seguir «GWB») exclui certas áreas económicas e alguns acordos do respectivo campo de aplicação material. No entanto, nem o mercado de trabalho nem as convenções colectivas são nela expressamente mencionados.

89 A interdição genérica de formação de cartéis refere-se unicamente a acordos que «forem susceptíveis de influenciar... as condições do mercado relativas ao comércio de bens ou de prestações de serviços profissionais» (31). Segundo os trabalhos preparatórios, o trabalho dependente não cabe na categoria dos «serviços profissionais». Assim, afirma-se que as convenções colectivas entre os parceiros sociais sobre salários e condições de trabalho ficam excluídas da proibição da formação de cartéis (32).

90 Os tribunais e o Bundeskartellamt (Gabinete Federal para os Cartéis) foram chamados, por diversas ocasiões, a apreciarem a legalidade de convenções colectivas celebradas entre os parceiros sociais que influenciavam os horários de abertura dos estabelecimentos comerciais ou, de um modo mais geral, os horários de funcionamento de determinados sectores industriais, quer directamente quer por via indirecta, através da regulamentação de horários de trabalho.

91 O Bundesarbeitsgericht considerou (33) que as convenções colectivas celebradas entre parceiros sociais não relevavam, em princípio, do âmbito de aplicação material das regras de concorrência. As razões aduzidas foram várias. O Bundesarbeitsgericht declarava liminarmente que a contratação colectiva era uma das actividades visadas pela protecção dos direitos fundamentais conferida pelo artigo 9._, n._ 3, da Grundgesetz (Lei Fundamental alemã). Em segundo lugar, que o mercado de trabalho gozava de um estatuto político especial «ordnungspolitsche Sonderstellung». Em terceiro lugar, que as condições de aplicação do primeiro parágrafo da GWB não se mostravam preenchidas: as organizações sindicais não podiam ser qualificadas como empresas na acepção da lei da concorrência, uma vez que não operavam nos mercados de bens e serviços. Assim sendo, as convenções colectivas não eram acordos entre empresas. Consequentemente, os pré-requisitos necessários para a celebração de tais convenções, designadamente a decisão de negociarem colectivamente por parte dos empregadores, deviam igualmente gozar de dispensa da aplicação da legislação antimonopólio. Em quatro lugar, na falta de critérios normativos explícitos, a ponderação dos interesses em jogo revelava-se impossível. E, em quinto lugar, a proibição da formação de cartéis só se aplicaria no caso de concertação abusiva entre empregadores que utilizassem intencionalmente o enquadramento das convenções colectivas para dissimularem a existência de um cartel para atentar contra a concorrência nos mercados de bens e serviços.

92 O Bundeskartellamt chegou a uma conclusão diferente. Num parecer sobre uma convenção colectiva que harmonizava directamente o fim das actividades comerciais ao Sábado e os períodos de férias no sector do comércio grossista (34), o Bundeskartellamt entendeu que tais acordos afectavam directamente os mercados de bens ou de prestações de serviços de carácter comercial e que, portanto, não estavam, a priori, isentos da aplicação do artigo 1._ da GWB, fazendo a destrinça entre esses acordos e os que se limitavam a regulamentar a duração do trabalho.

93 Numa segunda ocasião, o Bundeskartellamt foi ainda mais longe (35). As entidades patronais e os trabalhadores do sector retalhista haviam acordado entre si a adopção de horários de trabalho harmonizados que, indirectamente, impediam os proprietários das lojas de abrirem após uma dada hora. O Bundeskartellamt considerou que a regulamentação da duração do trabalho mediante negociação colectiva constituía um caso especial, devido à sua natureza dualista. Por um lado, as horas de abertura constituíam um factor de concorrência significativo no sector retalhista. As organizações sindicais e as entidades patronais influenciaram de forma indirecta, mas eficaz, a actividade das empresas de mão-de-obra nos mercados de bens e serviços, tendo-se, por conseguinte, envolvido numa actividade económica. Por outro lado, a negociação colectiva gozava da tutela dos direitos fundamentais, na medida em que se referia a condições de trabalho. Neste caso excepcional e específico de conflito, somente a ponderação dos interesses envolvidos poderia conduzir a uma solução aceitável. No caso em análise, o interesse da concorrência tinha de prevalecer.

94 O Kamergericht Berlin, pronunciando-se em segunda instância (36) precisamente sobre as mesmas cláusulas de regulamentação da duração do trabalho que já haviam sido objecto de comentário por parte do Bundeskartellamt (37), adoptou uma terceira linha de raciocínio. Considerou que nem as convenções colectivas, nem as partes signatárias das mesmas se encontravam, a priori, excluídas do âmbito de aplicação da legislação da concorrência alemã. Reconhecia no entanto que, face ao disposto no artigo 1._ da GWB, as convenções colectivas respeitantes a condições de trabalho e salários eram normalmente lícitas, uma vez que não era provável que as mesmas afectassem as «condições de mercado relativas ao comércio de bens ou de serviços de carácter comercial». Quanto às convenções colectivas especificamente em causa, a sua influência indirecta, mas real, sobre as horas de abertura do mercado de bens levava, em princípio, a uma violação da proibição de formação de cartéis. No entanto, as convenções relativas à duração do trabalho constituíam o cerne («im Kernbereich») do direito fundamental alemão de contratação colectiva. Tais convenções estão totalmente excluídas das interdições contidas em leis ordinárias.

95 No Reino Unido, e nos termos do Fair Trading Act 1973 (lei de protecção contra a concorrência desleal) o Secretary of State podia submeter as práticas laborais restritivas à apreciação da Monopolies and Mergers Commission (Comissão dos Monopólios e Fusões), para esta avaliar as suas repercussões no interesse público. Até há pouco tempo, tal faculdade nunca havia sido utilizada: no Reino Unido existe a tradição de não se invocar o direito da concorrência para lidar com questões de direito do trabalho (38). O primeiro processo remetido à Monopolies and Mergers Commission ao abrigo do Fair Trading Act data de 1988, referia-se a práticas laborais na indústria televisiva e cinematográfica. A Monopolies and Mergers Commission concluiu que as práticas em questão não tinham efeitos contrários ao interesse público (39). A situação não parece ser substancialmente diferente na vigência do novo Competition Act (lei da concorrência), de 1998, cujas disposições se inspiraram, em larga medida, nos artigos 85._ e 86._ do Tratado.

96 Nos Estados Unidos, as actividades sindicais estão, em princípio, excluídas da proibição de formação de cartéis contida no artigo 1._ do Sherman Act (Lei Sherman) (40), na sequência da não-aplicabilidade das regras de concorrência às relações laborais («labor exemption») que resulta, por um lado, da lei («statutory exemption») e, por outro, da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal («non-statutory exemption»). No entanto, estas excepções são de alcance limitado.

97 Quanto à isenção «legal», o Congresso norte-americano promulgou, já em 1914, o Clayton Act (Lei Clayton) com o objectivo de excluir da legislação antimonopólio os actos unilaterais levados a cabo pelos sindicatos no decurso de conflitos laborais. Esta lei estabelecia, inter alia, que «the labour of a human being is not a commodity or article of commerce» (o trabalho de um ser humano não é uma mercadoria nem um objecto de comércio). Como a intenção do legislador se viu parcialmente frustrada pela interpretação restritiva do Clayton Act efectuada pelos tribunais federais (41), o Congresso aprovou, em 1932, o Norris-La Guardia Act (Lei Norris La-Guardia), que se destinava a largar o âmbito da anterior isenção. No caso United States v. Hutcheson (42), o Supremo Tribunal Federal definiu as três condições de aplicação desta isenção. Primeiramente, é necessário que se esteja em presença de um conflito laboral. Em segundo lugar, o sindicato deve actuar em defesa dos seus próprios interesses («self-interest»). E, por último, o sindicato não deve estar a agir em conluio com grupos não ligados ao interesse dos trabalhadores, isto é, com o patronato.

98 Embora a isenção legal não abrangesse os acordos entre as organizações sindicais e as entidades patronais, o Supremo Tribunal Federal reconheceu, em jurisprudência posterior, a existência de uma isenção sem carácter legal, se bem que limitada, em princípio, às convenções respeitantes a salários e condições de trabalho. No caso Connell (43) o Supremo Tribunal Federal dos Estados Unidos declarou:

«The non-statutory exemption has its source in the strong labour policy favouring the association of employees to eliminate competion over wages and working conditions. Union success in organising wokers and standardising wages ultimately will affect price competition among employers, but the goals of federal labour law never could be achieved if these effects on business competition were held a violation of the antitrust laws. The Court therefore has acknowledged that labour policy requires tolerance for the lessening of business competition based on diferences in wages and working conditions... Labour policy clearly does not require, however, that a union have freedom to impose direct restraints on competition among those who employ its members. Thus, while the statutory exemption allows unions to accomplish some restraints by acting unilaterally..., the non-statutory exemption offers no similar protection when a union and a non-labour party agree to restrain competition in a business market.»

(«A isenção legal tem origem numa política laboral forte, que promove a associação do trabalhadores com vista a eliminar a concorrência no domínio dos salários e das condições de trabalho. O êxito obtido pelos sindicatos na organização dos trabalhadores e na uniformização dos salários acabará por afectar a concorrência de preços entre os empregadores, mas os fins que a legislação laboral se propõe jamais seriam atingidos se esses efeitos no jogo da concorrência entre as empresas fossem considerados como uma violação da legislação antimonopólio. Por essa razão, o Tribunal reconheceu que a política laboral requer uma atitude tolerante no que respeita à diminuição da concorrência empresarial baseada nas diferenças de salários e de condições de trabalho... Contudo, os imperativos da política laboral não conferem aos sindicatos liberdade para imporem directamente restrições à concorrência entre as empresas que empregam os seus membros. Portanto, se a isenção legal autoriza os sindicatos a implementar certas restrições ao agirem de forma unilateral..., já a isenção sem carácter legal não oferece semelhante protecção quando um sindicato e uma parte não ligada ao interesse dos trabalhadores concordam em restringir a concorrência num mercado de bens ou serviços.»)

99 Seria útil examinar brevemente três decisões importantes do Supremo Tribunal Federal dos Estados Unidos relativas ao alcance da isenção cuja génese não é a lei.

100 O processo United Mine Workers of America v. Pennington (44) referia-se a um alegado conluio entre as organizações sindicais e as grandes empresas do sector do carvão tendente a impor, inter alia, os níveis de salários estabelecidos por convenção colectiva a todos os operadores do sector, independentemente da respectiva capacidade financeira para os suportar, com o intuito de forçar os empregadores de menor dimensão a abandonarem a actividade.

101 A maioria dos juízes (6 votos a favor, 3 contra) considerou que tal comportamento não devia ficar imune à aplicação da legislação antimonopólio. A isenção legal não era aplicável ao caso, uma vez que existia um acordo entre um sindicato e alguns patrões. Uma convenção colectiva relativa aos preços de venda do carvão constituiria, manifestamente, uma violação das regras de concorrência. Pelo contrário, os salários encontravam-se no âmago das negociações colectivas entre os sindicatos e as entidades patronais. Por isso, o efeito no mercado de produtos decorrente da eliminação da concorrência baseada nos salários entre os empregadores reunidos para negociar convenções colectivas sobre essa matéria não constituía, em princípio, o tipo de restrições que o Congresso pretendia interditar ao adoptar o Sherman Act «[not] the kind of restraint Congress intended the Sherman Act to proscribe». Portanto, os sindicatos tinham o direito de celebrar acordos salariais com um grupo de entidades patronais negociando em conjunto e procurar obter, no seu próprio interesse e não por acordo com todos ou parte das entidades patronais desse agrupamento, os mesmos níveis de salários junto de outros empregadores. Contudo, «um grupo de empregadores não pode conluiar-se para eliminar concorrentes da indústria e o sindicato é solidariamente responsável com os esses empregadores se tomar parte num conluio» «one group of employers may not conspire to eliminate competitors from the industry and the union is liable with the employers if it becomes a party to the conspiracy». Daí que o alegado acordo entre o sindicato e os grandes produtores de carvão com vista a garantir a uniformização das normas laborais no conjunto do sector não pudesse beneficiar da isenção da aplicação da legislação antimonopólio.

102 O processo Meat Cutters v. Jewel Tea Co. (45), julgado no mesmo dia, referia-se ao horário de funcionamento dos estabelecimentos comerciais. Um sindicato local que representava praticamente todos os talhantes da zona concluiu um acordo com uma associação comercial de retalhistas do sector da alimentação no sentido de os balcões de venda de carne desses estabelecimentos só estarem abertos de segunda a sábado, das 9 horas às 18 horas. Confrontada com uma ameaça de greve no caso de não concordar com tais condições, uma das entidades patronais subscreveu o acordo e em seguida instaurou uma acção judicial contra o sindicato, pedindo a anulação do acordo nos termos do Sherman Act.

103 A maioria dos juízes (6 votos a favor, 3 contra) considerou que as normas antimonopólio não eram aplicáveis, mas discordaram da fundamentação que conduziu a essa conclusão. Três dos juízes da maioria defenderam que a restrição do horário de funcionamento estava tão intimamente relacionada com os salários, a duração e as condições de trabalho que uma negociação da mesma, conduzida em condições normais de concorrência e de boa-fé, estava excluída da aplicação do Sherman Act. Os outros três juízes da maioria, cujas opiniões haviam divergido no processo Pennington, afirmaram que a contratação colectiva referente a matérias que obrigatoriamente são objecto de negociação ao abrigo das leis do trabalho não estava, pela sua própria natureza, subordinada à legislação antimonopólio. Defenderam, em primeira linha, que os juízes eram obrigados a respeitar o espírito da lei, e que nenhum critério normativo possibilitava ao juiz incumbido de julgar um caso de concorrência distinguir entre convenções colectivas úteis ou prejudiciais àquela.

104 A minoria foi de parecer que o acordo respeitava directamente ao mercado dos produtos em causa e que, nessa medida, não apresentava nenhuns efeitos benéficos para a concorrência, pelo que era proibido pelo Sherman Act.

105 Em decisão recente, proferida no processo Brown v. Pro Football (46), o Supremo Tribunal dos Estados Unidos viu-se confrontado com uma situação na qual, tendo-se verificado um impasse no processo de negociação colectiva, as entidades patronais, actuando de forma concertada e unilateral, impuseram aos seus trabalhadores determinadas condições de trabalho. O caso referia-se às circunstâncias, um tanto excepcionais, das negociações entre a National Football League (Liga de Futebol nacional) e o sindicato dos futebolistas.

106 A maioria dos juízes (8 votos a favor, 1 contra) considerou que a isenção por via não legislativa escudava os acordos celebrados após o falhanço das negociações entre várias entidades patronais com o objectivo de fazer vigorar as condições constantes da última proposta em matéria de salários por eles formulada de boa-fé, no pressuposto de que tal conduta pertencia indubitavelmente ao domínio do direito do trabalho e da política laboral. Essa maioria sustentou, em primeiro lugar, que a negociação envolvendo uma multiplicidade de entidades patronais constituía um método bem assente, importante e generalizado de contratação colectiva, apresentando vantagens tanto para o patronato como para os trabalhadores. Em segundo lugar, submeter a prática em questão à legislação antimonopólio significava, na prática, pedir aos tribunais incumbidos de julgar acções no domínio da concorrência que dessem resposta a uma série de importantes questões práticas sobre a forma como as negociações colectivas das condições de trabalho deveriam ser conduzidas - o que era precisamente o que a «exclusão da matéria laboral» procurava evitar. E, em terceiro lugar, admitir uma responsabilização no domínio da concorrência ameaçava engendrar instabilidade e incerteza nos processos de negociação colectiva.

107 Segundo a opinião discordante expressa pelo Juiz Stevens, nem as políticas subjacentes à legislação laboral e à legislação antimonopólio nem a finalidade da isenção estabelecida por via jurisprudencial forneciam justificação bastante para que as acções colectivas da iniciativa dos empregadores para baixarem os salários para um nível inferior ao que teria sido atingido num mercado livre ficassem isentas de apreciação à luz do direito da concorrência.

108 Podemos resumir as conclusões desta síntese comparativa como segue:

109 Em todos os sistemas examinados as convenções colectivas entre parceiros sociais estão, em certa medida, excluídas da interdição de formação de cartéis anticoncorrenciais. No entanto, essa exclusão não é ilimitada.

110 Os fundamentos legais dessa isenção e os mecanismos jurídicos do seu reconhecimento diferem largamente. Assim, deparamos com:

- o primado do direito fundamental de contratação colectiva (Alemanha);

- uma disposição expressa de isenção contida na legislação antimonopólio ou noutras leis (Dinamarca, Finlândia, isenção legal nos Estados Unidos);

- elaboração jurisprudencial (isenção por via jurisprudencial nos Estados Unidos);

- a exigência de determinado requisito para que se verifique a violação da proibição da formação de cartéis, que normalmente não está presente nos acordos em questão (Alemanha);

- a aplicação das condições gerais de violação da proibição de formação de cartéis de forma que conduzem ao resultado pretendido (França);

- a prática tradicional de não aplicar as regras de concorrência às relações laborais (Reino Unido).

111 O alcance da isenção também varia. Contudo, os tribunais colocam-se frequentemente as seguintes questões:

- As convenções em análise dizem respeito a salários, duração ou outras condições de trabalho que constituem a essência da negociação colectiva?

- Em que medida esses acordos afectam os mercados de bens e serviços em que os empregadores em causa operam?

- Em que medida é que esses acordos afectam terceiros? Os terceiros passíveis de serem afectados são empresas que exerçam a sua actividade no mesmo mercado que não foram partes na negociação, as empresas que operam noutros mercados, e os consumidores.

- O objectivo desses acordos é prejudicar a concorrência?

- Será melhor aplicar normas rígidas e de aplicação imediata, ou proceder a uma análise comparativa casuística dos interesses em conflito?

112 É neste quadro que passarei a analisar o artigo 85._, n._ 1, do Tratado. Examinarei sucessivamente a aplicabilidade ratione materiae do 85._, n._ 1, do Tratado, em primeiro lugar, depois a questão de saber se houve acordo ou prática concertada entre empresas e, finalmente, a questão de saber se esses acordos ou práticas concertadas restringem significativamente a concorrência.

B - Aplicabilidade ratione materiae do artigo 85._, n._ 1, do Tratado CE

113 De acordo com os Fundos e os Governos neerlandês, francês e sueco, o artigo 85._, n._ 1, do Tratado não é, em princípio, aplicável ratione materiae às convenções colectivas sobre pensões celebradas entre associações patronais e sindicais. Os argumentos por eles aduzidos podem resumir-se da forma seguinte:

114 Para começar, estas convenções têm por objecto matéria social e promovem os objectivos sociais visados pelo Tratado. A aplicabilidade do artigo 85._, n._ 1, do Tratado comprometeria a realização destes objectivos.

115 Em segundo lugar, a aplicação do artigo 85._, n._ 1, do Tratado iria privar os parceiros sociais do seu direito fundamental de negociação colectiva, reconhecido por diversos instrumentos internacionais e europeus.

116 E, em terceiro lugar, a aplicabilidade do artigo 85._, n._ 1, do Tratado seria incompatível com diversas disposições do direito comunitário que encorajam e promovem expressamente a negociação colectiva entre os representantes do patronato e os dos trabalhadores.

117 Tais argumentos suscitam duas questões distintas, que passarei a examinar separadamente.

118 O primeiro argumento prende-se com o objecto destas convenções. Coloca a questão de saber se um dado acordo, independentemente da forma que reveste, foge ao campo de aplicação das regras de concorrência porque se refere a questões de ordem social, tais como condições de trabalho ou pensões, e porque visa um objectivo social. Dito de outra forma, existirá, no direito comunitário da concorrência, uma excepção generalizada em benefício do domínio social?

119 O segundo e terceiro argumentos referem-se ao quadro em que tais acordos são concluídos. Colocam a questão, mais limitada, de saber se as convenções colectivas celebradas entre parceiros sociais gozam de estatuto especial em termos de direito comunitário, daí resultando que, por princípio, o disposto no artigo 85._, n._ 1, do Tratado não lhes seja aplicável. Existirá uma excepção para a negociação colectiva entre parceiros sociais?

1. Existirá uma excepção genérica em favor do domínio social?

120 O artigo 85._, n._ 1, do Tratado faz parte de um «regime que garanta que a concorrência não seja falseada no mercado interno» o que, segundo o enunciado do artigo 3._, alínea g) do Tratado, constitui uma das linhas de acção da Comunidade.

121 O mesmo artigo 3._, alínea i) dispõe que nas actividades da Comunidade se incluirá «uma política social». O artigo 2._ do Tratado define como missão da Comunidade, inter alia, «promover... o desenvolvimento harmonioso e equilibrado das actividades económicas» e «um elevado nível de emprego e de protecção social».

122 Os Fundos defendem que resulta destas disposições que o domínio social não está sujeito às regras de concorrência. Devido às especificidades deste sector, as leis que regem a concorrência não podem, nem devem, interferir. Os Fundos argumentam que as convenções colectivas celebradas entre associações patronais e sindicais visam a promoção dos objectivos sociais do Tratado. Assim sendo, fazem parte do domínio social, o qual, em princípio, não está subordinado aos artigos 85._ e 86._ do Tratado.

123 Não partilho desta opinião. Tem sido jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que «quando o Tratado entendeu subtrair certas actividades à aplicação das regras de concorrência, previu uma derrogação expressa para esse efeito» (47): tal é o caso da produção e comercialização dos produtos agrícolas, por força do artigo 42._, n._ 1, da produção ou do comércio de equipamentos para fins militares, por força do artigo 223._, n._ 1, alínea b), e, em medida circunscrita, o de certas empresas, por força do artigo 90._, n._ 2, do Tratado.

124 Quanto aos assuntos sociais, não existe no Tratado qualquer disposição que, como acontece com o seu artigo 42._, exclua expressamente a aplicação das regras de concorrência ou a condicione a uma decisão do Conselho.

125 Além do mais, o Tribunal de Justiça tem sustentado inequivocamente a aplicabilidade das regras de concorrência comunitárias a um certo número de outros sectores «especiais» que, em determinados Estados-Membros, não relevam do campo de aplicação das respectivas regras de concorrência. A aplicabilidade das regras de concorrência a esses sectores tem sido frequentemente posta em causa, com base em argumentos fundamentados nas características especiais dos sectores em questão e nas contradições entre os objectivos políticos enunciados no artigo 3._ do Tratado.

126 No entanto, o Tribunal de Justiça tem rejeitado sistematicamente tais argumentos e aplicado o disposto nos artigos 85._ e 86._ do Tratado a sectores como os dos transportes (48), energia (49), banca (50) e seguros (51), baseando-se em que existem outros mecanismos, tais como as isenções previstas no artigo 85._, n._ 3, do Tratado, através das quais a legislação comunitária relativa à concorrência permite que se tomem em conta as particularidades de determinados ramos da actividade económica (52). Nesses casos, o Tribunal de Justiça não adoptou o parecer de que a existência de objectivos políticos conflituantes - como acontece, por exemplo, entre as alíneas f) (política comum no domínio dos transportes) e a alínea t) (medidas comunitárias no domínio da energia), ambas do artigo 3._ do Tratado - excluísse, por si só, a aplicação das regras de concorrência aos sectores em causa. O simples facto de a Comunidade prosseguir determinada política numa área económica não subtrai esta última à aplicação das regras de concorrência.

127 Além disso, e esta observação reveste-se de especial relevância nos casos vertentes, o Tribunal de Justiça já aceitou, numa série de decisões importantes, o princípio da aplicação das regras de concorrência ao domínio social, particularmente nas áreas do emprego e das pensões. Assim, o Tribunal reconheceu este princípio no tocante aos mercados de trabalho nos acórdãos Höfner e Elser (53) e Job Centre (54) e, a propósito das pensões, nos acórdãos Poucet e Pistre (55) e Fédération française des sociétés d'assurances (a seguir «FFSA») (56). Será necessário examinar ulteriormente estes casos de forma mais completa. Por enquanto bastará salientar que, ao debruçar-se sobre a questão de saber se os organismos em causa deveriam ser qualificados como empresas na acepção dos artigos 85._ e 86._ do Tratado, o Tribunal reconheceu implicitamente que as regras de concorrência se aplicavam ratione materiae a essas áreas. Mais recentemente, no acórdão Sodemare e o., e sem chegar, sequer, a analisar a questão de saber se organismos sem fins lucrativos que se dediquem a actividades de cuidados de saúde deveriam ser qualificados como empresas, aplicou simplesmente as regras de concorrência e concluiu que não tinha existido acordo, na acepção do artigo 85._, n._ 1, do Tratado (57).

128 O acórdão García e o., invocado em especial pelo Governo francês, não veio contradizer tal conclusão (58). Em causa estava a aplicabilidade ratione personae da terceira directiva sobre o seguro não vida (59), que se baseia nas regras da liberdade de estabelecimento e da livre prestação dos serviços. O Tribunal de Justiça considerou que o artigo 2._, n._ 2, da directiva devia «ser interpretado no sentido de que regimes de segurança social, como os que estão em causa nos processos principais, estão excluídos do âmbito de aplicação da Directiva 92/49».

129 Contrariamente às alegações do Governo francês, o n._ 14 desse acórdão trata do âmbito de aplicação pessoal da directiva em questão, i.e., os organismos aos quais a directiva se aplica, não se referindo à aplicabilidade das regras de concorrência ao domínio social. O Tribunal de Justiça, ao referir-se ao raciocínio seguido no acórdão Poucet e Pistre, já referido, limitou-se a relembrar a sua jurisprudência relativa à aplicabilidade ratione personae das regras de concorrência a certas instituições que fornecem prestações sociais. Além do mais, o n._ 12 do acórdão confirma que o Tribunal aderiu à tese defendida nos acórdãos Poucet e Pistre e FFSA, já referidos. Conforme já tive ocasião de explicar, esta tese parte do princípio de que o domínio das pensões e outras prestações sociais não está, ipso facto, excluídas do âmbito material das regras de competição.

130 Consequentemente, em minha opinião não existe uma excepção generalizada que subtraia o domínio social, no seu todo, ao âmbito de aplicação das regras de concorrência (60).

2. Existe alguma excepção em relação às convenções colectivas celebradas entre parceiros sociais?

131 Como já fiz notar, são dois os argumentos avançados em defesa da opinião de que as convenções colectivas celebradas entre parceiros sociais deveriam gozar de um estatuto especial. O primeiro desses argumentos baseia-se num alegado direito fundamental de negociação colectiva e o segundo no facto de o próprio direito comunitário incentivar a celebração de tais acordos.

a) Existirá um direito fundamental de negociação colectiva?

132 Os Fundos de pensões, os Governos francês e neerlandês e a Comissão sustentam que a existência de um direito fundamental de negociação colectiva na ordem jurídica comunitária deriva de um certo número de instrumentos jurídicos internacionais. Aplicar o artigo 85._, n._ 1, do Tratado a estes acordos, afirmam, equivaleria a privar os parceiros sociais desse direito fundamental.

133 Será que a ordem jurídica comunitária contempla, efectivamente, um tal direito fundamental? Eis uma questão da maior importância, uma vez que, a existir um tal direito, qualquer intervenção que atente contra a própria substância desse direito, ainda que no interesse geral, poderia ser ilegal (61).

134 Para efeitos de análise, farei a distinção entre três direitos: primeiro, o direito de os indivíduos formarem organizações sindicais ou patronais e a elas aderirem; segundo, o direito genérico de uma associação sindical ou patronal de empreender uma acção colectiva tendente a proteger os seus interesses profissionais; e, por fim, o direito específico que está em causa nos casos de que ocupamos - o direito de negociação colectiva das associações sindicais e patronais.

135 E, embora o Tratado CE - como veremos mais adiante - incentive a negociação colectiva, não contempla expressamente nenhum dos três direitos acima referidos.

136 Nos termos da Carta Comunitária dos Direitos Sociais Fundamentais dos Trabalhadores (62), empregadores e trabalhadores terão o direito de se filiarem em organizações profissionais ou sindicais «para a defesa dos seus direitos económicos e sociais» (artigo 11._). Cada um dos parceiros sociais terá «o direito de negociar e de celebrar convenções colectivas, nas condições previstas nas legislações e nas práticas nacionais» (artigo 12._). Assim sendo, os três «direitos» acima referidos estão abrangidos pela Carta.

137 Os efeitos jurídicos da Carta são, contudo, muito limitados. Com efeito, esta não representa um acto jurídico da Comunidade, mas tão somente uma declaração política solene adoptada pelos Chefes de Estado ou de Governo de onze dos então doze Estados-Membros, e não foi publicada no Jornal Oficial. No Acordo relativo à Política Social anexo ao Tratado da União Europeia, os mesmos onze Estados que adoptaram a Carta não quiseram conferir eficácia jurídica aos direitos aos quais haviam dado o seu apoio político na Carta.

138 A jurisprudência do Tribunal de Justiça fornece mais indicações quanto à questão geral do reconhecimento ou não, pelo direito comunitário, de algum dos três direitos acima mencionados. O Tribunal tem constantemente defendido que «os direitos fundamentais são parte integrante dos princípios gerais de direito cujo respeito é assegurado pelo Tribunal de Justiça. Para este efeito, o Tribunal de Justiça inspira-se nas tradições constitucionais comuns aos Estados-Membros, bem como nas indicações fornecidas pelos instrumentos internacionais para a protecção dos direitos do homem nos quais os Estados-Membros cooperam ou a que aderem» (63). A esse respeito «a Convenção Europeia dos Direitos do Homem reveste-se de um significado particular» (64).

139 No acórdão Union Syndicale e o. (65), o Tribunal de Justiça declarou: «A liberdade sindical reconhecida pelo artigo 24._-A do Estatuto dos Funcionários significa, à luz dos princípios gerais do direito do trabalho, que não somente os funcionários e agentes têm o direito de se constituir livremente em associações segundo a sua escolha, como essas organizações são livres de praticar tudo o que for lícito para a defesa dos interesses profissionais dos seus membros». Assim sendo, pode dizer-se que o Tribunal reconheceu, em primeiro lugar, o direito individual de associação e filiação e, depois, o direito de agir colectivamente. O carácter fundamental destes dois direitos foi confirmado no acórdão Bosman e o., já referido, quanto à liberdade de associação em geral (66) e no acórdão Maurissen e o./Tribunal de Contas (67) quanto às organizações sindicais. Permanece por decidir a questão de saber se existe um terceiro direito fundamental específico de negociação colectiva.

140 Passarei a examinar em seguida os instrumentos jurídicos internacionais invocados pelos Fundos, por determinados Estados-Membros e pela Comissão.

141 A Comissão, em particular, defende que o direito de negociação colectiva em matéria de salários e outras condições de trabalho é um direito fundamental garantido pelo artigo 11._ da Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, (a seguir «Convenção Europeia dos Direitos do Homem»), pelo artigo 6._ da Carta Social Europeia, pelo artigo 22._ do Pacto Internacional relativo aos Direitos Civis e Políticos, pelo artigo 8._ do Pacto Internacional relativo aos Direitos Económicos, Sociais e Culturais, e ainda pelas Convenções n.os 87 e 98 da Organização Internacional do Trabalho.

142 No entanto, a análise dos instrumentos jurídicos internacionais pertinentes não permite apoiar esta afirmação.

143 Tomando em consideração, em primeiro lugar, a Convenção Europeia dos Direitos do Homem, constatamos que o direito essencial que a mesma garante (no seu artigo 11._) é o direito de qualquer pessoa fundar e filiar-se em sindicatos. Esse direito é igualmente reconhecido pela Carta Social Europeia (artigo 5._), pelo Pacto Internacional relativo aos Direitos Civis e Políticos (artigo 22._), pelo Pacto Internacional relativo aos Direitos Económicos, Sociais e Culturais (artigo 8._), e ainda pela Convenção sobre a Liberdade Sindical e a Protecção do Direito Sindical e pela Convenção sobre o Direito de Organização e de Negociação Colectiva, ambas adoptadas no quadro da Organização Internacional do Trabalho.

144 Quanto ao direito dos sindicatos de recorrerem à acção colectiva, o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem baseou-se na expressão «para a defesa dos seus interesses» consagrada no n._ 1 do artigo 11._ da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, para sustentar que a liberdade sindical abrangia os direitos que eram «indispensáveis para o exercício efectivo da liberdade de associação» ou que constituíam «elementos essenciais» desta (68). Logo, o artigo 11._ também «protege a liberdade de defender os interesses profissionais dos aderentes de um sindicato mediante a acção colectiva deste, cuja condução e desenvolvimento os Estados-Membros devem, simultaneamente, autorizar e tornar possível» (69).

145 Contudo, este enunciado aparentemente lato parece referir-se apenas a um núcleo de actividades essenciais. Até ao momento, o único direito expressamente reconhecido pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem foi o de ser «ouvido» pelo Estado (70). Por outro lado, os sindicatos não têm o direito de ser consultados pelo Estado (71), nem o Estado é obrigado a celebrar convenções colectivas (72), nem o disposto no artigo 11._ implica necessariamente o direito à greve, quando os interesses dos seus membros podem ser defendidos por outros meios (73).

146 Quanto ao direito de negociação colectiva, e contrariamente às alegações dos Fundos, da Comissão e dos Governos acima mencionados, apenas o artigo 6._ da Carta Social Europeia parece reconhecer expressamente a sua existência. Contudo, o simples facto de um direito estar incluído na Carta não implica o seu reconhecimento universal como um direito fundamental. A Carta apresenta uma estrutura tal que os direitos a que faz menção representam mais objectivos políticos do que direitos susceptíveis de execução coerciva, e os Estados signatários só ficam obrigados a escolher, de entre os direitos enunciados na mesma, aqueles que se comprometem a proteger.

147 O artigo 4._ da Convenção sobre a Liberdade Sindical e a Protecção do Direito Sindical, cuja redacção foi cuidada, impõe aos Estados Contratantes a obrigação de «encorajar e promover» a negociação colectiva. Não confere qualquer direito.

148 Na jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem há uma significativa omissão de qualquer referência ao direito de negociação colectiva. A título de exemplo, no acórdão Sindicato sueco dos condutores de locomotivas/Suécia, já referido, a maioria dos membros da Comissão Europeia dos Direitos do Homem exprimiu-se a favor do reconhecimento do direito de negociação colectiva aos sindicatos. O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem entendeu que não tinha de se pronunciar sobre essa questão porque, segundo afirmou, tal direito não estava em causa e a legislação nacional já reconhecia esse direito ao requerente (74). Desde então, nunca mais o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem reconheceu expressamente a existência do referido direito. Pelo contrário, está patente que o referido tribunal tem mesmo relutância em fazê-lo.

149 Tal relutância é-nos sugerida, antes de mais, pela interpretação que o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem faz do artigo 6._ da Carta Social Europeia. Quanto ao n._ 1 do artigo 6._, que obriga os Estados «a favorecer a discussão paritária entre trabalhadores e entidades patronais», este Tribunal declarou que «a prudência dos termos utilizados demonstra que a Carta não contempla um genuíno direito de consulta» (75). No que se refere ao n._ 2 do artigo 6._, que obriga os Estados «a promover, quando tal for necessário e útil, a instituição de processos de negociação voluntária entre as entidades patronais..., de um lado, e as organizações sindicais, de outro», o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem considerou que «a prudência demonstrada na redacção... demonstra que a Carta não contempla um genuíno direito à celebração de tais convenções» (76).

150 Em segundo lugar, o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem tem constantemente sublinhado que «a liberdade sindical representa tão somente um aspecto particular da liberdade de associação», «não garantindo [o artigo 11._] um tratamento especial concreto dos sindicatos por parte do Estado» (77).

151 Finalmente, reveste algum interesse o acórdão Gustafsson/Suécia (78). O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem foi chamado a dirimir um litígio entre um sindicato e um empregador que se recusava a participar no processo de negociação colectiva no seu sector. O sindicato recorreu a boicotes e a outras medidas como forma de pressão para o levar a juntar-se aos empregadores signatários de uma convenção colectiva sectorial. A entidade patronal em questão objectou que a participação compulsória numa convenção colectiva equivalia, na prática, a uma obrigação de aderir a uma associação patronal. Assim sendo, em sua opinião o Governo sueco deveria ter intervindo para proteger a sua liberdade negativa de não aderir a uma associação patronal.

152 Será interessante considerar em primeiro lugar dois pareceres discordantes.

153 No seu parecer parcialmente discordante, oito juízes argumentaram que, na realidade, a pretensão do empregador não assentava na sua liberdade negativa de não aderir a uma associação, mas na sua liberdade negativa de não contratar colectivamente. Os juízes interpretaram a jurisprudência anterior do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem no sentido de que «o direito de negociação colectiva não constituía um elemento inerente à liberdade de associação». Por isso, em sua opinião, o artigo 11._ não era, de forma nenhuma, aplicável ao caso (79).

154 Dois outros juízes vencidos adoptaram o ponto de vista contrário, considerando que o direito de negociação colectiva constituía um elemento inerente à liberdade sindical, pelo que o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem deveria ter enveredado por uma ponderação entre o direito positivo à negociação colectiva dos sindicatos e o direito negativo do empregador de não se ver envolvido em tal processo contra a sua vontade (80).

155 Ambos os pareceres coincidiram ao insistir em que o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem se deveria ter pronunciado em definitivo sobre a existência de tal direito.

156 Em vez disso, a maioria dos juízes do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem optou por uma terceira solução. Relativamente às actividades sindicais considerou que «atento o carácter melindroso das questões sociais e políticas suscitadas pela busca de um justo equilíbrio entre os interesses em causa..., e considerando as importantes divergências que os sistemas jurídicos nacionais apresentam nesse domínio específico, é conveniente que os Estados Contratantes gozem de uma ampla margem de apreciação na escolha dos meios a empregar» (81). O acórdão limita-se depois a salientar que o Tribunal não via «razão para duvidar que as medidas tomadas pelo sindicato visavam finalidades legítimas, compatíveis com o disposto no artigo 11._ da Convenção». Prosseguia afirmando que «neste contexto deve recordar-se que a legitimidade da negociação colectiva é reconhecida por diversos instrumentos internacionais» (82). Parece, pois, que este tribunal teve o cuidado de evitar concluir que a Convenção garante o direito de negociação colectiva.

157 Esta análise leva-me a formular as seguintes conclusões, relativamente ao reconhecimento de um direito de negociação colectiva pelo direito comunitário.

158 A ordem jurídica comunitária protege o direito de constituição e adesão a organizações sindicais e patronais, que está no cerne da liberdade de associação.

159 Em minha opinião, o direito de empreender um acção colectiva com vista à defesa dos interesses profissionais, na medida em que seja indispensável para o exercício da liberdade de associação, também está tutelado pelo direito comunitário.

160 No entanto, não é possível afirmar que exista convergência suficiente entre as ordens jurídicas nacionais e os instrumentos jurídicos internacionais quanto ao reconhecimento de um direito fundamental específico de negociação colectiva.

161 Além disso a negociação colectiva está, em meu entender, e como qualquer outra negociação entre operadores económicos, suficientemente protegida pelo princípio geral da liberdade contratual. Por conseguinte, torna-se desnecessário um direito fundamental mais específico para esse fim. Em todo o caso, poder-se-ia sustentar que as restrições justificadas ao alegado direito de negociação colectiva seriam idênticas às restrições à liberdade contratual.

162 A este respeito pode também recordar-se que, na jurisprudência referente à liberdade de circulação dos trabalhadores e à igualdade de salários, o Tribunal de Justiça examina regularmente a questão de saber se as cláusulas das convenções celebradas entre os parceiros sociais infringem as disposições comunitárias que proíbem a discriminação em razão da nacionalidade (83) ou do sexo (84). Isso poderia ser encarado como uma aplicação da regra geral de que se podem impor restrições ao exercício de um direito fundamental, na condição de essas restrições corresponderem efectivamente a objectivos de interesse geral prosseguidos pela Comunidade e não constituírem, relativamente ao objectivo prosseguido, uma intervenção excessiva e intolerável que atente contra a própria substância dos direitos assim garantidos (85). É indubitável que, nos casos vertentes, o artigo 85._, n._ 1, do Tratado prossegue um objectivo fundamental do Tratado, designadamente a criação de um regime que garanta que a concorrência não seja falseada no mercado interno [artigo 3._, alínea g)].

163 Destas considerações decorre que, embora o patronato e os trabalhadores sejam, em princípio, livres de celebrar os acordos que entendam, devem, como qualquer outro agente económico, respeitar as limitações impostas pelo direito comunitário. O simples reconhecimento de um direito fundamental de negociação colectiva não seria, portanto, suficiente para subtrair a contratação colectiva à aplicabilidade das regras de concorrência.

164 No entanto, resulta também claramente da análise que precede a existência de um consenso, a nível internacional, quanto ao carácter legítimo e socialmente desejável de que se reveste a contratação colectiva.

165 Isto leva-me ao segundo argumento contra a aplicabilidade das regras de concorrência, a saber, o de que tais regras são incompatíveis com várias disposições do Tratado que promovem a negociação colectiva.

b) A promoção da negociação colectiva pelo direito comunitário

166 O artigo 118._ do Tratado dispõe que «cabe à Comissão promover uma colaboração estreita entre os Estados-Membros no domínio social, designadamente em questões relativas:

...

- ao direito sindical e às negociações colectivas entre entidades patronais e trabalhadores.»

167 O artigo 118._-B do Tratado CE dispõe:

«A Comissão esforça-se por desenvolver o diálogo entre parceiros sociais a nível europeu, que pode conduzir, se estes últimos o entenderem desejável, a relações convencionais.»

168 Além disso, o Acordo relativo à política social celebrado entre os Estados-Membros da Comunidade Europeia, com excepção do Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, que acompanha o Protocolo relativo à política social (86) anexo ao Tratado da União Europeia contém as seguintes disposições:

169 De acordo com o artigo 1._ do referido Acordo, «[a] Comunidade e os Estados-Membros terão por objectivos a promoção do... diálogo entre parceiros sociais...».

170 O artigo 2._, n._ 4, estabelece:

«Qualquer Estado-Membro pode confiar aos parceiros sociais, a pedido conjunto destes, a aplicação das directivas...»

171 Nos termos do artigo 3._, n._ 1:

«A Comissão tem por atribuição promover a consulta dos parceiros sociais ao nível comunitário...»

172 O artigo 4._, n._ 1, dispõe:

«O diálogo entre parceiros sociais ao nível comunitário pode conduzir, se estes o entenderem desejável, a relações contratuais, incluindo acordos.»

173 Segundo o artigo 4._, n._ 2:

«Os acordos celebrados ao nível comunitário serão aplicados... nas matérias abrangidas pelo artigo 2._, a pedido conjunto das partes signatárias, com base numa decisão adoptada pelo Conselho, sob proposta da Comissão.»

174 Os Fundos, os Governos neerlandês e francês e a Comissão extraíram dessas regras as seguintes conclusões: o Tratado e o Acordo relativo à Política Social promovem de forma explícita o processo de negociação e contratação colectivas entre os parceiros sociais; o direito comunitário reconhece que o diálogo entre os parceiros sociais pode contribuir para o processo legislativo a nível nacional ou mesmo a nível comunitário. Por conseguinte, é óbvio que o artigo 85._ do Tratado não se aplica a esta categoria de acordos.

175 A Comissão defende nas suas observações escritas que, se o artigo 85._ fosse aplicável, poder-se-ia considerar que a maior parte das convenções colectivas contemplaria condições de restrição da concorrência susceptíveis de afectar o comércio entre os Estados-Membros. Logo, por força do disposto no artigo 85._, n.os 1 e 2, as mesmas seriam proibidas e nulas. Mesmo uma isenção nos termos do artigo 85._, n._ 3, seria pouco provável porque, afirma, essa norma não prevê a ponderação de objectivos sociais.

176 Em certa medida concordo com estes argumentos.

177 Esta posição resulta, em primeiro lugar, de uma interpretação sistemática do Tratado. Há que levar em conta duas categorias de disposições potencialmente conflituantes. De um lado estão as regras acima referidas, que promovem a negociação colectiva. Tais regras partem claramente do pressuposto de que, em princípio, as convenções colectivas celebradas entre parceiros sociais são legais. Do outro lado está o artigo 85._ De harmonia com o disposto no artigo 85._, n._ 1, determinadas categorias de acordos são proibidas. Tais acordos proibidos são automaticamente nulos, por força do artigo 85._, n._ 2. Somente se os requisitos enunciados no artigo 85._, n._ 3, se mostrarem preenchidos poderá a Comissão declarar inaplicável a proibição contida no artigo 85._, n._ 1.

178 Conforme o demonstram os presentes casos e a síntese comparativa dos direitos nacionais, todos os sistemas jurídicos encerram, potencialmente, tensões entre estas duas categorias de disposições. É admitido que as convenções colectivas normais sobre matérias que constituem a essência das negociações colectivas, tais como os salários ou outras condições de trabalho, restringem a concorrência entre os trabalhadores: estes não se podem oferecer para trabalhar por um salário de nível inferior ao mínimo acordado. No entanto, o objectivo principal dos sindicatos e do processo de negociação colectiva é precisamente evitar uma «corrida ao mais baixo» dos empregados no tocante aos salários e às condições de trabalho. Essa é a razão pela qual as negociações colectivas são encorajadas por todas as ordens jurídicas nacionais, por instrumentos jurídicos internacionais e, especificamente, pelo próprio Tratado; além disso, a legislação comunitária no domínio do emprego contém disposições detalhadas sobre as medidas a pôr em prática, tanto por meio de negociações colectivas como por via legislativa (87). Se tais acordos estivessem sujeitos à proibição do artigo 85._, n._ 1, seria necessário solicitar à Comissão um certificado negativo ou uma isenção. Porém, e devido à sua própria natureza, tais acordos não se inserem facilmente no quadro das regras de concorrência.

179 Os autores do Tratado ou não estavam conscientes do problema ou não conseguiram chegar a acordo sobre uma solução para o mesmo. Por esse motivo, o Tratado não fornece indicações claras nesta matéria. Nestas circunstâncias, há que seguir uma orientação de acordo com princípios de interpretação bem estabelecidos. Uma vez que ambas as categorias de disposições constituem normas do Tratado situadas ao mesmo nível da hierarquia das fontes de direito, nenhuma delas deveria ter primazia absoluta sobre a outra, e nenhuma delas deveria ser completamente esvaziada de conteúdo. Uma vez que as disposições do Tratado que promovem as negociações colectivas pressupõem que as convenções colectivas são, em princípio, legítimas, o artigo 85._, n._ 1, não pode ter sido concebido com vista à sua aplicação às negociações colectivas entre parceiros sociais sobre temas essenciais das mesmas, tais como os salários e outras condições de trabalho. Logo, as convenções colectivas entre parceiros sociais em matéria de salários e de condições de trabalho deveriam ficar automaticamente fora do âmbito de aplicação da legislação da concorrência.

180 Existem ainda considerações de ordem prática que reforçam esta conclusão de princípio.

181 Admite-se geralmente que a negociação colectiva entre parceiros sociais permite evitar conflitos laborais onerosos, reduz os custos inerentes aos compromissos graças a um processo de negociação colectiva regido por determinadas regras e aumenta a previsibilidade e transparência. Um certo equilíbrio no poder de negociação de ambos os lados favorece a adopção de soluções equilibradas para cada um dos parceiros e para a sociedade em geral.

182 Além disso, se bem que susceptíveis de restringirem a concorrência entre trabalhadores assalariados, as convenções colectivas em matéria de salários, duração ou outras condições de trabalho provavelmente não terão um efeito restritivo significativo na concorrência entre empregadores. Quanto à concorrência no lado da procura no mercado de trabalho, normalmente cada empregador continua a ser livre de oferecer condições mais vantajosas aos seus trabalhadores. Quanto à concorrência nos mercados de produtos ou serviços em que os empregadores operam, faço notar, em primeiro lugar, que as convenções em matéria de salários ou de condições de trabalho só harmonizam um de entre os vários factores de produção. Logo, somente um aspecto da concorrência é afectado (88). Em segundo lugar, e como demonstra a prática da Comissão (89), a proximidade do mercado do factor em causa constitui um importante critério de avaliação do carácter sensível das restrições. No caso das convenções colectivas em matéria de salários e condições de trabalho, o preço final dos produtos ou serviços em causa será influenciado por muitos outros factores antes de estes chegarem ao mercado. Em terceiro lugar, e este constitui, talvez, o elemento mais importante, os custos dos factores de produção só aparentemente são harmonizados, uma vez que, em termos económicos, e ao contrário do que acontece com as matérias-primas, o trabalho não é um bem homogéneo. O facto de os trabalhadores auferirem a mesma remuneração nominal não significa que os seus custos reais para os respectivos empregadores sejam idênticos. Os custos reais só se podem determinar tendo em conta a produtividade dos trabalhadores. A própria produtividade é determinada por muitos factores como, por exemplo, a qualificação profissional, a motivação, o ambiente tecnológico e a organização do trabalho. Todos estes factores podem ser influenciados pelos empregadores e, na realidade, são-no. É precisamente isso que constitui o objectivo de uma gestão eficiente dos recursos humanos. Logo, existe realmente uma forte concorrência no capítulo do trabalho enquanto factor de custo. Finalmente, poderemos considerar que dois factos apoiam empiricamente a tese da inexistência de efeitos significativos na concorrência: por um lado, foi preciso esperar 40 anos para que fosse submetido ao Tribunal de Justiça o primeiro caso de compatibilidade entre uma convenção colectiva e o artigo 85._ do Tratado e, por outro, na resenha da questão nos direitos nacionais que acima apresentei, não existe um único caso que se refira a convenções normais versando sobre salários e condições de trabalho.

183 Esta conclusão, favorável a uma imunidade condicionada das convenções colectivas celebradas entre parceiros sociais no capítulo do direito da concorrência não é incompatível com os argumentos por mim expendidos acima no sentido de que não há qualquer excepção para o domínio social, entendido em termos globais. A diferença principal reside em que, quanto à negociação colectiva, preconizo uma excepção baseada não somente no objecto dum acordo, mas sobretudo no quadro formal em que tal acordo é concluído.

184 As razões subjacentes ao vasto campo de aplicação ratione materiae das regras de concorrência são simples. É lícito presumir que, ao celebrarem acordos entre si em condições normais, os operadores económicos privados estão a agir segundo os seus próprios interesses e não no interesse público. Assim sendo, as consequências dos seus acordos não correspondem necessariamente ao interesse público. Portanto, as autoridades que fiscalizam a concorrência deveriam, desde logo, poder analisar os acordos entre operadores económicos privados, mesmo em áreas específicas da economia, como a actividade bancária ou seguradora, e até o domínio social. Por esse motivo o Tratado contempla somente um número muito reduzido de excepções sectoriais à regra da aplicabilidade das regras de concorrência, baseadas unicamente no objecto contratual. Como já assinalei anteriormente, o Tribunal de Justiça deve continuar a fazer uma interpretação restritiva de tais excepções.

185 Não obstante, ao encorajar a negociação colectiva entre os parceiros sociais, o Tratado admite a possibilidade de uma excepção à presunção genérica relativa às consequências dos acordos celebrados entre operadores privados com fundamento no facto de que, em circunstâncias normais, esta particular categoria de acordos serviria o interesse público. Esta posição é corroborada pelos direitos nacionais e pela prática das autoridades da concorrência e pelos órgãos jurisdicionais dos Estados-Membros, que consideram que as negociações colectivas desempenham habitualmente uma função social valiosa. Considerar que as negociações colectivas estão sujeitas às regras de concorrência equivaleria, na realidade, a ir contra o sentido da prática geralmente adoptada pelos Estados-Membros. Tal atitude implicaria, não só que tais acordos tivessem de ser notificados ao abrigo da legislação de concorrência comunitária e/ou nacional, mas também que ficariam sujeitos à apreciação dos tribunais.

186 Considero, todavia, que a preconizada isenção das convenções colectivas celebradas entre parceiros sociais da aplicação da legislação da concorrência não deve ser ilimitada.

187 Tal constatação resulta, antes de mais e sobretudo, da interpretação do Tratado que acima adoptei. Se, por um lado, o artigo 85._, n._ 1, não pode interferir com a maior parte dos acordos favorecidos pelas regras sobre a negociação colectiva não é, por outro lado, menos verdade que tais regras não podem privar totalmente de sentido o artigo 85._, n._ 1.

188 É isso que resulta também claramente da redacção do Tratado. O artigo 117._ («... tal evolução [a melhoria das condições de vida e de trabalho dos trabalhadores] resultará... do funcionamento do mercado comum...») e o artigo 118._ («Sem prejuízo das outras disposições do presente Tratado...») parecem pressupor que as regras de concorrência são, em certa medida, aplicáveis aos acordos colectivos entre empregadores e trabalhadores. Quanto ao acordo relativo à política social, o preâmbulo do protocolo declara expressamente que «o presente protocolo e o referido acordo não prejudicam as disposições do Tratado que institui a Comunidade Europeia...».

189 Além do mais, a análise comparativa dos direitos nacionais a que procedi acima revelou que poderá haver casos em que as negociações colectivas são utilizadas para enquadrar acordos entre empregadores com efeitos gravosos, em termos de concorrência, para outras entidades ou mercados terceiros. Efectivamente, todos esses acordos examinados por diferentes autoridades e órgãos jurisdicionais nacionais se referiam a mercados ou operadores alheios às partes contratantes. Nenhum deles era um acordo normal sobre salários ou condições de trabalho.

190 Proponho, por isso, três condições para que se reconheça a isenção ipso facto.

191 Para começar, e como salienta a Comissão, o acordo deverá ter sido adoptado num quadro formal de negociações colectivas entre os parceiros sociais. A coordenação com carácter unilateral entre empregadores não relacionada com os processos de negociação colectiva não deverá beneficiar de uma isenção automática, independentemente do objecto dessa coordenação.

192 Em segundo lugar, o acordo deverá ter sido celebrado de boa-fé. Nesse contexto, convirá ter em atenção os acordos que aparentemente têm por objecto aspectos essenciais da negociação colectiva, tais como a duração do trabalho, mas que servem pura e simplesmente para encobrir sérias restrições à concorrência entre os empregadores nos mercados dos respectivos produtos. Também nestes casos excepcionais as autoridades fiscalizadoras da concorrência deveriam poder examinar o acordo em questão.

193 Em terceiro lugar, é necessário delimitar a finalidade da isenção das negociações colectivas, por forma a que esta abranja apenas os acordos em relação aos quais a mesma se justificar plenamente. Não será fácil achar um critério que faça uma delimitação clara, salvaguardando simultaneamente a necessária certeza jurídica. Permitir-me-ia sugerir como tentativa de possível critério o de que as convenções colectivas em causa devem ser as que versam aspectos essenciais da negociação colectiva, tais como os salários e as condições de trabalho, e que não afectem directamente outras entidades ou mercados terceiros. O teste consistiria em saber se os acordos se limitam a modificar ou a estabelecer direitos e obrigações no seio da relação laboral entre empregadores e trabalhadores, ou se vão mais além e afectam directamente as relações entre empregadores e terceiros, tais como os clientes, fornecedores, empregadores concorrentes ou os consumidores. A análise dos direitos nacionais a que procedi acima fornece vários exemplos deste último tipo de acordos. Uma vez que tais acordos podem ter efeitos prejudiciais na concorrência, deveriam ficar sujeitos a um exame em sede de direito da concorrência, pela Comissão ou por outras entidades competentes, que verificariam a eventual existência de uma significativa restrição da concorrência. Se tal acontecesse, a Comissão deveria ter condições para ponderar os diferentes interesses em jogo e conceder, se o julgasse apropriado, uma isenção ao abrigo do artigo 85._, n._ 3, do Tratado. Tanto o Tribunal de Justiça como a Comissão já reconheceram, em diversas ocasiões, a possibilidade de, neste contexto, se levarem em linha de conta razões de ordem social, em especial mediante a interpretação extensiva das condições enumeradas no 85._, n._ 3, do Tratado, por forma a contemplarem as preocupações respeitantes ao emprego (90).

194 Logo, a minha conclusão quanto à isenção das convenções colectivas em relação à aplicação da legislação da concorrência é a de que as convenções colectivas celebradas de boa-fé pelos parceiros sociais sobre matérias essenciais das negociações colectivas, como os salários e as condições de trabalho, que não afectem directamente outras entidades ou mercados terceiros, não são abrangidas pelo disposto no artigo 85._, n._ 1, do Tratado.

195 Estarão as convenções em apreço nos casos vertentes protegidas por esta isenção?

196 Convém relembrar que, de acordo com a legislação neerlandesa, as entidades patronais são, em princípio, livres de decidir oferecer ou não pensões complementares de reforma aos seus trabalhadores. Se o desejarem fazer, poderão celebrar convenções colectivas pelas quais os parceiros sociais se limitem a acordar pensões mínimas. Em tais casos as empresas empregadoras decidem o que fazer com as contribuições arrecadadas. Os parceiros sociais podem ainda acordar na criação de um fundo sectorial de pensões. Por seu turno, esse fundo sectorial poderá ser gerido quer pelos órgãos representativos do patronato e dos trabalhadores quer por uma companhia de seguros. Uma vez que os parceiros sociais tenham acordado em instituir um fundo sectorial de pensões, devem decidir se desejam, ou não, requerer ao ministro da tutela que torne a filiação nesse fundo sectorial de pensões obrigatória para todo o sector.

197 Dessa multiplicidade de opções resulta que as convenções em apreço podem ser analisadas como englobando três acordos distintos, com os seguintes conteúdos:

a) Os empregadores pagam ao fundo de pensões uma contribuição dum montante acordado por cada trabalhador pertencente a um dado sector.

b) Com as contribuições recolhidas estabelece-se um fundo sectorial de pensões único, gerido conjuntamente pelos representantes das associações patronais e sindicais.

c) Os parceiros sociais do sector requerem conjuntamente ao ministro da tutela que declare a obrigatoriedade de filiação para todas as empresas pertencentes ao sector.

198 No que se refere ao primeiro acordo, as contribuições para o fundo de pensões pagas pelos empregadores constituem parte integrante da remuneração auferida pelos trabalhadores (91). Suscitam os mesmos problemas de análise que os salários e outras condições de trabalho. As negociações colectivas sobre a harmonização das contribuições para os fundos de pensões constituem, portanto, negociações sobre o conteúdo dos contratos de trabalho que não afectam directamente terceiros. Assim sendo, estão ao abrigo da isenção que acima defendi.

199 Esta posição já se revela algo mais difícil em relação aos outros dois tipos de acordos. Poderão considerar-se meramente acessórios do primeiro acordo. Poder-se-ia no entanto alegar, com base no critério anteriormente sugerido, que eles não deveriam beneficiar de isenção. Por um lado, porque estes acordos implicam uma restrição à liberdade das empresas empregadoras que neles participam de confiar a companhias de seguros a administração dos fundos (bem como à liberdade de serem elas próprias a geri-los). Por outro lado, os parceiros sociais tentam, em conjunto, obrigar os empregadores que não participaram no processo de negociações colectivas a acatar o resultado das mesmas. Logo, na realidade estes dois acordos não representam meramente negociações colectivas sobre o conteúdo da relação laboral, antes afectando directamente as relações das entidades patronais com terceiros e, por conseguinte, estão excluídas do âmbito da isenção por mim proposta.

200 Consequentemente, passarei a examinar estes dois acordos à luz do disposto no artigo 85._, n._ 1, do Tratado.

C - Acordo entre empresas

201 Para os Governos neerlandês, francês e sueco, assim como para a Comissão, não existe «acordo entre empresas» e, portanto, o artigo 85._, n._ 1, do Tratado não é aplicável ratione personae. Argumentam que os trabalhadores não são «empresas», porque não se trata de entidades independentes que exerçam uma actividade económica mas que estão ligadas ao seu empregador. Os seus órgãos representativos, como os sindicatos, por exemplo, também não exercem uma actividade económica, pelo menos quando estão envolvidos em negociações colectivas sobre condições de trabalho ou pensões. Logo, uma das partes dos acordos em causa não pode ser qualificada como empresa.

202 Quanto ao argumento de que existe implicitamente um «acordo entre empresas», ou uma «decisão de associação de empresas» por parte das entidades empregadoras, o Governo neerlandês defende que os empregadores que participam em negociações colectivas em matéria de pensões não estão a exercer uma actividade económica, mas antes uma actividade de índole social.

203 A Comissão chegou a idêntica conclusão. Contudo, não se infere claramente das suas observações o raciocínio que seguiu para chegar a tal conclusão. Limita-se a chamar a atenção do Tribunal de Justiça para as consequências de uma decisão em contrário.

204 Analisarei, para já, a questão de saber se os operadores económicos envolvidos se podem classificar de empresas ou associações de empresas. Procurarei em seguida determinar se houve um acordo ou outra forma de concertação.

1. Empresa ou associação de empresas

205 O Tribunal de Justiça tem entendido que «o conceito de empresa abrange qualquer entidade que exerça uma actividade económica, independentemente do seu estatuto jurídico e modo de financiamento» (92). Quanto a este aspecto, convirá formular duas observações prévias.

206 Em primeiro lugar considero que, na economia do artigo 85._, o conceito de «empresa» serve um duplo propósito. Por um lado - e esta função é a mais óbvia - torna possível determinar as categorias de agentes às quais se aplicam as regras de concorrência. Esta questão coloca-se, por exemplo, em casos que envolvam organismos públicos (93). O teste, em tais casos, consiste em saber se o operador exerce uma actividade de carácter económico ou comercial. Por outro lado, serve para identificar a entidade à qual se poderá imputar um determinado comportamento. Este segundo problema coloca-se, por exemplo, em casos que digam respeito ao relacionamento entre empresas subsidiárias e sociedades-mãe (94). A questão aqui é saber se se trata de uma entidade independente agindo por conta própria, ou simplesmente de um «agente», sem autonomia para determinar o curso da sua acção.

207 Por outro lado, o Tribunal de Justiça tem declarado que «no contexto do direito da concorrência o termo `empresa' deve ser entendido como designando uma unidade económica para os efeitos do objecto do contrato em questão» (95). Por conseguinte, a noção de «empresa» é relativa, e deve ser apreciada em concreto, em função da actividade específica em análise. No acórdão Höfner e Elser (96), por exemplo, um serviço público envolvido, inter alia, em actividades de consultadoria de recrutamento de quadros foi considerado, relativamente a essa actividade, como empresa. Em contrapartida, no acórdão Calì & Figli (97), considerou-se que uma entidade limitadamente de direito privado, à qual foi confiada pelos poderes públicos uma actividade preventiva anti-poluição, não cabia no âmbito de aplicação pessoal das regras de concorrência relativas a essa actividade em especial.

208 Quanto aos casos vertentes, passarei a analisar, sucessivamente, se os a) trabalhadores assalariados, b) os sindicatos ou c) as entidades patronais, se deveriam catalogar como empresas ou associações de empresas para os efeitos do direito da concorrência.

a) Trabalhadores assalariados

209 O Tribunal de Justiça declarou, no acórdão Suiker Unie e o./Comissão, que os trabalhadores assalariados formam, com a empresa que os emprega, «uma unidade económica» (98). «Os órgãos auxiliares integrados na empresa do comitente» (99) não podem ser consideradas empresas. Neste acórdão, o Tribunal só tinha que fazer a distinção entre os trabalhadores assalariados e os agentes comerciais independentes nas suas relações com terceiros. Logo, o Tribunal podia fundamentar o seu raciocínio essencialmente na imputabilidade das actividades exercidas pelos seus trabalhadores ao empregador.

210 Todavia, nos casos em apreço o que está em causa é o relacionamento entre os trabalhadores assalariados e os seus empregadores. Nestes casos os trabalhadores assalariados participam, por intermédio dos respectivos sindicatos, em negociações colectivas relativas às pensões complementares de reforma e sua administração. Tais pensões integram a sua remuneração (100). Nessa óptica, os trabalhadores actuam de forma autónoma e por direito próprio, pelo que o raciocínio seguido pelo Tribunal de Justiça no acórdão Suiker Unie, já referido, não é directamente aplicável.

211 Logo, a questão que se coloca é saber como classificar a oferta de trabalho contra remuneração por parte dos trabalhadores.

212 Poder-se-ia argumentar que se trata de uma actividade económica semelhante à venda de bens ou à prestação de serviços. De um ponto de vista económico, poderá discutir-se se essa afirmação é correcta. Contudo, não penso que o seja do ponto de vista jurídico.

213 Em primeiro lugar, é difícil perceber como é que o termo «empresa» pode ser entendido na acepção de «trabalhador». Parece-me que interpretar o Tratado de modo a incluir o último termo no conceito do primeiro excede os limites que a redacção do mesmo impõe.

214 Depois, a interpretação funcional do termo «empresa» adoptada pelo Tribunal de Justiça na sua jurisprudência conduz-nos ao mesmo resultado. Relativamente aos organismos públicos, o Tribunal interroga-se se a actividade em causa é exercida - ou é susceptível de o ser - por entidades de direito privado que ofereçam bens ou serviços no mercado (101). As pessoas singulares também podem ser consideradas «empresas» (102) quando exerçam uma actividade económica independente de oferta de bens ou serviços num determinado mercado. O fundamento lógico de tais casos é a ideia de que as entidades em causa desempenham as «funções» de uma empresa. A aplicação dos artigos 85._ e 86._ justifica-se pelo facto de esses organismos públicos ou pessoas singulares estarem a operar no mesmo mercado ou em mercados semelhantes e de acordo com os mesmos princípios que as empresas ditas «normais» (103).

215 O trabalho subordinado é, por natureza própria, o oposto do exercício independente de uma actividade económica ou comercial. Regra geral, os trabalhadores não assumem o risco directo comercial associado a uma dada transacção. Estão sujeitos às ordens do seu empregador. Não oferecem os seus serviços a clientes diferentes, trabalhando apenas para uma única entidade patronal. Por estes motivos existe uma diferença funcional significativa entre um trabalhador assalariado e uma empresa que presta serviços. Tal diferença reflecte-se em estatutos jurídicos distintos, em vários domínios do direito comunitário (104) ou nacional.

216 Em terceiro lugar, o direito comunitário da concorrência não foi concebido para ser aplicado aos trabalhadores assalariados. Os exemplos de práticas restritivas da concorrência constantes dos artigos 85._, n._ 1, e 86._ do Tratado ou as condições de isenção enunciadas no artigo 85._, n._ 3, visam claramente os operadores económicos que se dediquem ao fornecimento de bens ou serviços. O artigo 85._, n._ 1, a), por exemplo, refere-se a «preços de compra ou de venda» e a «outras condições de transacção». Porém, o que respeita aos trabalhadores assalariados são as «remunerações» e as «condições de trabalho». Por conseguinte, aplicar o disposto no artigo 85._, n._ 1, aos trabalhadores assalariados exigiria o recurso a analogias difíceis entre os mercados de bens e serviços e os mercados de trabalho.

217 Assim, e em meu entender, os trabalhadores assalariados não são, em princípio, abrangidos pelo alcance pessoal da proibição estabelecida no artigo 85._, n._ 1. O futuro provavelmente demonstrar-nos-á se tal princípio também se aplica em certas áreas-limite, como é o caso do desporto profissional.

b) Sindicatos

218 Uma vez que os trabalhadores assalariados individuais não podem ser qualificados como empresas para os efeitos do artigo 85._, n._ 1, então os sindicatos ou outras organizações representativas dos trabalhadores, não constituem «associações de empresas».

219 Não obstante, serão os próprios sindicatos «empresas»?

220 O simples facto de um sindicato ser uma organização sem fins lucrativos não retira automaticamente às actividades que exerce a sua natureza económica (105).

221 Um sindicato é uma associação de trabalhadores assalariados. Está assente que as associações também podem ser classificadas como «empresas» desde que elas próprias exerçam uma actividade económica (106).

222 Convém relembrar que uma associação pode agir quer por direito próprio e, em certa medida, independentemente da vontade dos seus membros quer, simplesmente, como um órgão executivo de um acordo firmado entre os seus membros. No primeiro caso o seu comportamento é imputável à própria associação, enquanto que no segundo caso os responsáveis pela actividade desta são os seus membros.

223 No respeitante às associações comuns de natureza comercial, muitas vezes tal distinção não tem importância, uma vez que o artigo 85._ do Tratado se aplica do mesmo modo aos acordos entre empresas e às decisões de associações de empresas (107). Mas a mesma distinção já poderá interessar quando a Comissão tem de decidir quem deverá ser o destinatário da sua decisão e a quem deverá aplicar coimas (108).

224 Contudo, no caso dos sindicatos tal distinção já se reveste de carácter decisivo uma vez que, ao agir como mero agente, o sindicato não passa de um órgão executivo de um acordo entre os seus membros os quais - como já vimos acima - não são destinatários da proibição constante do artigo 85._, n._ 1.

225 Portanto, em relação às actividades sindicais convirá avançar em duas etapas: deve-se, primeiramente, determinar se uma dada actividade é imputável ao sindicato em si e, em caso afirmativo, se tal actividade é de natureza económica.

226 Existirão, certamente, algumas circunstâncias em que as actividades dos sindicatos satisfarão ambos os critérios. Alguns sindicatos poderão, por exemplo, gerir por direito próprio supermercados, caixas de aforro, agências de viagens ou outros negócios. Quando estiverem a agir nessa qualidade, aplicar-se-ão as regras da concorrência.

227 No entanto, nos casos em apreço a actividade dos sindicatos consiste em negociações colectivas com as entidades patronais em matéria de pensões para os trabalhadores assalariados do sector. Nesse contexto, os sindicatos actuam simplesmente como agentes dos trabalhadores pertencentes a um determinado sector, e não em nome próprio. Só esse facto é o bastante para demonstrar que, nos casos vertentes, não estão a agir como empresas para efeitos da aplicação do direito da concorrência.

c) Entidades patronais

228 Nos casos em análise as entidades patronais exercem actividades económicas em diferentes mercados de bens e serviços. Nessa óptica, devem ser consideradas empresas.

229 Para poderem produzir esses bens e serviços, contratam trabalhadores. Logo, a contratação de pessoal é inerente às suas actividades económicas principais.

230 Como já foi mencionado, o Governo neerlandês argumenta que as entidades patronais que participam em negociações colectivas sobre salários ou condições de trabalho não estão a exercer uma actividade económica, mas sim uma actividade social e que, pelo menos em relação a esta última, não se podem qualificar como empresas. A Comissão partilha essa opinião.

231 De qualquer forma, como eu advogo a admissão de uma excepção limitada à aplicabilidade ratione materiae das regras de concorrência, a qual contempla a categoria de acordos a que o Governo neerlandês e a Comissão se referem, não é verdadeiramente necessário analisar tal argumento em profundidade. Contudo, parece-me útil salientar que as entidades patronais prosseguem actividades económicas.

232 Para começar, as entidades patronais que participam em negociações colectivas sobre condições de trabalho, salários e pensões não são, regra geral, ou pelo menos exclusivamente, movidas por considerações de ordem social. Convirá, para sermos pragmáticos, admitir que existem motivações económicas como, por exemplo, prevenir conflitos laborais onerosos, reduzir os custos inerentes à transacção graças a um processo de negociação colectiva assente em regras e, ainda, conseguir uma maior previsibilidade e transparência no capítulo dos custos de produção.

233 Depois, o sucesso económico de uma empresa nos mercados nacionais ou internacionais de bens ou serviços dependerá da sua capacidade para celebrar com os seus trabalhadores as melhores convenções colectivas que for possível, o que irá influenciar a sua estrutura de custos. Logo, a negociação com os trabalhadores é parte essencial da sua actividade económica nos mercados e não pode ser artificialmente isolada dela.

234 E, por fim, o próprio conceito de negociação colectiva implica que cada uma das partes defenda os seus próprios interesses. Os órgãos representativos dos trabalhadores tentam garantir o máximo de regalias sociais, enquanto que os das entidades patronais se esforçam por acautelar os interesses económicos das empresas envolvidas no processo. Teoricamente, o equilíbrio entre os poderes de negociação de ambas as partes garante o resultado que melhor convirá tanto aos parceiros sociais como à sociedade. Por isso, nem sequer seria desejável que os empregadores fossem influenciados por outro tipo de considerações que não as económicas.

235 Por conseguinte, os empregadores continuam a ser empresas, mesmo quando participam em negociações colectivas.

236 Deste facto resulta ainda que, nos casos vertentes, as associações de empregadores são associações de empresas.

2. Acordo ou outra forma de concertação

237 Dado que nem os trabalhadores assalariados nem os seus órgãos representativos são empresas, concentrar-me-ei agora sobre a questão de saber se uma convenção colectiva celebrada entre parceiros sociais comporta, ou não, um acordo tácito entre as empresas que são as entidades patronais.

238 O Tribunal de Justiça considerou, no acórdão BNIC, que «o quadro jurídico em que tais acordos [entre empresas] são celebrados e tais decisões [entre associações de empresas] são tomadas, assim como a classificação desse quadro pelas diversas ordens jurídicas nacionais, não relevam para efeitos de aplicabilidade das regras de concorrência comunitárias, nomeadamente do artigo 85._ do Tratado» (109).

239 No acórdão Frubo/Comissão, o Tribunal de Justiça constata que «o n._ 1 do artigo 85._ aplica-se às associações na medida em que a sua actividade própria ou a das empresas aderentes tenda a produzir os efeitos nele referidos. Fazer qualquer outra interpretação do artigo 85._, n._ 1, seria privá-lo da sua essência» (110).

240 Da jurisprudência assente do Tribunal de Justiça resulta ainda que os acordos podem ser verbais (111) ou tácitos (112), bastando para tal que as empresas em questão hajam expressado a sua vontade comum de se comportarem de determinada forma (113).

241 Para que exista uma convenção colectiva entre os parceiros sociais, ambas as partes devem coordenar a respectiva actuação, quer mediante acordos ad hoc, quer através de associações institucionalizadas. No mínimo, à partida devem estar de acordo em negociar conjuntamente e em se conformarem com os resultados obtidos pelos seus representantes.

242 Assim sendo, e à luz da doutrina dos acórdãos do Tribunal de Justiça acima citados, não pode haver dúvida de que, do lado dos empregadores, existe um acordo tácito entre empresas, na acepção do artigo 85._, n._ 1, do Tratado. Ou então, no mínimo dos mínimos, estamos perante uma prática concertada, situação igualmente prevista no artigo 85._, n._ 1.

243 A Comissão respondeu de harmonia com este ponto de vista, na única decisão por ela adoptada sobre a relação entre o disposto no artigo 85._, n._ 1, e as convenções colectivas celebradas entre parceiros sociais. Na decisão Irish Banks' Standing Committee (114), uma associação de bancos irlandeses apresentou um pedido de certificado negativo relativamente a um acordo referente ao horário de abertura celebrado entre os bancos envolvidos, «bem como com o sindicato dos empregados bancários». A Comissão entendeu, em primeiro lugar, que as regras comunitárias sobre a concorrência eram aplicáveis ao sector bancário e, seguidamente, que «os bancos que participam nos acordos objecto do pedido de certificado negativo são empresas na acepção do 85._ do Tratado CEE», e prosseguiu declarando que: «O pedido de certificado negativo refere-se aos acordos entre as partes em cujo nome foi feito o pedido. Como tal, os acordos podem ser considerados como constituindo acordos entre empresas para os efeitos do artigo 85._»

244 Concluo, por conseguinte, que todas as convenções colectivas celebradas entre parceiros sociais pressupõem um acordo tácito entre empresas por parte das entidades patronais.

D - Restrições à concorrência

245 A questão reside em saber se os acordos tácitos entre entidades patronais - na medida em que estas não se encontrem ao abrigo de uma isenção da aplicação das regras de concorrência - «têm por objectivo ou efeito impedir, restringir ou falsear a concorrência», na acepção do artigo 85._, n._ 1.

246 Os fundos de pensões e o Governo neerlandês defendem que as convenções colectivas em causa não têm por objectivo nem por efeito restringir a concorrência. Essas convenções prosseguem uma finalidade social e não se destinam a limitar a concorrência entre as empresas envolvidas. A existir qualquer restrição, esta derivará não do comportamento das entidades patronais, mas da acção do Estado, ao tornar a filiação nos mesmos obrigatória para todas as empresas do sector.

247 Antes de iniciar a análise, convirá formular duas observações preliminares.

248 A primeira é a de que, nos casos vertentes, a interacção entre as convenções colectivas em apreço e a intervenção do Estado é complexa. Existe uma convenção colectiva celebrada entre os órgãos representativos das associações patronais e sindicais. Essa convenção pressupõe dois acordos tácitos, ou seja, um entre as entidades patronais e outro entre os trabalhadores assalariados. E, finalmente, há a intervenção do Governo neerlandês, que torna compulsória a filiação no fundo.

249 A análise deve centrar-se nas consequências do acordo tácito entre as entidades patronais e, por conseguinte, examinar, em cada caso, o eventual elemento de conexão entre esse acordo e os seus efeitos em relação a diferentes operadores e mercados.

250 A segunda é a de que os casos vertentes exigem uma análise cuidadosa, que tenha em conta os seus contextos económicos específicos.

251 Contrariamente a muitos regimes de concorrência nacionais, as regras comunitárias da concorrência são aplicáveis virtualmente a todos os sectores da economia (a título de exemplo, à agricultura, banca, seguros, energia, transportes e domínio social) e a todas as categorias de acordos (como os verticais, por exemplo). A latitude desse âmbito de aplicação implica uma necessidade acrescida de se levarem em conta as características económicas específicas de determinado sector ou categoria de acordos ao determinar se num caso concreto se verificou ou não uma infracção das regras de concorrência

252 Quanto à interpretação dos termos «impedir, restringir ou falsear a concorrência», na acepção do artigo 85._, n._ 1, as regras claras e bem definidas, que se limitam a apontar restrições à conduta dos operadores individuais, fornecem normalmente um fundamento válido para se presumir a existência de um efeito prejudicial à concorrência, promovendo igualmente a certeza jurídica que é de desejar. Contudo, em casos referentes a sectores específicos (115) ou categorias específicas de acordos (116), o Tribunal ultrapassou este ponto de vista puramente mecânico e procedeu a uma análise mais aprofundada. Em face do objecto e da natureza dos acordos em apreço nos casos vertentes, convirá, por isso, tomar em consideração os contextos económicos em que respectivamente se enquadram, bem como a motivação económica, por vezes complexa, que lhes está subjacente.

253 Passarei agora às convenções colectivas em apreço. Como já foi constatado acima, estas convenções podem cindir-se em três elementos, jurídica e economicamente independentes.

254 Como já foi dito acima, o primeiro elemento, a saber o acordo entre as entidades patronais com vista à harmonização das contribuições de pensão em todo o sector, está fora do âmbito de aplicação do artigo 85._, n._ 1. Trata-se, na realidade, de um acordo sobre a remuneração dos trabalhadores, matéria que constitui a própria essência das negociações colectivas e que não afecta directamente outras entidades ou mercados terceiros, pelo que as regras de concorrência não são aplicáveis ao caso.

255 Em questão, portanto, estão unicamente a segunda e a terceira partes do acordo, que têm - ou, pelo menos, pode alegar-se que têm - consequências para as companhias de seguros e para as entidades patronais que não tomaram parte na negociação colectiva a que nos referimos. Além disso, convém relembrar que somente o acordo tácito entre empregadores releva para o caso. Averiguarei, portanto, se existe uma restrição sensível da concorrência originada por um acordo tácito entre entidades patronais no que se refere, em primeiro lugar, ao acordo visando a criação de um fundo de pensões único que as mesmas gerem em conjunto com os sindicatos e, em segundo lugar, ao acordo quanto a requerer conjuntamente com os sindicatos ao ministro competente que torne a participação no fundo obrigatória para todas as empresas pertencentes ao sector.

1. O acordo visando a criação de um fundo de pensões único que as entidades patronais gerem em conjunto com os sindicatos

256 Para melhor compreender as razões subjacentes a este acordo convirá recordar as opções de que dispõem as entidades patronais e os trabalhadores. Há convenções colectivas nas quais os parceiros sociais se limitam a acordar num montante mínimo a pagar por cada trabalhador a título de contribuição de pensão. Em tais casos as empresas empregadoras decidem o que fazer com os fundos arrecadados. Podem optar livremente entre criar um fundo de pensões da empresa ou celebrar um contrato de seguro de grupo próprio da empresa com uma companhia de seguros, ou ainda estabelecer, com outras entidades patronais, um fundo de pensões comum.

257 Nos casos vertentes os órgãos representativos das associações patronais e sindicais optaram pela terceira hipótese, ou seja, a criação de um fundo de pensões comum sob gestão conjunta dos órgãos representativos de ambas as partes do sector de actividade.

258 Como poderá tal acordo ser encarado, do ponto de vista do direito da concorrência? Em primeiro lugar, o mesmo representa uma forma de cooperação horizontal voluntária entre empresas de um mesmo sector no tocante à gestão das pensões dos seus trabalhadores. Só a intervenção subsequente do Governo neerlandês veio tornar obrigatória a participação no fundo. E, em segundo lugar, essa cooperação é materializada, não duma forma ad hoc, mas no quadro de uma estrutura permanente, distinta das empresas participantes.

259 Logo, a criação de um fundo de pensões sob uma forma institucionalizada de cooperação identifica-se, em muitos aspectos, com aquilo que habitualmente se designa por estabelecimento de uma empresa comum de cooperação.

260 Passarei a examinar separadamente os efeitos dos acordos em questão sobre as empresas empregadoras (na alínea a) e sobre as companhias de seguros [na alínea b)].

a) Restrições à concorrência no tocante às entidades patronais

261 Terá a criação de um fundo de pensões efeitos restritivos apreciáveis sobre a concorrência entre as entidades patronais?

262 No caso de uma cooperativa agrícola de compras, o Tribunal de Justiça declarou:

«... a organização de uma empresa sob a forma jurídica específica de uma sociedade cooperativa não constitui em si um comportamento anticoncorrencial... essa forma jurídica tem a preferência tanto do legislador nacional como das autoridades comunitárias, enquanto factor de modernização e de racionalização... e de eficácia das empresas» (117).

263 Na sua «Comunicação relativa aos acordos, decisões e práticas concertadas respeitantes à cooperação entre empresas» (118), a Comissão declara:

«...

I. A Comissão encara favoravelmente a cooperação entre pequenas e médias empresas, na medida em que esta lhes permita trabalhar de maneira mais racional e aumentar a sua produtividade e competitividade num mercado alargado. Embora considerando que as sua tarefa consiste em facilitar, em especial, a cooperação entre pequenas e médias empresas, a Comissão reconhece que a cooperação entre grandes empresas pode, também ela, ser economicamente desejável, não se prestando a objecções do ponto de vista da política de concorrência.

...

É possível que outras formas de cooperação entre empresas, que não as referidas, não sejam proibidas pelo n._ 1 do artigo 85._ do Tratado CEE...

...

II. A Comissão considera que os seguintes acordos não restringem a concorrência:

...

2. Acordos que tenham unicamente por objecto:

a) A cooperação em matéria de contabilidade,

b) A garantia em comum do crédito,

c) As organizações comuns de cobrança,

d) A consulta de organismos comuns em matéria de organização de empresas ou em matéria fiscal.

Nestes casos, trata-se de uma cooperação em sectores que não dizem respeito nem à oferta de produtos e de serviços, nem às decisões económicas das empresas interessadas, pelo que daí não resulta qualquer restrição da concorrência.»

264 Na sua «Comunicação relativa ao tratamento das empresas comuns com carácter de cooperação à luz do artigo 85._ do Tratado CEE» (119), a Comissão declara, no ponto 15:

«Certas categorias de empresas comuns não são abrangidas pela proibição dos acordos, decisões e práticas concertadas, uma vez que não têm por objecto ou por efeito impedir, restringir ou falsear a concorrência. É o que se passa em especial em relação:

...

- às actividades neutras do ponto de vista da concorrência, na acepção da comunicação de 1968 relativa à cooperação entre empresas. As formas de cooperação descritas nesta comunicação não afectam a concorrência porque:

...

- dizem unicamente respeito aos aspectos técnicos da gestão da empresa,

- dizem unicamente respeito a actividades afastadas do mercado.»

265 O acórdão do Tribunal de Justiça e as duas Comunicações baseiam-se no raciocínio de que uma cooperação institucionalizada em matéria de gestão, que permita às empresas que nela participem a obtenção de economias de escala significativas e que se verifique numa área de actividade afastada dos mercados de produtos ou de serviços tem, de um modo geral, efeitos benéficos na concorrência.

266 Este raciocínio é igualmente válido para os fundos sectoriais de pensões.

267 O estabelecimento de um fundo de pensões único apresenta várias vantagens para as entidades patronais que nele participam. Antes do mais, permite economias de escala nos serviços essenciais ao funcionamento do regime de pensões, tais como a gestão das contribuições e dos pagamentos e das modalidades de depósito dos activos. Torna-se igualmente muito mais fácil gerir os casos dos trabalhadores que se transferem de uma empresa para outra pertencente ao mesmo sector.

268 Além do mais, um fundo sectorial de pensões goza de uma posição negocial mais forte, tanto nos mercados de investimento como perante os fornecedores de serviços (consultores e companhias de seguros). Logo, há efeitos muito favoráveis à concorrência na criação de tais fundos.

269 Por outro lado, tal como acontece com os gabinetes conjuntos de contabilidade ou de consultoria fiscal, a cooperação em matéria de gestão de pensões cobre um domínio de actividade que não diz directamente «respeito nem à oferta de produtos e de serviços, nem às decisões económicas das empresas participantes». Pelo contrário, essa cooperação inscreve-se num domínio que se encontra ainda mais distante do mercado de produtos do que, por exemplo, as actividades conjuntas de pesquisa e desenvolvimento.

270 Por conseguinte, a criação voluntária de um fundo sectorial de pensões representa uma forma eficaz e racional de cooperação favorável à concorrência entre empresas, que, em princípio, não é visada pelo disposto no artigo 85._, n._ 1.

271 No entanto a Albany, a Brentjens e a Drijvende Bokken alegam que se está perante uma infracção ao artigo 85._, n._ 1, devido à restrição da sua liberdade de organizar o seu próprio regime de pensões.

272 Relativamente às regras de uma cooperativa agrícola que limitava as possibilidades de abandono da associação, o Tribunal de Justiça considerou que:

«Todavia, daí não resulta que as disposições estatutárias que regem as relações entre a sociedade e os seus membros, nomeadamente as relativas à dissolução do vínculo contratual e as que impõem aos membros reservar à cooperativa a produção de leite, sejam automaticamente subtraídas à proibição do artigo 85._, n._ 1, do Tratado.

Com efeito, para escapar a essa proibição, as restrições impostas aos membros pelos estatutos das associações cooperativas e destinadas a garantir a sua fidelidade devem limitar-se ao necessário para assegurar o bom funcionamento da cooperativa e, em especial, garantir-lhe uma base comercial suficientemente vasta e uma certa estabilidade da participação social» (120).

273 Portanto, embora em determinadas circunstâncias as empresas possam criar cooperativas, as restrições contratuais da sua liberdade comercial resultantes desse facto devem ser limitadas ao mínimo necessário.

274 Em minha opinião, o caso de um fundo sectorial de pensões voluntariamente criado em que existiam restrições à possibilidade de saída pode apresentar analogias com um caso em que determinadas restrições contratuais acessórias destinadas a garantir a fidelidade dos membros são indispensáveis para «garantir-lhe uma base comercial suficientemente vasta e uma certa estabilidade da participação social».

275 A situação é, contudo, diferente nos casos sub judice. Nada nos autos indicia que as restrições em causa derivam directamente das convenções colectivas em apreço. A liberdade de recorrer a outros regimes especiais de pensões parece ser condicionada não pelos acordos que criam os fundos, mas devido à decisão dos Países Baixos em tornar a participação nos mesmos obrigatória. Com efeito, não existe um nexo de causalidade imediato entre os acordos iniciais celebrados entre algumas entidades patronais com vista à criação de um fundo de pensões comum e as efectivas dificuldades experimentadas pelas demandantes no processo principal, ao tentarem obter a isenção da participação obrigatória. A restrição da liberdade das demandantes no processo principal deve-se à intervenção do Governo neerlandês. A eventual compatibilidade dessa intervenção com os artigos 5._ e 85._, n._ 1, assim como com os artigos 86._ e 90._, n._ 1, já é uma outra questão, que analisaremos mais à frente.

b) Restrições à concorrência no tocante às companhias de seguros de pensões

276 A Albany, a Brentjens e a Drijvende Bokken argumentam que a proibição de celebração de contratos relativos a pensões complementares de reforma com companhias de seguros privadas afecta a posição competitiva das seguradoras. Estas últimas estão, efectivamente, impedidas de celebrar contratos de seguro de grupo com entidades patronais pertencentes a determinado sector, vendo-se, por esse motivo, afastadas de um segmento importante do mercado de seguros neerlandês. Além disso, existe um efeito cumulativo pelo facto de a participação obrigatória estar presente em praticamente todos os sectores da economia neerlandesa.

277 Examinarei, em primeiro lugar, os efeitos dos acordos iniciais celebrados entre algumas entidades patronais e os órgãos representativos dos trabalhadores com o objectivo de estabelecerem um fundo sectorial de pensões comum a ser gerido em conjunto. Para tal analisarei o contrato in abstracto, sem levar em conta a subsequente intervenção do Governo, partindo, portanto, da hipótese de que se trata de um fundo de pensões voluntário. Comentarei de seguida os efeitos da decisão governamental de tornar a participação obrigatória.

278 Quanto à criação voluntária de um fundo sectorial de pensões comum, devemos ter em mente que, a título individual, as entidades patronais podem optar entre constituir um fundo da empresa ou contratarem um seguro de grupo em benefício dos seus trabalhadores com uma seguradora.

279 Do ponto de vista do direito da concorrência, o resultado da opção por uma ou por outra via é indiferente. Essa escolha pode comparar-se à de um fabricante que tem de decidir entre a «aquisição» a fornecedores externos de determinados serviços (por exemplo, de limpeza ou de contabilidade), ou a «produção» interna dos mesmos. A decisão de não vinculação contratual com fornecedores externos nessas circunstâncias está ao abrigo da liberdade de celebração dos contratos. A recusa de contratar só seria relevante no contexto de uma empresa em posição dominante.

280 A decisão de algumas entidades patronais de cooperarem com outras com o propósito de estabelecerem um fundo único não piora a situação das companhias de seguros. Como já observei, todos os empregadores que nele participam são livres de não oferecer qualquer pensão aos seus trabalhadores, ou de as oferecer por intermédio de um fundo de pensões próprio da empresa. Para as companhias de seguros é indiferente que um certo número de entidades patronais decidam colocar em comum as contribuições de pensões, constituindo um fundo único, em vez de terem cada uma o seu fundo de pensões.

281 Por outro lado, e como já foi referido, nada nos autos indicia que o acordo colectivo inicial de criação de um fundo de pensões comum contivesse qualquer restrição ao abandono do fundo pelos membros nem à possibilidade de celebração, por parte destes, de um acordo mais vantajoso com uma companhia de seguros estranha. Logo, a mera criação voluntária dum fundo, sem carácter de exclusividade nem limitações à possibilidade de abandono dos seus membros, não tem verdadeiramente quaisquer efeitos de exclusão.

282 Por último, todas as partes e o Governo neerlandês reconhecem que os órgãos representativos das entidades patronais e dos trabalhadores podem confiar a administração dos fundos sectoriais a companhias de seguros. Desse modo é oferecida às seguradoras mais uma oportunidade para oferecerem os seus serviços em matéria de gestão a grandes fundos, representando uma grande quantidade de entidades patronais e de trabalhadores.

283 A decisão tomada pelos órgãos representativos das entidades patronais e dos trabalhadores de gerirem conjuntamente o fundo, prescindido de celebrar um contrato de gestão com uma companhia de seguros constitui, por outro lado, uma recusa de contratar que está, em princípio, coberta pela liberdade contratual e que só relevaria para os efeitos do artigo 86._

284 Portanto, quanto às entidades patronais que foram partes no acordo inicial visando a criação de um fundo sectorial de pensões, não se verifica um efeito real de exclusão das companhias de seguros. A opção de um empregador que se filia num fundo sectorial de pensões, em vez de confiar a gestão das contribuições a uma companhia de seguros, está protegida pela liberdade contratual.

285 Mais uma vez os argumentos das demandantes no processo principal visam essencialmente os efeitos da participação obrigatória. Só a obrigatoriedade de participação restringe a liberdade das entidades patronais de celebrarem contratos de seguro de grupo com as companhias de seguros. A obrigatoriedade de participação tem por efeito secundário impedir o acesso das companhias de seguros ao mercado potencial dos seguros de pensões complementares. Como já foi dito, a compatibilidade da intervenção do Governo neerlandês com o direito comunitário é um problema distinto, que tratarei mais adiante.

286 Assim, o acordo tácito inicial firmado entre as entidades patronais com a finalidade de criarem um fundo sectorial de pensões comum que elas gerem conjuntamente com os órgãos representativos dos trabalhadores não está abrangido pelo disposto no artigo 85._, n._ 1. Se há efeitos restritivos, estes devem-se à intervenção do Governo neerlandês.

2. O acordo visando a apresentação, em conjunto com os sindicatos, de um pedido solicitando ao ministro competente que declare obrigatória a participação de todas as empresas do sector

287 Em causa está o pedido conjunto solicitando ao ministro que torne obrigatória a participação de todas as empresas do sector.

288 No tocante às entidades patronais, o acordo pode ser caracterizado como uma actuação coordenada procurando obter a intervenção governamental, com o objectivo de criar condições de concorrência equitativas entre todas as empresas pertencentes ao sector.

289 Em primeiro lugar, convirá distinguir tal acção de uma acção directa contra empresas concorrentes estranhas ao acordo, com o objectivo de as forçar a aderir ou a cumprir o mesmo. Exemplos de métodos correntemente utilizados em tais casos são os boicotes e os contratos de exclusividade recíproca com compradores ou fornecedores. Em tais circunstâncias, as empresas infractoras alegaram frequentemente em sua defesa estarem a combater a concorrência desleal, o dumping ou, em termos mais gerais, a proteger o interesse público. O Tribunal de Justiça e a Comissão têm afirmado constantemente que a protecção dos interesses públicos, tais como a segurança dos produtos ou a luta contra a concorrência desleal, não compete às entidades privadas, mas sim aos poderes públicos (121).

290 Em segundo lugar, acabei de demonstrar que o acordo inicial firmado entre algumas entidades patronais e os órgãos representativos dos trabalhadores com a finalidade de criarem um fundo sectorial de pensões comum não é contrário ao artigo 85._, n._ 1. Por isso, o pedido conjunto em questão pode distinguir-se de um pedido por parte das empresas tendente ao alargamento dos efeitos de um acordo proibido a outras empresas pertencentes ao sector.

291 Contudo, parece-me que este último ponto não é de importância decisiva para a apreciação da legalidade do comportamento das empresas em questão. O disposto no artigo 85., n._ 1, não se aplica às meras diligências feitas pelas empresas para convencer os poderes públicos a alargar os efeitos de um dado acordo a outros operadores económicos (122).

292 Em primeiro lugar, tal acção, por si só, não afecta o jogo da concorrência nem a liberdade de cada um de nele participar. Todas as restrições são consequência de uma acção subsequente do Estado.

293 Em segundo lugar, a apresentação concertada de um pedido às autoridades estatais faz parte das nossas sociedades democráticas. As pessoas singulares ou colectivas têm o direito de se organizarem e de apresentarem em conjunto os respectivos pedidos ao Governo ou aos órgãos legislativos. Competirá depois às autoridades públicas decidir se a acção proposta corresponde ao interesse público. Só elas têm poder para tal decisão, e só elas devem arcar com a responsabilidade inerente.

294 Do acima exposto resulta que o artigo 85._, n._ 1, também não proíbe a apresentação conjunta de um pedido visando tornar a participação em determinado fundo obrigatória.

295 Uma vez que nenhum destes dois acordos restringe a concorrência, não há necessidade de apreciar os seus efeitos no comércio entre os Estados-Membros.

296 Concluo que o artigo 85._, n._ 1, não é aplicável ratione materiae às convenções colectivas celebradas entre as duas partes dum sector de actividade pelas quais as entidades patronais acordam pagar determinada contribuição de pensão por cada trabalhador pertence a esse sector, uma vez que tais acordos são acordos colectivos celebrados de boa-fé entre parceiros sociais sobre matéria que constitui a própria essência das negociações colectivas, tais como salários e condições de trabalho, que não afectam directamente mercados terceiros nem outras entidades. Nem nos casos vertentes o artigo 85._, n._ 1, se aplica ratione personae aos trabalhadores assalariados ou aos sindicatos porque, no contexto das negociações colectivas, nenhum deles está a agir como uma empresa, na acepção das regras de concorrência. Quanto aos dois acordos tácitos entre as entidades patronais, visando um deles o estabelecimento de um regime de pensões sectorial único gerido em conjunto pelos parceiros sociais e o outro a apresentação, juntamente com os sindicatos, de um pedido ao ministro competente solicitando a declaração da obrigatoriedade de participação, o artigo 85._, n._ 1, embora aplicável em princípio, não é infringido, uma vez que nenhum dos acordos restringe a concorrência.

297 Consequentemente não se verifica a violação do artigo 85._, n._ 1, quando as associações sindicais e patronais de um determinado sector da economia acordam colectivamente em criar um fundo sectorial de pensões comum e em requerer conjuntamente às autoridades que declarem obrigatória a participação no fundo de todas as pessoas pertencentes a esse sector.

VII - Artigos 5._ e 85._ do Tratado CE

298 A questão reside em saber se um Estado-Membro infringe os artigos 5._ e 85._ do Tratado quando, a pedido d as associações sindicais e patronais, torna a participação num fundo sectorial de pensões obrigatória para todas as empresas pertencentes a esse sector.

299 A Albany, a Brentjens e a Drijvende Bokken argumentam que ao criar o quadro legislativo para a participação obrigatória, e depois ao declarar obrigatória a participação em cada um dos três fundos, os Países Baixos favoreceram, por um lado, a conclusão, e, por outro, reforçaram os efeitos de um acordo contrário ao artigo 85._ Na sua perspectiva isso equivale a uma infracção dos artigos 5._ e 85._ do Tratado, de acordo com a interpretação que lhes foi dada pelo Tribunal de Justiça nos acórdãos Meng (123) e Ohra (124).

300 Os Fundos de Pensões, os Governos neerlandês, francês e sueco e ainda a Comissão defendem que, nos casos vertentes, e segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, não existe um acordo contrário ao artigo 85._ cuja conclusão pudesse ser favorecida ou cujos efeitos pudessem ser reforçados. Por outro lado, de acordo com os Fundos de Pensões, os Países Baixos não delegaram em operadores económicos privados a responsabilidade de tomar decisões de intervenção de interesse económico.

301 A jurisprudência do Tribunal de Justiça estabeleceu os seguintes princípios (125). Por si mesmo, o artigo 85._ respeita unicamente ao comportamento das empresas. Em princípio não abrange, portanto, medidas legislativas ou regulamentares emanadas dos Estados-Membros. Contudo, o artigo 85._, interpretado em conjugação com o artigo 5._, n._ 2, impõe aos Estados-Membros a obrigação de não tomarem ou manterem em vigor medidas, mesmo de natureza legislativa ou regulamentar, susceptíveis de eliminar o efeito útil das regras de concorrência aplicáveis às empresas. É o que acontece em três situações: em primeiro lugar, quando um Estado-Membro impõe ou favorece a conclusão de acordos, decisões ou práticas concertadas contrários ao artigo 85._; em segundo lugar, quando reforça os seus efeitos e, por último, quando retira à sua própria regulamentação o seu carácter estatal, delegando em operadores económicos privados a responsabilidade de tomarem decisões de intervenção em matéria económica.

302 Quanto à primeira das duas situações o Tribunal de Justiça impõe, para considerar ilegais as medidas estatais, que exista uma relação com um comportamento anticoncorrencial por parte das empresas (126). Assim, as medidas tomadas por um Estado que imponham ou favoreçam um determinado acordo entre empresas ou que reforcem os seus efeitos não são abrangidos pelo disposto nos artigos 5._ e 85._, se tal acordo não infringir o n._ 1 do artigo 85._ (127). Nos casos vertentes, como já se viu, os acordos em questão não restringem a concorrência e, portanto, não são visados pelo artigo 85._, n._ 1.

303 Relativamente à terceira hipótese, ou seja, aquela em que os poderes públicos tenham delegado os seus poderes em operadores económicos privados, resulta da legislação neerlandesa que o ministro da tutela é o único responsável pela decisão de tornar obrigatória a participação em dado fundo. Nos termos do artigo 3._, n._ 1, da BPW, os parceiros sociais só têm de a requerer ao ministro. A Câmara dos Seguros e o Sociaal Economische Raad, que de qualquer modo são organismos públicos, só têm o direito de ser consultados. Neste contexto, há que relembrar ainda que o ministro competente tem o poder de pôr fim à participação obrigatória (artigo 3, n._ 4, da BPW) e que fica obrigado a nova decisão quanto à participação obrigatória em caso de alteração das regras do regime de pensões (artigo 3, n._ 5, da BPW). Assim sendo, o poder de decidir sobre a obrigatoriedade da participação pertence ao ministro da tutela, não podendo os parceiros sociais impô-la por convenção colectiva.

304 Do que se expõe a seguir resultará claramente que a delegação de poderes que habilita os Fundos a decidir a concessão de dispensas a título individual da participação obrigatória é uma questão distinta, que deve ser analisada à luz da lex specialis (128) do artigo 90._, n._ 1.

305 Por conseguinte, e desde que o Tribunal de Justiça entenda manter a sua jurisprudência relativa ao artigo 5._, não há infracção aos artigos 5._ e 85._ do Tratado.

VIII - A qualificação como empresas dos fundos de pensões sectoriais neerlandeses

306 A questão reside em saber se os fundos sectoriais de pensões dos Países Baixos são «empresas» na acepção das regras de concorrência do Tratado. Mais especificamente, há que determinar se a actividade dos fundos sectoriais de pensões em apreço, designadamente a do serviço de complementos de pensões em benefício dos trabalhadores, se reveste de natureza económica (129).

307 As características essenciais dos fundos em análise são as seguintes:

- oferecem pensões complementares de reforma;

- foram originalmente criados por convenção colectiva celebrada entre parceiros sociais e cobrem a totalidade de um sector económico;

- a participação nos mesmos foi tornada obrigatória por decisão ministerial, sob reserva de dispensa em certos casos;

- são regimes assentes na gestão de fundos próprios, operando segundo o princípio da capitalização;

- os montantes das contribuições e das prestações são fixados pelo conselho de administração do fundo;

- as pensões são calculadas em função das reservas constituídas graças às contribuições pagas, dos resultados financeiros dos investimentos dos fundos e das despesas de administração dos mesmos;

- os regimes prosseguem uma finalidade social;

- apresentam os seguintes elementos de solidariedade a nível do sector: os fundos têm a obrigação efectiva de aceitarem a adesão de qualquer entidade patronal ou trabalhador pertencente ao sector; não há selecção de riscos mediante questionários ou exames clínicos. Não há, além disso, ligação entre o risco e as contribuições: todos os participantes pagam uma contribuição média que não leva em conta, por exemplo, a idade dos trabalhadores. As contribuições referentes aos trabalhadores de pequenas e médias empresas são idênticas às dos trabalhadores das grandes empresas; em caso de incapacidade para o trabalho, são concedidas dispensas de contribuições;

- os representantes do patronato e dos trabalhadores têm de ter assento em número igual no conselho de administração do fundo;

- a direcção do Fundo está obrigada a manter o equilíbrio financeiro do mesmo;

- os investimentos dos fundos devem ser efectuados op solide wijze (de maneira prudente);

- tal como acontece nas companhias de seguros privadas, a gestão é controlada pela Câmara dos Seguros;

- os fundos não têm fins lucrativos.

308 A Albany, a Brentjens e a Drijvende Bokken alegam que os fundos de pensões em análise são empresas, opinião que é partilhada pela Comissão.

309 Os Fundos de Pensões, bem como os Governos neerlandês, francês, alemão e sueco concordam unanimemente em que os referidos fundos não devem ser considerados empresas.

310 Antes de voltar aos casos mais específicos - Poucet e Pistre (130), Van Schijndel e Van Veen (131) e FFSA (132), importa relembrar certos princípios gerais do direito comunitário da concorrência relativos à caracterização das actividades de uma entidade.

311 Como já foi dito antes, de um modo geral o Tribunal de Justiça tem adoptado uma perspectiva funcional (133). A questão essencial reside em saber se a entidade em causa exerce uma actividade que seria, pelo menos em princípio, susceptível de ser exercida por uma empresa privada com fins lucrativos.

312 Esta interpretação funcional levou o Tribunal de Justiça a rejeitar um certo número de argumentos, por não serem relevantes. Em primeiro lugar, nem o estatuto jurídico nem o modo de financiamento da entidade têm qualquer significado (134). Assim, por exemplo, entidades públicas como o Bundesanstalt für Arbeit (135) alemão ou a Amministrazione autonoma dei monopoli di Stato italiana (136) foram considerados pelo Tribunal de Justiça como exercendo actividades de natureza económica nos domínios da colocação de mão-de-obra e do fornecimento de bens e serviços no mercado do tabaco manufacturado. Pelo contrário, o Tribunal de Justiça considerou que as regras da concorrência não eram aplicáveis a uma entidade de direito privado que se dedicava a uma actividade de vigilância antipoluição cujo exercício lhe fora confiado por um Estado-Membro (137). Em segundo lugar, o carácter não-lucrativo de uma entidade (138), ou o facto de esta não prosseguir finalidades não económicas (139) são, em princípio, irrelevantes. Em terceiro lugar, o facto de certas entidades terem sido incumbidas pelo Estado de desempenhar determinadas tarefas de interesse público não implica que essas entidades não sejam empresas uma vez que, se fosse esse o caso, as disposições dos n.os 1 e 2 do artigo 90._ do Tratado ver-se-iam despojadas de todo o significado. Por conseguinte, estão igualmente sujeitas às regras de concorrência, por exemplo, as actividades de telecomunicações públicas (140), dos fornecedores de serviços postais (141), das estações públicas de televisão (142) ou das sociedades ou empresas de trabalhos portuários (143). E, finalmente, o simples facto de determinadas actividades serem normalmente confiadas a serviços públicos não basta para as subtrair às regras da concorrência (144).

313 Em alguns casos o Tribunal de Justiça adoptou um ponto de vista que foi além desta interpretação funcional. No acórdão IAZ e o./Comissão, por exemplo, o Tribunal considerou que «o artigo 85._, n._ 1, do Tratado se aplica igualmente às associações de empresas na medida em que as suas próprias actividades, ou as das empresas pertencentes ao mesmo grupo, se destinem a produzir os resultados que ele visa suprimir» (145). O Tribunal de Primeira Instância chegou a idêntica conclusão, ao entender que «o n._ 1 do artigo 85._ do Tratado CEE dirige-se a entidades económicas constituídas por um conjunto de elementos materiais e humanos que podem concorrer para a prática de uma infracção do tipo da prevista nesta disposição» (146).

314 Em contrapartida, as actividades de uma entidade podem estar isentas da aplicabilidade das regras de concorrência em duas situações. Primeiro, as regras de concorrência não são aplicáveis à «actuação do Estado no exercício da autoridade pública» (147), ou quando entidades em que o Estado delegou a sua autoridade «actuam na qualidade de autoridades públicas» (148). Para esse efeito pouco interessa se o Estado exerce a sua autoridade pública directamente através de um organismo que faça parte da administração pública ou por intermédio de uma entidade de direito privado a quem conferiu direitos especiais ou exclusivos (149). Uma entidade exerce autoridade pública quando as actividades em questão constituem uma «missão de interesse público que se enquadra em funções essenciais do Estado», quando essas actividades «pela sua natureza, pelo seu objecto e pelas regras às quais estão sujeitas, estão ligadas ao exercício de prerrogativas... que são tipicamente prerrogativas de poder público» (150). Em segundo lugar, parece resultar do n._ 22 do acórdão Höfner e Elser, já referido, que as regras da concorrência não se aplicam quando a actividade em questão sempre tiver sido e for necessariamente exercida por entidades públicas (151).

315 Analisarei agora os três processos em que o tema controvertido era a qualificação de organismos semelhantes aos que estão em causa nos casos vertentes.

316 No acórdão Poucet e Pistre (152), o Tribunal de Justiça considerou que os organismos franceses encarregados da gestão do regime de seguro de doença e de maternidade aplicável ao conjunto dos trabalhadores não assalariados das profissões não agrícolas e do regime básico de pensão de terceira idade para as profissões artesanais não deveriam ser qualificados como empresas na acepção do direito da concorrência.

317 Esses regimes apresentavam as seguintes características:

- o regime de pensão de velhice assegurava a pensão de base;

- os regimes haviam sido instituídos por lei;

- a participação nos regimes era obrigatória;

- o regime de pensões não obedecia ao princípio da capitalização: funcionava segundo o princípio da redistribuição, servindo as contribuições pagas para financiar directamente as pensões dos trabalhadores reformados;

- os regimes prosseguiam um objectivo social, visando assegurar ao conjunto das pessoas por eles abrangidas uma cobertura dos riscos de doença e velhice, independentemente da sua condição económica e do seu estado de saúde aquando da inscrição;

- no regime de seguro de velhice a solidariedade exprimia-se pela circunstância de serem as contribuições pagas pelos trabalhadores em actividade que permitiam financiar as pensões dos trabalhadores reformados, traduzindo-se igualmente pela concessão de direitos a pensão em casos em que não houve contribuições e de direitos a pensão não proporcionais às contribuições pagas. Finalmente, a solidariedade manifestava-se entre os diferentes regimes de segurança social, participando os regimes excedentários no financiamento dos regimes com dificuldades financeiras estruturais.

318 Concluindo quanto à natureza dos regimes, o Tribunal de Justiça declarou:

«Resulta do que precede que os regimes de segurança social assim concebidos assentam num sistema de contribuição obrigatória, indispensável à aplicação do princípio da solidariedade e ao equilíbrio financeiro dos referidos regimes.»

319 Os órgãos de gestão desses regimes caracterizavam-se pelo seguinte:

- a gestão foi-lhes conferida por lei;

- as actividades destas caixas de segurança social estavam submetidas ao controlo do Estado;

- as caixas aplicavam a lei e não tinham qualquer influência sobre o montante das contribuições, a utilização dos fundos e a determinação do nível das prestações.

320 Concluindo quanto à natureza das actividades dessas caixas, o Tribunal de Justiça declarou:

«... os organismos encarregados da gestão do serviço público da segurança social desempenham uma função de carácter exclusivamente social. Essa actividade é, com efeito, baseada no princípio da solidariedade nacional e totalmente desprovida de qualquer fim lucrativo. As prestações pagas são prestações legais, independentes do montante das contribuições.

Daí resulta que essa actividade não é uma actividade económica...».

321 Nas conclusões que apresentei no caso Van Schijndel e Van Veen (153), concluí que o fundo de pensões profissional dos fisioterapeutas neerlandeses, que apresentava características similares aos fundos ora em apreço, não actuava como empresa nas suas relações com os seus membros. Contudo, devido à falta de informação quanto ao contexto legal e factual, limitei-me a expressar uma opinião provisória.

322 As características do regime e do fundo eram as seguintes:

- o fundo concedia pensões complementares de reforma;

- o regime foi instituído pela classe profissional dos fisioterapeutas;

- a participação obrigatória foi decretada por um despacho ministerial emitido nos termos duma lei neerlandesa relativa às pensões;

- o regime tinha fundos próprios, ou seja, as pensões eram financiadas mais a partir das reservas do que das contribuições correntes. Não era financiado pelo orçamento do Estado;

- o regime dos fisioterapeutas desempenhava uma função social. Os objectivos da lei ao abrigo da qual a participação no mesmo foi tornada obrigatória consistiam em assegurar a adaptação dos rendimentos da reforma ao crescente nível geral dos rendimentos, em permitir que os profissionais mais jovens contribuíssem para os maiores encargos com as prestações a favor dos seus colegas mais idosos e em prever a concessão de direitos a pensão relativamente a anos anteriores à entrada em vigor dos regimes;

- o regime comportava elementos de solidariedade entre os participantes. Em princípio, era cobrada uma contribuição de montante único e paga uma pensão de montante único - e isso independentemente da idade com que um inscrito tivesse começado a exercer a profissão e independentemente do seu estado de saúde no momento da inscrição. Em caso de incapacidade para o trabalho, a cobertura do seguro mantinha-se sem pagamento de contribuições;

- o fundo que administrava o regime não tinha fins lucrativos;

- o conselho de administração era constituído exclusivamente por membros do fundo;

- os membros do conselho de administração não eram remunerados, sendo apenas reembolsados das despesas.

323 Nas minhas conclusões no referido processo apliquei o raciocínio seguido pelo Tribunal de Justiça no acórdão Poucet e Pistre, já referido, e declarei - a título provisório, como já mencionei - que o fundo se assemelhava mais a uma instituição de segurança social do que a uma seguradora privada. O fundo, nas suas relações com os inscritos, não actuava como empresa, mas como instituição social encarregada pelos membros da profissão da organização do seu sistema de pensões. O Tribunal não tratou da questão de saber se o fundo se podia considerar uma empresa na acepção do artigo 85._, n._ 1.

324 Em acórdão posterior (FFSA (154)), o Tribunal de Justiça clarificou e tornou consideravelmente mais explícita a sua jurisprudência quanto à aplicabilidade das regras de concorrência aos regimes de pensões e às instituições que os gerem.

325 O regime francês de reforma complementar dos agricultores apresentava as seguintes características:

- concedia pensões complementares de reforma;

- foi instituído e regulamentado por lei;

- a participação no regime era facultativa;

- o regime baseava-se em capitais próprios, funcionando segundo o princípio da capitalização e não da redistribuição;

- as contribuições relacionavam-se directamente com os rendimentos;

- as prestações a que conferia direito dependiam unicamente do montante das contribuições pagas pelos beneficiários, bem como dos resultados financeiros dos investimentos efectuados pelo organismo gestor. Os benefícios e as contribuições não eram determinadas por lei, mas pelo conselho de gestão do organismo gestor;

- o regime tinha em vista uma actividade de carácter social; foi criado pelo Governo com o objectivo de proteger uma população com rendimentos mais baixos e uma média de idade mais elevada do que a das restantes categorias sócio-profissionais, e cujo regime de base de pensão de velhice era insuficiente;

- continha elementos de solidariedade. As contribuições não eram calculadas com referência ao risco e, assim sendo, não era feito qualquer questionário nem exigido exame médico, e não se procedia a qualquer selecção de riscos. Os aderentes impossibilitados de pagar as suas contribuições devido a doença podiam ser dispensados do seu pagamento. O pagamento das contribuições podia ser temporariamente suspenso por razões atinentes às condições económicas dos aderentes e, em caso de morte prematura de um aderente, um montante correspondente ao das contribuições acumuladas era colocado à disposição do regime, e não dos seus herdeiros;

- o organismo gestor não tinha em vista qualquer fim lucrativo, sendo a sua administração assegurada a título gracioso;

- a gestão estava sujeita ao controlo do Estado;

- os fundos arrecadados só podiam ser utilizados em certas aplicações financeiras autorizadas pelo Governo.

326 Os elementos essenciais do acórdão do Tribunal de Justiça são os seguintes:

«A este respeito, importa desde logo salientar que a inscrição no regime Coreva é facultativa, que esse regime funciona segundo o princípio da capitalização e que as prestações a que confere direito dependem unicamente do montante das contribuições pagas pelos beneficiários, bem como dos resultados financeiros dos investimentos efectuados pelo organismo gestor. [O organismo gestor] exerce, por isso, uma actividade económica em concorrência com as companhias de seguros de vida.

...

Os elementos de solidariedade que este regime contém, bem como as outras características... não são susceptíveis de contrariar esta qualificação.

Em qualquer caso, o princípio da solidariedade tem um alcance extremamente limitado, que deriva da natureza facultativa do regime. Nessas condições, não pode retirar à actividade exercida pelo organismo gestor do referido regime o seu carácter económico.

Além disso, deve notar-se que, certamente, a prossecução de uma finalidade de carácter social, as exigências de solidariedade, bem como as outras regras..., designadamente quanto aos direitos e obrigações do organismo gestor e dos beneficiários, ao estatuto deste e às restrições que sofre na realização dos investimentos, podem tornar o serviço prestado pelo regime Coreva menos competitivo do que o serviço equiparável prestado pelas companhias de seguros de vida. Essas dificuldades não impedem, porém, que se considere a actividade exercida pelo [organismo gestor] uma actividade económica. Falta analisar se estas dificuldades podem ser invocadas, por exemplo, para justificar o direito exclusivo deste organismo a proporcionar seguros de velhice cujas contribuições são dedutíveis do rendimento profissional tributável.

Por último, o simples facto de o [organismo gestor] não ter fins lucrativos não retira à actividade que exerce a sua natureza económica, uma vez que... pode dar lugar a comportamentos que as regras de concorrência visam reprimir.

Deve, por isso, responder-se ao órgão jurisdicional nacional que um organismo sem fins lucrativos, que gere um regime de seguro de velhice destinado a completar um regime de base obrigatório, instituído pela lei a título facultativo e funcionando, dentro dos limites das regras definidas pelo poder regulamentar, designadamente no que se refere às condições de adesão, às contribuições e às prestações, segundo o princípio da capitalização, constitui uma empresa na acepção dos artigos 85._ e segs. do Tratado.»

327 Antes de recordar as diferentes características dos fundos em análise nos casos em presença, seria útil extrair algumas conclusões genéricas desta jurisprudência.

328 Em primeiro lugar, como já havia constatado nas minhas conclusões relativas ao processo Van Schijndel e Van Veen, já referido, os regimes de pensões revestem diversas formas, variando entre os regimes estatais de segurança social, numa das extremidades do leque, e os regimes privados individuais geridos por seguradoras privadas, no outro. A dificuldade reside na classificação das categorias intermédias: trata-se de uma questão de graduação, que requer a análise de toda uma série de critérios.

329 Em segundo lugar, no seu acórdão FFSA, já referido, o Tribunal de Justiça refinou e clarificou consideravelmente a sua análise desta questão. Considero-me, portanto, em posição de reconsiderar a opinião que provisoriamente expressei nas minhas conclusões relativas ao acórdão Van Schijndel e Van Veen, já referido.

330 Em terceiro lugar, resulta claramente da jurisprudência do Tribunal de Justiça quanto ao conceito de empresa, e especialmente do acórdão Höfner e Elser e do n._ 20 do acórdão FFSA, já referidos, que o critério decisivo consiste em saber se uma actividade em concreto é necessariamente exercida por entidades públicas ou seus agentes. Contrariamente ao afirmado pelos Fundos de pensões, há que distinguir essa questão do tema distinto de saber quando, e em que medida, a concessão de determinados direitos exclusivos é necessária para o desempenho de uma missão de interesse público. A última questão só releva para os efeitos do artigo 90._, n._ 2, do Tratado. Decorre do artigo 90._ que o facto de ser necessário conferir direitos exclusivos a um organismo não retira, por si só, às suas actividades o seu carácter económico.

331 Em quarto lugar e de acordo com jurisprudência do Tribunal de Justiça, em especial com o n._ 21 do acórdão FFSA, já referido, a questão de saber se o organismo pode adoptar tipos de comportamentos que as regras de concorrência tentam prevenir é igualmente pertinente.

332 À luz do que antecede, passarei agora a analisar o problema de saber quais das características apresentadas pelos fundos de pensões neerlandeses em análise interessam para determinar se a sua actividade é de natureza económica.

333 Considero que as características seguintes são irrelevantes.

334 Em primeiro lugar, as modalidades de criação do regime ou do seu organismo gestor, bem como o seu estatuto jurídico, são irrelevantes para a qualificação das actividades de um fundo. No acórdão FFSA, já referido, o Tribunal de Justiça entendeu que as actividades da Caisse centrale de la mutualité sociale agricole française, que geria um regime instituído por lei, eram de natureza económica. Nem no acórdão Poucet e Pistre nem no acórdão FFSA, já referidos, se fez referência ao estatuto jurídico das diferentes «caisses». O facto de o Tribunal considerar que esse factor não era relevante para a sua análise é perfeitamente compatível com a sua jurisprudência em geral (155). A circunstância de, nos casos vertentes, os regimes de pensão complementar terem sido criados por convenção colectiva e serem conjuntamente geridos por representantes dos parceiros sociais, sob a forma jurídica de fundação («Stichting»), não tem, assim, qualquer significado para a classificação das suas actividades.

335 Em segundo lugar, e com base no n._ 20 do acórdão FFSA, já referido, as normas que regem a composição do organismo gestor, as restrições a que está sujeito ao realizar investimentos e o modo como é fiscalizado pelos poderes públicos carecem igualmente de importância. No acórdão Poucet e Pistre, já referido, o Tribunal ainda mencionou o controlo do Estado como constituindo um elemento relevante (156). Contudo, no acórdão FFSA já não refere esse aspecto, muito embora o Governo francês tenha levantado a questão (157). Por conseguinte, pouco importa, nos casos em apreço, que os representantes do patronato e dos trabalhadores disponham de igual número de lugares no conselho de administração do fundo, que a direcção do mesmo seja obrigada a manter o equilíbrio financeiro e a efectuar investimentos cautelosos, ou ainda que a gestão seja controlada pela Câmara dos Seguros. Pelo contrário, à semelhança da Albany, Drijvende Bokken e Brentjens, reconheço que o facto de as companhias de seguros e os fundos de pensões estarem sujeitos aos mesmos mecanismos de controlo é um sinal de que as suas actividades são similares.

336 Em terceiro lugar, a circunstância de os fundos prosseguirem uma finalidade de carácter social e o seu carácter não-lucrativo também não relevam para o caso. O Tribunal de Justiça parece ter atribuído alguma importância a estes dois aspectos no acórdão Poucet e Pistre, já referido (158). No entanto, o Tribunal de Justiça não os mencionou ao resumir esse acórdão no n._ 15 do seu acórdão FFSA, já referido. Coerente com a sua prática usual de não ter em conta o objectivo prosseguido nem a ausência de fins lucrativos (159), o Tribunal de Justiça considerou, nos n.os 20 e 21 do seu acórdão FFSA, já referido, que esses dois aspectos não podiam influenciar a sua apreciação.

337 Em contrapartida, as características a seguir descritas interessam à análise.

338 Primeiro, em face do n._ 16._ do acórdão FFSA, já referido, e contrariamente àquilo que foi por mim adiantado a título provisório no acórdão Van Schijndel e Van Veen, já referido, o modo de funcionamento do regime de pensões representa um factor de relevo. Considero que um regime de pensões sem capitais próprios que opere segundo o método da redistribuição, de acordo com o qual as contribuições correntes financiam as pensões dos reformados actuais, seja necessariamente operado directamente pelo Estado, ou indirectamente, por intermédio de organismos que actuam na qualidade de agentes do Estado ou de modo equiparável. Ainda que hipoteticamente, não vejo qualquer possibilidade de as entidades do sector privado poderem comercializar um regime de pensões baseado no princípio da redistribuição sem intervenção do Estado. Ninguém se prestaria a pagar as pensões dos outros sem a garantia de que a geração seguinte faria o mesmo. Tal é, precisamente, o motivo por que, historicamente, foi necessário introduzir tais sistemas, geridos pelo Estado ou, pelo menos, sob a sua tutela. Face ao exposto, tenho uma certa dificuldade em aceitar que as actividades destes regimes possam ser de natureza económica. Pelo contrário, é manifesto que o mercado está na origem de regimes de pensões que funcionam com base no princípio da capitalização. O facto de as actividades deste tipo de regimes, tal como muitas outras em matéria de seguros, serem regulamentadas pelo legislador no interesse dos consumidores e investidores não as priva do seu carácter económico. As restrições às suas actividades são igualmente susceptíveis de apreciação à luz do disposto no artigo 90._ do Tratado. Logo, nos casos vertentes é relevante o facto de os fundos sectoriais de pensões funcionarem segundo o método da capitalização.

339 Em segundo lugar, os mecanismos de tomada de decisão e os factores financeiros que influenciam o nível das contribuições e das prestações são também elementos relevantes.

340 Por um lado, há que distinguir entre os regimes em que os níveis das prestações e das contribuições são determinados pelo legislador, e aqueles em que estes níveis são fixados por decisão autónoma do conselho de administração do fundo. Neste contexto, é relevante o princípio subjacente ao n._ 21 do acórdão FFSA, já referido, e a alguns outros acórdãos do Tribunal de Justiça (160), já analisados: o de que as entidades independentes que estejam em posição de provocar os efeitos que as regras da concorrência visam acautelar devem ficar subordinados a essas regras.

341 Tanto o Governo alemão como a Comissão argumentam a este propósito que, uma vez que os efeitos jurídicos das convenções colectivas celebradas entre parceiros sociais são análogos aos produzidos pela legislação, a situação nos casos vertentes é equiparável à do acórdão Poucet e Pistre, já referido, em que o montante das contribuições e das prestações eram fixadas por lei. Penso, contudo, que não é necessário determinar em que medida os efeitos jurídicos derivados das convenções colectivas e da legislação são semelhantes. Nos processos em exame, as decisões respeitantes às contribuições e às prestações não são tomadas pelos parceiros sociais no quadro formal de negociações colectivas, mas por maioria no seio do conselho de administração do fundo. Além disso, é evidente que o objectivo principal do conselho de administração é promover os interesses de todos os participantes no fundo, e tais interesses podem divergir dos interesses das associações sindicais e patronais que nomeiam os membros do conselho.

342 Por outro lado, os regimes no âmbito dos quais o Estado garante um certo nível de contribuições e de prestações diferem daqueles em que o Estado não tem intervenção. Esse aspecto foi importante para o Tribunal se pronunciar no acórdão Poucet e Pistre, já referido, que fazia menção à solidariedade existente entre as várias instituições de segurança social (161), a qual se manifestava pela participação dos regimes excedentários no financiamento dos regimes que tinham dificuldades financeiras estruturais. Esta característica foi de novo mencionada no resumo do acórdão Poucet e Pistre, feito no acórdão FFSA (162), ambos já referidos. Pelo contrário, nos casos vertentes (como, de resto, no acórdão FFSA) o nível das prestações depende somente do montante das contribuições, dos resultados financeiros dos investimentos efectuados pelo organismo gestor e dos custos gerados por esse organismo.

343 Em terceiro lugar, os elementos de solidariedade inerentes ao regime são relevantes, como o demonstram o acórdão Poucet e Pistre (163) e o resumo que dele foi feito no acórdão FFSA (164), ambos já referidos. Contudo, no acórdão FFSA o Tribunal de Justiça entendeu que, naquele caso, os elementos de solidariedade tinham um alcance extremamente limitado, que não podia retirar à actividade exercida pelo regime o seu carácter económico (165). Nos casos vertentes, os elementos de solidariedade ao nível do sector não são nem mais numerosos, nem mais importantes do que os mencionados no acórdão FFSA, no qual não existia relação entre as contribuições e o risco, nem selecção de riscos mediante questionários ou exames médicos. A caixa tinha a obrigação de aceitar a inscrição de qualquer entidade patronal ou trabalhador pertencente ao sector (166). Em caso de doença eram concedidas dispensas da obrigação de pagamento das contribuições (167). A única diferença parece ser a de que alguns dos fundos de pensões neerlandeses exigem o pagamento de contribuições de valor fixo, enquanto que no caso FFSA, já referido, as contribuições eram pagas em função dos rendimentos. Todavia, uma vez que aparentemente os fundos neerlandeses também pagam pensões de montante fixo que não são proporcionais aos salários, tal diferença não interessa para o caso. Logo, também nos casos vertentes os elementos de solidariedade não são suficientemente importantes para retirar às actividades do fundo a sua natureza económica.

344 Todas as características relevantes dos fundos complementares de pensões dos Países Baixos até agora consideradas sugerem que as suas actividades revestem natureza económica. Porém, coloca-se a questão de saber se esta conclusão é posta em causa pelo facto de a participação na grande maioria desses fundos ter sido tornada obrigatória pelo Governo neerlandês nos termos de um quadro legislativo específico. Recorde-se que no processo FFSA, já referido, a inscrição era facultativa.

345 No acórdão Poucet e Pistre, já referido, o Tribunal de Justiça declarou que a contribuição obrigatória para os regimes de segurança social em causa era indispensável à aplicação do princípio da solidariedade e ao equilíbrio financeiro dos referidos regimes (168). No resumo do acórdão Poucet e Pistre feito no acórdão FFSA, ambos já referidos, o Tribunal reiterou este ponto de vista e considerou que a solidariedade inerente a esses regimes implicava, necessariamente, que os diversos regimes fossem geridos por um organismo único e que a inscrição nos mesmos fosse obrigatória (169). Desse modo, a participação obrigatória foi analisada como uma consequência necessária da presença de elementos de solidariedade significativos. Contudo, não se descortina claramente se a inscrição obrigatória constituiu um pressuposto para se concluir pela natureza não-económica das actividades dos fundos.

346 No acórdão FFSA, já referido, o Tribunal de Justiça baseou-se na inscrição facultativa para concluir que as actividades do regime eram de natureza económica (170). Estou de acordo quanto a este ponto. A inscrição facultativa é um indício particularmente forte de que as actividades em questão são comparáveis às de uma seguradora privada e que deveriam ser minuciosamente investigadas pelas autoridades da concorrência.

347 No entanto, a jurisprudência mostra que o Tribunal de Justiça ainda não teve ocasião de se pronunciar sobre a presente questão, nomeadamente a de saber se se devem retirar quaisquer ilações do facto de a participação em certos regimes ser obrigatória. Em minha opinião não se devem tirar quaisquer conclusões. Fazê-lo, permitiria, antes de mais, aos Estados-Membros subtraírem as actividades de determinadas entidades do âmbito de aplicação das regras da concorrência, declarando simplesmente a obrigatoriedade de participação no regime. Em segundo lugar, a participação obrigatória deve ser encarada como uma concessão de direitos exclusivos. Decorre do artigo 90._, n._ 1, do Tratado que as empresas que beneficiam de tais direitos continuam a ser empresas e a estar submetidas às regras da concorrência.

348 Concluo, portanto, que os fundos complementares de pensões dos Países Baixos são de natureza económica e que, por isso, são empresas na acepção do direito comunitário da concorrência.

IX - Artigos 90._ e 86._ do Tratado CE

349 A questão seguinte reside em saber se um Estado-Membro infringe as disposições conjugadas dos artigos 90._, n._ 1, e 86._ do Tratado, ao estabelecer um sistema de participação obrigatória em fundos sectoriais de pensões como os que existem nos Países Baixos e, no quadro desse sistema, tornar obrigatória a inscrição em fundos sectoriais de pensões.

350 Nesta altura do raciocínio será útil relembrar as características do sistema neerlandês.

351 Um primeiro conjunto de regras (normas relativas à participação obrigatória a nível de sector) estabelece as condições ao abrigo das quais o Governo pode tornar obrigatória a participação em determinado fundo por parte de todas as empresas pertencentes a um dado sector. Os parceiros sociais representativos de um sector económico apresentam um requerimento conjunto ao ministro competente, solicitando que este torne obrigatória a participação num fundo sectorial de pensões. De seguida, o ministro verifica se os regulamentos que regem as actividades dos fundos preenchem todos os requisitos legais. Antes de tomar uma decisão, consulta diversos organismos, incluindo o Instituto de Seguros. Emite depois uma portaria, tornando a participação obrigatória para todas as empresas e todos os trabalhadores do sector. Em caso de alteração das normas que regem o sistema, o ministro tem de emitir nova portaria.

352 Há depois um segundo conjunto de regras (as normas sobre isenções individuais) relativas às circunstâncias em que as empresas ou os trabalhadores, a título individual, podem ficar isentos da participação obrigatória, desde que tenham subscrito, ou desejem subscrever, regimes especiais de pensões alternativos.

353 Para que a isenção possa ser concedida, o regime alternativo deve satisfazer um certo número de condições. A mais importante requer que o regime alternativo garanta prestações pelo menos equivalentes às oferecidas pelo fundo sectorial.

354 É o próprio fundo sectorial quem se pronuncia sobre todos os pedidos de isenção. O fundo deve conceder a dispensa quando os regimes alternativos de pensões já estavam em vigor seis meses antes da apresentação do pedido mediante o qual foi declarada obrigatória a participação no fundo de pensões («o motivo de isenção baseado nos seis meses»). Em todos os restantes casos os fundos gozam de poder discricionário.

355 Está prevista a possibilidade de reclamação («bezwaar») contra a recusa de dispensa por parte de um fundo de pensões. A Câmara dos Seguros é competente para apreciar essa reclamação. De acordo com o Governo neerlandês, a decisão da Câmara dos Seguros quanto à reclamação constitui simplesmente uma proposta de conciliação, sem força jurídica. Da decisão da Câmara dos Seguros não cabe recurso.

356 Dos despachos de reenvio, e particularmente dos despachos proferidos pelo Kantongerecht no processo Albany, resulta que as instâncias cíveis são, em princípio, competentes para apreciar a legalidade das decisões dos fundos. Poder-se-á descortinar aí uma consequência directa ou indirecta do facto de os fundos serem pessoas colectivas sob a forma de fundações privadas («Stichting»).

357 No entanto, a extensão dos poderes dos tribunais civis em matéria de apreciação da legalidade das decisões discricionárias dos fundos quanto às isenções não é inteiramente clara. O Kantongerecht declarava, no processo Brentjens:

«Este tribunal não tem de apreciar o facto de o bedrijfspensioenfonds não ter visto motivo para fazer uso do seu poder discricionário de conceder uma isenção à Brentjens, dado que este poder emana da própria política de gestão do bedrijfspensioenfonds.»

358 Não obstante, outras considerações dos órgãos jurisdicionais de reenvio e uma fórmula empregue no processo Albany parecem implicar que existe um poder de tutela judicial limitado:

«As relações entre o Fundo sectorial de pensões e um participante são regidas por princípios de razoabilidade e de equidade e/ou por princípios gerais de boa administração.»

359 Esta fórmula dá ainda a entender que os tribunais neerlandeses têm algumas dúvidas quanto aos princípios que regem a questão. Mais uma vez, esse facto poderá ser consequência da natureza híbrida da decisão dos fundos de pensões.

360 De acordo com o Governo neerlandês, entrou em vigor em 26 de Abril de 1998 uma versão alterada das directrizes em matéria de dispensas. Foram acrescentadas três novos motivos de dispensa obrigatória, enquanto anteriormente o único motivo legal que obrigava à concessão da dispensa era o que se fundava nos seis meses de vigência prévia de outro regime. Presentemente, a isenção deve igualmente ser concedida sempre que:

- a entidade patronal já faça ou venha a fazer parte de um grupo de empresas que não é abrangido pelo âmbito de aplicação do fundo sectorial de pensões em questão;

- as entidades patronais tenham celebrado com os seus trabalhadores uma convenção colectiva própria, ficando assim exoneradas da participação compulsória numa convenção colectiva de carácter geral; ou

- os resultados das aplicações financeiras do fundo sectorial de pensões sejam, por um período de vários anos, sensivelmente inferiores aos resultados duma carteira de títulos tipo previamente estabelecida pelo fundo de pensões. Estabelecem-se princípios contabilísticos para a avaliação desse desempenho.

361 Em segundo lugar, foram introduzidas novas regras respeitantes à equivalência do sistema alternativo e ao cálculo da compensação, acima referida, para perdas actuariais (171).

362 Em terceiro lugar, a possibilidade de reclamação para a Câmara dos Seguros foi abolida.

363 Contudo, uma vez que os processos principais se regeram pela versão anterior das directrizes em matéria de dispensas, a versão alterada das mesmas não releva directamente para os casos vertentes.

364 E, finalmente, importa recordar que, de facto, a participação em 15 fundos sectoriais de pensões não foi tornada obrigatória.

365 Procederei agora à análise do artigo 90._, n._ 1, conjugado com o artigo 86._

366 O artigo 90._, n._ 1, dispõe:

«No que respeita às empresas públicas e às empresas a que concedam direitos especiais ou exclusivos, os Estados-Membros não tomarão nem manterão qualquer medida contrária ao disposto no presente Tratado, designadamente ao disposto nos artigos 7._ e 85._ a 94._, inclusive.»

367 O artigo 86._ dispõe:

«É incompatível com o mercado comum e proibido, na medida em que isso seja susceptível de afectar o comércio entre os Estados-Membros, o facto de uma ou mais empresas explorarem de forma abusiva uma posição dominante no mercado comum ou numa parte substancial deste...»

368 A Albany, a Brentjens e a Drijvende Bokken sustentam que o sistema neerlandês de fundos de pensões sectoriais obrigatórios viola estas disposições em dois aspectos. Em primeiro lugar, afirmam que as características dos sistemas são de tal ordem que os serviços oferecidos pelos fundos em matéria de pensões não satisfazem, ou deixaram de satisfazer, as necessidades das empresas. Quanto a este ponto, as demandantes no processo principal remetem para o acórdão Höfner e Elser, já referido (172). Em seguida, e segundo a sua perspectiva, resulta do acórdão GB-Inno-BM (173) que os fundos de pensões não devem ser autorizados a decidir eles próprios da concessão, ou não, de isenções individuais da obrigação de inscrição.

369 Os Fundos de pensões, os Governos neerlandês e francês e a Comissão concordam unanimemente - embora por razões diferentes - que os artigos 90._, n._ 1, e 86._ não são violados e que, em qualquer caso, o sistema neerlandês está justificado ao abrigo do preceituado no artigo 90._, n._ 2.

370 Quanto ao artigo 90._, n._ 1, e ao artigo 86._ gostaria de formular duas observações preliminares.

371 É importante, para começar, considerar a posição que os artigos 90._, n._ 1, e 86._ ocupam na economia do Tratado. Como já realcei anteriormente (174), os artigos 85._ e 86._ são dirigidos às empresas, e não aos Estados-Membros. Há, no entanto, um princípio geral - decorrente do artigo 5._, n._ 2, - que impõe aos Estados-Membros que se abstenham de tomar ou manter em vigor quaisquer medidas, ainda que de natureza legislativa ou regulamentar, susceptíveis de eliminar os efeitos úteis da concorrência (175). Examinei noutro local (176) a jurisprudência relativa aos artigos 5._ e 85._ que aplicou esse princípio geral à intervenção do Estado no contexto dos acordos entre empresas. O artigo 90._, n._ 1, ilustra uma outra aplicação - de carácter legal - deste princípio geral (177). Quando é aplicável ratione personae, o artigo 90._, n._ 1, constitui uma lex specialis em relação ao artigo 5._, n._ 2 (178).

372 Em segundo lugar, importa relembrar que a aplicabilidade do artigo 90._, n._ 1, ou mesmo uma infracção desta disposição, não acarretam automaticamente nenhuma consequência quanto à aplicabilidade dos artigos 85._ e 86._ às empresas envolvidas. As empresas titulares de direitos exclusivos continuam subordinadas às regras de concorrência (179). A única excepção a essa regra ocorre quando o efectivo comportamento que se analisa não é imputável à empresa, designadamente quando o comportamento contrário à concorrência é exigido por legislação nacional ou esta legislação cria um quadro jurídico que, por si só, elimina qualquer possibilidade de comportamento concorrencial (180). Por conseguinte, e independentemente da resposta a dar pelo Tribunal de Justiça às questões respeitantes ao artigo 90._, n._ 1, cada um dos fundos continuará, em princípio, a estar sujeito às regras de concorrência.

373 Para responder às questões suscitadas pelo órgão jurisdicional de reenvio, há que determinar, em primeiro lugar, se os fundos de pensões são empresas às quais os Países Baixos tenham outorgado direitos especiais ou exclusivos, em segundo lugar, se os fundos detêm uma posição dominante no mercado comum ou numa parte substancial deste e, por último, se os países Baixos têm, na acepção do artigo 90._, n._ 1, tomado ou mantido «qualquer medida contrária ao disposto no... Tratado» e, mais especificamente, uma medida contrária ao disposto no artigo 86._ e que não se possa justificar nos termos do artigo 90._, n._ 2.

A - Aplicabilidade do artigo 90._, n._ 1: empresas que beneficiam de direitos exclusivos ou especiais

374 Segundo o Governo neerlandês, a portaria que torna a inscrição obrigatória limita-se a criar obrigações que incumbem às empresas envolvidas, não garantindo direitos exclusivos em matéria de seguro de pensões e nem sequer de pensões complementares.

375 Penso que este argumento não colhe. Com efeito, as contribuições destinadas pelas entidades patronais e pelos trabalhadores a pensões complementares devem, imperativamente, ser geridas pelos fundos. Logo, estes beneficiam do direito exclusivo de efectuar a colecta das contribuições e de as administrar. Mas esse direito exclusivo dos fundos representa simplesmente o contraponto da obrigação imposta, a nível sectorial, de inscrever os trabalhadores num determinado fundo de pensões complementar.

376 Além do mais, poder-se-ia argumentar que, ao abrigo das regras neerlandesas relativas à concessão de isenções, os fundos gozam ainda de um segundo direito exclusivo, a saber, o direito de decidir discricionariamente sobre os pedidos de dispensa, a título individual, da inscrição obrigatória.

377 Logo, os fundos pertencem ao tipo de empresas às quais o artigo 90._, n._ 1, é aplicável.

B - Aplicabilidade do artigo 86._: posição dominante no mercado comum ou numa parte substancial deste

378 Para a Albany, a Brentjens e a Drijvende Bokken, cada um dos fundos detém, no respectivo sector económico, uma posição dominante no mercado dos serviços de seguros de pensão.

379 Os fundos afirmam que são intervenientes relativamente pequenos no mercado dos seguros de pensões, onde muitas outras empresas operam. Em sua opinião, os argumentos das demandantes no processo principal baseiam-se numa definição extremamente restritiva do mercado de referência.

380 Nas suas observações escritas a Comissão contestou inicialmente a existência de uma posição dominante, baseando-se sobretudo nos argumentos utilizados pelos fundos. Contudo, na audiência, adoptou a posição oposta e aliou-se ao Governo francês no tocante a esse aspecto, tendo alegado que, uma vez que a inscrição era obrigatória, não existia escolha alternativa, quer do lado da oferta quer do da procura.

381 Não me alongarei sobre este ponto. É jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que uma empresa que beneficie de um monopólio legal na oferta de certos serviços numa parte substancial do mercado comum pode ser considerada como ocupando uma posição dominante, na acepção do artigo 86._ do Tratado (181). Por esse motivo, o facto de a posição do fundo de pensões ser devida a uma intervenção governamental é irrelevante (182).

382 Sendo a inscrição obrigatória, as outras formas de seguro privado de pensões não representam alternativas válidas a um fundo complementar sectorial. Para efeitos de pensões complementares, as entidades patronais e os trabalhadores pura e simplesmente não se podem inscrever noutro lado. Portanto, o facto de cada fundo explorar só um regime de pensões e o de existirem muitos outros, e mais importantes, também não é relevante (183).

383 Para terminar, cada fundo cobre a totalidade do território neerlandês e, por conseguinte, uma parte substancial do mercado comum. Logo, cada um dos fundos ocupa uma posição dominante no que se refere ao fornecimento de seguros de pensão complementares num determinado sector económico dos Países Baixos.

C - Medidas nacionais contrárias ao disposto nos artigos 90._ e 86._

384 Como já assinalei acima, a Albany, a Brentjens e a Drijvende Bokken contestam a compatibilidade do sistema neerlandês com as disposições dos artigos 90._, n._ 1, e 86._ com base em dois fundamentos, e remetem para os acórdãos Höfner e Elser e GB-Inno-BM, já referidos.

385 Quanto ao primeiro desses argumentos, designadamente o de que os serviços de pensões oferecidos pelos fundos não satisfazem, ou deixaram de satisfazer, as necessidades das empresas, as demandantes no processo principal consideram que as pensões oferecidas são demasiado baixas, não têm ligação com os salários e, em resultado disso, revelam-se sistematicamente inadequadas. Sustentam que o sistema neerlandês dá origem a outros efeitos negativos: de facto, as entidades patronais vêem-se forçadas a tomar outras providências em matéria de pensões, estando impedidas de contratar um plano global de poupanças com uma seguradora. Assim sendo, as empresas têm de funcionar com diferentes operadores de regimes de pensões, o que faz aumentar os custos administrativos e acarreta outras perdas de eficácia.

386 Em apoio do segundo argumento, de que os fundos não deveriam ser autorizados a decidir eles próprios sobre a concessão de isenções a título individual da participação obrigatória, as demandantes no processo principal sustentam que os fundos são colocados numa posição em que podem unilateralmente escolher o nível de concorrência a que ficarão expostos.

387 Do meu ponto de vista, estes argumentos colocam dois problemas distintos, sendo o primeiro o de saber se, e em que medida, a obrigação de participação nos fundos, enquanto tal, é compatível com o disposto nos artigos 90._, n._ 1, e 86._; e o segundo o da compatibilidade das regras de concessão discricionária de dispensas a título individual com as mesmas disposições.

1. Compatibilidade da obrigação de participação com o disposto nos artigos 90._ e 86._

388 Como já realcei, o artigo 90._, n._ 1, é uma aplicação particular do artigo 5, n._ 2, impondo obrigações aos Estados-Membros, e não directamente às empresas. Decorre da sua interacção com o artigo 86._ que esta disposição não pode constituir a base jurídica adequada para imputar aos Estados-Membros a responsabilidade por um comportamento anticoncorrencial autónomo por parte das empresas devido à única razão de estas se encontrarem sob a sua jurisdição. Logo, o artigo 90._, n._ 1, só será infringido quando existir um nexo de causalidade entre, por um lado, a intervenção legislativa ou administrativa de um Estado-Membro e por outro, o comportamento anticoncorrencial das empresas. No contexto do artigo 90._, n._ 1, o Tribunal de Justiça tem-se pronunciado no sentido de que os alegados abusos devem ser «consequência directa» do quadro jurídico nacional (184).

389 Esta é uma das razões para o dilema fundamental que coloca a aplicação do artigo 90._, n._ 1. Por um lado, a outorga de direitos exclusivos ou, dito noutros termos, a criação de um monopólio legal, é uma medida estrutural do Estado que tradicionalmente favorece os comportamentos anticoncorrenciais. Por outro lado, os termos em que o artigo 90._ se encontra redigido parecem sugerir que, em si, a concessão de direitos exclusivos parece não ter sido o tipo de medidas que os autores do Tratado tinham em mente proibir ao redigirem o artigo 90._, n._ 1.

390 Ao porem em causa a participação obrigatória, as demandantes no processo principal estão, na realidade, a impugnar o próprio direito exclusivo do fundo. Esse é, precisamente, o dilema com que nos deparamos.

391 O Tribunal de Justiça tem reiteradamente declarado que o simples facto de criar uma posição dominante por via da concessão de direitos exclusivos não é, enquanto tal, incompatível com os artigos 90, n._ 1, e 86._ do Tratado (185).

392 Foi este o princípio geral que presidiu ao acórdão Centre d'insémination de la Crespelle (186). Em causa estava o monopólio detido em França pelos centros de inseminação no tocante ao fornecimento de determinados serviços aos criadores. O Tribunal de Justiça começou por relembrar o princípio acima referido, tendo de seguida reconhecido que as proibições contidas nos artigos 90._, n._ 1, e 86._ seriam, todavia, violadas se a empresa em causa fosse levada, pelo mero exercício do direito exclusivo que lhe foi atribuído, a explorar a sua posição dominante de modo abusivo. O Tribunal debruçou-se em seguida sobre a questão da existência de uma relação directa entre a lei nacional e o abuso alegado, precisando que a simples concessão do direito de exclusividade não é normalmente suficiente para tornar inevitável o abuso, na acepção conferida a esta fórmula (187). O Tribunal decidiu que, em face dos factos, a legislação não «levava» os centros a abusarem da sua posição dominante. Noutro ponto analisou então se os próprios centros haviam cometido um abuso sancionado pelo artigo 86._ e pelo qual fossem os únicos responsáveis.

393 Contudo, se bem que a concessão de direitos de exclusividade não seja, por si só, contrária aos artigos 90._, n._ 1, e 86._, o Tribunal de Justiça tem constantemente considerado que os Estados-Membros não gozam de uma liberdade ilimitada quanto à outorga de direitos exclusivos, declarando o seguinte:

«... mesmo que este artigo [artigo 90._, n._ 1] pressuponha a existência de empresas titulares de certos direitos especiais ou exclusivos, daí não resulta que todos os direitos especiais e exclusivos sejam necessariamente compatíveis com o Tratado. Isso depende das diferentes regras para que o n._ 1 do artigo 90._ remete» (188).

394 No que se refere ao alcance de tais limitações, as fórmulas utilizadas pelo Tribunal de Justiça não têm sido inteiramente coerentes (189). É, por isso, necessário examinar os principais casos em que o Tribunal teve de decidir a mesma difícil questão, ou seja, a da compatibilidade de um direito exclusivo, considerado enquanto tal, com os artigos 90._, n._ 1, e 86._ Nesses processos o dilema acima referido manifestou-se, naturalmente, de forma particularmente pronunciada.

395 Os acórdãos de referência quanto à compatibilidade de um direito de exclusividade com o artigo 90._, n._ 1, podem dividir-se em três grupos. Por conveniência, passarei a referi-los como acórdãos do tipo ERT (190), do tipo Höfner e Elser (191) e do tipo Corbeau (192). Analisarei a fundamentação subjacente a cada um destes grupos de acórdãos, e aplicá-la-ei aos casos vertentes.

a) Os acórdãos do tipo ERT

396 No processo ERT foi a cumulação de dois direitos exclusivos - o de difusão dos programas próprios da empresa e o de retransmissão de emissões estrangeiras - que deu origem a um conflito de interesses. A empresa beneficiária do monopólio foi levada a abusar da sua posição dominante por uma política discriminatória que favorecia os programas de produção própria.

397 No processo Raso e o. (193), o regime italiano em causa não só conferia às sociedades concessionárias da estiva portuária o direito exclusivo de fornecer mão de obra temporária a determinadas empresas, como também lhes permitia concorrer com empresas que dependiam dos seus serviços. Desse modo o conflito de interesses era inevitável uma vez que, no mero exercício do seu monopólio, a empresa de estiva podia falsear a concorrência no mercado secundário em benefício próprio.

398 No acórdão Merci convenzionale porto di Genova (194), o Tribunal de Justiça, pronunciando-se sobre os direitos exclusivos conferidos às empresas e sociedades portuárias italianas, declarou o seguinte:

«A este respeito, resulta das circunstâncias descritas pelo órgão jurisdicional nacional e discutidas perante o Tribunal de Justiça que as empresas a quem foi concedido, segundo as modalidades definidas na regulamentação nacional em causa, direito exclusivo são, por esse facto, levadas tanto a exigir o pagamento de serviços não solicitados, como a facturar preços desproporcionados...» (195)

399 Nem a passagem citada nem o resto do acórdão permitem decifrar claramente se, na realidade, o quadro legal comportava características que iam para além da concessão dos direitos exclusivos que justificassem a aplicação do artigo 90._, n._ 1. Não obstante, uma vez que o Tribunal se referiu expressamente às «circunstâncias descritas pelo órgão jurisdicional nacional», inclinar-me-ia a incluir este caso também no primeiro grupo.

400 Nesses três casos não era somente o monopólio em si que era contrário aos artigos 90._, n._ 1, e 86._, mas também a combinação desse monopólio com outros elementos tornavam os abusos muito prováveis. Medidas estruturais que iam mais longe do que a concessão de um direito exclusivo levaram as empresas em questão a abusar da sua posição dominante. Só nesse caso existia motivo para considerar o Estado responsável, pelo menos em parte, pelo comportamento anticoncorrencial da empresa detentora do monopólio.

401 Coloca-se a questão de saber se os casos ora submetidos ao Tribunal correspondem à situação verificada nos acórdãos do tipo ERT, e se existem elementos estruturais para além da existência do direito exclusivo que levem os fundos de pensões a abusar da sua posição dominante.

402 Alega-se, em primeiro lugar, que, até ao momento, não existe prova de qualquer abuso em concreto, como seria, por exemplo, o montante excessivamente elevado das contribuições ou excessivamente modesto das prestações.

403 Esse facto não é por si só decisivo. Resulta da economia do artigo 90._, n._ 1, e da jurisprudência do Tribunal de Justiça (196) que a questão não reside em saber se foram efectivamente cometidos abusos, mas se o enquadramento jurídico conduz as empresas - ainda que teoricamente - a cometer tais abusos.

404 Todavia, não me apercebo de nada no sistema neerlandês que possa induzir os fundos a cometer tais abusos. Pelo contrário, os fundos são controlados por diferentes poderes públicos e por um conselho composto por aderentes. São obrigados a investir os fundos arrecadados segundo critérios prudenciais. As normas fiscais condicionam o montante máximo das pensões. Nestes aspectos a margem de manobra dos fundos é, portanto, limitada. Por consequência, mesmo em presença de abusos concretos do tipo acima referido, os fundos de pensões seriam os únicos responsáveis para efeitos do artigo 86._

405 Não existem portanto, na legislação neerlandesa, elementos estruturais adicionais que levem os fundos a abusar da sua posição dominante.

b) Os acórdãos do tipo Höfner e Elser

406 No processo Höfner e Elser (197) o Tribunal de Justiça foi chamado a pronunciar-se sobre a legalidade do monopólio de colocação de mão-de-obra na Alemanha, tendo declarado, a esse propósito:

«... Um Estado-Membro apenas viola, na verdade, as disposições contidas nessas ditas normas se a empresa em questão, pelo mero exercício do direito exclusivo que lhe foi confiado, explorar de forma abusiva a sua posição dominante.

Nos termos do artigo 86._, segundo parágrafo, alínea b) do Tratado, tal prática abusiva pode consistir, designadamente, numa limitação da actividade, em prejuízo dos que recorrem ao serviço em causa.

Ora, um Estado-Membro cria uma situação em que a actividade de prestação é limitada quando a empresa à qual concedeu um direito exclusivo que abrange as actividades de mediação no emprego de quadros e dirigentes de empresas não se encontra manifestamente em condições de satisfazer a procura existente no mercado para este género de actividades e quando o exercício efectivo destas por sociedades privadas se torna impossível devido à manutenção em vigor de uma disposição legal que proíbe tais actividades, sob pena de nulidade dos contratos celebrados no seu exercício» (198).

407 No processo Job Centre (199), a República Italiana garantia activamente o respeito por um monopólio similar de mediação de emprego, prevendo procedimentos criminais. O Tribunal confirmou o seu acórdão Höfner e Elser. Salientou as particularidades do mercado de fornecimento de serviços relativos à colocação dos trabalhadores e declarou o seguinte:

«Num mercado tão amplo e diferenciado, que está, além disso, sujeito, em virtude do desenvolvimento económico e social, a grandes alterações, os serviços públicos de emprego correm o risco de não estar em condições de satisfazer uma parte significativa de toda a procura de trabalho» (200).

408 Nestes dois últimos casos, ao invés do que acontecia com os do tipo ERT, a intervenção do Estado não ia além da outorga de um direito exclusivo. No entanto, o Tribunal de Justiça concluiu que, devido ao contexto económico específico e à natureza dos serviços em causa, a empresa detentora do monopólio não podia deixar de abusar da sua posição dominante ao limitar constantemente a «produção, a distribuição ou o desenvolvimento técnico em prejuízo dos consumidores», na acepção do artigo 86._, alínea b). Assim, nessas circunstâncias excepcionais, o Tribunal considerou que se justificava uma verdadeira excepção ao princípio da liberdade de concessão de direitos exclusivos pelos Estados-Membros.

409 Porém, ao referir-se, no acórdão Höfner, a uma empresa que não estava manifestamente em condições de satisfazer a procura, o Tribunal afirmou claramente que só marginalmente exerce um controlo judicial da legalidade dos monopólios.

410 Coloca-se a questão de saber se os casos vertentes apresentam uma situação do tipo Höfner e Elser, em que o fundo não pode deixar de, pelo simples exercício do direito exclusivo que lhe foi conferido, explorar a sua posição dominante de forma abusiva. O contexto factual e económico é tal que os fundos de pensões complementares não se encontram, manifesta e sistematicamente, em condições de satisfazerem a procura?

411 As partes divergem grandemente quanto a este ponto. O Tribunal de Justiça não está em posição de resolver a questão, que requer avaliações económicas e factuais detalhadas. E, no caso de questões prejudiciais suscitadas por um órgão jurisdicional nacional ao abrigo do artigo 177._ do Tratado, tais avaliações competem ao juiz nacional. Contudo, pode ser útil mencionar algumas linhas de orientação relativamente aos factores que os órgãos jurisdicionais nacionais podem achar pertinentes para efectuar tais avaliações.

412 Antes do mais, os órgãos jurisdicionais nacionais devem ter em mente as responsabilidades respectivas do Governo neerlandês e dos fundos de pensões no contexto dos artigos 90._, n._ 1, e 86._ Um Estado-Membro só pode ser considerado responsável quando o sistema falha, isto é, quando os abusos sejam «consequência directa» da sua intervenção regulamentar ou decisória, ao passo que as empresas que beneficiam de direitos exclusivos ou especiais são as únicas responsáveis por qualquer violação das regras de concorrência que lhes seja exclusivamente imputável. Logo, não haverá violação dos artigos 90._, n._ 1, e 86._ quando a única razão pela qual um fundo não se encontre «manifestamente em condições de satisfazer a procura» for a sua má gestão ou a sua errada política de investimentos.

413 Depois, os órgãos jurisdicionais nacionais deveriam ter consciência de que este tipo de questão é sempre uma questão de grau, que levanta problemas de uma grande complexidade e que implica juízos de valor sobre importantes opções de índole social e económica. Deve, por isso, realçar-se que, no acórdão Höfner e Elser, o Tribunal de Justiça limitou o âmbito do seu controlo e o do controlo por parte dos órgãos jurisdicionais nacionais aos sistemas nacionais que sejam manifestamente inadequados.

414 Por fim, e porque a concessão de direitos exclusivos implica avaliações económicas delicadas, os Estados-Membros devem dispor, nestas áreas, de uma margem de apreciação ao decidirem se a empresa detentora do monopólio consegue, ou não, satisfazer a procura. Esta é mais uma razão para reduzir o âmbito do controlo judicial a exercer pelos órgãos jurisdicionais nacionais.

415 A Comissão aduziu ainda um argumento suplementar: em caso algum podem os fundos ser comparados a entidades seguradoras normais, uma vez que têm de limitar as suas actividades a um só sector e não estão autorizados a fazer uma selecção de bons ou maus riscos.

416 Em minha opinião, tais argumentos referem-se ao artigo 90._, n._ 2, e conduzem-nos directamente ao terceiro grupo de acórdãos, a saber, os do tipo Corbeau.

c) Os acórdãos do tipo Corbeau

417 No processo Corbeau (201) foi pedido ao Tribunal de Justiça que se pronunciasse sobre a compatibilidade do monopólio postal na Bélgica com os artigos 90._, n._ 1, e 86._ O Tribunal absteve-se de identificar claramente quais as (eventuais) disposições da legislação belga que estariam em contradição com o disposto nos artigos 90._, n._ 1, e 86._ Em vez disso, declarou que o artigo 90._, n._ 1, devia ser interpretado em conjugação com o artigo 90._, n._ 2, prosseguindo de imediato uma análise comparativa dos diferentes argumentos susceptíveis de justificarem a extensão do monopólio. O Tribunal declarou, inter alia, o seguinte:

«Deste modo [o artigo 90._, n._ 2] permite aos Estados-Membros a atribuição a empresas por eles incumbidas da gestão de serviços de interesse económico geral, de direitos exclusivos que podem prejudicar a aplicação das normas do Tratado relativas à concorrência, na medida em que restrições à concorrência, ou até a exclusão de qualquer concorrência, por parte de outros operadores económicos, sejam necessárias ao desempenho da missão especial atribuída às empresas titulares de direitos exclusivos» (202).

418 Mais recentemente, no acórdão Corsica Ferries France (203) o Tribunal de Justiça adoptou a mesma linha de raciocínio a propósito dos direitos exclusivos dos grupos de pilotagem de barra em dois grandes portos italianos. Sem se pronunciar quanto a uma violação prima facie do artigo 90._, n._ 1, o Tribunal considerou que, de qualquer modo, esses direitos exclusivos se justificavam nos termos do artigo 90._, n._ 2.

419 Em meu entender, mesmo o acórdão Sacchi (204), anteriormente proferido pelo Tribunal, se insere nessa categoria. Na parte dispositiva desse acórdão (205), o Tribunal fez referência ao artigo 90._ sem especificar, como fez noutras partes do acórdão, o parágrafo aplicável. Porém, vistas as conclusões do advogado-geral Reischl (206), não se pode excluir que o Tribunal pretendesse referir-se ao artigo 90._, n._ 2.

420 Resulta desta jurisprudência do Tribunal que, quando se aplica a excepção contemplada no artigo 90._, n._ 2, a concessão de direitos exclusivos é, de qualquer modo, justificada. Será o artigo 90._, n._ 2, aplicável aos casos em apreço?

421 O artigo 90._, n._ 2, dispõe:

«As empresas encarregadas da gestão de serviços de interesse económico geral ou que tenham a natureza de monopólio fiscal ficam submetidas ao disposto no presente Tratado, designadamente às regras de concorrência, na medida em que a aplicação destas regras não constitua obstáculo ao cumprimento, de direito ou de facto, da missão particular que lhe foi confiada. O desenvolvimento das trocas comerciais não deve ser afectado de maneira que contrarie os interesses da Comunidade.»

422 A primeira questão que se coloca é a de saber se os fundos de pensões estão encarregados da gestão de serviços de interesse económico geral. Em minha opinião, não deve haver muitas dúvidas a esse respeito.

423 Nos Países Baixos, o regime legal de pensões limita-se a garantir uma pensão indexada ao salário mínimo. Assim sendo, os regimes complementares de pensões permitem que uma grande parte da população beneficie de pensões de valor superior a esse mínimo. Portanto, os fundos têm um objectivo social. Os fundos não agem primariamente no seu próprio interesse, nem no interesse privado individual dos seus aderentes (207): actuam sobretudo no interesse geral. Recentemente o legislador comunitário reconheceu indirectamente a função social importante reservada às pensões complementares, ao adoptar uma directiva relativa à salvaguarda dos direitos de pensão complementar dos trabalhadores assalariados e independentes que se deslocam no interior da Comunidade (208).

424 Além do mais, os fundos, como já se disse, não têm fins lucrativos. São obrigados a aceitar todas as entidades patronais e todos os trabalhadores que pertençam ao sector. Logo, não podem efectuar qualquer selecção dos riscos recorrendo a questionários ou exames médicos. Não há qualquer relação entre o risco e as quotizações. Todas as pessoas inscritas pagam uma contribuição de valor fixo que não tem em conta, por exemplo, nem a idade do trabalhador nem a dimensão da empresa. Em caso de incapacidade para o trabalho, é concedida a dispensa do pagamento das contribuições.

425 Por conseguinte, a portaria que torna a participação obrigatória é um acto de autoridade pública, encarregando o fundo em causa de um serviço de interesse geral.

426 A questão seguinte, sobre se a abolição do sistema de participação obrigatória constituiria um obstáculo ao cumprimento, de direito ou de facto, das missões particulares confiadas aos fundos reveste-se, pois, de importância decisiva.

427 Os fundos e o Governo neerlandês alegam que a manutenção dos seus direitos exclusivos é uma condição necessária à sobrevivência dos fundos de pensões. Remetendo para o acórdão Corbeau, argumentam que o seu equilíbrio financeiro ficaria ameaçado se não houvesse obrigatoriedade de participação, empregando, em relação a este argumento, a imagem de uma espiral negativa, em que os «riscos bons» (isto é, as grandes empresas com pessoal jovem e saudável utilizado em actividades não perigosas) procurariam obter condições mais vantajosas junto das seguradoras privadas, deixando os fundos com uma maior concentração de riscos maus. Por seu turno, esse facto iria provocar um aumento do custo das pensões dos trabalhadores, nomeadamente das pensões dos trabalhadores das pequenas e médias empresas com pessoal com médias de idade mais elevadas e envolvido em actividades perigosas. Em resultado disso, tornar-se-ia cada vez mais difícil, se não mesmo impossível, segurar os maus riscos a preços aceitáveis.

428 Adicionalmente, alegam que só com base na participação obrigatória que é possível haver contribuições forfetárias (sem relação com os ricos), bem como pensões forfetárias (sem relação com os salários). Estado-Membro sua opinião, esse tipo de seguro de pensões nunca poderia ser oferecido pelas seguradoras privadas.

429 De acordo com a Albany, a Brentjens e a Drijvende Bokken, o sistema neerlandês de participação obrigatória vai além do que é necessário para se atingir o objectivo de um nível adequado de protecção social.

430 Em primeiro lugar, bastariam convenções colectivas contendo um mínimo de exigências em matéria de pensões. Em princípio, deveria ser deixada às entidades patronais a incumbência de fixarem regras detalhadas para a administração das contribuições arrecadadas. Se necessário, a lei poderia igualmente impor requisitos mínimos. Um bom exemplo nesta matéria é o fornecido por uma lei que se encontra em vigor desde 1 de Janeiro de 1998, que proíbe os exames médicos prévios no contexto dos contratos de seguros de grupo de pensões.

431 Relativamente ao argumento segundo o qual a viabilidade dos prémios e prestações forfetários só poderia ser assegurada no quadro da participação obrigatória, a Albany, a Brentjens e a Drijvende Bokken contrapõem que, na realidade, o sistema de contribuições de montante fixo já não constitui uma característica essencial dos regimes de pensão complementar, e que não é imposto por lei. Inversamente, vários regimes sectoriais de pensões funcionam com um sistema de prémios de montante fixo e sem obrigatoriedade de inscrição.

432 E, por fim, uma prova empírica de que a participação obrigatória não é necessária é fornecida pelos 15 regimes de pensão complementar dos Países Baixos que funcionam sem que a inscrição nos mesmos seja imperativa.

433 Em meu entender, ainda há demasiados pontos importantes relativos ao contexto factual sobre os quais as partes não estão de acordo e/ou que não são inteiramente claros.

434 Como é que, por exemplo, certos fundos de pensões conseguem sobreviver sem a participação obrigatória? A resposta escrita do Governo neerlandês a uma questão colocada pelo Tribunal de Justiça ainda deixa subsistir certas dúvidas e, além disso, foi parcialmente contestada pelas demandantes no processo principal. Na audiência as partes estiveram em desacordo quanto à questão de saber se, e em que medida, as contribuições e prestações de montante fixo constituíam ainda uma característica essencial dos fundos de pensões complementares nos Países Baixos.

435 Mais uma vez o Tribunal não está em condições de decidir se a abolição da participação obrigatória constituiria um obstáculo ao cumprimento, de direito ou de facto, de missões particulares confiadas aos fundos. O exame detalhado de todos os aspectos económicos, financeiros e sociais compete aos órgãos jurisdicionais nacionais, que deverão ter em conta os aspectos seguintes.

436 O artigo 90._, n._ 2, visa conciliar os interesses dos Estados-Membros em utilizar certas empresas como instrumentos de política económica ou social, com o interesse da Comunidade em que sejam respeitadas as regras da concorrência e do mercado comum (209). Sendo uma disposição que permite derrogar regras do Tratado, o artigo 90._, n._ 2, é de interpretação estrita (210).

437 Todavia, não pode ser proibido aos Estados-Membros terem em consideração, quando definem os serviços de interesse geral que confiam a determinadas empresas, objectivos próprios da sua política nacional (211). Em relação a este aspecto convém relembrar que o direito comunitário não prejudica a competência dos Estados-Membros de organizarem os seus sistemas de segurança social (212), gozando, portanto, de um amplo poder discricionário neste domínio.

438 O Tribunal de Justiça precisou recentemente que, para a excepção consagrada no artigo 90._, n._ 2, ser aplicável, não é necessário que a própria sobrevivência da empresa seja ameaçada (213). De acordo com a redacção dos termos dessa disposição, basta que a aplicação das regras da concorrência constitua obstáculo ao cumprimento, de direito ou de facto, das especiais obrigações que incumbem a essa empresa.

439 Competirá, portanto, aos órgãos jurisdicionais nacionais, em primeiro lugar, determinar com precisão quais são as obrigações de serviço público cometidas aos fundos e, seguidamente, se o cumprimento dessas obrigações seria dificultado se não existisse obrigatoriedade de participação.

440 Do acima exposto resulta que a participação obrigatória não constitui, por si só, uma violação das disposições dos artigos 90._, n._ 1, e 86._, a não ser que, em virtude do quadro regulamentar neerlandês, os fundos não estejam manifestamente em condições de satisfazerem a procura e que a abolição da participação obrigatória não comprometa o desempenho dos serviços de interesse geral que lhes foram confiados.

2. As disposições relativas ao poder discricionário para conceder isenções de participação obrigatória

441 Como já foi dito, o sistema neerlandês contém normas relativas às dispensas individuais da inscrição obrigatória para os casos em que as entidades patronais ou os trabalhadores tenham subscrito, ou desejem subscrever, regimes de pensões especiais alternativos. Três aspectos dessas regras são importantes. Primeiro, é o próprio fundo sectorial competente quem tem de se pronunciar sobre todos os pedidos de isenção. Segundo, na maior parte dos casos o fundo goza de poder discricionário. E, por último, em consequência de tal poder discricionário os órgãos jurisdicionais nacionais limitam-se a exercer um controlo judicial residual da decisão do fundo (214).

442 Remetendo para o acórdão GB-Inno-BM (215), a Albany, a Brentjens e a Drijvende Bokken alegam que essas normas violam os artigos 90._, n._ 1, e 86._ porque conferem aos fundos a possibilidade de decidirem unilateralmente do nível de concorrência a que ficarão expostos.

443 Em contrapartida, os fundos alegam que, de facto, o poder discricionário de que gozam é limitado. Na prática, os fundos não podem conceder isenções mais frequentemente, porque isso iria criar precedentes perigosos. Um maior número de isenções iria enfraquecer a solidariedade ao nível do sector e comprometeria a participação obrigatória enquanto tal, bem como, em última análise, a existência dos próprios fundos. Daí se infere, em sua opinião, que os fundos não são comparáveis ao organismo público visado no acórdão GB-Inno-BM, já referido.

444 A Comissão defende, em primeiro lugar, que a possibilidade de dispensa individual constitui uma abertura excepcional num sistema que, sem ela, seria hermeticamente fechado. Em seu entender, não faria sentido analisar a compatibilidade das normas relativas à concessão de isenções a título individual se a própria participação obrigatória for compatível com o Tratado.

445 Se bem compreendo o argumento da Comissão, qualquer disposição que se refira a dispensas individuais seria automaticamente lícita quando a participação obrigatória, assim como o direito exclusivo dos fundos como tal, tivessem sido considerados compatíveis com os artigos 90, n._ 1, e 86._

446 Não estou de acordo com esta opinião.

447 O alcance do monopólio detido por cada fundo é determinado não só pela portaria que declara a participação obrigatória mas também pelas possibilidades de isenção que apresenta. Se o direito exclusivo do fundo, tal como definido, devesse ser considerado legítimo, seria certamente uma contradição reclamar que os artigos 90._, n._ 1, e 86._ requerem a criação de motivos suplementares (obrigatórios) de isenção. Até aqui concordo com a Comissão.

448 No entanto, o problema neste caso é diferente. A questão não reside no âmbito material do direito exclusivo do fundo, conforme delimitado pela portaria relativa à participação obrigatória e pelos motivos de dispensa que é possível invocar, mas no mecanismo formal pelo qual são tomadas as decisões nessa matéria. Sempre que um fundo toma uma decisão discricionária relativamente a um pedido de isenção individual está, de facto, a determinar ele mesmo o alcance do seu monopólio legal. Essa delegação de poderes de decisão não constitui um elemento necessário e inerente às disposições relativas ao alcance material do direito exclusivo. Logo, pode ser dissociado dessas disposições e ser impugnado separadamente.

449 Na audiência, a Comissão sustentou, em segundo lugar, que nada no quadro regulamentar neerlandês levava os fundos de pensões a abusar do seu poder discricionário. Remetendo para o acórdão Centre d'insémination de la Crespelle (216), a Comissão afirmou que só os fundos poderiam ser responsáveis pelos eventuais abusos.

450 Mais uma vez não fiquei convencido. Ao confiar aos fundos o poder de decidirem quanto aos pedidos individuais de isenção, a legislação neerlandesa cria, manifestamente, um conflito de interesses.

451 Ao adoptar normas quanto à concessão discricionária das isenções, o legislador neerlandês reconheceu que poderão existir situações em que empresas pertencentes a um determinado sector poderão ter interesse legítimo em requerer a isenção. Lembremo-nos, por exemplo, das empresas pertencentes a um mesmo grupo económico com uma política de pensões própria, ou de outras situações que agora estão contempladas como constituindo motivos obrigatórios de isenção na última versão das directrizes em matéria de dispensas (217).

452 Em contrapartida, os fundos sectoriais têm um interesse óbvio em manter uma taxa elevada de participação. Mais aderentes significam, por exemplo, maiores economias de escala no tocante aos custos administrativos, maior poder de aquisição nos mercados financeiros e uma repartição dos riscos mais favorável.

453 As directrizes em matéria de dispensas na versão aplicável ao processo principal confiam aos fundos a tarefa de proceder a uma análise comparativa destes dois conjuntos de interesses. Assim, em certo sentido, o fundo representa simultaneamente os papéis de juiz e de parte.

454 É jurisprudência assente que a criação de semelhantes conflitos de interesses viola os artigos 90._, n._ 1, e 86._

455 No acórdão França/Comissão (218), foi solicitado ao Tribunal de Justiça que se pronunciasse sobre uma directiva baseada nos artigos 90._, n.os 1 e 3 (219), que obrigava os Estados-Membros a garantir que, em matéria de equipamento terminal de telecomunicações, a responsabilidade da elaboração das regras e a supervisão fosse confiada a uma entidade independente da empresa gestora da rede pública. O Tribunal considerou:

«... um sistema de concorrência não falseada, como o que está previsto no Tratado, só pode ser garantido se estiver garantida a igualdade de oportunidades entre os diferentes operadores económicos. Confiar a uma empresa que comercializa aparelhos terminais a tarefa de elaborar as especificações a que deverão responder os aparelhos terminais, de controlar a sua aplicação e de aprovar esses aparelhos traduz-se em conferir-lhe o poder de determinar, a seu bel-prazer, quais os aparelhos terminais susceptíveis de serem ligados à rede pública e em conceder-lhe, desse modo, uma evidente vantagem sobre os seus concorrentes» (220).

456 No acórdão GB-Inno-BM (221), o Tribunal de Justiça reiterava tal constatação, acrescentando:

«... a manutenção de uma concorrência efectiva e a garantia de transparência exigem...» que o organismo que elaborar as especificações e as regras de aprovação seja uma entidade independente de todos os demais concorrentes presentes no mercado dos terminais.

457 No acórdão Tranchant (222) o Tribunal de Justiça considerou, de forma mais específica, que a exigência de independência «tem pois por finalidade excluir todo e qualquer risco de conflito de interesses entre, por um lado, a autoridade reguladora... e, por outro, as empresas...».

458 Noutros casos semelhantes o Tribunal de Justiça exerceu um controlo estrito da exigência de independência (223). Nos acórdãos Decoster (224) e Taillandier (225), por exemplo, considerou que a exigência de independência não estava preenchida quando as diferentes direcções-gerais do Ministério dos Correios e Telecomunicações francês estavam simultaneamente encarregadas da exploração da rede pública e da aplicação da política comercial das telecomunicações, por um lado, e da homologação dos aparelhos terminais, por outro.

459 Uma outra forma de conflito de interesses foi considerado contrário aos artigos 90._, n._ 1, e 86._ pelo Tribunal de Justiça nos acórdão ERT (226) e, mais recentemente, no acórdão Raso (227). Neste último acórdão, em especial, o Tribunal explica claramente a razão pela qual tais conflitos de interesse constituem uma ameaça para a concorrência e as empresas concorrentes.

460 Além do mais, resulta dos acórdãos GB-Inno-BM (228) e Raso e o. (229), que a violação dos artigos 90._, n._ 1, e 86._ se deve ao facto de o quadro legal estar na origem do conflito do interesses em causa, não sendo necessário identificar nenhum caso particular de abuso.

461 Nos casos vertentes os perigos inerentes a este tipo de conflitos de interesses são consideravelmente agravados pelas outras duas características do sistema, a saber, o poder discricionário dos fundos e o limitado controlo jurisdicional das suas decisões.

462 Relativamente a uma situação semelhante, embora num contexto diferente, o Tribunal de Justiça, no processo Meroni/Alta Autoridade, pronunciou-se como segue:

«as consequências resultantes de uma delegação de poderes são muito diferentes, consoante envolvam poderes de execução claramente definidos, cujo exercício seja, por essa razão, susceptível de um controlo rigoroso, à luz de critérios objectivos estabelecidos pela autoridade delegante, ou um poder discricionário, que implique uma ampla margem de apreciação e que, segundo o uso que dele se fizer, se possa traduzir na execução de uma verdadeira política económica» (230).

463 Quanto ao poder discricionário dos fundos de pensão, mais especificamente, é relevante o acórdão Lagauche e o. (231). O operador belga de telecomunicações também havia sido incumbido da homologação de equipamento de telecomunicações. Mas, ao contrário do que acontecia no caso GB-Inno-BM, era o ministro quem estabelecia as especificações técnicas necessárias à homologação. A única missão do organismo detentor do monopólio consistia em verificar a conformidade dos equipamentos com as especificações técnicas fixadas pelo ministro. Na ausência de poder discricionário, o Tribunal de Justiça entendeu que não havia violação dos artigos 90._, n._ 1, e 86._

464 Para compreender a importância do controlo jurisdicional exaustivo bastará referirmo-nos aos referidos acórdãos GB-Inno-BM (232) e Lagauche e o. (233). Em ambos os acórdãos o Tribunal de Justiça, pronunciando-se embora no contexto do artigo 30._, precisou que as decisões de um organismo investido de poderes reguladores e de supervisão susceptíveis de afectar os direitos dos indivíduos derivados do direito comunitário devem ser sujeitas ao controlo jurisdicional.

465 Nos casos vertentes, as directrizes em matéria de dispensas criam um quadro que reúne três elementos decisivos, ou seja, o conflito de interesses, o poder discricionário e um controlo jurisdicional meramente residual. Concluo, portanto, sem que seja necessário tomar posição quanto à nova versão das directrizes em matéria de dispensas, que as disposições neerlandesas referentes ao poder discricionário em matéria de isenções individuais violam os artigos 90._, n._ 1, e 86._

466 Falta ainda tratar brevemente os argumentos finais da Comissão. Esta defende, em primeiro lugar, que o organismo gestor do fundo é, de facto, a única entidade que tem condições para decidir em matéria de isenções, invocando em seguida a possibilidade de reclamação para a Câmara dos Seguros.

467 Em minha opinião o segundo argumento contradiz - pelo menos em parte - o primeiro. Se a Câmara dos Seguros, enquanto órgão independente, pode conhecer das reclamações apresentadas das decisões dos fundos, porque não pode então decidir sobre os pedidos de isenção individual? Porque não poderá um outro órgão independente encontrar o justo equilíbrio entre os interesses dos fundos de pensões e os interesses dos seus aderentes? Quanto ao segundo argumento tornou-se evidente, no decurso das fases escrita e oral do processo que, como já foi dito, a Câmara dos Seguros não tem o poder de tomar decisões legalmente vinculativas. Assim sendo, o recurso para a Câmara dos Seguros não representa uma via de recurso apropriada.

468 Em face do exposto, normas como as constantes das directrizes neerlandesas em matéria de dispensas são contrárias aos artigos 90._, n._ 1, e 86._, na medida em que conferem aos fundos de pensões um poder discricionário para decidir sobre os pedidos de isenção individual da participação obrigatória, que só marginalmente é passível de controlo jurisdicional.

X - Os efeitos jurídicos do acórdão do Tribunal de Justiça

469 O Hoge Raad pede expressamente o Tribunal de Justiça que esclareça quais as consequências do seu acórdão.

470 Do que antecede resulta que é necessário distinguir entre dois aspectos da legislação neerlandesa: a participação obrigatória, em si, e as disposições relativas ao poder discricionário em matéria de concessão de isenções.

471 A primeira questão só se colocaria se o órgão jurisdicional nacional devesse decidir que o sistema neerlandês de participação obrigatória, em si, ou a portaria que tornasse a participação em determinado fundo obrigatória, são contrários ao disposto nos artigos 90, n._ 1, e 86._, e refere-se às consequências de um tal juízo.

472 Ao contrário do que alegam os fundos de pensões, tal julgamento a nível nacional seria baseado na lex specialis dos artigos 90, n._ 1, e 86._, e não no artigo 5._, n._ 2 (234). Os artigos 90, n._ 1, e 86._ têm efeito directo (235). Por isso, as leis e disposições regulamentares nacionais tornando a participação obrigatória seriam, em princípio, inaplicáveis (236).

473 O Governo neerlandês pede ao Tribunal de Justiça que limite os efeitos da sua decisão no tempo.

474 A interpretação pelo Tribunal de Justiça de uma disposição de direito comunitário limita-se a esclarecer e precisar, quando tal é necessário, o significado e o alcance dessa norma, tal como deve ou deveria ter sido entendida e aplicada desde o momento da sua entrada em vigor. O Tribunal tem no entanto admitido que, a título excepcional e por aplicação do princípio geral da certeza jurídica, e tendo em conta os sérios efeitos que o seu acórdão poderá acarretar, se limitem os efeitos da sua decisão no tempo, relativamente ao passado (237).

475 Contra tal limitação poderia argumentar-se que, depois da questão prejudicial suscitada pelo Hoge Raad no processo Van Schijndel e Van Veen, (238) os operadores económicos em causa poderiam ter ficado com algumas dúvidas quanto à legalidade da participação obrigatória em fundos de pensão complementar (239).

476 Por outro lado, no domínio das pensões, a necessidade de uma limitação dos efeitos ratione temporis coloca-se com particular acuidade. Os acórdãos que não contemplassem tais limitações poderiam perturbar retroactivamente o equilíbrio financeiro de muitos regimes de pensões e pôr em causa situações jurídicas que já esgotaram todos os seus efeitos no passado (240). Estou, portanto, inclinado a recomendar uma limitação ratione temporis, a título excepcional, dos efeitos do acórdão.

477 Há que realçar que compete unicamente ao Tribunal de Justiça decidir sobre a referida limitação excepcional, e que esta só será admissível no próprio texto do acórdão que se pronuncie sobre a interpretação solicitada (241).

478 Nos casos vertentes, e segundo a minha análise, é ao órgão jurisdicional nacional que competirá pronunciar-se definitivamente quanto à compatibilidade da participação obrigatória com o direito comunitário. Isso não impede o Tribunal de Justiça, creio, de tomar uma decisão definitiva quanto aos efeitos ratione temporis do acórdão que proferir, baseando expressamente a sua decisão no pressuposto de que, à luz da sua interpretação, os órgãos jurisdicionais nacionais irão declarar o enquadramento jurídico neerlandês contrário ao disposto nos artigos 90._, n._ 1, e 86._

479 A segunda questão diz respeito aos efeitos de um acórdão que declare incompatíveis com os artigos 90._, n._ 1, e 86._ as disposições relativas à concessão de isenções individuais do tipo das aplicáveis nos Países Baixos.

480 Em virtude do efeito directo dos artigos 90._, n._ 1, e 86._, as normas relativas à concessão de isenções individuais são inaplicáveis. Uma vez que tais normas podem ser dissociadas, como já foi mencionado, as normas relativas à participação obrigatória não seriam afectadas (242). Os outros efeitos derivariam, mais uma vez, do direito nacional, dentro dos limites impostos pelo direito comunitário.

XI - Conclusão

De acordo com o que acabo de expor, proponho que o Tribunal de Justiça responda do seguinte modo às questões suscitadas nestes processos:

«1) Não há violação do artigo 85._, n._ 1, do Tratado CE quando os representantes das entidades patronais e dos trabalhadores de um dado sector económico acordam colectivamente em criar um fundo sectorial de pensões e em requerer conjuntamente às autoridades competentes a declaração da obrigatoriedade de participação no mesmo para todas as pessoas pertencentes ao sector.

2) Não há violação dos artigos 5._ e 85._ do Tratado CE quando, a pedido conjunto dos representantes das entidades patronais e dos trabalhadores, um Estado-Membro torna a participação em determinado regime de pensões sectorial obrigatória para todas as empresas pertencentes ao sector.

3) Os fundos de pensões sectoriais neerlandeses são `empresas', na acepção das regras de concorrência do Tratado.

4) Os artigos 90._, n._ 1, e 86._ do Tratado CE só prejudicam a aplicação de normas relativas à participação obrigatória em fundos sectoriais de pensões, como as disposições neerlandesas, se, devido ao quadro regulamentar neerlandês e à decisão que declare obrigatória a participação, os fundos não estiverem manifestamente em condições de satisfazer a procura, e a abolição da participação obrigatória não comprometer o desempenho dos serviços de interesse geral que lhes foram confiados.

Os artigos 90._, n._ 1, e 86._ do Tratado CE só prejudicam a aplicação de normas como as constantes das directrizes neerlandesas em matéria de dispensas se as mesmas conferirem aos fundos de pensões um poder discricionário para decidir sobre os pedidos de isenção individual da participação obrigatória, que só marginalmente seja passível de controlo jurisdicional.

5) Na medida em que as disposições nacionais sejam consideradas contrárias aos artigos 90._, n._ 1, e 86._ do Tratado CE, as mesmas são inaplicáveis, sem prejuízo de uma eventual limitação ratione temporis dos efeitos do acórdão a proferir pelo Tribunal de Justiça.»

(1) - Stb. 1956, 281.

(2) - Acórdão de 14 de Dezembro de 1995, Van Schijndel e Van Veen (C-430/93 e C-431/93, Colect., p. I-4705).

(3) - Stb. 1949, J 121.

(4) - Kamerstukken II 1948-1949, 785, n._ 5, p. 2.

(5) - Hand. II, 1 de Fevereiro de 1949, p. 1101.

(6) - Staatscourant 1953, 1.

(7) - Lutjens, E.: Pensionenvoorzieningen voor werknemers: juridische beschouwingen over ouderdomspensionen, Zwolle, 1989, p. 364.

(8) - Acórdão de 16 de Julho de 1992 (C-83/91, Colect., p. I-4871).

(9) - Acórdão de 26 de Janeiro de 1993 (C-320/90, C-321/90 e C-322/90, Colect., p. I-393).

(10) - Despacho de 21 de Dezembro de 1995 (C-307/95, Colect., p. I-5083).

(11) - Acórdão Meilicke, já referido na nota 8, n._ 26, e acórdão Telemarsicabbruzzo e o., já referido na nota 9, n._ 6.

(12) - Acórdão Telemarsicabbruzzo e o., já referido na nota 9, n._ 7, e despacho de 19 de Março de 1993, Banchero (C-157/92, Colect., p. I-1085, n._ 5).

(13) - Despacho Max Mara, já referido na nota 10, n._ 8, e despacho de 13 de Março de 1996, Banco de Fomento e Exterior (C-326/95, Colect., p. I-1385, n._ 7).

(14) - Despacho Max Mara, já referido na nota 10, n._ 8, e despacho de 20 de Março de 1996, Sunino e Data (C-2/96, Colect., p. I-1543, n._ 5).

(15) - Primeira questão no processo Brentjens, segunda questão no processo Drijvende Bokken.

(16) - Segunda questão no processo Brentjens, terceira questão no processo Drijvende Bokken e, em certa medida, segunda questão no processo Albany.

(17) - Terceira questão no processo Brentjens, primeira questão no processo Drijvende Bokken e primeira questão no processo Albany.

(18) - Quarta questão no processo Brentjens, quarta e quinta questões no processo Drijvende Bokken e terceira questão no processo Albany.

(19) - Sexta questão no processo Drijvende Bokken.

(20) - Acórdão Van Schijndel e Van Veen, já referido na nota 2.

(21) - V., no entanto, as conclusões apresentadas pelo advogado-geral C. O. Lenz no processo Bosman e o. (C-415/93, Colect., p. I-4921, n.os 273 e 274); v. também a Decisão 86/507/CEE da Comissão, de 30 de Setembro de 1986, «Irish Banks' Standing Committee» (JO L 295, p. 28); bem como a resposta à pergunta escrita n._ 777/89 (JO 1990, C 328, p. 3), que comentarei mais pormenorizadamente a seguir.

(22) - Artigo 7._ da Ordonnance 86-1243, de 1 de Dezembro de 1986.

(23) - Conseil de la concurrence, Décision N._ 90-D-21, de 26 de Junho de 1990, Syndicats d'artistes-interprètes.

(24) - Acórdão de 6 de Março de 1991 da cour d' appel de Paris, 1ère Chambre, Syndicat français d'artistes interprètes et autres, in Contrats-Concurrence-Consommation, 1991, p. 108 :«[L]a prohibition edictée par l'ordonnance... intéresse toute forme de concertation, quels qu'en soient les auteurs et les victimes directes, dès lors qu'objectivement elles ont pour objet ou peuvent avoir pour effet d'empêcher, de restreindre ou de fausser le jeu de la concurrence sur un marché.» (A proibição decretada pela ordonnance... diz respeito a todas as formas de concertação, quaisquer que sejam os autores e as vítimas directas, desde que, em termos objectivos, tenham ou possam vir a ter por efeito impedir, restringir ou falsear o jogo da concorrência num dado mercado).

(25) - V. a exposição de motivos da decisão do Conseil de la concurrence, já referida na nota 23.

(26) - Conseil de la concurrence, Avis n._ 92-A-01, de 21 de Janeiro de 1992, Syndicat français des assureurs-conseils.

(27) - Kom. 1987:4, p. 61; HE 148/1987 vp., p. 14 e HE 162/1991 vp., p. 9.

(28) - KHO taltio 1586, de 11 de Abril de 1995.

(29) - Lov n._ 384, de 10 de Junho de 1997.

(30) - Ufr. 1965.634H cf. Ufr. 1965B.260

(31) - «... soweit sie geeignet sind, die Erzeugung oder die Marktverhältnisse für den Verkehr mit Waren oder gewerblichen Leistungen durch Beschränkung des Wettbewerbs zu beeinflussen».

(32) - Amtliche Begründung für den Entwurf eines Gesetzes gegen Wettbewerbsbeschränkungen, BT-Drucks 2/1158, S. 30.

(33) - Sentença de 27 de Junho de 1989, 1- AZR 404/88, parcialmente citada em WuW/E VG 347.

(34) - Carta do Bundeskartellamt de 31 de Janeiro de 1961 - Z2 - 121 100 - 465/60, reproduzida em WuW/E Bkarta 339.

(35) - Observações escritas do Bundeskartellamt na acção instaurada no Landgericht Berlin em 3 de Abril de 1989 - P-178/88, sumariadas em WuW 1989, pp. 563 e 564.

(36) - Acórdão do Kammergericht de 21 de Fevereiro de 1990 - Kart. U 4357/89, reproduzido em WuW/E OLG 4531.

(37) - V. nota 35.

(38) - Whish R.: Competition Law, Butterworths, 3rd edition, 1993, p. 77. V. ainda, no quadro da antiga Restrictive Trade Practices Act 1976 (lei das práticas comerciais restritivas), as excepções em matéria laboral previstas nos artigos 9._, n._ 6 (bens), e 18._, n._ 6 (serviços): os acordos referentes aos salários, condições de admissão, horas e condições de trabalho não estavam sujeitos a declaração.

(39) - Labour Practices in TV and Film-making, Cm 666 (1989).

(40) - «Every contract, combination in the form of trust or otherwise, or conspiracy, in restraint of trade or commerce among the several States or with foreign nations is hereby declared to be illegal.» (Ficam proibidos todos os contratos e coligações sob a forma de trust ou outra forma, bem como as concertações com vista à restrição dos negócios ou do comércio entre os vários Estados ou com nações estrangeiras.)

(41) - Duplex Printing Press Co. v. Deering, 254 US 443.

(42) - 312 US 219.

(43) - Acórdão de 2 de Junho de 1975, Connell Construction v. Plumbers and Steamfitters Local Union No. 100, 421 US 616.

(44) - Acórdão de 7 Junho de 1965, 381 US 657.

(45) - Acórdão de 7 Junho de 1965, 381 US 676.

(46) - 116 S. Ct. 2116 (1996).

(47) - V., por exemplo, o acórdão de 30 de Abril de 1986, Asjes e o. (209/84 a 213/84, Colect., p. I-1425, n._ 40).

(48) - Idem, e acórdão de 11 de Abril de 1989, Ahmed Saeed Flugreisen e o. (66/86, Colect., p. 803).

(49) - Acórdão de 27 de Abril de 1994, Almelo e o. (C-393/92, Colect., 1994, p. I-1477).

(50) - Acórdão de 14 de Julho de 1981, Züchner (172/80, Recueil, p. 2021, n.os 6 a 9).

(51) - Acórdão de 27 de Janeiro de 1987, Verband der Sachversicherer/Comissão (45/85, Colect., p. 405).

(52) - Ibidem, n._ 15.

(53) - Acórdão de 23 de Abril de 1991 (C-41/90, Colect., p. I-1979).

(54) - Acórdão de 11 de Dezembro de 1997 (C-55/96, Colect., p. I-7119).

(55) - Acórdão de 17 de Fevereiro de 1993 (C-159/91 e C-160/91, Colect., p. I-637).

(56) - Acórdão de 16 de Novembro de 1995 (C-244/94), Colect., p. I-4013).

(57) - Acórdão de 17 de Junho de 1997 (C-70/95, Colect., p. I-3395, n._ 43).

(58) - Acórdão de 26 de Março de 1996 (C-238/94, Colect., p. I-1673).

(59) - Directiva 92/49/CEE do Conselho, de 18 de Junho de 1992, relativa à coordenação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas respeitantes ao seguro não vida e que altera as directivas 73/239/CEE e 88/357/CEE (terceira directiva sobre o seguro não vida) (JO L 228, p. 1, rectificado pelo JO L 311, pp. 34, 35 e 42).

(60) - V., no mesmo sentido, as conclusões do advogado-geral C. O. Lenz relativas ao caso Bosman e o., no qual este declarava: «Não há, em meu entender, nenhuma disposição que afaste em geral e totalmente do âmbito das regras da concorrência do Tratado CEE acordos que tenham por objecto relações de trabalho» (acórdão referido na nota 21, n._ 273 das conclusões). No n._ 138 do seu acórdão, o Tribunal entendeu que não era necessário pronunciar-se sobre a interpretação dos artigos 85._ e 86._ do Tratado.

(61) - Acórdão de 5 de Outubro de 1994, Alemanha/Conselho (C-280/93, Colect., p. I-4973, n.os 78 e 87).

(62) - Carta Comunitária dos Direitos Sociais Fundamentais dos Trabalhadores, adoptada por onze Chefes de Estado ou de Governo reunidos em Estrasburgo, no dia 9 de Dezembro de 1989.

(63) - Parecer 2/94, de 28 de Março de 1996 (Colect., I-1759, n._ 33).

(64) - Acórdão de 18 de Junho de 1991, ERT (C-260/89, Colect., p. I-2925, n._ 41).

(65) - Acórdão de 8 de Outubro de 1974 (175/73, Recueil, p. 917, n._ 14, Colect., p. 439).

(66) - Acórdão Bosman e o., já referido na nota 21, n.os 79 e 80.

(67) - Acórdão de 18 de Janeiro de 1990 (193/87 e 194/87, Colect., p. I-95, n.os 11 a 16 e n._ 21).

(68) - Acórdão do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem de 27 de Outubro de 1975, Sindicato nacional da polícia belga /Bélgica (Recueil, Série A, vol. 19, n._ 39).

(69) - Ibidem, n._ 40.

(70) - Acórdão Sindicato nacional da polícia belga/Bélgica, já referido na nota 68, n._ 39; acórdão do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem de 6 de Fevereiro de 1976, Sindicato sueco dos condutores de locomotivas/Suécia (Recueil, Série A, vol. 20, n._ 40).

(71) - Acórdão Sindicato nacional da polícia belga/Bélgica, já referido na nota 68, n._ 38.

(72) - Acórdão Sindicato sueco dos condutores de locomotivas/Suécia , já referido na nota 70, n._ 39.

(73) - Acórdão do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem de 6 de Fevereiro de 1976, Schmidt e Dahlström/Suécia, Recueil, Série A, vol. 21, n._ 36.

(74) - Acórdão referido na nota 70, n._ 38.

(75) - Acórdão Sindicato nacional da polícia belga/Bélgica, já referido na nota 68, n._ 38. O Tribunal comentou o alcance do artigo 6._, n._ 1, da Carta Social Europeia ao proceder à interpretação do artigo 11._ da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.

(76) - Acórdão Sindicato sueco dos condutores de locomotivas/Suécia, já referido na nota 70, n._ 39. O Tribunal comentou o significado do artigo 6._, n._ 2, da Carta Social Europeia, uma vez mais quando procedia à interpretação do artigo 11._ da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.

(77) - Acórdão Schmidt e Dahlström/Suécia, já referido na nota 73, n._ 34.

(78) - Acórdão do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem de 25 de Abril de 1996, R.J.D., 1996-II, n._ 9; Recueil, p. 636.

(79) - Voto parcialmente vencido dos Juízes Ryssdal, Spielmann, Palm, Foighel, Pekkanen, Loizou, Makarczyk e Repik no acórdão Gustafsson/Suécia, já referido na nota 78.

(80) - Voto contra do Juiz Martens, a que se juntou o do Juiz Matscher no acórdão Gustafsson/Suécia, já referido na nota 78, n._ 6.

(81) - Acórdão Gustafsson/Suécia, já referido na nota 78, n._ 45.

(82) - Ibidem, n._ 53.

(83) - Acórdãos de 15 de Janeiro de 1998, Schöning-Kougebetopolou (C-15/96, Colect., p. I-47), e de 24 de Setembro de 1998, Comissão/França (C-35/97, Colect., p. I-5325).

(84) - Acórdão de 13 de Maio de 1986, Bilka-Kaufhaus (C-170/84, Colect., p. 1607).

(85) - Acórdão de 17 de Outubro de 1995, The Queen/Minister of Agriculture, Fisheries and Food, ex parte National Federation of Fishermen's Organizations e o. (C-44/94, Colect., p. I-3115, n._ 55).

(86) - JO 1992, C 191, p. 90.

(87) - V., a título de exemplo, os artigos 4._, 6._, 17, n._ 3, e 18._, n._ 1, da Directiva 93/104/CE do Conselho, de 23 de Novembro de 1993, relativa a determinados aspectos da organização do tempo de trabalho (JO L 307, p. 18).

(88) - Decisão Irish Banks' Standing Committee, já referida na nota 21, n._ 18.

(89) - Comunicação da Comissão relativa ao tratamento das empresas comuns com carácter de cooperação à luz do artigo 85._ do Tratado CEE (JO 1993, C 43 p. 2, III.2 d).

(90) - Acórdãos de 25 de Outubro de 1977, Metro/Comissão (26/76, Colect., p. 659, n._ 43), e de 11 de Julho de 1985, Remia e o./Comissão (42/84, Recueil, p. 2545, n._ 42); Decisão 84/380/CEE da Comissão, de 4 de Julho de 1984, «Fibras Sintéticas» (JO L 207, p. 17, n._ 37), e Decisão 93/49/CEE da Comissão, de 23 de Dezembro de 1992, «Ford/Wolkswagen» (JO L 20, p. 14, n._ 23).

(91) - Acórdão de 17 de Maio de 1990, Barber (C-262/88, Colect., p. I-1889).

(92) - Acórdão Höfner e Elser, já referido na nota 53.

(93) - V., por exemplo, os acórdãos de 4 de Maio de 1988, Bodson (30/87, Colect., p. 2479), Höfner e Elser, já referido na nota 53, e acórdão de 19 de Janeiro de 1994, SAT Fluggesellschaft (C-364/92, Colect., p. I-43).

(94) - Acórdão de 24 de Outubro de 1996, Viho/Comissão (C-73-95 P, Colect., p. I-5457), e os acórdãos mencionados no n._ 16 desse acórdão.

(95) - Acórdão de 12 de Julho de 1984, Hydrotherm (170/83, Recueil, p. 2999, n._ 11) (sublinhado meu).

(96) - Já referido na nota 53.

(97) - Acórdão de 18 de Março de 1997, Calì & Figli (-343/95, Colect., p. I-1547).

(98) - Acórdão de 16 de Dezembro de 1975 (40/73 a 48/73, 50/73, 54/73, 55/73, 56/73, 111/73, 113/73 e 114/73, Colect., p. 563, n._ 539).

(99) - Ibidem, n._ 542.

(100) - Acórdão Barber, já referido na nota 91.

(101) - V. os acórdãos Calì & Figli, já referido na nota 97, e Höfner e Elser, já referido na nota 53.

(102) - V., a propósito dos despachantes alfandegários italianos, o recente acórdão do Tribunal de Justiça de 18 de Junho de 1998, Comissão/Itália (C-35/96, p-3851).

(103) - V., para uma comparação detalhada com as empresas «normais», o acórdão Comissão/Itália, já referido na nota 102, n.os 36 a 38.

(104) - V., a título de exemplo, os artigos 48._ e 59._ do Tratado CE.

(105) - V. os acórdãos de 29 de Outubro de 1980, Van Landewyck e o./Comissão (209/78 a 215/78 e 218/78, Recueil, p. 3125, n._ 88) e FFSA, já referido na nota 56, n._ 21.

(106) - Implícito no acórdão de 21 de Março de 1974, BRT e o. (127/73, Colect., p. 165, n._ 7); conclusões apresentadas pelo advogado-geral Mayras nesse processo (Colect., p. 173) e conclusões do advogado-geral Lenz relativas ao processo Bosman e o., já referido na nota 21, n._ 256.

(107) - V. as conclusões do advogado-geral Lenz relativas ao processo Bosman e o., já referido na nota 21, n._ 258.

(108) - V. os problemas no despacho do Presidente do Tribunal de Primeira Instância de 4 de Junho de 1996, SCK e o./Comissão (T-18/96 R., Colect., p. II-407) e acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 22 de Outubro de 1997, SCK/Comissão (T-213/95 e T-18/96, Colect., p.II-1739).

(109) - Acórdão de 30 de Janeiro de 1985, BNIC (123/83, Recueil. p. 391, n._ 17).

(110) - Acórdão de 15 de Maio de 1975 (71/74, Recueil, p. 563, n.os 30 e 31, Colect., p. 205).

(111) - Acórdão de 20 de Junho de 1978, Tepea/Comissão (28/77, Recueil, p. 1391, n._ 41, Colect., p. 483).

(112) - Acórdão de 25 de Outubro de 1983, AEG/Comissão (107/82, Recueil, p. 3151, n._ 38).

(113) - Acórdão de 15 de Julho de 1970, ACF Chemiefarma/Comissão (41/69, Colect., p. 447, n._ 112), e Van Landewyck e o./Comissão, já referido na nota 105, n._ 86).

(114) - Já referido nas notas 21 e 88.

(115) - Acórdãos de 15 de Dezembro de 1994, Gottrup-Klim e o. (C-250/92, Colect., p. I-5641, n._ 31), e de 12 de Dezembro de 1995, Oude Luttikhuis (C-399/93, Colect., p. I-4515, n._ 10); acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 15 de Setembro de 1998, European Night Services e o./Comissão (T-374/94, T-375/94, T-384/94 e T-388/94, Colect., p. II-0000, n.os 136 e 137).

(116) - Acórdãos de 30 de Junho de 1966, LTM (56/65, Colect. 1965-1968, p. 381); de 28 de Fevereiro de 1991, Delimitis (C-234/89, Colect., p. I-935); de 8 de Junho de 1971, Deutsche Gramophon (78/70, Recueil, p. 487); de 8 de Junho de 1982, Nungesser e Eisele/Comissão (258/78, Recueil, p. 2015); e de 28 de Janeiro de 1986, Pronuptia (161/84, Colect., p. 353).

(117) - Acórdão Oude Luttikhuis, já referido na nota 115, n._ 12.

(118) - JO 1968, C 75, p. 3; EE 08 F1 p. 117; rectificado pelo JO 1968, C 84, p. 14.

(119) - Já referida na nota 89, p. 2.

(120) - Acórdão Oude Luttikhuis, já referido na nota 115, n.os 13 e 14.

(121) - Acórdão de 17 de Janeiro de 1984, VBVB e o./Comissão (43/82 e 63/82, Recueil, p. 19, n._ 37); acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 12 de Dezembro de 1991, Hilti/Comissão (T-30/89, Colect., p. II-1439, n.os 115 a 119); e Decisão 94/815/CE da Comissão, de 30 de Novembro de 1994, «Cimento» (JO L 343, p. 1, n._ 8).

(122) - Decisão «Cimento», já referida na nota 119.

(123) - Acórdão de 17 de Novembro de 1993 (C-2/91, Colect., p. I-5751).

(124) - Acórdão de 17 de Novembro de 1993 (C-245/91, Colect., p. I-5851).

(125) - Acórdãos de 21 de Setembro de 1988, van Eycke (C-267/88, Colect., p. 4769, n._ 16); Meng, já referido na nota 123, n._ 14; de 17 de Novembro de 1993, Reiff (C-185/91, Colect., p. I-5801, n._ 14); Ohra, já referido na nota 124, n._ 10; acórdão de 9 de Junho de 1994, Delta Schiffahrts- und Speditionsgesellschaft (C-153/93, Colect., p. I-2517, n._ 14); de 5 de Outubro de 1995, Centro Servizi Spediporto (C-96/94, Colect., p. I-2883, n.os 20 e 21); de 17 de Outubro de 1995, DIP e o. (C-140/94, C-141/94 E C-142/94, Colect., I-3257, n.os 14 e 15); Sodemare e o., já referido na nota 57, n.os 41 e 42; de 18 de Junho de 1998, Corsica Ferries France (C-266/96, Colect., p. I-3949, n.os 35, 36 e 49), e Comissão/Itália, já referido na nota 102, n.os 53 e 54).

(126) - V. o dispositivo dos acórdãos Meng, já referido na nota 123, e Ohra, já referido na nota 124.

(127) - V., a título de exemplo recente, o acórdão Corsica Ferries France, já referido na nota 125, n._ 51.

(128) - Acórdão de 5 de Outubro de 1994, Centre d'insémination de la Crespelle (C-323/93, Colect., p. I-5077, n._ 15).

(129) - V., supra, n._ 207.

(130) - Já referido na nota 55.

(131) - Já referido na nota 2.

(132) - Já referido na nota 56.

(133) - V., supra, n._ 214.

(134) - Acórdãos Höfner e Elser, já referido na nota 53, n._ 21, e Job Centre, já referido na nota 54, n._ 21.

(135) - Acórdão Höfner e Elser, já referido na nota 53.

(136) - Acórdãos de 16 de Junho de 1987, Comissão/Itália (118/85, Colect., p. 2599, n.os 6 a 16), e de 14 de Dezembro de 1995, Banchero (C-387/93, Colect., p. I-4663, n._ 50).

(137) - Acórdão Calì & Figli, já referido na nota 97.

(138) - Acórdão Van Landewyck e o., já referido na nota 105, n._ 88; conclusões do advogado-geral C. O. Lenz relativas ao processo Bosman e o., já referido na nota 21, n._ 255.

(139) - Acórdão de 30 de Abril de 1974, Sacchi (155/73, Colect., p. 223, n.os 13 e 14).

(140) - Acórdão de 20 de Março de 1985, Itália/Comissão (41/83, Recueil, p. 873, n.os 18 e 19).

(141) - Acórdão de 19 de Maio de 1993, Corbeau (C-320/91, Colect., p. I-2533, n._ 8).

(142) - Acórdão ERT, já referido na nota 64, n._ 33, e acórdão de 3 de Outubro de 1985, CBEM (311/84, Recueil, p. 3261, n._ 17).

(143) - Acórdão de 10 de Dezembro de 1991, Merci convenzionali porto di Genova, (C-179/90, Colect., p. I-5889, n._ 9.

(144) - Acórdão Höfner e Elser, já referido na nota 53, n._ 22.

(145) - Acórdãos de 8 de Novembro de 1983, IAZ e o./Comissão (96/82 a 102/82, 104/82, 105/82, 108/82 e 110/82, Recueil, p. 3369, n._ 20), e Frubo/Comissão, já referido na nota 110, n.os 30 e 31.

(146) - Acórdão de 17 de Dezembro de 1991, Enichem Anic/Comissão (T-6/89, Colect., p. II-1623, n._ 235).

(147) - Acórdão Comissão/Itália, já referido na nota 136, n.os 7 e 8, e Calì & Figli, já referido na nota 97, n.os 16 e 17.

(148) - Acórdão Bodson, já referido na nota 93, n._ 18.

(149) - Acórdãos Comissão/Itália, já referido na nota 136, n.os 7 e 8, e Calì & Figli, já referido na nota 97, n.os 16 e 17.

(150) - Acórdãos SAT Fluggesellschaft, já referido na nota 93, n._ 30, e Calì & Figli, já referido na nota 97, n.os 22 e 23.

(151) - Acórdão Höfner e Elser, já referido na nota 53.

(152) - Já referido na nota 55.

(153) - Já referido na nota 2, n.os 53 a 65 das minhas conclusões.

(154) - Já referido na nota 56.

(155) - V., supra, n._ 312, bem como as notas 134 a 137.

(156) - N._ 14, interpretado em conjugação com o n._ 16.

(157) - N._ 11.

(158) - N._ 18.

(159) - V., supra, n._ 312, bem como as notas 138 e 139.

(160) - V., supra, n._ 313 e notas 145 e 146.

(161) - N._ 12.

(162) - N._ 15.

(163) - N.os 10 e 18.

(164) - N._ 15.

(165) - N._ 19.

(166) - N._ 9.

(167) - N._ 10.

(168) - N._ 13.

(169) - N._ 15.

(170) - N.os 17 e 22.

(171) - V., supra, n._ 15.

(172) - Já referido na nota 53.

(173) - Acórdão de 13 de Dezembro de 1991 (C-18/88, Colect., p. I-5941).

(174) - V., supra, n._ 301.

(175) - Acórdãos de 16 de Novembro de 1977, INNO, Colect., p. 753, n.os 30 e 31; acórdão Ahmed Saeed Flugreisen e o., já referido na nota 48, n._ 48; e acórdão ERT, já referido na nota 64, n._ 35.

(176) - V., supra, n.os 298 a 305.

(177) - Acórdãos INNO, já referido na nota 175, n.os 32 e 42, e Ahmed Saeed Flugreisen e o., já referido na nota 48, n._ 50.

(178) - Acórdão Centre d'insémination de la Crespelle, já referido na nota 128, n._ 15.

(179) - Acórdãos de 29 de Novembro de 1978, Pigs Marketing Board (83/78, Colect., p. 821, n.os 43 e 44); CBEM, já referido na nota 142, n.os 16 e 17; e Centre d'insémination de la Crespelle, já referido na nota 128, n._ 24 a 27.

(180) - Acórdão de 11 de Novembro de 1997, Comissão e França/Ladbroke (C-359/95 P e C-379/95 P, Colect., p. I-6225, n.os 32 a 37).

(181) - Acórdãos CBEM, já referido na nota 142, n._ 16; Höfner e Elser, já referido na nota 53, n._ 28; ERT, já referido na nota 64, n._ 31; Merci convenzionale porto di Genova, já referido na nota 143, n._ 14; de 12 de Fevereiro de 1998, Raso e o. (C-163/96, Colect., p. 533, n._ 25), e Corsica Ferries France, já referido na nota 125, n._ 39.

(182) - Acórdão CBEM, já referido na nota 142, n._ 16.

(183) - Acórdão de 13 de Novembro de 1975, General Motors/Comissão (26/75, Recueil, p. 1367, n._ 9; Colect., p. 467).

(184) - Acórdão Centre d'insémination de la Crespelle, já referido na nota 128, n._ 20.

(185) - V., a título de exemplo, os acórdãos CBEM, já referido na nota 142, n._ 17; Höfner e Elser, já referido na nota 53, n._ 29; Merci convenzionali porto di Genova, já referido na nota 143, n._ 16, e Corbeau, já referido na nota 141, n._ 11.

(186) - Já referido na nota 128.

(187) - V. a argumentação análoga expendida nos acórdãos Banchero, já referido na nota 136, e Job Centre, já referido na nota 54.

(188) - Acórdão de 19 de Março de 1991, França/Comissão (C-202/88, Colect., p. 1223, n._ 22).

(189) - V., a título de exemplo, os acórdãos Merci convenzionali porto di Genova, já referido na nota 143, n._ 17, e de 25 de Junho de 1998, Chemische Afvalstoffen Dusseldorp (C-203/96, Colect., p. 4075, n._ 61).

(190) - Já referido na nota 64; v. igualmente os acórdãos Merci convenzionali porto di Genova, já referido na nota 143, e Raso e o., já referido na nota 181.

(191) - Já referido na nota 53, e acórdão Job Centre, já referido na nota 54.

(192) - Já referido na nota 154; v. igualmente o acórdão Corsica Ferries France, já referido na nota 125, e o acórdão Sacchi, já referido na nota 139.

(193) - Já referido na nota 181.

(194) - Já referido na nota 143.

(195) - N._ 19.

(196) - Acórdãos Raso e o., já referido na nota 181, n._ 31, e GB-Inno-BM, já referido na nota 173 n.os 23 e 24.

(197) - Já referido na nota 53.

(198) - N.os 29 a 31.

(199) - Já referido na nota 54.

(200) - N._ 34.

(201) - Já referido na nota 141.

(202) - N._ 14.

(203) - Já referido na nota 125.

(204) - Já referido na nota 139.

(205) - N._ 14, terceira alínea.

(206) - Colect. 1974, p. 234.

(207) - Acórdão BRT e o., já referido na nota 106, n._ 23, e, a contrario, o acórdão Züchner, já referido na nota 50, n._ 7.

(208) - Directiva 98/49/CE do Conselho, de 29 de Junho de 1998 (JO L 209, p. 46).

(209) - Acórdão de 23 de Outubro de 1997, Comissão/Países Baixos (C-157/94, Colect., p. I-5699, n._ 39).

(210) - Ibidem, n._ 37.

(211) - Acórdão Comissão/Países Baixos, já referido na nota 209, n._ 40.

(212) - Acórdãos de 7 de Fevereiro de 1984, Duphar e o. (238/82, Recueil, p. 523, n._ 16); Poucet e Pistre, já referido na nota 55, n._ 6; e Sodemare e o., já referido na nota 57, n._ 27.

(213) - Acórdão Comissão/Países Baixos, já referido na nota 209, n._ 43.

(214) - V., supra, n.os 352 a 363.

(215) - Já referido na nota 173.

(216) - Já referido na nota 128 e comentado no n._ 392, supra.

(217) - V., supra, n._ 360.

(218) - Já referido na nota 188.

(219) - Comparar com o n._ 13 deste acórdão.

(220) - N._ 51.

(221) - Já referido na nota 173, n._ 26.

(222) - Acórdão de 9 de Novembro de 1995, Tranchant (C-91/94, Colect., p. I-3911, n._ 19).

(223) - Acórdãos de 17 de Novembro de 1992, dito «Mercados de serviços de telecomunicações», Espanha e o./Comissão (C-271/90, C-281/90 e C-289/90, Colect., p. I-5833, n._ 22); de 27 de Outubro de 1993, Decoster (C-69/91, Colect., p. I-5335); e de 27 de Outubro de 1993, Taillandier (C-92/91, Colect., 1 p. I-5383).

(224) - Já referido na nota 223.

(225) - Já referido na nota 223.

(226) - Já referido na nota 64, n._ 37.

(227) - Já referido na nota 181, n.os 28 a 31.

(228) - Já referido na nota 173, n.os 23 e 24.

(229) - N._ 31.

(230) - Acórdão de 13 de Junho de 1958, Meroni/Alta Autoridade (9/56, Recueil, p. 9, n._ 152, Colect., p. 229).

(231) - Acórdão de 27 de Outubro de 1993, Lagauche e o. (C-46/90 e C-93/91, Colect., p. I-5267).

(232) - Já referido na nota 173, n.os 34 a 36.

(233) - Já referido na nota 231, n.os 25 a 29.

(234) - V., supra, n._ 304, e o acórdão Centre d'insémination de la Crespelle, já referido na nota 128, n._ 15.

(235) - Acórdão Merci convenzionali porto di Genova, já referido no n._ 143, n._ 23.

(236) - Acórdãos de 4 de Abril de 1968, Lück (34/67, Recueil, p. 359 e, em especial, p. 370, Colect. 1965-1968, p. 839), e de 22 de Outubro de 1998, IN.CO.GE'90 (C-10/97 e C-22/97, Colect., p. 6307, n.os 18 a 21).

(237) - Acórdão de 15 de Setembro de 1998, Edis (C-231/96, Colect., p. I-4951, n.os 15 e 16).

(238) - Já referido na nota 2.

(239) - Acórdão Bosman e o., já referido na nota 21, n._ 146.

(240) - Acórdão Barber, já referido no n._ 91, n._ 4.

(241) - Acórdão de 27 de Março de 1980, Salumi e o. (66/79, 127/79 e 128/79, Recueil p. 1237, n._ 11).

(242) - V., numa situação comparável, as conclusões do advogado-geral G. Tesauro relativas ao processo Decoster, já referido na nota 223, p. 5371.