61995J0341

Acórdão do Tribunal de 14 de Julho de 1998. - Gianni Bettati contra Safety Hi-Tech Srl. - Pedido de decisão prejudicial: Pretura circondariale di Avezzano - Itália. - Regulamento (CE) n. 3093/94 - Medidas de protecção da camada de ozono - Restrições quanto à utilização dos hidroclorofuorocarbonos e halons - Validade. - Processo C-341/95.

Colectânea da Jurisprudência 1998 página I-04355


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


1 Direito comunitário - Interpretação - Métodos - Interpretação à luz dos acordos internacionais celebrados pela Comunidade

2 Ambiente - Protecção da camada de ozono - Regulamento n._ 3093/94 - Alcance - Proibição da utilização e da comercialização de hidroclorofluorocarbonos destinados ao combate aos incêndios - Violação dos artigos 30._ e 130._-R do Tratado - Inexistência

(Tratado CE, artigos 30._ e 130._-R; Regulamento n._ 3093/94 do Conselho, artigo 5._)

3 Ambiente - Disposições do Tratado - Artigo 130._-R - Condições de aplicação - Fiscalização pelo órgão jurisdicional comunitário - Limites

(Tratado CE, artigo 130._-R)

4 Ambiente - Acções a desenvolver pela Comunidade - Adopção de medidas relativas a um problema ambiental específico - Admissibilidade - Condições

(Tratado CE, artigos 130._-R e segs.)

5 Ambiente - Política da Comunidade - Exigência de um nível de protecção elevado - Alcance

(Tratado CE, artigo 130._-R, n._ 2)

6 Questões prejudiciais - Admissibilidade - Questão colocada sem qualquer precisão sobre o contexto factual e regulamentar

(Tratado CE, artigo 177._)

Sumário


7 Os textos do direito comunitário devem ser interpretados, na medida do possível, à luz do direito internacional, em especial quando os mesmos têm por objectivo justamente dar cumprimento a um acordo internacional celebrado pela Comunidade.

8 O artigo 5._ do Regulamento n._ 3093/94, relativo às substâncias que empobrecem a camada de ozono, contém uma proibição de princípio, aplicável a partir de 1 de Junho de 1995, de utilização de hidroclorofluorocarbonos (HCFC). Na medida em que, entre as excepções que acompanham a referida proibição, não está prevista a utilização dos HCFC como substâncias destinadas ao combate aos incêndios, a disposição em causa deve ser interpretada no sentido de que proíbe totalmente a utilização e, consequentemente, a comercialização dos HCFC destinados aos referidos fins.

Esta proibição não é inválida à luz do artigo 130._-R do Tratado, dado que o legislador comunitário não cometeu um erro de apreciação manifesto no que respeita às condições de aplicação da referida disposição, nem desrespeitou o princípio da proporcionalidade. Ao adoptar uma medida mais rigorosa do que as impostas pelas suas obrigações internacionais e ao prever que a Comissão, em função do progresso técnico, pode acrescentar, suprimir ou alterar a lista das utilizações proibidas, o legislador respeitou, em especial, o princípio da protecção elevada previsto no n._ 2 e teve em consideração os dados científicos e técnicos disponíveis, como exige o n._ 3 da referida disposição.

A proibição em causa também não é inválida à luz do artigo 30._ do Tratado, dado que a protecção do ambiente que tem por objectivo constitui uma exigência imperativa que pode limitar a aplicação da referida disposição.

9 O artigo 130._-R do Tratado, relativo à política da Comunidade no domínio do ambiente, prevê uma série de objectivos, princípios e critérios que o legislador comunitário deve respeitar no âmbito da aplicação desta política. Contudo, tendo em conta a necessidade da ponderação de determinados objectivos e princípios, bem como a complexidade da aplicação dos critérios, a fiscalização judicial deve necessariamente limitar-se à questão de saber se, ao adoptar determinada regulamentação, o legislador cometeu um erro de apreciação manifesto no que respeita às condições de aplicação do artigo 130._R do Tratado.

10 Não resulta das disposições do título XVI do Tratado, relativo ao ambiente, que o artigo 130._-R, n._ 1, imponha ao legislador, cada vez que adopta medidas de preservação, de protecção e de melhoria do ambiente relativas a um problema ambiental específico, que adopte simultaneamente medidas que se destinem ao ambiente no seu conjunto. Daqui decorre que esta disposição permite a adopção de medidas que têm por objectivo unicamente determinados aspectos definidos do ambiente, na medida em que contribuam para a preservação, protecção e melhoria da qualidade do mesmo.

11 Embora seja pacífico que o artigo 130._-R, n._ 2, do Tratado impõe que a política da Comunidade no domínio do ambiente vise um nível de protecção elevado, esse nível de protecção, para ser compatível com a mesma disposição, não deve necessariamente ser tecnicamente o mais elevado possível. Efectivamente, o artigo 130._-T do Tratado permite que os Estados-Membros mantenham ou introduzam medidas de protecção reforçadas.

12 A necessidade de se chegar a uma interpretação do direito comunitário que seja útil ao órgão jurisdicional nacional exige que este defina o quadro factual e legal em que se inscrevem as questões que coloca ou que, pelo menos, explique as hipóteses factuais em que assentam essas questões. Estas exigências são particularmente válidas em determinados domínios, como o da concorrência, que são caracterizados por complexas situações de facto e de direito.

Partes


No processo C-341/95,

que tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 177._ do Tratado CE, pela Pretura circondariale di Avezzano (Itália), destinado a obter, no litígio pendente neste órgão jurisdicional entre

Gianni Bettati

e

Safety Hi-Tech Srl,

uma decisão a título prejudicial sobre a validade do artigo 5._ do Regulamento (CE) n._ 2093/94 do Conselho, de 15 de Dezembro de 1994, relativo às substâncias que empobrecem a camada de ozono (JO L 333, p. 1),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

composto por: G. C. Rodríguez Iglesias, presidente, C. Gulmann, H. Ragnemalm e M. Wathelet, presidentes de secção, G. F. Mancini, J. C. Moitinho de Almeida, P. J. G. Kapteyn, D. A. O. Edward, P. Jann, L. Sevón e K. M. Ioannou (relator), juízes,

advogado-geral: P. Léger,

secretário: H. A. Rühl, administrador principal,

vistas as observações escritas apresentadas:

- em representação da Safety Hi-Tech Srl, por Maurizio Maresca e Salvatore Elio La Rosa, advogados no foro de Génova,

- em representação do Governo italiano, pelo professor Umberto Leanza, chefe do Serviço do Contencioso Diplomático do Ministério dos Negócios Estrangeiros, na qualidade de agente, assistido por Pier Giorgio Ferri, avvocato dello Stato,

- em representação do Governo austríaco, por Wolf Okresek, Ministerialrat no Bundeskanzleramt, na qualidade de agente,

- em representação do Conselho da União Europeia, por Anna Lo Monaco e Guus Houttuin, membros do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes,

- em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por Laura Pignataro e Antonio Aresu, membros do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes,

visto o relatório para audiência,

ouvidas as alegações da Safety Hi-Tech Srl, representada por Maurizio Maresca, do Governo italiano, representado por Pier Giorgio Ferri, do Governo espanhol, representado por Rosario Silva de Lapuerta e Nuria Díaz Abad, abogados del Estado, na qualidade de agentes, do Governo francês, representado por Romain Nadal, secretário adjunto dos Negócios Estrangeiros na direcção dos assuntos jurídicos do Ministério dos Negócios Estrangeiros, na qualidade de agentes, do Conselho, representado por Anna Lo Monaco e Guus Houttuin, e da Comissão, representada por Laura Pignataro e Paolo Stancanelli, membro do Serviço Jurídico, na qualidade de agente, na audiência de 11 de Novembro de 1997,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 3 de Fevereiro de 1998,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por decisão de 16 de Outubro de 1995, entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 30 do mesmo mês, a Pretura circondariale di Avezzano submeteu, nos termos do artigo 177._ do Tratado CE, uma questão prejudicial sobre a validade do artigo 5._ do Regulamento (CE) n._ 3093/94 do Conselho, de 15 de Dezembro de 1994, relativo às substâncias que empobrecem a camada de ozono (JO L 333, p. 1, a seguir «regulamento»).

2 Esta questão foi suscitadas no âmbito de um litígio entre Gianni Bettati, proprietário da empresa Bettati Antincendio di Reggio Emilia, e a Safety Hi-Tech Srl (a seguir «Safety») decorrente da recusa de pagamento pelo primeiro à segunda do fornecimento de um produto designado «NAF S III», composto por hidroclorofluorocarbonos (a seguir «HCFC»), que é utilizado no combate aos incêndios.

3 Resulta do processo principal que a Safety forneceu a G. Bettati, nos termos de um contrato de 12 de Maio de 1995, determinada quantidade do referido produto, pela qual recebeu parte do montante devido. Em consequência da recusa de G. Bettati de pagar o montante restante, ou seja, 22 294 730 LIT, a Safety requereu à Pretura circondariale uma injunção contra G. Bettati.

4 Por decisão de 31 de Julho de 1995, o referido órgão jurisdicional ordenou a G. Bettati que pagasse o montante restante à Safety. G. Bettati deduziu oposição a esta decisão pelo facto de o produto adquirido se revelar, posteriormente à celebração do contrato, inadequado e desprovido de utilidade, justificando dessa forma a resolução do contrato nos termos do artigo 1497._ do código civil italiano, uma vez que o artigo 5._ do regulamento proíbe, a partir de 1 de Julho de 1995, a comercialização do referido produto.

5 A Safety, que se constituiu parte no processo, impugnou a compatibilidade do mesmo regulamento com os artigos 3._, 5._, 30._, 86._, 92._ e 130._-R do Tratado CE, dado que o regulamento em causa proíbe a utilização dos HCFC no combate aos incêndios.

6 O regulamento, que tem como base jurídica o artigo 130._-S, n._ 1, do Tratado CE, o qual se destina a realizar os objectivos previstos no artigo 130._-R, tem por finalidade, como resulta dos seus considerandos, atentos os conhecimentos científicos e técnicos e a existência de substâncias de substituição, a adopção de medidas de eliminação progressiva das substâncias que empobrecem a camada de ozono.

7 Em especial, como resulta dos terceiro, quarto e quinto considerandos, o regulamento foi adoptado para dar cumprimento aos compromissos assumidos pela Comunidade, por um lado, no âmbito da Convenção de Viena, de 22 de Março de 1985, para a protecção da camada de ozono (a seguir «Convenção de Viena»), e do protocolo de Montreal, de 16 de Setembro de 1987, relativo às substâncias que empobrecem a camada de ozono (Decisão 88/540/CEE do Conselho, de 14 de Outubro de 1988, JO L 297, p. 8), protocolo este que foi alterado em 29 de Junho de 1990 (Decisão 91/690/CEE do Conselho, de 12 de Dezembro de 1991, JO L 377, p. 28), e, por outro, no âmbito da segunda emenda ao protocolo de Montreal, de 25 de Novembro de 1992, relativo às substâncias que empobrecem a camada de ozono (Decisão 94/68/CE do Conselho, de 2 de Dezembro de 1993, JO 1994, L 33, p. 1), instrumentos estes em que são partes todos os Estados-Membros e a Comunidade.

8 O artigo 1._ do regulamento, que determina o respectivo âmbito de aplicação, esclarece que o regulamento é aplicável à produção, importação, exportação, oferta, utilização e/ou recuperação das diversas substâncias, designadas «substâncias regulamentadas», ali enumeradas, entre as quais constam os HCFC e os halons.

9 Os HCFC são definidos no décimo segundo travessão do artigo 2._ do regulamento como sendo uma das substâncias regulamentadas e enumeradas no grupo VIII do Anexo I, incluindo os seus isómeros. Os halons são definidos no sétimo travessão do mesmo artigo do regulamento como sendo uma das substâncias regulamentadas enumeradas no grupo III do Anexo I, incluindo os seus isómeros.

10 No que respeita em especial ao regime de utilização dos HCFC, o artigo 4._, n.os 8, 9, segundo parágrafo, e 10, do regulamento estabelece um regime especial aplicável aos HCFC comercializados ou utilizados para consumo próprio pelos produtores ou importadores.

11 Qualquer outra utilização dos HCFC, com excepção da respectiva utilização para consumo próprio pelos produtores ou importadores, está regulamentada no artigo 5._ do regulamento, sob o título «Controlo da utilização de hidroclorofluorcarbonos», que dispõe o seguinte:

«1. A partir do primeiro dia do sexto mês seguinte à data da entrada em vigor do presente regulamento, será proibida a utilização de hidroclorofluorocarbonos, excepto:

- como solventes,

- como agentes refrigerantes,

- na produção de espumas rígidas isolantes e espumas com pele integrada utilizadas em aplicações de segurança,

- em utilizações laboratoriais, incluindo investigação e desenvolvimento,

- como matéria-prima no fabrico de outros produtos químicos,

- como gás de transporte utilizado para efeitos de esterilização em sistemas fechados.

2. A partir de 1 de Janeiro de 1996, serão proibidas as seguintes utilizações de hidroclorofluorocarbonos:

- em utilizações não circunscritas de solventes, incluindo máquinas de limpar e sistemas de desidratação abertos, sem compartimento frigorífico, em colas e outras substâncias adesivas, em agentes de desmoldagem, quando não utilizados em equipamento fechado, na limpeza de esgotos, quando os hidroclorofluorocarbonos não são recuperados e em aerossóis, excepto no caso de utilização como solventes para reagentes na revelação de impressões digitais em superfícies porosas como o papel, e no caso de utilização enquanto agentes fixadores para impressoras a laser fabricadas antes de 1 de Janeiro de 1996,

- em equipamentos fabricados depois de 31 de Dezembro de 1995 para as seguintes utilizações:

a) como agentes refrigerantes em sistemas não fechados de evaporação directa,

b) como agentes refrigerantes nos aparelhos de refrigeração e congelação domésticos,

c) nos aparelhos de ar condicionado de veículos automóveis,

d) nos aparelhos de ar condicionado de transportes públicos rodoviários.

3. A partir de 1 de Janeiro de 1998, será proibida a utilização de hidroclorofluorocarbonos em equipamentos fabricados depois de 31 de Dezembro de 1997 para as seguintes utilizações:

- nos aparelhos de ar condicionado de transportes públicos ferroviários,

- como gás de transporte utilizado para efeitos de esterilização em sistemas fechados.

4. A partir de 1 de Janeiro de 2000, será proibida a utilização de hidroclorofluorocarbonos em equipamentos fabricados depois de 31 de Dezembro de 1999 para as seguintes utilizações:

- como agentes refrigerantes em entrepostos e armazéns frigoríficos públicos e de distribuição,

- como agentes refrigerantes para equipamentos de potência igual ou superior a 150 kW,

excepto quando existam normas, regulamentos de segurança ou outras restrições afins relativas à utilização de amoníaco.

5. A partir da data de entrada em vigor da restrição de utilização, será proibida a importação, colocação em livre circulação ou a colocação no mercado de equipamentos aos quais se aplique uma restrição de utilização ao abrigo do presente artigo. Os equipamentos que comprovadamente foram fabricados antes da data da restrição de utilização não serão abrangidos pela proibição.

6. Nos termos do procedimento previsto no artigo 16._, a Comissão pode acrescentar, suprimir ou alterar os elementos da lista dos n.os 1 a 4, em função do progresso técnico.»

12 No que respeita aos halons, o artigo 3._, n._ 3, do regulamento prevê, salvo determinadas excepções constantes dos n.os 8 a 12 do mesmo artigo:

«... cada produtor assegurará que a partir de 31 de Dezembro de 1993 cesse a produção de halons.

Em função das indicações apresentadas pelos Estados-Membros e nos termos do procedimento previsto nos termos do artigo 16._, a Comissão aplicará os critérios definidos na decisão IV/25 das partes no protocolo de Montreal para proceder à determinação anual de quaisquer utilizações essenciais para as quais possa ser permitida a produção e importação de halons na Comunidade depois de 31 de Dezembro de 1993, bem como dos utilizadores que possam proceder a essas utilizações essenciais para consumo próprio. Essa produção e importação só serão permitidas se nenhuma das partes no protocolo dispuser de alternativas adequadas nem de halons reciclados.

A Comissão concederá licenças aos utilizadores a designar nos termos do segundo parágrafo e notificá-los-á das utilizações que forem autorizados a praticar, das substâncias que forem autorizados a utilizar e das respectivas quantidades.

A fim de satisfizer a procura por parte dos utilizadores designados no segundo parágrafo, a autoridade competente do Estado-Membro em que se situa a produção em questão pode autorizar determinado produtor a produzir halons após 31 de Dezembro de 1993. A autoridade competente do Estado-Membro em questão notificará a Comissão dessa autorização, com a devida antecedência».

13 Por outro lado, o artigo 4._, n._ 3, do regulamento prevê também, no que diz respeito aos halons:

«... cada produtor assegurará que a partir de 31 de Dezembro de 1993 não colocará no mercado nem utilizará halons para consumo próprio.

A fim de satisfazer a procura por parte dos utilizadores autorizados nos termos do n._ 3 do artigo 3._, a autoridade competente do Estado-Membro em que decorre a produção de um produtor pode autorizar este último a colocar halons no mercado após 31 de Dezembro de 1993.»

14 Além disso, salvo autorização excepcional concedida pela Comissão, o artigo 8._, n._ 1, do regulamento proíbe a colocação em livre circulação na Comunidade, entre outras coisas, de halons importados de Estados que não sejam partes no protocolo, quer se trate de substâncias virgens, recuperadas ou valorizadas, e o artigo 9._ proíbe também a colocação em livre circulação na Comunidade de produtos que contenham, nomeadamente, halons importados de Estados que não sejam partes no protocolo.

15 No que respeita à utilização de halons, é pacífico que o regulamento não contém uma disposição análoga ao artigo 5._, que se refere à utilização dos HCFC.

16 A Pretura circondariale tem dúvidas quanto à validade do artigo 5._ do regulamento, na medida em que o mesmo proíbe sem excepção, a partir de 1 de Junho de 1995, a utilização dos HCFC como material de combate aos incêndios, atentas as disposições do Tratado relativas à política ambiental da Comunidade, à livre circulação de mercadorias e à livre concorrência, uma vez que aquela disposição não prevê proibição idêntica relativamente aos halons, também utilizados no sector em questão, os quais têm um potencial de destruição da camada de ozono superior ao dos HCFC e um impacto ainda mais negativo sobre o ambiente.

17 Tendo em conta estas considerações, o órgão jurisdicional nacional decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«O artigo 5._ do Regulamento (CE) n._ 3093/94 do Conselho, de 15 de Dezembro de 1994, é válido, tendo em conta os artigos 3._, 5._, 30._, 86._, 92._ e 130._-R do Tratado CE, na parte em que proíbe incondicionalmente, a partir de 1 de Junho de 1995, a utilização dos HCFC no sector do combate aos incêndios, pelos fundamentos e considerações apresentados na descrição do litígio?»

18 Com esta questão, o órgão jurisdicional nacional pretende unicamente saber se a proibição de utilização dos HCFC no combate aos incêndios a partir de 1 de Junho de 1995 é compatível com determinadas disposições do Tratado. Contudo, embora este órgão jurisdicional considere que essa proibição resulta incontestavelmente do regulamento, há que analisar as disposições relevantes do mesmo.

19 A título liminar, deve recordar-se que o regulamento, incluindo o seu artigo 5._, se destina a dar cumprimento aos compromissos assumidos pela Comunidade no âmbito da Convenção de Viena e do protocolo de Montreal bem como da sua segunda emenda.

20 É pacífico que os textos de direito comunitário devem ser interpretados, na medida do possível, à luz do direito internacional, em especial quando os referidos textos têm por objectivo justamente dar cumprimento a um acordo internacional celebrado pela Comunidade (v., neste sentido, acórdão de 10 de Setembro de 1996, Comissão/Alemanha, C-61/94, Colect., p. I-3989, n._ 52).

21 Nos termos do artigo 2._, n._ 3, da Convenção de Viena, as partes na convenção podem adoptar medidas internas mais rigorosas desde que, tendo em conta as considerações científicas, contribuam para promover a utilização de substâncias alternativas cujos efeitos sejam menos nocivos para a camada de ozono.

22 Tendo em conta esta faculdade, o sexto considerando do regulamento refere que, em função, nomeadamente, dos conhecimentos científicos, é conveniente, em determinados casos, introduzir medidas de controlo mais rigorosas do que as previstas na segunda emenda do protocolo de Montreal.

23 É para atingir este objectivo que o artigo 5._ do regulamento proíbe a utilização dos HCFC.

24 Esta proibição de princípio, aplicável a partir de 1 de Junho de 1995, é, contudo, acompanhada de uma série de excepções, restritivamente enumeradas no artigo 5._, n._ 1, do referido regulamento. Assim, nos termos da referida disposição, os HCFC podem ser utilizados, após 1 de Junho de 1995, como solventes, agentes refrigerantes, na produção de espumas rígidas isolantes e espumas com pele integrada utilizadas em aplicações de segurança, em utilizações laboratoriais, incluindo investigação e desenvolvimento, como matéria-prima no fabrico de outros produtos químicos e como gás de transporte utilizado para efeitos de esterilização em sistemas fechados.

25 Por outro lado, nos termos da proibição de utilização de princípio, o artigo 5._, n.os 2, 3 e 4, do regulamento prevê a proibição de outras utilizações dos HCFC a partir de 1 de Janeiro de 1996, 1 de Janeiro de 1998 e 1 de Janeiro de 2000.

26 Resulta destas disposições que a utilização dos HCFC como substâncias destinadas ao combate aos incêndios não está prevista no regulamento, pelo que a respectiva utilização, nos termos do artigo 5._, n._ 1, do regulamento, está proibida a partir de 1 de Junho de 1995.

27 Assim, há que averiguar se a proibição total de utilização dos HCFC destinados ao combate aos incêndios implica igualmente a da sua comercialização.

28 A este respeito, deve salientar-se que a comercialização dos HCFC como substâncias destinadas ao combate aos incêndios não é referida no artigo 5._ do regulamento. Contudo, na medida em que a colocação no circuito comercial dos HCFC para os referidos fins constitui um acto a montante da utilização destas substâncias e não tem outra finalidade senão a sua utilização para este efeito, há que concluir que, uma vez que a utilização dos HCFC é totalmente proibida a partir de 1 de Junho de 1995, a sua comercialização como substâncias destinadas ao combate aos incêndios deve ser considerada também proibida a partir da referida data.

29 Esta interpretação é apoiada tanto pelo artigo 3._ como pelos artigos 6._ a 13._ do regulamento, que se referem, respectivamente, à produção de substâncias regulamentadas e à sua importação, actos que se situam também a montante da respectiva utilização. Efectivamente, a ausência nas referidas disposições de referência à produção ou importação dos HCFC destinados ao combate aos incêndios indica que o legislador comunitário, ao determinar a proibição de princípio de utilização das substâncias em questão para aqueles fins, considerou que a regulamentação do regime de produção, importação e, consequentemente, de comercialização das mesmas substâncias carecia de objecto.

30 Assim sendo, o artigo 5._ do regulamento deve ser interpretado no sentido de que proíbe totalmente a utilização e, consequentemente, a comercialização dos HCFC destinados ao combate aos incêndios.

Quanto à compatibilidade do artigo 5._ do regulamento com o artigo 130._-R do Tratado

31 A Safety entende que a proibição de utilização dos HCFC como substâncias destinadas ao combate aos incêndios é ilegal à luz do artigo 130._-R do Tratado, pelo facto de o Conselho, ao não respeitar o objectivo, os princípios e os critérios desta disposição, ter excedido os limites do seu poder de apreciação.

32 Pelo contrário, o Conselho considera que o artigo 130._-R do Tratado lhe atribui um poder de apreciação discricionário e que o Tribunal de Justiça não pode fiscalizar o resultado dessa apreciação. Considera também que a mesma disposição lhe atribui um largo poder de apreciação no que respeita à escolha das medidas para pôr em prática a política de protecção do ambiente. Apenas a natureza manifestamente inadequada das medidas em questão em relação ao fim prosseguido poderia pôr em causa a respectiva legalidade.

33 O artigo 130._-R do Tratado dispõe o seguinte:

«1. A política da Comunidade no domínio do ambiente contribuirá para a prossecução dos seguintes objectivos:

- a preservação, a protecção e a melhoria da qualidade do ambiente;

- a protecção da saúde das pessoas;

- a utilização prudente e racional dos recursos naturais;

- a promoção, no plano internacional, de medidas destinadas a enfrentar os problemas regionais ou mundiais do ambiente.

2. A política da Comunidade no domínio do ambiente visará um nível de protecção elevado, tendo em conta a diversidade das situações existentes nas diferentes regiões da Comunidade. Basear-se-á nos princípios da precaução e da acção preventiva, da correcção, prioritariamente na fonte, dos danos causados ao ambiente e do poluidor-pagador...

...

3. Na elaboração da sua política no domínio do ambiente, a Comunidade terá em conta:

- os dados científicos e técnicos disponíveis;

- as condições do ambiente nas diversas regiões da Comunidade;

- as vantagens e os encargos que podem resultar da actuação ou da ausência de actuação;

- o desenvolvimento económico e social da Comunidade no seu conjunto e o desenvolvimento equilibrado das suas regiões.

4. ...»

34 Esta disposição prevê, assim, uma série de objectivos, princípios e critérios que o legislador comunitário deve respeitar no âmbito da aplicação da política do ambiente.

35 Contudo, tendo em conta a necessidade da ponderação de determinados objectivos e princípios referidos no artigo 130._-R, bem como a complexidade da aplicação dos critérios, a fiscalização judicial deve necessariamente limitar-se à questão de saber se, ao adoptar o regulamento, o Conselho cometeu um erro de apreciação manifesto no que respeita às condições de aplicação do artigo 130._-R do Tratado.

36 Assim, há que analisar se, tendo em conta o objectivo do regulamento, o mesmo foi adoptado em violação do artigo 130._-R do Tratado.

37 A este respeito, a Safety invoca três argumentos.

38 Em primeiro lugar, ao autorizar a utilização de outras substâncias, como os halons, o regulamento não tem em conta dois outros parâmetros fundamentais para a protecção do ambiente, a saber, a incidência dos HCFC sobre o aquecimento do planeta (Global Warming Potential, a seguir «GWP») e a sua permanência na atmosfera (Atmospheric Lifetime, a seguir «ALT»), factores esses que deveriam ser tomados em consideração conjuntamente com o potencial de empobrecimento de ozono (Ozone Depletion Potencial, a seguir «ODP»). No entender da Safety, se tivessem sido tomados em consideração todos estes factores, os HCFC revelar-se-iam muito menos nocivos do que os halons. Consequentemente, ao tomar apenas em consideração o índice ODP e ao limitar-se a prever medidas contra o empobrecimento da camada de ozono, o regulamento não assegurou a protecção do ambiente na globalidade, como prevê o artigo 130._-R do Tratado, mas apenas de uma parte do mesmo.

39 A título liminar, deve salientar-se que a não proibição de utilização de outras substâncias, mesmo supondo-a ilegal, não pode, por si só, afectar a validade da proibição de utilização dos HCFC.

40 No que respeita à acusação de não tomada em consideração do GWP e do ALT dos HCFC, deve recordar-se que o artigo 130._-R, n._ 1, do Tratado prevê, entre outros objectivos da política da Comunidade no domínio do ambiente, a preservação, a protecção e a melhoria da qualidade do ambiente.

41 Como o Tribunal de Justiça decidiu no acórdão de 14 de Julho de 1994, Peralta (C-379/92, Colect., p. I-3453, n._ 57), o artigo 130._-R do Tratado limita-se a definir os objectivos gerais da Comunidade em matéria de ambiente. A competência para decidir das acções a empreender foi confiada ao Conselho pelo artigo 130._-S. Além disso, o artigo 130._-T precisa que as medidas de protecção adoptadas em comum nos termos do artigo 130._-S não constituem obstáculo à manutenção e ao estabelecimento, por cada Estado-Membro, de medidas de protecção reforçadas compatíveis com o Tratado.

42 Não resulta destas disposições que o artigo 130._-R, n._ 1, do Tratado imponha ao legislador comunitário, cada vez que adopta medidas de preservação, de protecção e de melhoria do ambiente relativas a um problema ambiental específico, que adopte simultaneamente medidas que se destinem ao ambiente no seu conjunto.

43 Daqui decorre que o artigo 130._-R, n._ 1, do Tratado permite a adopção de medidas que têm por objectivo unicamente determinados aspectos definidos do ambiente, na medida em que contribuam para a preservação, protecção e melhoria da qualidade do mesmo.

44 A este respeito, o regulamento, como resulta do próprio título, tem por objectivo regulamentar as substâncias que empobrecem a camada de ozono. O facto de apenas este aspecto da preservação, da protecção e da melhoria do ambiente ser referido pelo regulamento não pode, por isso, ser considerado incompatível com a finalidade do artigo 130._-R, n._ 1, do Tratado.

45 Em segundo lugar, no entender da Safety, ao autorizar a utilização de halons, os quais, relativamente aos HCFC, têm um ODP muito mais elevado e revestem, por isso, uma perigosidade muito maior para o ozono, o regulamento não assegurou um nível elevado de protecção do ambiente, como exige o artigo 130._-R, n._ 2, do Tratado.

46 No que respeita a esta exigência, deve salientar-se que o regulamento assegura uma protecção elevada. Efectivamente, resulta dos seus quarto e quinto considerandos que, tendo em conta os conhecimentos científicos e a fim de respeitar os compromissos da Comunidade no âmbito da Convenção de Viena e da segunda emenda ao protocolo de Montreal, tem por objectivo determinar medidas para controlar, designadamente, a utilização dos HCFC. O sexto considerando do regulamento esclarece, por outro lado, que, em função nomeadamente dos conhecimentos científicos, é conveniente, em determinados casos, introduzir medidas de controlo mais rigorosas do que as previstas na segunda emenda ao protocolo. Ao proibir, no artigo 5._, n._ 1, do regulamento, a utilização dos HCFC e ao adoptar, deste modo, uma medida mais rigorosa do que as impostas pelas suas obrigações internacionais, o legislador comunitário não ignorou o princípio do nível de protecção elevado previsto no artigo 130._-R, n._ 2, do Tratado.

47 Por último, embora seja pacífico que o artigo 130._-R, n._ 2, do Tratado exige que a política da Comunidade no domínio do ambiente vise um nível de protecção elevado, esse nível de protecção, para ser compatível com a mesma disposição, não deve necessariamente ser tecnicamente o mais elevado possível. Efectivamente, como se referiu no n._ 41 do presente acórdão, o artigo 130._-T do Tratado permite que os Estados-Membros mantenham ou introduzam medidas de protecção reforçadas.

48 Em último lugar, a Safety entende que, ao não proibir a utilização de outras substâncias igualmente destinadas ao combate aos incêndios, entre as quais os hidrofluorocarbonos e os perfluorocarbonos, o regulamento não teve em conta os dados científicos e técnicos disponíveis, como exige o artigo 130._-R, n._ 3, do Tratado, uma vez que, por possuírem índices GWP e ALT muito elevados, estas substâncias são mais nocivas ao ambiente do que os HCFC, cujos índices ODP, GWP e ALT são considerados aceitáveis.

49 O artigo 130._-R, n._ 3, do Tratado exige que, na elaboração da sua política no domínio do ambiente, a Comissão tenha em conta, designadamente, os dados científicos e técnicos disponíveis. Contudo, não se pode considerar que o regulamento não respeita esta exigência.

50 Efectivamente, para além da tomada em consideração dos conhecimentos científicos referidos nos quarto e quinto considerandos, o sétimo considerado do regulamento salienta «que é conveniente rever periodicamente as utilizações autorizadas de substâncias que empobrecem a camada de ozono» e o oitavo considerando «que é necessário acompanhar a evolução do mercado das substâncias que destroem o ozono, em especial no que se refere a uma oferta suficiente para utilizações essenciais, bem como os progressos efectuados no desenvolvimento de sucedâneos adequados, mas também no que se refere à necessidade de manter no mínimo as importações de substâncias que empobrecem a camada de ozono, virgens, recuperadas ou valorizadas, com liberdade de circulação na Comunidade».

51 É precisamente tomando em consideração os dados científicos e técnicos disponíveis que o artigo 5._, n._ 6, do regulamento, que se refere à utilização dos HCFC, prevê que, em função do progresso técnico, a Comissão pode acrescentar, suprimir ou alterar a lista das utilizações proibidas.

52 Deve acrescentar-se, por outro lado, que, como resulta do processo principal, quando da adopção do regulamento, existiam do ponto de vista científico soluções alternativas à utilização dos HCFC através do emprego de produtos menos nocivos para a camada de ozono, como a água, o pó e os gases inertes.

53 Assim, o legislador comunitário, ao adoptar a proibição de utilização e, consequentemente, de comercialização dos HCFC como substâncias destinadas ao combate aos incêndios, não cometeu um erro de apreciação manifesto. Nestas condições, improcede a acusação acima analisada, baseada na ilegalidade do regulamento à luz do artigo 130._-R do Tratado.

54 A Safety considera também que a proibição de utilização e, consequentemente, de comercialização dos HCFC como substâncias destinadas ao combate aos incêndios é desproporcionada em relação à protecção do ambiente.

55 Para analisar esta acusação, deve recordar-se que, segundo jurisprudência constante, a fim de definir se uma disposição de direito comunitário está em conformidade com o princípio da proporcionalidade, é necessário verificar se os meios que aplica são aptos para realizar o objectivo a atingir e se não ultrapassam aquilo que é necessário para o atingir (v., nomeadamente, acórdão de 13 de Maio de 1997, Alemanha/Parlamento e Conselho, C-223/94, Colect., p. I-2405, n._ 54).

56 Tendo em conta o objectivo do regulamento, que consiste na protecção da camada de ozono, deve declarar-se que o meio que o referido regulamento aplica no artigo 5._, n._ 1, ou seja, a proibição de utilização e, consequentemente, de comercialização dos HCFC como substâncias destinadas ao combate aos incêndios, é adequado para alcançar aquele objectivo. Tendo em conta, contudo, o facto de que outras substâncias igualmente nocivas, ou mesmo mais, para a camada de ozono, como os halons, são autorizados no âmbito do combate aos incêndios, há que analisar se a referida proibição não ultrapassa os limites impostos pelo respeito do princípio da proporcionalidade.

57 A este respeito, basta recordar, como resulta do processo principal, que os halons apresentam uma capacidade de extinção insubstituível, designadamente para fazer face a incêndios em espaços reduzidos, com efeitos tóxicos extremamente diminutos, enquanto, para obter o mesmo resultado, é necessária uma quantidade mais significativa de HCFC, com maior efeito tóxico.

58 Dado que, como foi referido no n._ 52 do presente acórdão, existem produtos de substituição eficazes para os HCFC, como a água, o pó e os gases inertes, e, para determinadas utilizações essenciais, produtos de substituição insubstituíveis, como os halons, como foi referido no n._ 57 do presente acórdão, a proibição de utilização dos HCFC não pode ser considerada contrária ao princípio da proporcionalidade.

59 Deve, assim, concluir-se que a análise do artigo 5._, n._ 1, do regulamento à luz do artigo 130._-R do Tratado não revela qualquer elemento susceptível de pôr em causa a sua validade.

Quanto à compatibilidade do artigo 5._ do regulamento com o artigo 30._ do Tratado

60 O órgão jurisdicional nacional submete também ao Tribunal de Justiça a questão da validade, à luz do artigo 30._ do Tratado, da proibição de utilização e de comercialização dos HCFC, prevista no artigo 5._, n._ 1, do regulamento, como substâncias destinadas ao combate aos incêndios.

61 Deve recordar-se, a título liminar, que, segundo jurisprudência constante, a proibição das restrições quantitativas bem como das medidas de efeito equivalente aplica-se não apenas relativamente às medidas nacionais, mas também relativamente às medidas adoptadas pelas instituições comunitárias (v., nomeadamente, acórdãos de 17 de Maio de 1984, Denkavit Nederland, 15/83, Recueil, p. 2171, n._ 15, e de 9 de Agosto de 1994, Meyhui, C-51/93, Colect., p. I-3879, n._ 11).

62 A protecção do ambiente foi já considerada pelo Tribunal de Justiça como um dos objectivos essenciais da Comunidade (v. acórdão de 7 de Fevereiro de 1985, Association de défense des brûleurs d'huiles usagées, 240/83, Recueil, p. 531, n._ 13). No acórdão de 20 de Setembro de 1988, Comissão/Dinamarca (302/86, Colect., p. 4607, n._ 9), o Tribunal de Justiça declarou que a protecção do ambiente constitui uma exigência imperativa susceptível de limitar a aplicação do artigo 30._ do Tratado.

63 Contudo, a Safety entende que, tendo em conta o artigo 30._ do Tratado, não foi também respeitado o princípio da proporcionalidade.

64 A este respeito, basta recordar que, como resulta do objectivo do regulamento e das considerações constantes dos n.os 57 a 59 do presente acórdão, a proibição de utilização e de comercialização dos HCFC a fim de proteger a camada de ozono não pode ser considerada desproporcionada em relação ao objectivo prosseguido.

65 Deve, por isso, responder-se que a análise da questão submetida não revelou qualquer elemento susceptível de pôr em causa a validade do artigo 5._ do regulamento.

Quanto à compatibilidade do artigo 5._ do regulamento com o artigo 86._ do Tratado

66 O órgão jurisdicional nacional pretende, no essencial, saber se o artigo 5._, n._ 1, do regulamento, ao impor a proibição de utilização e de comercialização dos HCFC tem por efeito, em violação do artigo 86._ do Tratado, favorecer um abuso de posição dominante dos produtores e vendedores de substâncias diferentes dos HCFC que não são proibidas pelo referido regulamento.

67 A este respeito, deve recordar-se que, segundo jurisprudência constante, a necessidade de se chegar a uma interpretação do direito comunitário que seja útil ao órgão jurisdicional nacional exige que este defina o quadro factual e legal em que se inscrevem as questões que coloca ou que, pelo menos, explique as hipóteses factuais em que assentam essas questões, (v., designadamente, acórdão de 26 de Janeiro de 1993, Telemarsicabruzzo e o., C-320/90 a C-322/90, Colect., p. I-393, n._ 6, e despacho de 19 de Março de 1993, Banchero, C-157/92, Colect., p. I-1085, n._ 4).

68 Como o Tribunal de Justiça decidiu no acórdão Telemarsicabruzzo e o. e no despacho Banchero, já referidos (respectivamente n.os 7 e 5), estas exigências são particularmente válidas em determinados domínios, como o da concorrência, que são caracterizados por situações de facto e de direito complexas.

69 Ora, o despacho de reenvio não contém indicações suficientes que satisfaçam essas exigências.

70 Efectivamente, não fornece os dados necessários susceptíveis de delimitar o mercado em causa nem esclarece a incidência da proibição de comercialização dos HCFC sobre o funcionamento do mesmo mercado. Além disso, o órgão jurisdicional de reenvio limita-se a mencionar o artigo 86._ do Tratado sem indicar as razões precisas que o levaram a questionar a validade da proibição prevista no artigo 5._, n._ 1, do regulamento, tendo em conta a situação que lhe foi submetida.

71 Deste modo, as indicações constantes do despacho de reenvio, pela descrição demasiado imprecisa das situações de direito e de facto a que o órgão jurisdicional nacional se refere, não permitem que o Tribunal de Justiça dê uma interpretação útil do direito comunitário.

72 Nestas condições, nos termos dos artigos 92._ e 103._, n._ 1, do Regulamento de Processo, deve ser julgada manifestamente inadmissível esta parte da questão submetida ao Tribunal de Justiça.

Quanto à compatibilidade do artigo 5._ do regulamento com o artigo 92._ do Tratado

73 Em conformidade com jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, só podem ser considerados auxílios, na acepção do artigo 92._, n._ 1, do Tratado, as vantagens atribuídas, directa ou indirectamente, através de recursos de Estado. Com efeito, resulta dos próprios termos daquela disposição e das regras de procedimento instituídas pelo artigo 93._ do Tratado CE que as vantagens resultantes de fundos diversos dos recursos de Estado não estão compreendidas no campo de aplicação das disposições em causa (v. acórdãos de 24 de Janeiro de 1978, Van Tiggele, 82/77, Recueil, p. 25, n.os 24 e 25, Colect., p. 15, e de 17 de Março de 1993, Sloman Neptun, C-72/91 e C-73/91, Colect., p. I-887, n._ 19).

74 No presente caso, a eventual vantagem para as empresas produtoras de halons da proibição de utilização dos HCFC no sector do combate aos incêndios resultará de uma medida adoptada pelo legislador comunitário no domínio do ambiente e não de uma medida estatal e não implica, assim, qualquer transferência, directa ou indirecta, de recursos de Estado para empresas produtoras de halons. Assim, o artigo 5._ do regulamento não é abrangido pelo artigo 92._ do Tratado.

Quanto à compatibilidade do artigo 5._ do regulamento com os artigos 3._ e 5._ do Tratado

75 O artigo 3._ do Tratado determina os domínios e os objectivos sobre os quais deve incidir a acção da Comunidade. Enuncia, assim, os princípios gerais do mercado comum, que são aplicados em conjugação com os capítulos respectivos do Tratado destinados a concretizar estes princípios (acórdão de 10 de Janeiro de 1985, Leclerc e o., 229/83, Recueil, p. 1, n._ 8).

76 Os objectivos gerais constantes do artigo 3._ e relevantes no presente caso, ou seja, «um mercado interno caracterizado pela abolição... dos obstáculos à livre circulação de mercadorias...» [alínea c)] e «um regime que garanta que a concorrência não seja falseada no mercado interno» [alínea g)], foram explicitados, respectivamente, em especial nos artigos 30._ e segs. e 86._ e segs. do Tratado. Ora, foi já atrás declarado que o artigo 5._ do regulamento é compatível com o artigo 30._ do Tratado e que não é possível responder à questão da sua compatibilidade com o artigo 86._ do Tratado, por ausência de indicações necessárias no despacho de reenvio. Assim, não há que responder à questão relativa à respectiva compatibilidade com o artigo 3._ do Tratado.

77 No que respeita ao artigo 5._ do Tratado, em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, o mesmo impõe deveres recíprocos de cooperação leal entre os Estados-Membros e as instituições comunitárias (despacho de 13 de Julho de 1990, Zwartveld e o., C-2/88 Imm., Colect., p. I-3365, n._ 17, e acórdão de 13 de Outubro de 1992, Portugal e Espanha/Conselho, C-63/90 e C-67/90, Colect., p. I-5073, n._ 52). Consequentemente, esta disposição não pode ter em vista uma medida adoptada pelo legislador comunitário no domínio do ambiente que pode eventualmente implicar vantagens ou inconvenientes para determinadas empresas. Assim, não há que responder à questão relativa à compatibilidade do artigo 5._ do regulamento com o artigo 5._ do Tratado.

78 Tendo em conta o que antecede, deve responder-se ao órgão jurisdicional de reenvio que a análise da questão submetida não revelou qualquer elemento susceptível de afectar a validade do artigo 5._ do regulamento.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

79 As despesas efectuadas pelos Governos italiano, espanhol, francês e austríaco, bem como pelo Conselho e pela Comissão, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

pronunciando-se sobre a questão submetida pela Pretura circondariale di Avezzano, por decisão de 16 de Outubro de 1995, declara:

A análise da questão submetida não revelou qualquer elemento susceptível de afectar a validade do artigo 5._ do Regulamento (CE) n._ 3093/94 do Conselho, de 15 de Dezembro de 1994, relativo às substâncias que empobrecem a camada de ozono.