61994J0069

Acórdão do Tribunal (Sexta Secção) de 29 de Maio de 1997. - República Francesa contra Comissão das Comunidades Europeias. - Leite - Regime de imposição suplementar - Normas de execução - Decisão 93/673/CEE - Competência da Comissão. - Processo C-69/94.

Colectânea da Jurisprudência 1997 página I-02599


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


Agricultura - Organização comum de mercado - Leite e produtos lácteos - Imposição suplementar sobre o leite - Questionário anual dirigido aos Estados-Membros sobre a aplicação do regime - Comunicação à Comissão - Redução forfetária dos adiantamentos sobre a tomada a cargo das despesas agrícolas em caso de não cumprimento do prazo fixado - Decisão 93/673 - Base jurídica - Violação do Regulamento n._ 729/70 ou do princípio da proporcionalidade - Inexistência

(Regulamento n._ 729/70 do Conselho; Regulamento n._ 536/93 da Comissão, artigo 8._, quarto travessão; Decisão 93/673 da Comissão)

Sumário


Ao adoptar a Decisão 93/673, que fixa a redução forfetária dos adiantamentos sobre a tomada a cargo das despesas agrícolas em caso de não cumprimento do prazo de comunicação do questionário anual respeitante à aplicação do regime de imposição suplementar sobre o leite e ao prever, mais especificamente, uma taxa de redução de 1% do montante global pago ao Estado-Membro a título do exercício orçamental anterior em caso de comunicação tardia, uma taxa de 0,5% do mesmo montante global em caso de cálculo inexacto da imposição em mais de 10% e uma taxa de 0,04% por dado ausente, a Comissão baseou-se validamente no quarto travessão do artigo 8._ do Regulamento n._ 536/93, que estabelece as normas de execução da imposição suplementar, regulamento este que submete os Estados-Membros à obrigação de comunicarem o questionário em causa, devidamente preenchido, antes da data indicada e autoriza a Comissão a proceder a uma redução dos adiantamentos não apenas no caso de comunicação tardia do questionário, mas também quando este esteja incompleto ou seja inexacto.

A referida decisão não viola o Regulamento n._ 729/70 relativo ao financiamento da política agrícola comum, visto a redução dos adiantamentos, que não pode ter natureza definitiva, não excluir o controlo do seu bem fundado no âmbito do apuramento das contas estabelecido pelo referido regulamento, altura essa em que o Estado-Membro interessado poderá apresentar o seu ponto de vista quanto à legalidade da redução, ficando assim garantidos os seus direitos da defesa.

Por último, a decisão não viola o princípio da proporcionalidade, na medida em que visa precisar, numa preocupação de aplicação uniforme e de segurança jurídica, a forma de aplicação da redução dos adiantamentos, definindo, para esse efeito, os diversos casos de incumprimento que dão lugar à correspondente taxa de redução. A este respeito, as características decorrentes da natureza forfetária das modalidades da redução não são de molde a torná-la desproporcionada relativamente ao respectivo objectivo, modalidades essas que não parecem excessivas relativamente à importância que a comunicação em boa e devida forma representa para a gestão do regime da imposição.

Partes


No processo C-69/94,

República Francesa, representada por Edwige Belliard, directora adjunta da Direcção dos Assuntos Jurídicos do Ministério dos Negócios Estrangeiros, e Jean-Louis Falconi, secretário dos Negócios Estrangeiros na mesma direcção, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo na sede da Embaixada de França, 9, boulevard du Prince Henri,

recorrente,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada por Gérard Rozet, consultor jurídico, na qualidade de agente, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de Carlos Gómez de la Cruz, membro do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,

recorrida,

que tem por objecto um recurso de anulação da Decisão 93/673/CE da Comissão, de 10 de Dezembro de 1993, que fixa a redução forfetária dos adiantamentos sobre a tomada a cargo das despesas agrícolas em caso de não cumprimento das disposições relativas à comunicação do questionário anual respeitante à aplicação do regime de imposição suplementar no sector do leite e dos produtos lácteos estabelecido pelo Regulamento (CEE) n._ 3950/92 do Conselho (JO L 310, p. 44),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA

(Sexta Secção),

composto por: J. L. Murray, presidente da Quarta Secção, exercendo funções de presidente da Sexta Secção, C. N. Kakouris, P. J. G. Kapteyn, G. Hirsch (relator) e H. Ragnemalm, juízes,

advogado-geral: G. Tesauro,

secretário: H. von Holstein, secretário adjunto,

visto o relatório para audiência,

ouvidas as alegações das partes na audiência de 27 de Junho de 1996, na qual o Governo francês foi representado por Frédéric Pascal, adido da administração central na Direcção dos Assuntos Jurídicos do Ministério dos Negócios Estrangeiros, na qualidade de agente, e a Comissão por Gérard Rozet,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 26 de Setembro de 1996,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por petição entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 21 de Fevereiro de 1994, a República Francesa interpôs, nos termos do primeiro parágrafo do artigo 173._ do Tratado CE, recurso de anulação da Decisão 93/673/CE da Comissão, de 10 de Dezembro de 1993, que fixa a redução forfetária dos adiantamentos sobre a tomada a cargo das despesas agrícolas em caso de não cumprimento das disposições relativas à comunicação do questionário anual respeitante à aplicação do regime de imposição suplementar no sector do leite e dos produtos lácteos, estabelecido pelo Regulamento (CEE) n._ 3950/92 do Conselho (JO L 310, p. 44, a seguir «decisão controvertida»).

2 No âmbito da organização comum de mercado no sector do leite e dos produtos lácteos, foi instituído um regime de imposição suplementar pelo Regulamento (CEE) n._ 856/84 do Conselho, de 31 de Março de 1984, que altera o Regulamento (CEE) n._ 804/68, que estabelece a organização comum de mercado no sector do leite e dos produtos lácteos (JO L 90, p. 10; EE 03 F30 p. 61), e pelo Regulamento (CEE) n._ 857/84 do Conselho, de 31 de Março de 1984, que estabelece as regras gerais para a aplicação da imposição referida no artigo 5._-C do Regulamento (CEE) n._ 804/68 no sector do leite e produtos lácteos (JO L 90, p. 13; EE 03 F30 p. 64). Este regime, que foi objecto de prorrogação até 31 de Março de 1993, foi renovado por sete novos períodos consecutivos de doze meses, com algumas alterações, tendo em vista o seu aperfeiçoamento e simplificação, pelo Regulamento (CEE) n._ 3950/92 do Conselho, de 28 de Dezembro de 1992, que institui uma imposição suplementar no sector do leite e dos produtos lácteos (JO L 405, p. 1).

3 No que se refere à natureza e utilização da imposição, o artigo 10._ do Regulamento n._ 3950/92 estabelece:

«A imposição é considerada parte integrante das intervenções destinadas à regularização dos mercados agrícolas e será afectada ao financiamento das despesas do sector leiteiro.»

4 Com base na autorização contida no artigo 11._ deste último regulamento, nos termos da qual «as normas de execução do presente regulamento e, designadamente, as características do leite, entre as quais o teor de matéria gorda, consideradas representativas para efeitos de fixação das quantidades de leite entregues ou compradas serão adoptadas de acordo com o procedimento previsto no artigo 30._ do Regulamento (CEE) n._ 804/68», a Comissão adoptou o Regulamento (CEE) n._ 536/93, de 9 de Março de 1993, que estabelece as normas de execução da imposição suplementar no sector do leite e dos produtos lácteos (JO L 57, p. 12). O quarto travessão do artigo 8._ deste diploma determina:

«Os Estados-Membros comunicarão à Comissão:

- ...

- ...

- ...

- antes de 1 de Setembro de cada ano, o questionário em anexo devidamente preenchido. Em caso de não cumprimento do prazo, a Comissão procederá a uma redução forfetária dos adiantamentos sobre a tomada a cargo das despesas agrícolas.»

5 No que se refere ao não cumprimento do prazo, o quinto considerando deste regulamento refere:

«que a experiência adquirida demonstrou que os importantes atrasos verificados na transmissão dos dados relativos à recolha e à venda directa e no pagamento da imposição comprometiam a eficácia do regime; que, para obviar a essa situação, importa extrair da experiência adquirida as conclusões necessárias e prever exigências estritas em matéria de prazos de comunicação e pagamento, bem como sanções para os casos de incumprimento».

6 Com base no quarto travessão do artigo 8._ do Regulamento n._ 536/93, a Comissão adoptou a decisão controvertida, que inclui os seguintes três artigos:

«Artigo 1._

Caso o questionário anexo ao Regulamento (CEE) n._ 536/93 não tenha sido comunicado antes de 1 de Setembro, a Comissão procederá, relativamente a Setembro e aos Estados-Membros em causa, a uma redução dos adiantamentos sobre a tomada a cargo das despesas no valor de 1% do montante global pago ao Estado-Membro em questão no sector do leite e dos produtos lácteos a título do exercício orçamental anterior.

Artigo 2._

Caso o cálculo da imposição devida à Comunidade, com base nos dados comunicados em resposta ao questionário anexo ao Regulamento (CEE) n._ 536/93, se verifique inexacto em mais de 10%, a Comissão procederá, relativamente aos Estados-Membros em causa, a uma redução dos adiantamentos sobre a tomada a cargo das despesas no valor de 0,5% do montante global pago ao Estado-Membro em questão no sector do leite e dos produtos lácteos a título do exercício orçamental anterior ao exercício durante o qual a inexactidão tiver sido demonstrada.

Artigo 3._

Caso a resposta ao questionário anexo ao Regulamento (CEE) n._ 536/93 esteja incompleta, a Comissão procederá, em relação aos Estados-Membros em causa, a uma redução dos adiantamentos sobre a tomada a cargo das despesas no valor de 0,04%, por dado ausente, do montante global pago ao Estado-Membro em questão no sector do leite e dos produtos lácteos a título do exercício orçamental anterior.»

7 Em apoio do recurso que interpôs da decisão controvertida, a República Francesa invoca três fundamentos de anulação baseados em

- violação dos artigos 8._, quarto travessão, do Regulamento n._ 536/93, e 11._ do Regulamento n._ 3950/92, bem como de determinadas formalidades essenciais;

- violação do Regulamento (CEE) n._ 729/70 do Conselho, de 21 de Abril de 1970, relativo ao financiamento da política agrícola comum (JO L 94, p. 13; EE 03 F3 p. 220), bem como

- violação do princípio da proporcionalidade.

Quanto ao primeiro fundamento baseado em violação dos artigos 8._, quarto travessão, do Regulamento n._ 536/93 e 11._ do Regulamento n._ 3950/92

8 Este fundamento é composto por duas partes.

Quanto à acusação baseada em violação do quarto travessão do artigo 8._ do Regulamento n._ 536/93

9 O Governo francês sustenta que o quarto travessão do artigo 8._ do Regulamento n._ 536/93 não pode servir de fundamento jurídico à adopção dos artigos 2._ e 3._ da decisão controvertida, diversamente do que sucede com o artigo 1._ Aquela disposição prevê a redução forfetária dos adiantamentos sobre a tomada a cargo das despesas agrícolas apenas para a hipótese de o questionário em causa ser tardiamente comunicado à Comissão, ou seja, após o prazo concedido; ficam assim excluídas as hipóteses de questionário inexacto, que é objecto do artigo 2._ da decisão controvertida, e a de questionário incompleto, constante do artigo 3._ da mesma decisão.

10 No que se refere mais especificamente às sanções previstas para as hipóteses de questionários inexactos ou incompletos, os princípios gerais de direito e, em especial, o da legalidade das penas exigem que as sanções sejam previstas de forma limitativa em diploma e que delas seja feita interpretação restrita.

11 A Comissão entende, pelo contrário, que o quarto travessão do artigo 8._ do Regulamento n._ 536/93 constitui base jurídica suficiente para a adopção da decisão controvertida ao prever consequências financeiras negativas para a hipótese de questionário indevidamente preenchido. Os dados fornecidos pelos questionários são indispensáveis para a plena eficácia do regime das quotas leiteiras e para que a Comissão possa assumir as suas responsabilidades de gestão em tempo útil. Tal tarefa fica comprometida em caso de respostas incompletas.

12 Decorre da redacção da primeira frase do quarto travessão do artigo 8._ do Regulamento n._ 536/93 que esta disposição sujeita os Estados-Membros a uma dupla obrigação. Os Estados-Membros devem não apenas comunicar o questionário em causa antes da data indicada, a saber, antes de 1 de Setembro de cada ano, mas também devidamente preenchido.

13 Assim, não se pode entender terem sido cumpridas as obrigações impostas pela primeira frase do quarto travessão do artigo 8._ do Regulamento n._ 536/93 no caso de o conteúdo do questionário comunicado em devido tempo não ser exacto ou completo. Há lugar a uma redução forfetária dos adiantamentos sobre a tomada a cargo das despesas agrícolas, na acepção da segunda frase daquela disposição, desde que ocorra um dos três exemplos enumerados na decisão controvertida, a saber, caso o questionário em causa não seja comunicado antes de 1 de Setembro ou se comunicado nessa data for incompleto ou, em determinada medida, inexacto.

14 Esta interpretação é corroborada pelo objectivo do questionário e pelo papel desempenhado por este documento no âmbito da gestão do regime da imposição suplementar instituído pelo Regulamento n._ 3950/92.

15 A gestão deste regime, que criou um mecanismo de responsabilidade financeira, a saber, a imposição suplementar, é confiada tanto aos Estados-Membros como à Comissão. Abrange, designadamente, dois tipos de actividade, a saber, por um lado, a cobrança da imposição, seu controlo e pagamento do produto da imposição à Comunidade e, por outro, a adopção de eventuais medidas de intervenção correctivas com vista às evoluções e adaptações estruturais, tal como decorre dos décimo sexto e décimo sétimo considerandos do Regulamento n._ 3950/92.

16 De acordo com o respectivo segundo considerando, o Regulamento n._ 536/93 enuncia as regras de controlo que permitem a verificação da regularidade da cobrança da imposição. As medidas de controlo são confiadas, nos termos do artigo 7._ do Regulamento n._ 536/93, às autoridades nacionais competentes; estas são obrigadas, de acordo com o quarto travessão do artigo 8._ do mesmo regulamento, a informar anualmente a Comissão, através do referido questionário, dos resultados que reflectem a situação relativa à cobrança da imposição.

17 De acordo com as afirmações da Comissão, não impugnadas pelo Governo francês, aquela instituição necessita de tais informações relativas à cobrança das imposições para avaliar em tempo útil se e porque forma são obtidos os resultados esperados pelo regime de quotas leiteiras à produção e para determinar o respectivo impacto orçamental sobre o exercício em curso e os exercícios seguintes decorrentes da evolução da referida produção. Com efeito, o produto da imposição cobrada pelo Estado-Membro é por este entregue à Comunidade, mais exactamente ao Fundo Europeu de Orientação e de Garantia Agrícola (a seguir «FEOGA»), que o utiliza, nos termos do artigo 10._ do Regulamento n._ 3950/92, para financiar as despesas relativas à estabilização e regularização do mercado dos produtos lácteos.

18 Ora, o questionário apenas tem valor para a Comissão, para que possa exercer correctamente a sua função no âmbito do processo orçamental, caso reflicta fielmente a situação relativa à cobrança das imposições. Tal apenas se pode verificar se os dados nele contidos forem exactos e completos.

19 No que se refere às eventuais medidas de intervenção, tais medidas apenas podem ser propostas pela Comissão caso disponha de informações correctas e completas. Tendo em conta a necessidade de eventuais medidas adequadas e apropriadas à evolução real, o questionário deve, pois, ser fiável, no sentido de dever conter dados exactos e completos.

20 Recordem-se, por último, os acórdãos de 17 de Outubro de 1991, Alemanha/Comissão (C-342/89, Colect., p. I-5031, n._ 16), e Itália/Comissão (C-346/89, Colect., p. I-5057, n._ 16), de acordo com os quais a Comissão tem o poder de diminuir o pagamento das somas devidas a título de adiantamentos mensais quando constatar que, com violação do direito comunitário, o organismo nacional não cobrou certas receitas destinadas ao FEOGA.

21 Ora, a Comissão apenas pode exercer a competência que assim lhe é atribuída, independentemente da competência de que dispõe nos termos do quarto travessão do artigo 8._ do Regulamento n._ 536/93, caso os dados contidos no questionário sejam exactos e completos e lhe permitam assim verificar se as autoridades nacionais não omitiram cobrar imposições devidas por operadores que tenham ultrapassado as quotas.

22 Cabe, assim, rejeitar a acusação do Governo francês relativa à violação do quarto travessão do artigo 8._ do Regulamento n._ 536/93.

Quanto à acusação baseada em violação do artigo 11._ do Regulamento n._ 3950/92

23 O Governo francês sustenta que os artigos 2._ e 3._ da decisão controvertida não podem também fundar-se no artigo 11._ do Regulamento n._ 3950/92. Esta disposição autoriza a Comissão a adoptar as normas de execução do regime de imposição suplementar nos termos do procedimento dito «comité de gestão», de acordo com o artigo 30._ do Regulamento (CEE) n._ 804/68 do Conselho, de 27 de Junho de 1968 (JO L 148, p. 13; EE 03 F2 p. 146). Apesar de as sanções previstas nos artigos 2._ e 3._ da decisão controvertida poderem ser assimiladas a normas de execução, na acepção do artigo 11._ do Regulamento n._ 3950/92, o comité de gestão, cuja participação no processo de adopção das normas de execução em causa é expressamente prescrita, não foi consultado aquando da adopção da decisão controvertida.

24 Há que declarar que a decisão controvertida precisa as condições de aplicação da competência de redução atribuída à Comissão pelo quarto travessão do artigo 8._ do Regulamento n._ 536/93, pelo que não pode ser considerada como abrangida, enquanto norma de execução, pelo artigo 11._ do Regulamento n._ 3950/92.

25 Com efeito, na medida em que a decisão controvertida estabelece, de forma geral e igual para todos os Estados-Membros, as diferentes percentagens de redução aplicáveis aos diversos tipos de incumprimento de que pode padecer a comunicação do questionário, tal decisão precisa, no interesse da segurança jurídica, a forma por que a Comissão entende proceder às reduções dos adiantamentos nos diversos casos previstos.

26 Decorre das considerações precedentes não ser também procedente a acusação baseada em violação do artigo 11._ do Regulamento n._ 3950/92.

Quanto ao segundo fundamento baseado em violação do Regulamento n._ 729/70

27 Em apoio deste fundamento, o Governo francês baseia-se, na falta de uma definição expressa dos poderes atribuídos à Comissão pela regulamentação comunitária em causa, nos acórdãos Alemanha/Comissão e Itália/Comissão, já referidos.

28 O Governo francês sustenta que sanções financeiras aplicáveis aos Estados-Membros como as instituídas pela decisão controvertida têm, diversamente da redução em causa nos acórdãos Alemanha/Comissão e Itália/Comissão, já referidos, a natureza de sanções definitivas. A aplicação de tais sanções é, assim, automática. Além disso, o Governo francês refere, quanto ao respeito dos direitos da defesa, que nem a decisão controvertida nem o Regulamento n._ 536/93 autorizam o Estado-Membro em causa a precisar, relativamente a uma medida de redução contra si adoptada, o respectivo ponto de vista, designadamente no que se refere às justificações do atraso penalizado.

29 Este fundamento deve ser rejeitado. Por um lado, tal como foi já salientado no n._ 20 do presente acórdão, o Tribunal de Justiça reconheceu à Comissão, nos acórdãos Alemanha/Comissão e Itália/Comissão, já referidos, o poder de reduzir, enquanto aguarda decisão definitiva sobre o apuramento das contas anuais, o pagamento das somas devidas a título de adiantamentos mensais no caso de o organismo nacional não ter cobrado, com violação do direito comunitário, certas receitas destinadas ao FEOGA.

30 Por outro lado, o Tribunal de Justiça constatou também, no n._ 18 dos acórdãos Alemanha/Comissão e Itália/Comissão, já referidos, que as decisões relativas aos adiantamentos mensais tomadas no decurso do exercício, unicamente com base nos elementos disponíveis nesse momento, apenas revestem um carácter temporário e provisório e não podem antecipar a decisão final e definitiva relativa ao apuramento anual das contas. Esta decisão é tomada na sequência do processo contraditório específico no decurso do qual os Estados-Membros interessados dispõem de todas as garantias necessárias para defender o seu ponto de vista.

31 Ora, se essa decisão de reduzir os adiantamentos mensais adoptada em caso de omissão da cobrança, com violação do direito comunitário, de certas receitas destinadas ao FEOGA reveste um mero carácter temporário e provisório e está sujeita ao processo de apuramento, o mesmo deverá suceder com a decisão de redução dos mesmos adiantamentos mensais, na acepção do quarto travessão do artigo 8._ do Regulamento n._ 536/93, em consequência da omissão de comunicar em boa e devida forma os dados obrigatórios relativos a tais receitas, decisão essa que não pode, assim, ter natureza definitiva e obstar ao controlo efectuado aquando do apuramento das contas.

32 Daqui decorre que, contrariamente à afirmação da recorrente, a redução dos adiantamentos, na acepção do quarto travessão do artigo 8._ do Regulamento n._ 536/93, não exclui o controlo do seu bem fundado no âmbito do apuramento das contas estabelecido no Regulamento n._ 729/70. Nessa altura, o Governo francês poderá apresentar o seu ponto de vista quanto à legalidade da redução dos adiantamentos, pelo que estão garantidos os direitos da defesa.

Quanto ao terceiro fundamento baseado em violação do princípio da proporcionalidade

33 A título liminar, o Governo francês salienta existirem outras fontes de informação para além do questionário que possibilitam a gestão pela Comissão do mercado do leite e não existir relação entre o cumprimento do prazo estabelecido para a comunicação do questionário e a eficácia do regime.

34 Com base nos acórdãos de 20 de Fevereiro de 1979, Buitoni (122/78, Recueil, p. 677); de 24 de Setembro de 1985, Man (Sugar) (181/84, Recueil, p. 2889), e de 18 de Abril de 1989, Drewes (358/87, Colect., p. 891), o Governo francês sustenta, em seguida, que a obrigação de transmissão do questionário no prazo concedido é uma obrigação acessória cujo incumprimento não pode ser objecto de uma sanção idêntica, até mesmo superior, ao incumprimento de uma obrigação principal, como seja a aplicável em caso de não cobrança da imposição suplementar devida pelos produtores que tenham ultrapassado as respectivas quantidades de referência.

35 As sanções instituídas pela decisão controvertida são desproporcionadas em virtude da respectiva natureza automática, da ausência de graduação e do montante das retenções. Desta forma, sanções forfetárias e automáticas em caso de má aplicação das medida de gestão administrativa são demasiado rigorosas, na acepção do acórdão Buitoni, já referido. Não existe qualquer relação entre o montante da retenção e o prejuízo financeiro sofrido pelo FEOGA; com efeito, tal prejuízo, constituído pelo atraso na cobrança, é compensado pelos juros de mora devidos pelos operadores. Além disso, as sanções previstas nos artigos 1._ e 3._ da decisão controvertida podem ser aplicadas a um Estado-Membro sem que exista imposição suplementar a pagar ao FEOGA.

36 No que se refere em especial às sanções, o artigo 1._ da decisão controvertida não contém qualquer graduação em função da importância do atraso. Quanto ao artigo 2._, o Governo francês entende serem dificilmente compreensíveis as razões pelas quais um Estado-Membro deve ser penalizado por fraudes que ele próprio pôs em evidência através dos controlos que praticou. Além disso, tal disposição permite aplicar uma penalidade na maior parte dos casos igual, ou até mesmo superior, à rectificação gerada, no âmbito de um apuramento, por uma diferença de 10% entre a soma efectivamente devida e a soma calculada a partir dos dados comunicados em resposta ao questionário em causa. O artigo 3._ também não contém qualquer graduação em função da importância da falta deste ou daquele dado.

37 A Comissão responde que a jurisprudência relativa às obrigações primárias e acessórias não é aplicável visto o Tribunal de Justiça a ter desenvolvido no contexto perfeitamente específico da prestação de caução. Além disso, a comunicação dos dados solicitados pelo questionário antes de 1 de Setembro não constitui tarefa impossível visto os Estados-Membros deles disporem antes dessa data. As consequências financeiras negativas, designadamente as previstas no artigo 2._ da decisão controvertida decorrentes da inexactidão, apenas põem em causa um número restrito dos dados a que se refere o questionário. Assim, a margem de 10% de diferença, sancionada pelo artigo 2._ da decisão controvertida, apenas foi ultrapassada pela República Francesa uma única vez, relativamente ao período 1987/1988, com uma diferença de 12,67%. A Comissão conclui que a decisão controvertida estabelece uma graduação das consequências financeiras negativas em função do tipo de incumprimento pelo Estado-Membro da sua obrigação de comunicar o questionário antes de 1 de Setembro.

38 Para apreciar a conformidade de uma disposição de direito comunitário, em especial no sector das organizações comuns de mercados agrícolas, com o princípio da proporcionalidade, importa examinar se as medidas instituídas por essa disposição ultrapassam os limites do que é necessário e apropriado para alcançar o objectivo pretendido pela regulamentação em causa. É necessário, em particular, verificar se os meios que aquela disposição utiliza para realizar o objectivo pretendido estão de acordo com a importância deste e se são necessários para o alcançar (v. acórdão de 21 de Janeiro de 1992, Pressler, C-319/90, Colect., p. I-203, n._ 12).

39 No que se refere ao seu objectivo, a decisão controvertida visa precisar, numa preocupação de aplicação uniforme e de segurança jurídica, o processo de aplicação da redução forfetária dos adiantamentos. Para esse efeito, define os diversos casos de incumprimento da obrigação de comunicar o questionário no prazo atribuído e estabelece, para cada um deles, a correspondente taxa de redução.

40 Saliente-se, em primeiro lugar, que a proporcionalidade das modalidades de redução previstas na decisão controvertida não pode ser posta em causa nem pela existência de outras fontes de informação nem pela pretensa falta de relação entre o cumprimento do prazo estabelecido para o envio do questionário e a eficácia do regime.

41 Mesmo que a Comissão disponha efectivamente de outras fontes de informação, não ficou provado que estas forneçam idênticas informações disponíveis na mesma data que as exigidas pelo questionário.

42 No que se refere à pretensa inexistência de relação entre a eficácia do regime e o prazo, basta salientar que a própria República Francesa referiu a função e importância do prazo no âmbito do processo orçamental. Os resultados obtidos no âmbito deste processo graças aos dados comunicados pelo questionário tornam possível que a Comissão exerça o seu papel de gestora, quanto mais não seja propondo às instituições competentes as eventuais medidas de correcção que se imponham.

43 No que se refere, em segundo lugar, à necessária diferenciação, de acordo com o Governo francês, entre a obrigação principal e as obrigações acessórias, cabe rejeitar tal acusação, visto que a redução mensal, de natureza provisória, dos adiantamentos sobre a tomada a cargo das despesas agrícolas em virtude do não cumprimento do prazo de comunicação do questionário em causa não pode ser comparada à recusa definitiva de tomar em consideração um montante em virtude de uma imposição indevidamente não cobrada pelo Estado-Membro.

44 Saliente-se, em seguida, que, ao estabelecer duas taxas de redução diferentes em função dos casos de incumprimento da obrigação decorrente do quarto travessão do artigo 8._ do Regulamento n._ 536/93, a decisão controvertida atende à importância que cada tipo de incumprimento representa para a Comissão no cumprimento do seu papel de gestora do regime da imposição suplementar.

45 É certo que, apesar de as taxas de redução serem graduadas em função dos diversos casos de incumprimento, as modalidades de redução instituídas pela decisão controvertida conservam determinada natureza forfetária, como salientou o Governo francês.

46 Assim, os diversos graus de importância dos elementos do questionário não são tomados em consideração aquando da aplicação dos artigos 1._ e 3._ da decisão controvertida; o artigo 2._ da mesma decisão não estabelece qualquer relação entre o montante da redução e o da rectificação gerada por uma diferença superior em 10% entre a soma da imposição efectivamente devida e a calculada em função do questionário; a decisão controvertida em nada atende ao prejuízo financeiro sofrido pelo FEOGA em virtude do incumprimento da obrigação imposta pelo quarto travessão do artigo 8._ do Regulamento n._ 536/93.

47 Contudo, tais características decorrentes da natureza forfetária das modalidades da redução não são susceptíveis de a tornar desproporcionada relativamente ao respectivo objectivo. Tais modalidades de redução (taxa de redução de 1% do montante global pago ao Estado-Membro a título do exercício orçamental anterior, aplicável exclusivamente, porém, aos adiantamentos relativos ao mês de Setembro e em caso de comunicação tardia do questionário, taxa de redução de 0,5% do mesmo montante global no caso de o cálculo da imposição ser inexacto em mais de 10% e taxa de 0,04% por dado ausente) não parecem, em si mesmas, excessivas relativamente à importância que a comunicação em boa e devida forma representa para a gestão do regime da imposição. Elas são tanto menos excessivas quanto não se aplicam a título definitivo às despesas elegíveis, mas apenas, como decorre das considerações relativas à violação do Regulamento n._ 729/70, aos adiantamentos mensais, pelo que se revestem de natureza provisória, sendo o seu bem fundado sujeito a controlo aquando do apuramento das contas.

48 Em consequência, deve entender-se não proceder este último fundamento.

49 Assim sendo, atendendo ao conjunto de considerações precedentes, há que negar provimento ao recurso na totalidade.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

50 Por força do disposto no n._ 2 do artigo 69._ do Regulamento de Processo, a parte vencida deve ser condenada nas despesas. Tendo a República Francesa sido vencida, há que condená-la nas despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA

(Sexta Secção)

decide:

51 É negado provimento ao recurso.

52 A República Francesa é condenada nas despesas.