61995J0071

Acórdão do Tribunal de 4 de Fevereiro de 1997. - Reino da Bélgica contra Comissão das Comunidades Europeias. - Bananas - Organização comum de mercado - Contingente de importação - Adesão de novos Estados-Membros - Medidas transitórias. - Processos apensos C-71/95, C-155/95 e C-271/95.

Colectânea da Jurisprudência 1997 página I-00687


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


1 Agricultura - Organização comum de mercado - Banana - Regime das importações - Contingente pautal - Medidas transitórias adoptadas pela Comissão na sequência da adesão da Áustria, da Finlândia e da Suécia - Base jurídica - Artigo 149._ do acto de adesão - Violação do princípio da não discriminação - Falta

(Tratado CE, artigo 40._, n._ 3; Acto de adesão da Áustria, da Finlândia e da Suécia, artigos 137._, n._ 2, e 149._; Regulamento n._ 404/93 do Conselho, artigo 19._; Regulamentos n._ 3303/94, n._ 479/95 e n._ 1219/95 da Comissão)

2 Actos das instituições - Fundamentação - Obrigação - Alcance

(Tratado CE, artigo 190._)

Sumário


3 Para adoptar os Regulamentos n.os 3303/94, 479/95 e 1219/95, que prevêem, para os três primeiros meses seguintes à adesão da Áustria, da Finlândia e da Suécia, que as autoridades competentes desses Estados-Membros autorizem os operadores estabelecidos nos seus territórios que tenham importado bananas durante os anos anteriores a importarem bananas provenientes de países terceiros dentro dos limites de determinados contingentes especiais, derrogando, desse modo, a organização comum de mercado instituída pelo Regulamento n._ 404/93, a Comissão baseou-se validamente no artigo 149._ do acto de adesão, que a habilita, durante um período limitado, a tomar as medidas transitórias que se revelem necessárias para facilitar a transição do regime existente nos novos Estados-Membros para o regime resultante da aplicação da organização comum de mercado.

Com efeito, o artigo 149._ permite derrogar o princípio, constante do artigo 137._, n._ 2, do acto de adesão, que prevê a aplicação integral da organização comum nos novos Estados-Membros, logo a partir de 1 de Janeiro de 1995, sujeitando as medidas que prevê a uma única condição, isto é, à necessidade de facilitar essa transição. Esta condição estava preenchida, uma vez que a inclusão dos operadores dos novos Estados-Membros no contingente pautal fixado para a Comunidade dos Doze implicaria uma redução dos direitos de importação dos operadores dos antigos Estados-Membros, a atribuição de direitos insuficientes aos operadores dos novos Estados-Membros, uma penúria de bananas no interior da Comunidade e uma subida dos preços, consequências estas incompatíveis com os objectivos do regulamento do Conselho.

Por outro lado, a sujeição dos operadores económicos dos novos Estados-Membros a um regime diferente do aplicável aos operadores dos antigos Estados-Membros, porque não prevê a aplicação do critério de repartição definido no artigo 19._ do Regulamento n._ 404/93, não infringe o princípio da não discriminação consagrado pelo artigo 40._, n._ 3, do Tratado. Com efeito, a situação de facto e de direito nos novos Estados-Membros era diferente da existente nos antigos, dado que, pelas razões acima referidas, se impunha a fixação, a título transitório, de um contingente especial e que, tendo em conta o facto de que os operadores económicos dos novos Estados-Membros pertenciam a uma única categoria, a aplicação do critério de repartição teria originado sérios problemas de abastecimento.

4 A fundamentação exigida pelo artigo 190._ do Tratado deve ser adaptada à natureza do acto em causa. Deve pôr em evidência, de modo claro e inequívoco, o raciocínio da autoridade comunitária, autora do acto, de modo a permitir aos interessados conhecer as justificações da medida tomada e ao Tribunal de Justiça exercer o seu controlo. Não se pode exigir que a fundamentação de um acto especifique os diferentes elementos de facto e de direito objecto do mesmo, quando esse acto entra no quadro sistemático do conjunto de que faz parte.

Partes


Nos processos apensos C-71/95, C-155/95 e C-271/95,

Reino da Bélgica, representado por J. Devadder, director de administração no Ministério dos Negócios Estrangeiros, do Comércio Externo e da Cooperação para o Desenvolvimento, na qualidade de agente, com domicílio escolhido no Luxemburgo na sede da Embaixada da Bélgica, 4, rue des Girondins,

recorrente,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada por T. van Rijn, consultor jurídico, na qualidade de agente, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de Carlos Gómez de la Cruz, membro do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg

recorrida,

apoiada, nos processos C-71/95 e C-155/95, pela

República Francesa, representada por C. de Salins, subdirectora na Direcção dos Assuntos Jurídicos do Ministério dos Negócios Estrangeiros, e F. Pascal, assessor da administração central nessa mesma direcção, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo na sede da Embaixada de França, 9, boulevard du Prince Henri,

interveniente,

que têm por objecto a anulação:

- no processo C-71/95, do Regulamento (CE) n._ 3303/94 da Comissão, de 21 de Dezembro de 1994, que estabelece medidas transitórias para a importação de bananas na Áustria, na Finlândia e na Suécia durante o primeiro trimestre de 1995 (JO L 341, p. 46);

- no processo C-155/95, do Regulamento (CE) n._ 479/95 da Comissão, de 1 de Março de 1995, que estabelece medidas transitórias para a aplicação do regime do contingente pautal de importação de bananas durante o segundo trimestre de 1995, na sequência da adesão da Áustria, da Finlândia e da Suécia (JO L 49, p. 18);

- no processo C-271/95, do Regulamento (CE) n._ 1219/95 da Comissão, de 30 de Maio de 1995, que estabelece medidas transitórias para a aplicação do regime do contingente pautal de importação de bananas durante o terceiro trimestre de 1995, na sequência da adesão da Áustria, da Finlândia e da Suécia (JO L 120, p. 20),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

composto por: G. C. Rodríguez Iglesias, presidente, G. F. Mancini, J. C. Moitinho de Almeida (relator) e J. L. Murray, presidentes de secção, P. J. G. Kapteyn, C. Gulmann, D. A. O. Edward, J.-P. Puissochet, G. Hirsch, P. Jann e H. Ragnemalm, juízes,

advogado-geral: M. B. Elmer,

secretário: D. Louterman-Hubeau, administradora principal,

visto o relatório para audiência,

ouvidas as alegações das partes na audiência de 9 de Julho de 1996, na qual o Governo belga se fez representar por A. De Ridder, consultor adjunto no Serviço Jurídico do Ministério dos Negócios Estrangeiros, do Comércio Externo e da Cooperação para o Desenvolvimento, na qualidade de agente, o Governo francês, por F. Pascal, e a Comissão, por T. van Rijn,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 15 de Outubro de 1996,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por petições que deram entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 14 de Março de 1995 no processo C-71/95, em 17 de Maio de 1995 no processo C-155/95, e em 10 de Agosto de 1995 no processo C-271/95, o Reino da Bélgica requereu, ao abrigo do artigo 173._, primeiro parágrafo, do Tratado CE, a anulação do Regulamento (CE) n._ 3303/94 da Comissão, de 21 de Dezembro de 1994, que estabelece medidas transitórias para a importação de bananas na Áustria, na Finlândia e na Suécia durante o primeiro trimestre de 1995 (JO L 341, p. 46), do Regulamento (CE) n._ 479/95 da Comissão, de 1 de Março de 1995, que estabelece medidas transitórias para a aplicação do regime do contingente pautal de importação de bananas durante o segundo trimestre de 1995, na sequência da adesão da Áustria, da Finlândia e da Suécia (JO L 49, p. 18), e do Regulamento (CE) n._ 1219/95 da Comissão, de 30 de Maio de 1995, que estabelece medidas transitórias para a aplicação do regime do contingente pautal de importação de bananas durante o terceiro trimestre de 1995, na sequência da adesão da Áustria, da Finlândia e da Suécia (JO L 120, p. 20) (a seguir «regulamentos impugnados»).

2 Por dois despachos do presidente do Tribunal de Justiça, de 6 de Setembro de 1995 (processo C-155/95) e de 4 de Outubro de 1995 (processo C-71/95), a República Francesa foi admitida como interveniente ao lado da Comissão.

3 Por despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 14 de Junho de 1996, os três processos foram apensos para efeitos da fase oral e do acórdão.

4 O Regulamento (CEE) n._ 404/93 do Conselho, de 13 de Fevereiro de 1993, que estabelece a organização comum de mercado no sector das bananas (JO L 47, p. 1, a seguir «regulamento do Conselho»), substituiu, no título IV, os diferentes regimes comerciais nacionais anteriores por um regime comercial comum com os países terceiros.

5 O artigo 18._, n._ 1, deste regulamento, na redacção que lhe foi dada pelo Regulamento (CE) n._ 3290/94 do Conselho, de 22 de Dezembro de 1994, relativo às adaptações e medidas transitórias necessárias no sector da agricultura para a execução dos acordos concluídos no âmbito das negociações comerciais multilaterais do «Uruguay Round» (JO L 349, p. 105), prevê a abertura de um contingente pautal de 2,1 milhões de toneladas/peso líquido para o ano de 1994 e de 2,2 milhões de toneladas/peso líquido para os anos seguintes, para as importações de «bananas de países terceiros» e de «bananas não tradicionais ACP».

6 O artigo 19._, n._ 1, do regulamento do Conselho procede a uma repartição do contingente pautal que é aberto até 66,5%, para a categoria de operadores que comercializaram bananas de países terceiros ou de bananas não tradicionais ACP, até 30%, para a categoria de operadores que comercializaram bananas comunitárias ou bananas tradicionais ACP, e até 3,5%, para a categoria de operadores estabelecidos na Comunidade que começaram, a partir de 1992, a comercializar bananas que não as bananas comunitárias ou tradicionais ACP.

O artigo 19._, n._ 4, estabelece:

«Na hipótese de um aumento do contingente pautal, a quantidade disponível suplementar será atribuída aos operadores das categorias referidas no n._ 1...»

7 Em execução do regulamento do Conselho, a Comissão adoptou, nomeadamente, o Regulamento (CEE) n._ 1442/93, de 10 de Junho de 1993, que estabelece normas de execução do regime de importação de bananas na Comunidade (JO L 142, p. 6), e que retoma a distinção entre as três categorias de operadores económicos referidas no n._ 6 do presente acórdão e as denomina categorias A, B e C.

8 O Acto relativo às condições de adesão e às adaptações dos Tratados em que se funda a União, anexo ao Tratado de adesão da República da Áustria, da República da Finlândia e do Reino da Suécia à União Europeia (JO 1994, C 241, p. 21, a seguir «acto de adesão»), prevê, no artigo 137._, n._ 2, segundo travessão, que «os direitos e obrigações decorrentes da Política Agrícola Comum são inteiramente aplicáveis aos novos Estados-Membros».

9 O artigo 148._ do acto de adesão dispõe:

«1. Salvo disposição em contrário em casos específicos, o Conselho, deliberando por maioria qualificada, sob proposta da Comissão, adoptará as disposições necessárias à execução do presente título.

2. O Conselho... pode proceder às adaptações das disposições constantes do presente título que se revelem necessárias em consequência de alterações da regulamentação comunitária.»

10 O artigo 149._, n._ 1, do acto de adesão prevê:

«Se forem necessárias medidas transitórias para facilitar a passagem do regime existente nos novos Estados-Membros para o regime decorrente da aplicação da organização comum de mercado, nos termos do presente título, essas medidas serão adoptadas segundo o procedimento... [do comité de gestão]. As referidas medidas podem ser tomadas durante um período que terminará em 31 de Dezembro de 1997, sendo a sua aplicação limitada a esta data.»

11 Segundo o artigo 150._ do acto de adesão:

«1. As medidas transitórias respeitantes à aplicação dos actos relativos à Política Agrícola Comum e não especificadas no presente acto, incluindo no domínio das estruturas, tornadas necessárias em consequência da adesão, serão adoptadas antes da adesão de acordo com o procedimento previsto no n._ 3 [e não poderão entrar em vigor antes da] data da adesão.

...

3. O Conselho, deliberando por maioria qualificada, sob proposta da Comissão, adoptará as medidas transitórias referidas nos n.os 1 e 2 do presente artigo. No entanto, as medidas que afectem instrumentos inicialmente adoptados pela Comissão serão adoptadas por esta instituição de acordo com o procedimento previsto no n._ 1 do artigo 149._»

12 O artigo 4._, n._ 1, do Regulamento n._ 3303/94 e o artigo 1._, n._ 1, dos Regulamentos n.os 479/95 e 1219/95 prevêem para os primeiro, segundo e terceiro trimestres do ano de 1995, respectivamente, que as autoridades competentes da Áustria, da Finlândia e da Suécia autorizem os operadores estabelecidos nos respectivos territórios, e que tenham importado bananas no decurso de um ou mais dos anos de 1991, 1992 e 1993, a importarem bananas originárias de países terceiros dentro dos limites de determinados contingentes fixados.

13 O artigo 4._, n._ 1, terceiro e quarto parágrafos, do Regulamento n._ 3303/94 e o artigo 1._, n._ 1, terceiro e quarto parágrafos, dos Regulamentos n.os 479/95 e 1219/95 precisam:

«A autorização de importação concedida aos operadores não pode incidir numa quantidade superior a [uma determinada percentagem] da média das quantidades anuais pelos mesmos importada em 1991, 1992 e 1993.

Esta autorização não prejudica a quantidade de referência a atribuir ao operador em causa a título de 1995, em aplicação do... Regulamento (CEE) n._ 1442/930.»

14 Estes regulamentos, que têm como base o acto de adesão, nomeadamente o artigo 149._, n._ 1, são justificados, no segundo considerando do Regulamento n._ 3303/94 e no terceiro considerando dos Regulamentos n.os 479/95 e 1219/95, pelo facto de «a fim de facilitar a transição do regime existente nos novos Estados-Membros antes da sua adesão para o regime resultante da aplicação das regras da organização comum de mercado no sector das bananas, [ser] conveniente adoptar medidas transitórias [para o trimestre de 1995 em causa] e autorizar os operadores estabelecidos nos seus territórios a importar [nesse trimestre] uma determinada quantidade de bananas originárias de países terceiros».

15 O artigo 3._, n.os 2 e 3, do Regulamento n._ 479/95 prevê:

«Até 31 de Março de 1995, as autoridades competentes estabelecerão as listas dos operadores em causa, bem como as quantidades comercializadas por cada operador, de acordo com as regras previstas no... Regulamento (CEE) n._ 1442/93»

e transmiti-las-ão à Comissão, o mais tardar em 7 de Abril de 1995.

16 Em 6 de Abril de 1995, a Comissão apresentou ao Conselho uma proposta de regulamento que adapta o Regulamento (CEE) n._ 404/93, no que se refere ao volume do contingente pautal anual de importação de bananas na Comunidade, na sequência da adesão da Áustria, da Finlândia e da Suécia (JO C 136, p. 22).

17 Em 3 de Agosto de 1995, a Comissão adoptou o Regulamento (CE) n._ 1924/95, que estabelece medidas transitórias para a aplicação do regime do contingente pautal de importação de bananas, na sequência da adesão da Áustria, da Finlândia e da Suécia (JO L 185, p. 24). Este regulamento baseia-se no artigo 149._, n._ 1, do acto de adesão e resulta do seu quarto considerando que foi adoptado pelo facto de o Conselho não ter tomado nenhuma decisão sobre o aumento do contingente pautal, com base na proposta da Comissão.

18 No artigo 1._ deste regulamento, é aberta, para a importação de bananas de países terceiros e de bananas não tradicionais ACP, a título de 1995, na Áustria, na Finlândia e na Suécia, uma quantidade de 353 000 toneladas, peso líquido, adicional ao contingente pautal previsto no artigo 18._ do regulamento do Conselho.

As quantidades já importadas nos três novos Estados-Membros, ao abrigo dos regulamentos impugnados, são imputadas à quantidade global assim fixada.

Em relação ao quarto trimestre de 1995, o artigo 2._ do Regulamento n._ 1924/95 prevê a emissão de certificados de importação na Áustria, na Finlândia e na Suécia, distinguindo entre os operadores das categorias A e C, inscritos nos registos pelas autoridades competentes dos três novos Estados-Membros, nos termos do Regulamento n._ 479/95.

19 A Comissão justificou a adopção deste regime pelo facto de as autorizações de importação nos novos Estados-Membros, para os três primeiros trimestres de 1995, terem tido que ser imputadas ao contingente global da Comunidade, de os novos Estados-Membros se terem abastecido exclusivamente em bananas de países terceiros, de as autorizações terem, por isso, sido concedidas aos operadores da categoria A, de o saldo disponível do contingente pautal, mesmo aumentado com uma quantidade adicional, não permitir efectuar, no quarto trimestre, uma repartição entre as diferentes categorias de operadores nos termos do disposto no artigo 19._ do regulamento do Conselho, tendo em conta as autorizações de importação já concedidas nos três novos Estados-Membros desde o princípio do ano de 1995, e pelo facto de, além disso, essa aplicação não permitir satisfazer as necessidades de abastecimento da Comunidade.

20 Pelo Regulamento (CE) n._ 2008/95, de 18 de Agosto de 1995, a Comissão fixou o coeficiente uniforme de redução para a determinação da quantidade de bananas originárias de países terceiros e de bananas não tradicionais ACP a atribuir a cada operador para importação na Áustria, na Finlândia e na Suécia no quarto trimestre de 1995 (JO L 196, p. 3).

Quanto ao primeiro fundamento

21 O Reino da Bélgica sustenta, nas petições de recurso nos processos C-71/95 e C-155/95, que incumbia ao Conselho, com base no disposto no artigo 149._ do acto de adesão, e não à Comissão, adoptar os regulamentos impugnados que prevêem medidas transitórias que derrogam o disposto no regulamento do Conselho.

22 Nas réplicas nos processos C-71/95 e C-155/95, bem como na petição de recurso no processo C-271/95, o Reino da Bélgica explica que os regulamentos impugnados deviam ter sido adoptados com base não no artigo 149._ mas no artigo 148._, ou, eventualmente, no artigo 150._ do acto de adesão. Concede que, nas petições de recurso dos dois primeiros processos, se referiu, por lapso, ao artigo 149._ desse acto, por se ter baseado numa versão do acto de adesão anterior à versão definitiva.

23 O Reino da Bélgica acrescenta que não põe em causa a necessidade do aumento do contingente em virtude das novas adesões. Para proceder a esse aumento, a Comissão podia ter-se baseado no artigo 16._, n._ 3, do regulamento do Conselho, seguindo o procedimento nele previsto.

Quanto à admissibilidade

24 Nas contestações nos processos C-71/95 e C-155/95, a Comissão faz notar que o Reino da Bélgica cometeu um erro na referência às disposições aplicáveis. Este erro seria essencial, uma vez que o artigo 149._ do acto de adesão, em que se baseiam os regulamentos, autoriza a Comissão, ao contrário do que sustenta o recorrente, a adoptar medidas transitórias.

25 Nas tréplicas nos processos C-71/95 e C-155/95, a Comissão salienta, por outro lado, que os argumentos avançados pelo Reino da Bélgica, nas réplicas nestes dois processos, se afastam da apresentação sumária do recurso constante das respectivas petições, dado que nestas o recorrente afirma que os regulamentos deviam ter sido adoptados pelo Conselho, e, nas réplicas, põe a tónica nas diferentes funções dos artigos 148._, 149._ e 150._ do acto de adesão.

26 A Comissão considera que incumbe ao Tribunal de Justiça apurar se o Reino da Bélgica cumpriu, quanto a este fundamento, as exigências dos artigos 38._ e 42._ do Regulamento de Processo.

27 A República Francesa faz notar que, nas petições dos processos C-71/95 e C-155/95, o Reino da Bélgica contesta a competência da Comissão para a adopção dos regulamentos impugnados e que só levanta o problema da base jurídica na fase da réplica.

28 Para analisar a questão da admissibilidade dos recursos nos processos C-71/95 e C-155/95, no que diz respeito ao primeiro fundamento de anulação, convém recordar que o artigo 38._ do Regulamento de Processo exige que a petição especifique qual o objecto do litígio e que contenha uma exposição sumária dos fundamentos do pedido, e que o artigo 42._ do mesmo regulamento proíbe a invocação de novos fundamentos no decurso da instância, a menos que tenham origem em elementos de direito e de facto que se tenham revelado durante o processo.

29 Um fundamento só pode ser considerado novo se não tiver sido referido, de modo directo ou indirecto, na petição (v. acórdãos de 15 de Dezembro de 1961, Fives Lille Cail e o./Alta Autoridade, 19/60, 21/60, 2/61 e 3/61, Recueil, p. 561, Colect. 1954-1961, p. 637; e de 30 de Setembro de 1982, Amylum/Conselho, 108/81, Recueil, p. 3107, n._ 25).

30 A este respeito, ter-se-á que constatar que, apesar da diferente apresentação formal do fundamento nas petições e nas réplicas, os argumentos invocados são substancialmente idênticos, dado que o recorrente contesta que os regulamentos impugnados tenham podido ser adoptados pela Comissão com base numa disposição do acto de adesão que estabelece a competência desta, quando deveriam ter sido adoptados pelo Conselho com base numa disposição relativa às competências desta instituição.

31 Por outro lado, verifica-se pelo teor das contestações e das tréplicas apresentadas pela Comissão que esta não se equivocou quanto ao fundo das críticas avançadas no quadro deste fundamento, de modo que teve a possibilidade de defender utilmente o seu ponto de vista.

32 Há assim que decidir que os recursos nos processos C-71/95 e C-155/95 são admissíveis quanto ao seu primeiro fundamento de anulação.

Quanto ao mérito

33 Para examinar a procedência deste fundamento, convirá lembrar que o artigo 149._, n._ 1, do acto de adesão confere à Comissão poderes para decidir, segundo o procedimento dito do comité de gestão, das medidas transitórias que se revelem necessárias durante um prazo que terminará em 31 de Dezembro de 1997.

34 Verifica-se, a este propósito, que a organização comum de mercado no sector das bananas não podia ser aplicada aos novos Estados-Membros da Comunidade, se o Conselho não tivesse, previamente, aumentado o contingente pautal. A inclusão dos operadores dos três novos Estados-Membros no contingente pautal fixado para a Comunidade dos Doze implicaria, com efeito, uma redução dos direitos de importação dos operadores dos antigos Estados-Membros, a atribuição de direitos insuficientes aos operadores dos novos Estados-Membros e uma penúria de bananas no interior da Comunidade e uma subida dos preços, consequências estas incompatíveis com os objectivos do regulamento do Conselho.

35 Ao invés do que sustenta o Reino da Bélgica, o aumento do contingente, tornado necessário pelas novas adesões, não poderia ter sido decidido com base no artigo 16._, n._ 3, do regulamento do Conselho. Basta constatar que, no caso em apreço, não estava em causa adaptar o contingente pautal na sequência de uma revisão do balanço previsional do consumo na Comunidade, mas estabelecer um regime tornado necessário pela adesão dos três novos Estados-Membros e que não se encontrava previsto no acto de adesão.

36 Acresce que, como a Comissão correctamente sublinhou, a aplicação imediata da organização comum de mercado das bananas aos novos Estados-Membros teria originado sérios problemas de abastecimento, pelo facto de que, nestes Estados, os operadores económicos importavam bananas de países terceiros e se enquadravam, portanto, apenas na categoria A.

37 Ao contrário do que defende o Reino da Bélgica, nem o artigo 148._ nem o artigo 150._ do acto de adesão podiam constituir a base jurídica para as medidas transitórias que se impunham.

38 Com efeito, o artigo 148._, n._ 1, do acto de adesão confere ao Conselho o poder de definir as medidas necessárias à execução do título VI respeitante à agricultura. Não permite, portanto, derrogar o disposto no artigo 137._, n._ 2, do acto de adesão, que prevê a aplicação integral da organização comum de mercado. O artigo 150._, por seu lado, só diz respeito ao período que medeia entre a data da assinatura e a data de entrada em vigor do acto de adesão.

39 O Reino da Bélgica alega que o artigo 149._ do acto de adesão não pode constituir a base jurídica de medidas transitórias que, como acontece no presente caso, suspendem a aplicação de uma organização comum de mercado. As medidas que este artigo prevê, e cuja competência cabe à Comissão, devem ser adoptadas «nos termos do presente título», o que implica que a organização comum deve ser respeitada e que só medidas destinadas a acelerar e a facilitar a passagem à organização comum podem ser adoptadas com base nesta disposição.

40 Deve salientar-se a este respeito que as medidas previstas no artigo 149._ se destinam a facilitar a transição para o regime decorrente da «aplicação da organização comum de mercado, nos termos do presente título». Esta aplicação rege-se pelo artigo 137._ do acto de adesão, que precisa que a organização de mercado no sector das bananas é aplicável a partir de 1 de Janeiro de 1995 nos novos Estados-Membros, sem prever qualquer adaptação ou medida transitória.

41 O artigo 149._ sujeita as medidas a que se refere a uma única condição, ou seja, a necessidade de facilitar a transição do regime existente nos novos Estados-Membros para o regime decorrente da aplicação da organização comum de mercado nesses países.

42 Como o Governo francês observou com razão, esta interpretação é a única que confere ao artigo 149._ um efeito útil. Com efeito, a Comissão dispõe já de competências para a execução que não estão limitadas no tempo. Ora, as medidas particulares que a Comissão pode adoptar ao abrigo do artigo 149._ expiram em 31 de Dezembro de 1997.

43 Resulta do que precede que a Comissão podia validamente adoptar os regulamentos impugnados com base no artigo 149._ do acto de adesão, de modo que o primeiro fundamento não merece acolhimento.

Quanto ao segundo fundamento

44 O Reino da Bélgica sustenta que os regulamentos impugnados sujeitam os operadores económicos dos novos Estados-Membros a um regime diferente do aplicável aos operadores dos antigos Estados-Membros, porque não prevêem a aplicação do critério de repartição. Esta diferença de tratamento não tem justificação objectiva e infringe, portanto, o princípio da não discriminação consagrado pelo artigo 40._, n._ 3, do Tratado CE.

45 Lembre-se que o Tribunal de Justiça declarou, nos n.os 34 a 36 do presente acórdão, que, na falta de uma adaptação pelo Conselho do contingente global para a Comunidade alargada, se impunha a fixação pela Comissão, a título transitório, de um contingente especial para os novos Estados-Membros.

46 Pelos motivos expostos no n._ 36 deste acórdão, a Comissão era obrigada a adoptar um regime transitório que não retomasse o critério de repartição entre os operadores económicos previsto no artigo 19._ do regulamento do Conselho.

47 Porém, para facilitar a plena aplicação da organização comum nos novos Estados-Membros, fez depender a importação de bananas nestes Estados da emissão de certificados e previu um coeficiente uniforme de redução.

48 Por último, a Comissão limitou a aplicação do regime transitório a um ano. Não se provou que tenha cometido um erro manifesto de apreciação ao considerar esse prazo necessário para facilitar a plena aplicação da organização comum nos novos Estados-Membros.

49 Por outro lado, os regulamentos impugnados estabelecem que as autorizações de importação são concedidas aos operadores económicos dos novos Estados-Membros, sem prejuízo das quantidades de referência a atribuir a esses mesmos operadores, em função do ano de 1995, nos termos do artigo 6._ do Regulamento n._ 1442/93. Como sustenta, com razão, a Comissão, em relação ao ano de 1995 no seu todo, os operadores dos novos Estados-Membros devem ter o mesmo tratamento que os dos antigos Estados-Membros.

50 Nestas condições, ter-se-á que concluir que a situação de facto e de direito nos novos Estados-Membros era diferente da existente nos doze antigos Estados-Membros e que essa diferença justificava a adopção pela Comissão dos regulamentos impugnados.

51 Assim, o segundo fundamento não procede.

Quanto ao terceiro fundamento

52 O Reino da Bélgica alega que os considerandos dos regulamentos impugnados não contêm fundamentação suficiente e que a Comissão infringiu, portanto, o artigo 190._ do Tratado CE.

53 Há que lembrar a este respeito que, segundo jurisprudência constante, a fundamentação exigida pelo artigo 190._ do Tratado deve ser adaptada à natureza do acto em causa. Deve pôr em evidência, de modo claro e inequívoco, o raciocínio da autoridade comunitária, autora do acto, de modo a permitir aos interessados conhecer as justificações da medida tomada e ao Tribunal de Justiça exercer o seu controlo. Resulta, além disso, desta jurisprudência que não se pode exigir que a fundamentação de um acto especifique os diferentes elementos de facto e de direito objecto do mesmo, quando esse acto entra no quadro sistemático do conjunto de que faz parte (v. acórdãos de 13 de Outubro de 1992, Portugal e Espanha/Conselho, C-63/90 e C-67/90, Colect., p. I-5073, n._ 16, e de 14 de Julho de 1994, Grécia/Conselho, C-353/92, Colect., p. I-3411, n._ 19).

54 Recorde-se que os Regulamentos n.os 3303/94 e 479/95 visam, segundo os seus segundo e terceiro considerandos, respectivamente, facilitar a transição do regime existente nos novos Estados-Membros antes da sua adesão à Comunidade para o regime resultante da organização comum de mercado.

55 Se bem que em termos diferentes, a Comissão lembra, no terceiro considerando do Regulamento n._ 1219/95, esse objectivo.

56 Na falta de uma adaptação pelo Conselho do contingente pautal para a Comunidade alargada, a necessidade, para a Comissão, de fixar, a título transitório, contingentes especiais para os novos Estados-Membros e a impossibilidade em que se encontrava esta instituição de aplicar a esses contingentes o critério de repartição eram manifestas para os interessados, nomeadamente para os antigos Estados-Membros da Comunidade.

57 Nestas condições, o terceiro fundamento não merece acolhimento.

58 Resulta de quanto precede que deve ser negado provimento aos três recursos interpostos pelo Reino da Bélgica.$

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

59 Por força do disposto no n._ 2 do artigo 69._ do Regulamento de Processo, a parte vencida deve ser condenada nas despesas, se tal tiver sido pedido. Tendo o Reino da Bélgica sido vencido, há que condená-lo nas despesas. Nos termos do n._ 4 do mesmo artigo, os Estados-Membros e as instituições que intervieram no processo suportarão as suas próprias despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA

decide:

60 Negar provimento aos recursos.

61 Condenar o Reino da Bélgica nas despesas da instância.

62 Condenar a República Francesa, interveniente, a suportar as suas próprias despesas.