Conclusões do advogado-geral Léger apresentadas em 10 de Dezembro de 1996. - República Federal da Alemanha contra Parlamento Europeu e Conselho da União Europeia. - Directiva relativa aos sistemas de garantia de depósitos - Base jurídica - Obrigação de fundamentação - Princípio da subsidiariedade - Proporcionalidade - Protecção do consumidor - Controlo pelo Estado-Membro de origem. - Processo C-233/94.
Colectânea da Jurisprudência 1997 página I-02405
1 A República Federal da Alemanha interpôs um recurso de anulação da Directiva 94/19/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de Maio de 1994, relativa aos sistemas de garantia de depósitos (1) (a seguir «directiva» ou «directiva impugnada»), porque, por um lado, o artigo 57._, n._ 2, do Tratado CE, com base no qual esse texto foi adoptado, não constitui uma base jurídica suficiente e, por outro, porque a directiva não foi fundamentada nos termos do disposto no artigo 190._ do Tratado CE.
2 A título subsidiário, a recorrente solicita a anulação de três disposições da directiva:
- O artigo 4._, n._ 1, segundo parágrafo, que se opõe à «exportação» das garantias, ao prever que a cobertura de que beneficiam os depositantes das sucursais criadas pelas instituições de crédito noutros Estados-Membros não pode exceder a cobertura oferecida pelo sistema de garantia correspondente do Estado-Membro de acolhimento;
- O artigo 4._, n._ 2, nos termos do qual o Estado-Membro cujo sistema de garantia de depósitos exceda o nível ou o âmbito da cobertura prevista noutro Estado-Membro deve assegurar um sistema de garantia de depósitos, a que as sucursais das instituições de crédito autorizadas neste último Estado possam aderir para complementar a sua garantia;
- O artigo 3._, n._ 1, primeiro parágrafo, segundo período, da directiva, que fixa uma obrigação de adesão das instituições de crédito a um sistema de garantia.
3 O Conselho e o Parlamento, apoiados pela Comissão, pedem que seja negado provimento ao recurso.
I - A adopção da directiva
4 No âmbito mais amplo da construção do sistema bancário europeu, e para completar a obra já realizada, a Comissão adoptou a recomendação 87/63/CEE (2), destinada a incentivar os Estados-Membros a criar sistemas de garantia de depósitos.
5 Entendendo que a recomendação não tinha produzido os efeitos desejados, a Comissão apresentou, em 14 de Abril de 1992, uma proposta de directiva «relativa aos sistemas de garantia de depósitos» (3), em relação à qual o Parlamento aceitou as linhas gerais, em 10 de Março de 1993. Este último apresentou pedidos de alterações que, em grande parte, foram integradas, como o aumento do nível de cobertura (4). A Comissão apresentou ao Conselho, em 7 de Junho de 1993, uma proposta alterada (5), que, numa posição comum de 25 de Outubro de 1993, este último confirmou nos aspectos essenciais.
6 O Parlamento foi novamente consultado sobre o projecto de directiva, em conformidade com o procedimento de co-decisão entre o Parlamento e o Conselho previsto pelo artigo 189._-B, recentemente introduzido no Tratado de Roma pelo Tratado da União Europeia, e aplicável às directivas adoptadas nos termos do artigo 57._, n._ 2, terceiro período, do Tratado. O Parlamento procedeu a numerosas alterações à posição comum do Conselho por decisão de 9 de Março de 1994 (6). Devido a um desacordo persistente entre as duas instituições, o Comité de Conciliação reuniu-se para definir um projecto comum, o que permitiu a adopção da directiva em 30 de Maio de 1994.
7 A Directiva 94/19 é uma das primeiras adoptadas através do procedimento do artigo 189._-B. Sobretudo, segundo penso, é a primeira a ter saído da fase de conciliação prevista por esse texto.
8 Uma das principais características do artigo 189._-B é permitir a adopção de actos sem recorrer à unanimidade. Nesse novo quadro processual, o Conselho delibera efectivamente por maioria qualificada, com excepção dos casos em que se deve pronunciar sobre as alterações do Parlamento que foram objecto de um parecer negativo da Comissão. Nessa situação, a unanimidade é a regra.
9 Não tendo o voto da República Federal da Alemanha sido suficiente para impedir a adopção da directiva, o Governo alemão interpôs o presente recurso.
10 Defende, essencialmente, a ideia segundo a qual o seu próprio sistema de garantia de depósitos permitiria atingir os objectivos prosseguidos pela directiva sem recorrer a exigências comparáveis.
II - Apresentação geral da Directiva 94/19
11 O objectivo principal da directiva é instituir sistemas de garantia de depósitos em todos os Estados-Membros e harmonizar, a partir de um montante mínimo, as garantias aplicáveis.
12 O artigo 3._, n.os 1 e 4, da directiva prevê que:
«1. Cada Estado-Membro tomará todas as medidas para que sejam instituídos e oficialmente reconhecidos, no seu território, um ou mais sistemas de garantia de depósitos. Salvo nas circunstâncias previstas no segundo parágrafo e no n._ 4, nenhuma instituição de crédito autorizada nesse Estado-Membro ao abrigo do disposto no artigo 3._ da Directiva 77/780/CEE poderá aceitar depósitos se não for membro de um desses sistemas.
Todavia, os Estados-Membros poderão dispensar uma instituição de crédito da obrigação de pertencer a um sistema de garantia de depósitos se ela pertencer a um sistema que proteja a própria instituição de crédito e, nomeadamente, garanta a respectiva liquidez e solvabilidade, assegurando assim aos depositantes uma protecção pelo menos equivalente à oferecida por um sistema de garantia de depósitos, e que, no entender das autoridades competentes, satisfaça as seguintes condições:
- o sistema existe e está oficialmente reconhecido no momento da adopção da presente directiva,
- o sistema tem como objecto evitar que os depósitos junto das instituições de crédito pertencentes a esse sistema possam tornar-se indisponíveis e possui os meios necessários para o efeito,
- o sistema não consiste numa garantia prestada às instituições de crédito pelo próprio Estado-Membro ou pelas suas autoridades locais ou regionais,
- o sistema assegura aos depositantes uma informação nos termos e condições definidos no artigo 9._ da presente directiva.
Os Estados-Membros que utilizem esta faculdade notificarão a Comissão desse facto; os Estados-Membros devem comunicar, nomeadamente, as características desses sistemas de protecção e as instituições de crédito por eles cobertas, bem como quaisquer posteriores alterações às informações comunicadas. A Comissão informará disso o Comité consultivo bancário.
4. Sempre que a legislação nacional o permita, e com o consentimento expresso das autoridades competentes que tiverem emitido a respectiva autorização, uma instituição de crédito excluída de um sistema de garantia de depósitos pode continuar a aceitar depósitos se, antes da sua exclusão, tiver estabelecido mecanismos de garantia alternativos que assegurem aos depositantes um nível e um âmbito de protecção pelo menos equivalentes aos que forem oferecidos pelos sistemas reconhecidos oficialmente» (7).
13 O artigo 4._, n.os 1 e 2, dispõe:
«1. Os sistemas de garantia de depósitos introduzidos e oficialmente reconhecidos num Estado-Membro, em conformidade com o n._ 1 do artigo 3._, garantirão os depositantes das sucursais estabelecidas por instituições de crédito noutros Estados-Membros.
Até 31 de Dezembro de 1999, o nível e o âmbito, incluindo a percentagem, da cobertura fornecida não devem exceder o nível e o âmbito de cobertura máximos oferecidos pelo sistema de garantia correspondente no território do Estado-Membro de acolhimento.
Antes dessa data, a Comissão elaborará um relatório com base na experiência adquirida com a aplicação do segundo parágrafo e ponderará a necessidade de manter este regime em vigor. Se necessário, a Comissão apresentará uma proposta de directiva ao Parlamento Europeu e ao Conselho destinada a prorrogar a sua vigência.
2. Sempre que o nível ou o âmbito, incluindo a percentagem, da cobertura oferecida pelo sistema de garantia do Estado-Membro de acolhimento exceder o nível ou o âmbito da cobertura fornecida no Estado-Membro em que a instituição de crédito está autorizada, o Estado-Membro de acolhimento deve assegurar que exista, no seu território, um sistema de garantia de depósitos oficialmente reconhecido a que a sucursal possa aderir voluntariamente a fim de complementar a garantia de que os seus depositantes já beneficiam devido ao facto de ser membro do sistema do Estado-Membro de origem.
O sistema a que a sucursal venha a aderir deve cobrir a categoria de instituições a que pertence ou aquela que melhor lhe corresponda no Estado-Membro de acolhimento» (8).
14 O artigo 7._ fixa o montante mínimo da garantia. Os seus n.os 1 e 3 contêm, nomeadamente, as seguintes disposições:
«1. Os sistemas de garantia de depósitos devem estipular que o conjunto dos depósitos de um mesmo depositante deve ser garantido até 20 000 ecus no caso de os depósitos ficarem indisponíveis.
Até 31 de Dezembro de 1999, os Estados-Membros onde, no momento da adopção da presente directiva, os depósitos não estiverem garantidos até 20 000 ecus, podem manter o montante máximo previsto nos seus sistemas de garantia, sem que esse montante possa ser inferior a 15 000 ecus.
3. O presente artigo não obsta à manutenção ou à adopção de disposições que ofereçam uma cobertura de depósitos mais elevada ou mais ampla» (9).
15 O artigo 9._ prevê uma obrigação de informação dos depositantes, a cargo das instituições de crédito, sobre o sistema de garantia aplicável.
16 O artigo 10._ fixa em três meses o prazo em que os sistemas de garantia devem pagar os créditos que se tornaram indisponíveis.
III - O sistema de garantia bancário alemão
17 Como resulta dos articulados do Governo alemão e das respostas dadas aquando da audiência, a legislação alemã de garantia de depósitos tem as seguintes características.
18 Instituído em 1976, o fundo de garantia de depósitos da associação federal dos bancos alemães é um organismo de seguro voluntário, não estatal, organizado pela própria associação federal. Existem também outros sistemas de garantia: por exemplo, o dos bancos cooperativos ou o das caixas de poupança.
19 As instituições de crédito estabelecidas na Alemanha são praticamente todas membros de um sistema de garantia. Em Outubro de 1993, apenas cinco instituições com sede na Alemanha e possuidoras de uma autorização para aceitar depósitos, incluindo de pequenos aforradores, não eram aderentes.
20 A protecção assegurada pelo sistema de garantia alemão é particularmente eficaz, uma vez que cobre a quase totalidade dos depósitos, o que faz do nível de protecção alemão o mais elevado da Comunidade.
21 Na Alemanha, qualquer instituição de crédito que não pertença a nenhum organismo autorizado de garantia de depósitos é obrigada a informar disso os seus clientes, antes da abertura de uma conta.
22 As autoridades nacionais da tutela podem proibir que uma instituição de crédito receba depósitos se não for membro de um sistema de garantia e se estiver ameaçada de falência.
23 O fundo de garantia de depósitos da associação federal dos bancos alemães está autorizado pelas empresas aderentes a recolher todas as informações necessárias junto do Bundesaufsichtsamt für das Kreditwesen e do Deutsche Bundesbank, de modo que está em situação de verificar as informações prestadas pelos bancos. Além disso, dispõe do direito de acesso aos documentos sociais dos bancos aderentes e de os verificar no local.
24 As instituições de crédito devem enviar às autoridades nacionais da tutela os relatórios de verificação elaborados pelo sistema de garantia.
IV - O pedido principal
A - A base jurídica da directiva
25 A base jurídica escolhida pelo legislador comunitário foi o artigo 57._, n._ 2, que atribui ao Conselho a competência para adoptar as directivas que visem coordenar as disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados-Membros, respeitantes ao acesso às actividades não assalariadas e ao seu exercício. Tem a seguinte redacção:
«[A fim de facilitar o acesso às actividades não assalariadas e ao seu exercício], o Conselho adoptará, antes do termo do período de transição, directivas que visem coordenar as disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados-Membros, respeitantes ao acesso às actividades não assalariadas e ao seu exercício. O Conselho, deliberando por unanimidade, sob proposta da Comissão, e após consulta do Parlamento Europeu, decide sobre as directivas cuja execução implique, num Estado-Membro pelo menos, uma alteração dos princípios legislativos existentes do regime das profissões, no que respeita à formação e às condições de acesso de pessoas singulares. Nos outros casos, o Conselho delibera de acordo com o procedimento previsto no artigo 189._-B» (10).
26 O artigo 57._, n._ 2, faz parte das disposições, citadas pelo artigo 7._-A, que servem de fundamento jurídico às medidas aprovadas pela Comunidade, destinadas a estabelecer progressivamente o mercado interno.
27 A República Federal da Alemanha sustenta que o artigo 57._, n._ 2, do Tratado não pode constituir a única base jurídica da directiva, porque esta destina-se mais a reforçar a protecção dos depositantes do que a permitir a realização do mercado bancário único.
28 Segundo a recorrente, sendo a defesa dos consumidores o objectivo principal, este só podia ser atingido recorrendo ao artigo 235._ do Tratado CE, não sendo aplicáveis os artigos 100._-A e 129._-A, de modo que os artigos 57._ e 235._ deviam aplicar-se simultaneamente. Daqui conclui que, não havendo a unanimidade exigida pelo artigo 235._, a directiva não foi regularmente adoptada (11).
29 O Conselho, o Parlamento e a Comissão consideram, pelo contrário, que o objectivo principal da directiva é a realização do mercado bancário único, o reforço da estabilidade do sistema bancário e a igualdade de concorrência, ao passo que a protecção dos consumidores constitui apenas um aspecto acessório, inerente a esse objectivo.
30 Trata-se, assim, uma vez mais, de delimitar, para definir o processo de adopção de uma norma comunitária, os âmbitos de aplicação respectivos de dois textos susceptíveis de lhe servir de base jurídica.
31 Para determinar a base jurídica de um acto, há que, em conformidade com a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça (12), partir de elementos objectivos susceptíveis de fiscalização jurisdicional, tais como o objectivo procurado e o conteúdo do acto litigioso.
32 Na medida em que a harmonização tem por objectivo, por definição, aproximar legislações existentes, há que colocar a questão da natureza dessa diligência para determinar a base jurídica pertinente.
33 A aproximação das normas nacionais é ao mesmo tempo destinada a impor, quando forem justificadas, exigências comparáveis a todos os Estados-Membros, e a vinculá-los a regras ou objectivos comuns. Todas as diligências de harmonização juntam, assim, o seu objectivo principal de aproximação das legislações com o próprio objectivo dessas legislações. Deste modo, têm naturalmente vocação para se fundamentar num dupla base jurídica: a que autoriza a harmonização e a que se refere ao objectivo da legislação. De modo que, à primeira vista, parece necessário exigir sistematicamente que os textos de harmonização das legislações assentem numa dupla base legal.
34 O Tribunal de Justiça pronunciou-se quanto ao fundamento de conciliar duas bases jurídicas que eram justificadas por um texto que prossegue um duplo objectivo. Distinguiu o caso em que não era possível dissociar as duas finalidades (13), o que justificava então «... adoptar os actos correspondentes com base em ambas as disposições em causa» (14), do caso em que uma dessas finalidades deve ser considerada acessória da outra, constituindo esta última então a única base jurídica do texto em causa (15). É à luz destes princípios que há que examinar a censura invocada.
35 Quanto ao objectivo prosseguido, é um facto que a liberdade de estabelecimento e a livre de prestação de serviços no sector bancário, por um lado, a estabilidade do sistema bancário e a protecção dos aforradores, por outro, constituem de modo claro os dois objectivos da directiva. Aliás, este ponto não é contestado pelas partes, que divergem, no entanto, quanto à determinação de qual dos dois deve primar e que, por consequência, deve servir para a determinação da base jurídica procurada.
36 O duplo objectivo da directiva impugnada é expresso nas seguintes disposições:
«Considerando que, em conformidade com os objectivos do Tratado, é conveniente promover o desenvolvimento harmonioso da actividade das instituições de crédito em toda a Comunidade através da supressão de todas as restrições à liberdade de estabelecimento e à livre prestação de serviços, reforçando simultaneamente a estabilidade do sistema bancário e a protecção dos aforradores» (16).
37 Mas não é fácil, tendo em conta apenas os considerandos, discernir qual dos dois prevalece. A presença de ambos em numerosos considerandos (v., nomeadamente, os considerandos primeiro, segundo, quinto, oitavo, décimo terceiro, décimo quarto, vigésimo terceiro e vigésimo quinto, no sentido da exigência de uma harmonização, e os considerandos terceiro, nono, décimo primeiro, décimo sexto, no sentido da protecção dos consumidores) conduziria a considerar necessária uma dupla base jurídica.
38 A dificuldade em estabelecer uma hierarquia entre os dois objectivos é igualmente manifesta lendo o conteúdo da directiva. Explica-se pelo facto de um grande número dos princípios enunciados por toda a regulamentação destinada à harmonização dos sistemas de garantia de depósitos bancários visarem necessariamente, através do seu próprio objectivo, a protecção dos depositantes. Em primeiro lugar, poder-se-ia considerar que, se o legislador organizou uma legislação de harmonização dos sistemas de garantia de depósitos bancários, fê-lo tanto, ou mesmo mais, para assegurar a protecção dos depositantes que até então não beneficiavam, ou não dispunham dela de modo efectivo, como para alargar neste domínio obrigações idênticas à totalidade dos operadores económicos em causa para tornar iguais as condições legais de exercício das suas actividades. O conteúdo da directiva é disso testemunha quando fixa uma obrigação de cada instituição pertencer a um sistema de garantia (artigo 3._, n._ 1). O legislador mostra-se também directamente preocupado com os depositantes, quando, por exemplo, limita a três meses, a contar da indisponibilidade do depósito, o pagamento da garantia (artigo 10._, n._ 1).
39 No entanto, parece-me que, embora a exigência de protecção preceda no tempo a harmonização, esta última não pode ser considerada secundária e deve, pelo contrário, tratando-se da Directiva 94/19, ser considerada principal.
40 Por um lado, a liberdade de estabelecimento e a livre prestação de serviços, condições da realização do mercado único bancário, pressupõem que o acesso às actividades não assalariadas e ao seu exercício sejam facilitados por uma coordenação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados-Membros, destinada a suprimir as diferenças constitutivas de obstáculos injustificados. Esta exigência de coordenação é afirmada pelo artigo 57._, n._ 2, do Tratado como um objectivo autónomo cuja importância justifica, nos termos do mesmo texto, que seja atingido num tempo limitado. Faz parte integrante do objectivo, mais geral, do mercado interno, enunciado pelo artigo 7._-A do Tratado.
41 Por outro lado, certas disposições da directiva contestada foram impostas por considerações estranhas, mesmo opostas, de facto, a qualquer preocupação de protecção dos consumidores.
42 É o que se passa em relação ao nível de garantia previsto no artigo 7._, n._ 1, da directiva, justificado, nos termos do décimo sexto considerando, pelo facto de que seria inadequado «impor em toda a Comunidade um nível de protecção que poderia em certos casos ter o efeito de incentivar uma gestão pouco sólida das instituições de crédito». Embora os Estados-Membros sejam livres de ultrapassar o nível desse limite, o texto expressa assim claramente o cuidado de o legislador procurar atingir, a custo de uma limitação da protecção dos depositantes, um equilíbrio destinado a garantir a estabilidade do sistema global, que, de outra forma, poderia comprometer a sua própria existência por querer assegurar em demasia a defesa da sua clientela.
43 A «proibição de exportação» prevista pelo artigo 4._, n._ 1, segundo parágrafo, é uma outra ilustração do lugar reservado pela directiva ao objectivo de harmonização e de estabilidade do sistema bancário. Conduz, na prática, a limitar tanto o nível como o alcance da cobertura prevista pela garantia de uma instituição de crédito de um Estado-Membro, da qual uma sucursal está instalada no território doutro Estado-Membro que oferece uma garantia menor. A protecção dos depositantes é nesse caso ainda sacrificada, embora provisoriamente, às exigências de uma harmonização progressiva.
44 O mesmo se passa quanto à regra enunciada pelo artigo 4._, n._ 2, da directiva, segundo a qual é o Estado-Membro de acolhimento, e não o Estado-Membro de origem, que deve assegurar que exista, no seu território, um sistema de garantia a que uma sucursal possa aderir voluntariamente a fim de complementar a garantia de que os seus depositantes já beneficiam no Estado-Membro de origem. Embora o conceito de cobertura complementar permita sem dúvida uma melhor protecção dos consumidores, a escolha do Estado-Membro de acolhimento, em vez do Estado-Membro de origem, para assegurar a sua realização, não tem qualquer ligação com essa exigência.
45 Por outro lado, ao precisar que o nível da garantia é aplicável não a cada depósito, mas ao conjunto dos depósitos, junto da mesma instituição de crédito, independentemente do número de depósitos, o artigo 8._ enuncia uma modalidade restritiva de aplicação da garantia bancária.
46 Inversamente, cada uma das disposições da directiva favoráveis aos depositantes pode ser ligada ao objectivo inicial de harmonização para a realização do mercado interno. Os artigos citados pela recorrente (17) com o objectivo de demonstrar a existência de um objectivo principal de protecção estabelecem regras que qualquer diligência de harmonização com o objectivo de realização do mercado interno não pode, sob pena de ser incompleta, deixar passar em claro.
47 Assim, o artigo 3._ da directiva impõe a criação de pelo menos um sistema de garantia no território de cada Estado-Membro, o que é efectivamente o mínimo se se pretender fixar um nível mínimo harmonizado de garantia de depósitos no âmbito da realização do mercado bancário único.
48 O mesmo se passa em relação ao artigo 7._, que fixa um montante de cobertura mínimo, que, como já salientei, tinha sido adoptado a um nível voluntariamente intermédio (18).
49 Seguidamente, a obrigação de informação a cargo das instituições de crédito, prevista no artigo 9._, constitui uma obrigação geral mínima que a recorrente não demonstra que não tinha já sido prevista na legislação adoptada por certos Estados dotados de um sistema de garantia antes da adopção da directiva contestada (19), e cujo alargamento aos outros Estados-Membros releva, assim, da lógica anunciada de harmonização dos sistemas.
50 Por último, o artigo 10._ fixa o prazo, igual para os Estados-Membros, de reembolso dos créditos dos depositantes pelos sistemas de garantia. Ainda aqui, nada permite dizer que o período escolhido seja mais favorável aos depositantes do que o eventualmente fixado pelos Estados-Membros que asseguravam já a garantia dos depósitos. Além disso, o prazo poderia, de qualquer modo, ser mais curto ainda do que o que foi adoptado. Afigura-se, na realidade, que se tratava sobretudo de fixar um prazo único e igual para todos.
51 Aliás é natural que o objectivo de harmonização, que se manifesta, por um lado, como vimos, por uma limitação da garantia dada a certos depositantes, se traduza, de modo simétrico, por um aumento da protecção de outros depositantes, como é o caso quando a directiva prevê a criação obrigatória de um sistema de protecção onde não existia, ou fixa o montante mínimo da garantia. Este aumento do nível de protecção em certos Estados-Membros poderia ser considerado um princípio que justifica uma base jurídica própria se, colocado no contexto global da directiva e no âmbito mais amplo da Comunidade, não parecesse relevar, pelo contrário, de uma lógica geral de coordenação das legislações, apenas dando origem, além disso, à melhoria da situação de certos depositantes.
52 No entanto, mesmo pressupondo, como sustenta a República Federal da Alemanha, que os dois objectivos da directiva sejam equivalentes e tornem necessário o recurso a dois fundamentos jurídicos, as disposições do artigo 129._-A são então, na minha opinião, aplicáveis.
53 Como a recorrente e o Conselho, penso que o artigo 129._-A, n._ 1, alínea a), do Tratado não está adaptado. Com efeito, esse texto visa as medidas adoptadas pela Comunidade, em aplicação do artigo 100._-A, tendo em vista contribuir para a realização de um nível elevado de defesa dos consumidores no âmbito da realização do mercado interno. Ora, embora o artigo 100._-A e o artigo 57._, n._ 2, do Tratado tenham em comum a adopção de regras destinadas à realização do mercado interno, o primeiro fazendo referência ao artigo 7._-A do Tratado, no qual se encontra definido esse conceito, e sendo o segundo expressamente citado pelo artigo 7._-A, o artigo 100._-A só se aplica «salvo disposição em contrário do presente Tratado». Daqui resulta que o artigo 57._, n._ 2, cujo âmbito de aplicação, limitado à coordenação das regras relativas ao acesso às actividades não assalariadas e ao seu exercício, é mais reduzido, exclui a aplicação do artigo 100._-A e, em consequência, do artigo 129._-A, n._ 1, alínea a).
54 O artigo 129._-A, n._ 1, alínea b), em contrapartida, parece ser aplicável, nessa situação. Dispõe que «A Comunidade contribuirá para a realização de um nível elevado de defesa dos consumidores através de... acções específicas de apoio e complemento à política seguida pelos Estados-Membros em defesa da saúde, da segurança e dos interesses económicos dos consumidores e para lhes facultar uma informação adequada» (20).
55 A recorrente contesta a aplicabilidade deste texto. Considera que, ao autorizar apenas acções específicas, o artigo 129._-A, n._ 1, alínea b), só permite adoptar medidas que não relevem das categorias do artigo 189._, contrariamente às referidas pela alínea a). Na opinião da recorrente, tratava-se mais de planos e de programas de acções, exclusivos dos actos enumerados por esse texto (21).
56 Acrescenta que o artigo 129._-A, n._ 1, alínea b), pode unicamente reforçar e completar a política dos Estados-Membros. As condições dessas acções não estariam preenchidas no presente processo, uma vez que dois Estados-Membros ainda não teriam instituído o sistema de garantia de depósitos (22).
57 Ora, nada no texto deixa pressupor uma limitação do seu âmbito de aplicação. Pelo contrário, quando o legislador pretende circunscrever uma competência à realização de acções não obrigatórias, expressa-o claramente, como nos artigos 126._, 128._ e 129._ do Tratado, em que qualifica como «acções de incentivo» as medidas destinadas à realização dos objectivos ligados à educação, à cultura e à saúde pública. Do mesmo modo, tem o cuidado de afastar expressamente dos domínios tratados por estes textos qualquer projecto de harmonização (23), necessitando, em princípio, esses projectos do recurso a normas imperativas.
58 Por outro lado, o artigo 129._-A não indica, quando dispõe que as acções específicas «[apoiam e complementam a] política seguida pelos Estados-Membros em defesa... dos interesses económicos dos consumidores e para lhes facultar uma informação adequada», que essas acções estejam ligadas à política levada a cabo por cada Estado-Membro num dado domínio de intervenção.
59 Na falta de uma redacção do texto que deixe entrever o carácter restritivo que lhe dá a argumentação do Governo alemão, a alínea b) deve, pelo contrário, ser interpretada como designando as acções específicas de apoio e complemento à política seguida por todos os Estados-Membros no domínio geral da protecção dos interesses económicos dos consumidores.
60 Assim, é pouco importante que certos Estados-Membros não tenham criado um sistema de garantia de depósitos. Basta que tenha sido empreendida uma política global de defesa dos interesses dos consumidores, o que não é duvidoso.
61 Uma outra razão milita a favor da aplicação do artigo 129._-A, n._ 1, alínea b). Ao enunciar que «A Comunidade contribuirá para a realização de um nível elevado de defesa dos consumidores...», o texto do artigo 129._-A afirma o carácter complementar da competência atribuída à Comunidade pelo Tratado em matéria de protecção dos consumidores. O recurso ao n._ 1, alínea a), do artigo 129._-A não se justifica pelas razões já desenvolvidas (24). Em contrapartida, a aplicação do artigo 129._-A, n._ 1, alínea b), é confirmada pelo facto de, segundo o legislador comunitário, o objectivo de protecção dos consumidores prosseguido no domínio da garantia dos depósitos bancários ainda não ter sido alcançado. O quinto considerando da directiva dispõe com efeito: «... o seguimento dado pelos Estados-Membros à recomendação 87/63/CEE da Comissão, de 22 de Dezembro de 1986, relativa à instituição, na Comunidade, de sistemas de garantia de depósitos, não permitiu atingir completamente o resultado desejado» (25).
62 A economia geral dos objectivos fixados pelo Tratado e dos procedimentos que organiza para os atingir dão-nos também indicações úteis para a determinação da base jurídica. A identidade dos procedimentos prevista pelos artigos 57._, segundo parágrafo, 100._-A e 129._-A prova que os domínios tratados por estes textos (respectivamente, a regulamentação das actividades não assalariadas, a harmonização das regulamentações no âmbito do estabelecimento e do funcionamento do mercado interno e a contribuição da Comunidade para a realização de um nível elevado de protecção dos consumidores) são considerados, de um ponto de vista institucional, como da mesma importância e justificam um processo decisório idêntico, no qual deve intervir o Parlamento a título do seu poder de co-decisão.
63 Por conseguinte, seria difícil demonstrar que as disposições da directiva, embora relevando de um destes domínios, tenham uma natureza própria que justifica o recurso a um procedimento de adopção mais estrito.
64 Conclui-se que o artigo 129._-A, n._ 1, alínea b), permite a adopção de textos vinculativos e que, no caso de uma segunda base jurídica ser necessária para a regularidade da directiva contestada, este texto devia constituir o seu fundamento jurídico.
65 Sendo o procedimento do artigo 189._-B, utilizado para a adopção da directiva, também o imposto pelo artigo 129._-A, a omissão deste último texto constitui um vício puramente formal que não pode dar origem à nulidade do acto contestado (26). Na verdade, a consulta do Comité Económico e Social é obrigatória, nos termos do artigo 129._-A, ao passo que não é exigida pelo artigo 57._, n._ 2. No entanto, não é contestado que a consulta teve lugar (27), de modo que nenhuma irregularidade real é susceptível de justificar a anulação da Directiva 94/19.
66 Estas considerações conduzem-me a propor ao Tribunal de Justiça que afaste o artigo 235._ do Tratado, cuja aplicação apenas é admitida, devido ao seu carácter subsidiário, na falta de qualquer outro fundamento jurídico.
67 Por outro lado, não pode ser razoavelmente sustentado que a estabilidade do sistema bancário justifica o recurso ao artigo 235._ como base da directiva, porque esse objectivo escapa ao domínio do artigo 57._, n._ 2 (28), quando a coordenação das regulamentações nacionais em matéria de garantia de depósitos bancários é precisamente destinada a impedir qualquer transferência brutal e maciça de fundos de um Estado-Membro para outro, que seria a consequência de diferenças demasiado grandes de nível das garantias propostas.
68 Por conseguinte, o fundamento relativo à falta de base legal deve ser rejeitado.
B - A obrigação de fundamentação
69 A República Federal da Alemanha acrescenta que a Directiva 94/19 está insuficientemente fundamentada, visto o disposto no artigo 190._ do Tratado. O texto não refere que foi tomado em consideração o princípio da subsidiariedade, tal como está consagrado no artigo 3._-B, segundo parágrafo, do Tratado. Afirma que este princípio está sujeito à fiscalização jurisdicional do Tribunal de Justiça e que não foi demonstrado que as duas condições que permitem derrogar a competência dos Estados-Membros estavam preenchidas (29) (30).
70 Não me parece que as autoridades competentes não tenham tomado em consideração a obrigação de fundamentação, mesmo que, tendo em conta o carácter exclusivo da competência da Comunidade, o Conselho e o Parlamento não fossem, em minha opinião, obrigados a justificar a necessidade de aplicar o princípio da subsidiariedade.
71 Resulta de jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa ao artigo 190._ que, para cumprir a obrigação de fundamentação, «... é necessário que os actos comunitários contenham a exposição dos elementos de facto e de direito nos quais a instituição se fundou, de modo a que o Tribunal possa exercer o seu controlo e que tanto os Estados-Membros como os interessados conheçam as condições nas quais as instituições comunitárias aplicaram o Tratado» (31). Por outro lado, o Tribunal de Justiça já precisou que «a omissão da referência a uma disposição precisa do Tratado pode não constituir um vício substancial quando o fundamento jurídico de um acto puder ser determinado com base noutros elementos deste», mas «tal referência explícita é, no entanto, indispensável, quando, na falta dela, os interessados e o Tribunal são deixados na incerteza quanto ao fundamento jurídico preciso» (32).
72 Desde o primeiro considerando da directiva, o legislador salienta a necessidade de «... promover o desenvolvimento harmonioso da actividade das instituições de crédito em toda a Comunidade...», para, no segundo considerando, deduzir daí que «é indispensável assegurar um nível mínimo harmonizado de protecção dos depósitos, independentemente da sua localização no interior da Comunidade».
73 Refere, no quinto considerando, que o seguimento dado pelos Estados-Membros à recomendação de 1986 (33) «... não permitiu atingir completamente o resultado desejado» e que «... esta situação se pode vir a revelar prejudicial ao bom funcionamento do mercado único».
74 As autoridades comunitárias verificam, assim, a insuficiência das acções nacionais no domínio da garantia de depósitos, apesar da recomendação da Comissão, e insistem na necessidade de harmonizar os sistemas nacionais. Justificam, assim, o recurso a uma acção a nível comunitário mais vinculativa do que seria uma simples recomendação, com o objectivo de obviar à omissão dos Estados-Membros.
75 Embora suficiente em relação às disposições do artigo 190._, a descrição dos fundamentos pelos quais as autoridades comunitárias justificaram a sua intervenção em relação ao princípio da subsidiariedade assenta, no entanto, em minha opinião, numa apreciação inexacta da competência comunitária.
76 A Comissão defende a ideia segundo a qual a acção da Comunidade diria respeito a um domínio que exclui qualquer competência concorrencial dos Estados-Membros, o que conduziria a afastar a aplicação do princípio da subsidiariedade (34).
77 O Conselho e o Parlamento, ao afirmarem que o princípio da subsidiariedade é respeitado, parecem considerar que a competência é partilhada (35).
78 A recorrente, por seu turno, contesta também o carácter exclusivo da competência da Comunidade na realização do mercado interno (36).
79 Alega que, na matéria, enquanto a Comunidade não tiver exercido o seu poder de harmonização das legislações num determinado domínio, o Estado-Membro tem o direito de adoptar as medidas que julgar necessárias. A opinião contrária conduziria, em sua opinião, ao resultado inaceitável de os Estados-Membros não terem o direito de implementar, antes da harmonização, medidas destinadas a suprimir os obstáculos ao mercado interno, e de favorecerem eles próprios a integração europeia. Acrescenta que o reconhecimento, em benefício da Comunidade, de uma competência exclusiva em matéria de mercado interno, equivaleria a confiar-lhe essa competência em quase todos os domínios de actividade, uma vez que a medida em questão eliminaria obstáculos ao mercado interno (37).
80 É um facto que a realização do mercado interno não releva sempre da competência exclusiva da Comunidade. Os textos aplicáveis organizam, na matéria, procedimentos variados. No n._ 4 do artigo 100._-A, por exemplo, o legislador considera a possibilidade de os Estados-Membros, em determinadas condições, «aplicar[em] disposições nacionais» depois da adopção de medidas de harmonização.
81 O Tratado também não exclui sistematicamente a competência dos Estados-Membros no domínio, mais geral, da harmonização, como demonstra o artigo 118._-A, relativo à harmonização das condições existentes no domínio da melhoria da segurança e da saúde dos trabalhadores no ambiente do trabalho (38). No caso em apreço, o essencial do trabalho de harmonização cabe aos Estados-Membros.
82 Mas, vê-se, nessas situações, a divisão das competências é claramente enunciada. Ao contrário, o artigo 57._ em nenhum momento faz alusão à competência dos Estados-Membros. Confia apenas à Comunidade o cuidado de proceder à coordenação das normas nacionais nesse domínio, o que demonstra, desde a origem, que os autores do Tratado consideraram que a coordenação em matéria de acesso às actividades não assalariadas e do seu exercício era melhor alcançada através de uma acção comunitária do que através de uma acção ao nível nacional.
83 De resto, é lógico que a harmonização das legislações seja realizada através de uma norma comum aos diferentes Estados. Como o Tribunal de Justiça já declarou num acórdão recente (39), esse objectivo pressupõe necessariamente «uma acção de envergadura comunitária».
84 Por outro lado, há que recordar que, no vertente processo, a competência exclusiva da Comunidade, tal como está prevista pelo artigo 57._, n._ 2, diz principalmente respeito coordenação das legislações no domínio das actividades não assalariadas e ao seu exercício. Não abrange a totalidade da competência dos Estados-Membros nessa própria matéria.
85 Quando a competência exclusiva da Comunidade é, como no caso em apreço, limitada à harmonização das legislações, ela não priva nessa medida os Estados-Membros do seu poder de adoptar novas regras no domínio considerado. Na verdade, a harmonização conduz necessariamente à alteração de uma parte das regras de fundo em vigor em determinados Estados-Membros. Estes não deixam de ter uma liberdade total enquanto as autoridades comunitárias não intervierem para proceder à aproximação das legislações nacionais. Também nada os impede de adoptar normas, tendo em conta, desde a sua adopção, as adoptadas pelos outros Estados-Membros. Além disso, uma vez realizada a harmonização comunitária, os Estados-Membros podem ainda intervir desde que não sejam prejudicadas as normas harmonizadas, sendo a margem de intervenção que lhes é assim consentida função do grau de harmonização escolhido.
86 Conclui-se do que acima foi dito que a Comunidade, no domínio da directiva, não age no âmbito de uma competência subsidiária, mas efectivamente nos termos de atribuições exclusivas, de modo que as autoridades comunitárias não eram obrigadas a justificar que as condições impostas pelo artigo 3._-B, segundo parágrafo, estavam preenchidas.
87 Num plano mais geral, parece-me útil referir ao Tribunal de Justiça o interesse que pode haver, em minha opinião, no objectivo de uma justa aplicação do princípio da subsidiariedade, em fazer uma aplicação particularmente exigente da obrigação de fundamentação prevista pelo artigo 190._ do Tratado, sempre que o legislador comunitário intervenha para adoptar novas normas.
88 O princípio da subsidiariedade é consagrado pelo Tratado da União Europeia como um princípio geral do direito comunitário, em conformidade com as posições adoptadas aquando do Conselho Europeu de Edimburgo (40). Na declaração interinstitucional sobre a democracia, a transparência e a subsidiariedade, as autoridades comunitárias concluíram pela necessidade de cada uma delas justificar o cumprimento desse princípio (41).
89 Deste modo, não parece excessivo, tendo em conta a importância do princípio da subsidiariedade na repartição das competências entre os Estados-Membros e a Comunidade, e dada a necessidade de o Tribunal de Justiça exercer a sua fiscalização sobre as condições em que as instituições comunitárias fizeram aplicação do Tratado, esperar dessas instituições que futuramente fundamentem sistematicamente as suas decisões em relação ao princípio da subsidiariedade.
90 Cada um dos actos adoptados pela Comunidade deverá, assim, comportar, tácita ou expressamente, mas de modo claro, uma justificação sobre o fundamento da intervenção da autoridade competente, mesmo que apenas se trate de dizer, eventualmente, que não há que aplicar a subsidiariedade.
V - O pedido subsidiário
91 A República Federal da Alemanha pede, a título subsidiário, no caso de ser negado provimento ao seu pedido principal de anulação da directiva na sua globalidade, a anulação dos artigos 4._, n._ 1, segundo parágrafo (proibição de «exportação»), 4._, n._ 2 (complemento de garantia), e 3._, n._ 1, segundo período (adesão obrigatória).
A - Quanto à proibição de ultrapassagem da cobertura proposta pelo sistema de garantia do Estado-Membro de acolhimento, denominada proibição de «exportação»
92 O artigo 4._, n._ 1, da directiva prevê que os sistemas de garantia dos depósitos cobrirão os depositantes das sucursais criadas pelas instituições de crédito noutros Estados-Membros e que, até 31 de Dezembro de 1999, o nível e o âmbito da cobertura prevista não poderão exceder o nível e o âmbito máximo de cobertura oferecida pelo sistema de garantia correspondente no território do Estado-Membro de acolhimento.
93 O Governo alemão considera que as razões que levaram o Conselho e o Parlamento a impor essa proibição não estão claramente expressas e que, por conseguinte, essa disposição viola o artigo 190._ do Tratado (42).
94 Tendo em conta os princípios enunciados pelo Tribunal de Justiça (43), este argumento parece que não pode ser acolhido. O estudo do conteúdo dos considerandos da directiva revela claramente, em minha opinião, as razões pelas quais foi decidido proibir a exportação das garantias mais alargadas.
95 Assim, o décimo quarto considerando da directiva refere-se aos riscos que poderiam decorrer, em termos de estabilidade do mercado, de uma confrontação imediata dos sistemas de garantia, e precisa que o nível e o âmbito da cobertura não devem transformar-se num instrumento de concorrência.
96 Os considerandos da directiva deviam precisar melhor o que se deve entender por esses termos? Não penso assim: independentemente da opinião que se dê quanto à pertinência dos fundamentos de adopção da disposição contestada, o seu sentido exacto não se presta a confusão.
97 Do mesmo modo, resulta claramente do conteúdo da directiva que, ao descrever a proibição de exportação como destinada a evitar a perturbação do mercado devida à prática de níveis de cobertura superiores aos oferecidos no Estado-Membro de acolhimento, o legislador pretendeu evitar que os depositantes dos bancos desse Estado, avisados da nova possibilidade, oferecida por uma instituição de crédito proveniente de outro Estado-Membro, de beneficiarem de uma garantia mais alargada dos seus depósitos, não os transferissem repentina e simultaneamente em detrimento do sistema bancário nacional, correndo-se o risco de o desestabilizar e privando-o de uma parte substancial da sua clientela.
98 É também perfeitamente compreensível, à luz do texto contestado, que o fundamento da proibição tem a sua origem no cuidado de limitar, pelo menos provisoriamente, a concorrência pelos sistemas de garantia.
99 Vistas estas disposições suficientemente claras, e que revelam o objectivo prosseguido pelas autoridades comunitárias, qualquer exigência de precisão suplementar é excessiva.
100 A recorrente, por outro lado, censura a directiva por tornar mais difícil, mesmo impossível, a liberdade de estabelecimento, em contradição com o objectivo prosseguido pelo artigo 57._, n._ 2, de facilitar o acesso às actividades não assalariadas e o seu exercício (44).
101 É um facto que a República Federal da Alemanha, cujo sistema de garantia de depósitos parece ser particularmente protector dos depositantes, deverá, nos termos da directiva, privar-se de uma das vantagens concorrenciais de que dispõe no desenvolvimento da actividade das suas instituições bancárias no exterior do seu território. Mas a realização de um objectivo definido pelo Tratado não pode medir-se à escala de um único Estado-Membro, sobretudo quando corresponde a uma diligência de harmonização que, numa lógica de aproximação das legislações, deve poder beneficiar de concessões por parte dos Estados-Membros, desde que estas não sejam exageradas e que, no final, o objectivo definido pelos textos possa ser atingido à escala comunitária.
102 Ora, é necessário recordar que, no caso em apreço, a proibição do artigo 4._, n._ 1, segundo parágrafo, da directiva é feita durante um período de cinco anos e, portanto, provisoriamente. Esta disposição não priva de modo definitivo as instituições de crédito de certos Estados-Membros de um meio de se desenvolverem no território comunitário.
103 Pelo contrário, é justificada pela preocupação legítima de evitar uma harmonização demasiado rápida, susceptível de fragilizar os sistemas nacionais, que, devido à sua recente criação, não teriam tido tempo de assegurar uma redução significativa das diferenças de garantia. Na verdade, a República Federal da Alemanha não é o único Estado-Membro a dever submeter-se à proibição «de exportação». Mas os sistemas susceptíveis de dela beneficiar são, actualmente, mais numerosos, o que justifica, em meu entender, a oportunidade da medida criticada.
104 Mais, o alcance real desta proibição, limitada no tempo e circunscrita apenas às instituições de crédito estabelecidas no território de um Estado-Membro cujos bancos beneficiam de uma garantia menor, deve ser apreciada em relação à economia geral da directiva contestada. Esta terá, com efeito, nomeadamente, por consequência instituir um sistema de garantia nos dois Estados-Membros, aumentar, segundo o próprio Governo alemão (45), a garantia em cinco deles ao nível de harmonização mínimo (20 000 ecus) fixado pela directiva, e favorecer a instalação de sucursais em qualquer Estado-Membro, sem que sejam obrigadas a passar pelo sistema do Estado-Membro de acolhimento.
105 Por último, não se pode sustentar que este objectivo seja comprometido pela exigência, denunciada pela recorrente, de um cálculo de taxas de cotização diferenciadas, que não está demonstrado poder dar origem a dificuldades intransponíveis.
106 Perante estes elementos, que não têm porém qualquer carácter exaustivo quanto ao texto contestado, a restrição do artigo 4._ não nos permite considerar que a directiva seja susceptível de limitar o acesso às actividades não assalariadas e o seu exercício.
107 O Governo alemão acrescenta que «a proibição de exportação» não é compatível com o objectivo de um nível elevado de protecção dos consumidores fixado pelos artigos 3._, alínea s), e 129._-A do Tratado (46).
108 Não sou dessa opinião, porque penso, pelas razões já expostas (47), que a directiva não prossegue esse objectivo a título principal, de modo que não pode estar sujeita a ele. Se não é contestável que, nos termos do artigo 3._, alínea s), «... a acção da Comunidade implica... uma contribuição para o reforço da defesa dos consumidores», esta acção deve ser realizada «nas condições» previstas pelo Tratado. Essas condições estão enunciadas no artigo 129._-A, único artigo do título XI, intitulado «Defesa dos consumidores», que, recordo, não me parece que deva constituir a base jurídica da directiva.
109 Quanto à hipótese em que o objectivo de protecção dos consumidores constituiria um objectivo do mesmo nível que o que é fixado pelo artigo 57._, n._ 2, do Tratado, a análise da directiva demonstra que as novas regras de harmonização legitimam e equilibram, através da melhoria durável do nível geral dos sistemas de garantia (48), a proibição «de exportação», que, há que recordar, é provisória.
110 A República Federal da Alemanha sustenta, além disso, que a proibição de «exportação» é contrária ao princípio da proporcionalidade, porque, embora esta proibição seja adequada para impedir distorções de concorrência, não é, em contrapartida, nem indispensável nem razoável (49).
111 Em primeiro lugar, há que recordar que, segundo a jurisprudência constante do Tribunal, para determinar que uma disposição de direito comunitário está em conformidade com o princípio da proporcionalidade, é necessário verificar se os meios que utiliza são adequados para realizar o objectivo visado e se não ultrapassam aquilo que é necessário para o atingir. Quando, com efeito, existe uma escolha entre várias medidas apropriadas, há que recorrer à menos coerciva e os ónus impostos não devem ser exagerados relativamente aos objectivos prosseguidos (50).
112 Ninguém contesta a aptidão da medida de proibição para obviar às perturbações do mercado. Em contrapartida, a recorrente sustenta que o objectivo prosseguido poderia ser alcançado através de uma medida menos agressiva, consistente numa cláusula de protecção que autorizaria a autoridade competente a apenas intervir em caso de crise (51).
113 Ao adoptar a directiva contra o parecer do Governo alemão e fazendo a escolha de um dispositivo de proibição preventiva, o Conselho, tal como o Parlamento, considerou que a eficácia deste dispositivo podia tornar legítimas as obrigações criadas pela medida contestada.
114 Pelo contrário, ao defender a ideia de que um sistema de protecção pontual desencadeado em caso de iminência de uma perturbação do mercado poderia, com a mesma eficácia, impedir os riscos, a recorrente pretende demonstrar que o objectivo prosseguido poderia ser atingido sem recorrer a exigências tais como a da proibição de «exportação».
115 Assim, o Tribunal de Justiça é levado a apreciar os respectivos méritos e os inconvenientes do sistema criticado e do proposto pela República Federal da Alemanha, o que pressupõe que o Tribunal de Justiça tem que proceder a uma avaliação de uma situação económica complexa.
116 Ora, nessa situação, mesmo que não seja de excluir que eram possíveis outros meios para chegar ao resultado desejado, o Tribunal de Justiça não pode substituir pela sua apreciação a apreciação do legislador comunitário sobre a natureza mais ou menos adequada das medidas por ele escolhidas. A não ser que a recorrente prove um erro manifesto de apreciação ou um desvio de poder, ou demonstre que o legislador ultrapassou manifestamente os limites do seu poder de apreciação (52).
117 Do mesmo modo, quando, para adoptar uma regulamentação, o legislador comunitário é levado a apreciar os efeitos futuros dessa regulamentação, e quando esses efeitos não podem ser previstos com exactidão, a sua apreciação só pode ser censurada se for manifestamente errada perante os elementos de que ele dispunha no momento da adopção da regulamentação (53).
118 No caso em apreço, os efeitos da regulamentação contestada assentam em hipóteses e implicam, deste modo, uma grande parte de incerteza. Uma abordagem comparada dos dois sistemas pressuporia, nomeadamente, uma análise precisa dos riscos de perturbação real do mercado, devidos a diferenças de nível de protecção, à capacidade das autoridades competentes para detectar num prazo suficiente os sinais precursores de um início de crise e à sua aptidão para interromper atempadamente os movimentos indesejáveis de capitais.
119 O Governo alemão salienta os inconvenientes atribuídos à solução escolhida pela directiva, mas não demonstra que a cláusula de protecção seja susceptível de assegurar uma garantia superior ou mesmo comparável. Limita-se a invocar que, pressupondo real o risco de transferência dos depósitos de bancos de um Estado-Membro para sucursais de bancos estrangeiros que oferecem uma protecção superior, haverá tempo suficiente para tomar medidas de protecção que permitam obviar a qualquer levantamento susceptível de pôr em perigo a existência dos bancos locais. Esta hipótese não é de modo algum demonstrada.
120 Os artigos do Tratado que dão aos Estados a possibilidade de recorrer a medidas de protecção noutras circunstâncias não permitem concluir pela existência de uma teoria das medidas de protecção em direito comunitário que privilegiaria de modo sistemático o recurso a esse tipo de disposições em caso de risco de perturbações em certos mercados. Nos termos do seu poder de apreciação, as autoridades comunitárias podiam, assim, decidir que, tendo em conta as características do mercado em causa e o carácter incerto da situação a obviar, havia necessidade de um dispositivo mais eficaz e mais sistemático.
121 Por outro lado, a recorrente não demonstra que os textos que cita pela razão de preverem medidas de protecção sejam directamente transponíveis para o domínio da directiva. O seu objecto, efectivamente, ou é diferente [o artigo 226._ do Tratado, relativo à alteração grave de uma situação económica regional, e o Regulamento (CEE) n._ 3916/90 do Conselho, de 21 de Dezembro de 1990, relativo a medidas a tomar em caso de crise no mercado dos transportes rodoviários de mercadorias (54)] ou ultrapassa o simples risco de movimentos de capitais no interior de um Estado-Membro (o artigo 73._ do Tratado e a Directiva 88/361/CEE do Conselho, de 24 de Junho de 1988, para a execução do artigo 67._ do Tratado (55)).
122 De resto, esses textos não implicam o compromisso através do qual as autoridades comunitárias seriam, de futuro, obrigadas a recorrer a uma regulamentação de protecção a posteriori sempre que perturbações ameaçassem o mercado. Aplicam-se apenas aos casos que enunciam e não podem, de modo algum, vincular o legislador comunitário.
123 Por estes fundamentos, o pedido de anulação das disposições do artigo 4._, n._ 1, segundo parágrafo, da directiva parece-me dever ser rejeitado.
B - Quanto à obrigação de aceitar as sucursais no sistema de garantia de depósitos do Estado-Membro de acolhimento
124 O artigo 4._, n._ 2, da Directiva 94/19 prevê que:
«Sempre que o nível ou o âmbito, incluindo a percentagem, da cobertura oferecida pelo sistema de garantia do Estado-Membro de acolhimento exceder o nível ou o âmbito da cobertura fornecida no Estado-Membro em que a instituição de crédito está autorizada, o Estado-Membro de acolhimento deve assegurar que exista, no seu território, um sistema de garantia de depósitos oficialmente reconhecido a que a sucursal possa aderir voluntariamente a fim de complementar a garantia de que os seus depositantes já beneficiam devido ao facto de ser membro do sistema do Estado-Membro de origem.
O sistema a que a sucursal venha a aderir deve cobrir a categoria de instituições a que pertence ou aquela que melhor lhe corresponda no Estado-Membro de acolhimento.»
125 O Governo alemão sustenta que a obrigação assim imposta a um Estado-Membro, de acolher as sucursais que desejem complementar a garantia do seu Estado de origem, é contrária ao princípio do controlo do Estado de origem e viola o princípio da proporcionalidade (56).
126 Não é contestado por nenhuma das partes que o princípio do controlo do Estado de origem constitui o princípio director que presidiu ao trabalho de harmonização no domínio dos serviços financeiros.
127 No entanto, não está demonstrado que as autoridades comunitárias, nos diferentes textos de harmonização do direito bancário, tenham adoptado esse princípio com a intenção de lhe subordinar de futuro, e de modo sistemático, os actos abrangidos por esse domínio.
128 De resto, nessa situação, só estariam vinculadas devido à necessidade de respeitar o princípio da confiança legítima em relação aos administrados que têm o direito de esperar a aplicação do princípio em causa, que não é a situação do caso em apreço.
129 Assim, as autoridades comunitárias têm o direito de se afastar do princípio do Estado de origem.
130 Não deixa de ser verdade que a directiva está principalmente baseada nessa regra, como demonstra o seu sétimo considerando, nos termos do qual é recordado que a autorização de sucursais foi suprimida pelos Estados-Membros de acolhimento, que o controlo da sua solvabilidade é assegurado pelas autoridades competentes do Estado-Membro de origem e que o sistema de garantia «... apenas pode ser aquele que existe, para essa categoria de instituições, no Estado da sede social, em virtude, nomeadamente, da ligação existente entre a supervisão da solvabilidade de uma sucursal e a sua participação num sistema de garantia de depósitos».
131 Assim, ela sublinha que as instituições de crédito ficam efectivamente sujeitas ao princípio do Estado de origem, de modo que a derrogação contestada parece estar limitada ao caso específico em que o Estado-Membro de acolhimento propõe a uma sucursal uma garantia superior à do Estado-Membro de origem.
132 A recorrente contesta, por outro lado, a necessidade da cobertura complementar tal como é organizada pela directiva, que, embora susceptível de atingir o objectivo que ela fixou, prejudicaria os direitos dos sistemas de garantia de depósitos do Estado-Membro de acolhimento e poderia ser substituída por medidas menos coercivas, em conformidade com o princípio da proporcionalidade.
133 Não estou de acordo com esta apreciação. Em primeiro lugar, há que relativizar o peso do ónus que incide sobre o sistema de garantia do Estado-Membro de acolhimento. Trata-se principalmente de uma garantia complementar limitada, até 31 de Dezembro de 1999, à parte que exceda 15 000 ecus para os Estados em que, no momento da adopção da directiva, os depósitos não estiverem cobertos até 20 000 ecus, e à parte que exceda este último montante para os outros.
134 Há que observar que outros Estados-Membros já ultrapassaram o montante mínimo fixado pela directiva, o que reduz nesta medida o esforço exigido aos sistemas de garantia mais eficazes. Outros Estados ainda desejarão de futuro aumentar o nível da garantia, em conformidade com o objectivo de harmonização prosseguido pela directiva.
135 Em segundo lugar, se uma sucursal considerar que a diferença de garantia não atinge um grau que justifique uma adesão complementar, ou que, independentemente do seu nível, a garantia não é determinante para a conquista do mercado do Estado-Membro de acolhimento, tem o direito de não aderir ao sistema de cobertura complementar.
136 Por outro lado, como salienta o Parlamento, a adesão voluntária ao sistema de garantia complementar está necessariamente sujeita às condições fixadas pelo sistema do Estado de acolhimento, as quais constituem a contrapartida da prestação que ele deverá assegurar em caso de dificuldades (57).
137 É o que resulta:
- do artigo 4._, n._ 3, da directiva, que dispõe: «A admissão deve ficar subordinada ao cumprimento das obrigações inerentes à qualidade de membro, incluindo, em especial, o pagamento de quaisquer contribuições ou outros encargos»;
- da alínea a) do anexo II da directiva, nos termos da qual «O sistema do Estado-Membro do acolhimento conservará todos os direitos para impor as suas regras objectivas e genericamente aplicáveis às instituições de crédito participantes»;
- da alínea d) do anexo II, que prevê que «O sistema do Estado-Membro de acolhimento terá o direito de reclamar das sucursais o pagamento de uma quota-parte dos encargos emergentes da cobertura complementar, numa base adequada que tenha em conta a garantia financiada pelo sistema do Estado-Membro de origem.»
138 Uma vez que os direitos pagos pela instituição de crédito são fixados segundo critérios objectivos que têm em conta o risco que representa a sucursal - devendo este, com toda a lógica, ser função da diferença de garantia ou da ausência total de garantia oferecida pelo sistema do Estado-Membro de origem -, a obrigação de cobertura complementar a cargo de certos Estados-Membros de acolhimento não parece fazer incidir sobre o seu sistema de garantia um ónus excessivo.
139 Os princípios definidos pelo artigo 5._ do Tratado, pela Primeira Directiva 77/780/CEE do Conselho, de 12 de Dezembro de 1977, relativa à coordenação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas respeitantes ao acesso à actividade dos estabelecimentos de crédito e ao seu exercício (58), e pelo anexo II da directiva permitem, além disso, responder ao fundamento segundo o qual o sistema de garantia de depósitos do Estado-Membro de acolhimento não tem a possibilidade de controlar suficientemente a solvabilidade ou de prever as dificuldades de pagamento de uma sucursal.
140 Nos termos do artigo 5._, primeiro parágrafo, do Tratado, os Estados-Membros tomarão todas as medidas gerais ou especiais capazes de assegurar o cumprimento das obrigações resultantes de actos das instituições da Comunidade. O Tribunal de Justiça já decidiu que, nos termos deste texto, os Estados-Membros e as suas instituições são obrigados entre eles a «cooperar lealmente» e que, para facilitar a aplicação de uma disposição de direito comunitário, um Estado-Membro deve «... assistir... qualquer outro Estado-Membro a que incumba uma obrigação por força do direito comunitário» (59).
141 O artigo 7._, n._ 1, da Directiva 77/780, alterado pela Segunda Directiva 89/646/CEE do Conselho, de 15 de Dezembro de 1989 (60), dispõe:
«As autoridades competentes dos Estados-Membros em causa colaborarão estreitamente a fim de fiscalizar a actividade dos estabelecimentos de crédito que actuem, nomeadamente por neles terem criado sucursais, num ou em vários Estados-Membros que não sejam o da sua sede social. Essas autoridades comunicarão entre si todas as informações relativas à direcção, à gestão e à propriedade desses estabelecimentos de crédito, susceptíveis de facilitar a sua fiscalização e o exame das condições da sua autorização, bem como todas as informações susceptíveis de facilitar a supervisão de tais instituições, especialmente em matéria de liquidez, de solvabilidade, de garantia dos depósitos, de limitação dos grandes riscos, de organização administrativa e contabilística e de controlo interno.»
142 A alínea a) do anexo II da Directiva 94/19 prevê que «O sistema do Estado-Membro de acolhimento... poderá exigir a prestação de informações pertinentes e terá o direito de verificar essas informações junto das autoridades competentes do Estado-Membro de origem.»
143 O direito de acesso a uma informação completa sobre a instituição de crédito, incluindo a sociedade-mãe, doutro Estado-Membro é, assim, reconhecido às autoridades competentes do Estado-Membro de acolhimento.
144 A efectividade dessa regra em relação à instituição de crédito é assegurada pelo artigo 4._, n._ 4, da directiva, que permite ao sistema de garantia, com a autorização das autoridades competentes para dar a autorização, excluir a sucursal que não cumpriu as suas obrigações na qualidade de membro do sistema de garantia de depósitos.
145 Do mesmo modo, o artigo 4._, n._ 4, obriga as autoridades competentes para emitir a autorização a tomar todas as medidas necessárias para assegurar o cumprimento das referidas obrigações.
146 Assim, o Estado-Membro de origem tem uma obrigação de colaboração que deve permitir ao sistema do Estado-Membro de acolhimento beneficiar das informações necessárias ao exercício da sua missão em relação às sucursais estrangeiras aderentes.
147 Conclui-se que as exigências invocadas pelo Governo alemão não se afiguram exageradas em relação ao objectivo prosseguido e que, deste modo, não pode ser assinalada nenhuma violação do princípio da proporcionalidade.
C - Quanto à obrigação de adesão
148 Nos termos do artigo 3._, n._ 1, da directiva, cada Estado-Membro tomará as medidas para que sejam instituídos e oficialmente reconhecidos, no seu território, um ou mais sistemas de garantia de depósitos. Além disso, salvo excepção, nenhuma instituição de crédito autorizada num Estado-Membro poderá aceitar depósitos se não for membro de um desses sistemas.
149 A República Federal da Alemanha considera que essa obrigação de adesão é contrária ao artigo 3._-B, terceiro parágrafo, do Tratado CE e ao princípio da proporcionalidade (61).
150 Alega que a solução escolhida da adesão forçada ao sistema de garantia é contrária ao sistema nacional alemão, que constitui uma «prática nacional estabelecida» na acepção em que o entende o texto do Conselho Europeu de Edimburgo (62), e não é uma «solução diferente» dada aos Estados-Membros, na acepção das mesmas disposições. A instituição de um sistema de garantia em todos os Estados-Membros, ou a harmonização dos já preexistentes, seria suficiente, e a recorrente considera que a adesão obrigatória não é necessária.
151 Por último, o Governo alemão acrescenta que, para que os aforradores sejam protegidos, é suficiente, por um lado, que os seus depósitos sejam seguros até ao limite de uma determinada cobertura mínima, por outro lado, que a lei torne obrigatória a informação dos clientes, antes da abertura de uma conta, da adesão ou não da instituição de crédito a um sistema de garantia, seguidamente, que o banco tenha a obrigação de enviar às autoridades nacionais de tutela os relatórios de verificação elaborados pelo sistema de garantia e, por último, que as autoridades nacionais tenham a possibilidade de proibir que uma instituição de crédito que esteja ameaçada de falência aceite depósitos se não for membro de um sistema de garantia.
152 O texto, acima referido, extracto do Conselho Europeu de Edimburgo expressa a vontade do Conselho de respeitar «as práticas estabelecidas no plano nacional» e permitir aos Estados-Membros recorrer a «soluções diferentes para realizar os objectivos da medida».
153 Todavia, o objectivo do respeito das práticas nacionais é assegurado, segundo o texto, «sem prejuízo da legislação comunitária», e o recurso a «soluções diferentes» depende do carácter adequado das situações em causa. Estas atenuantes traduzem claramente o cuidado do Conselho de não subordinar sistematicamente a legislação comunitária ao respeito das tradições nacionais.
154 No caso em apreço, a adopção da directiva, e a não contestação por parte dos Estados-Membros, com excepção da República Federal da Alemanha, demonstra que a questão do respeito das práticas nacionais estabelecidas só subsiste em relação ao sistema de garantia desse Estado.
155 Ora, o Governo alemão refere que, no mês de Outubro de 1993, em trezentas instituições detentoras de uma autorização para aceitar depósitos e com sede na Alemanha, apenas cinco não eram membros de um sistema de garantia, e que a taxa dos depósitos não cobertos em relação aos depósitos cobertos era pouco mais de um por mil (63).
156 Daqui resulta que a obrigação de adesão instituída pela directiva, e aceite por outros Estados-Membros, não parece constituir para esse Estado uma obrigação efectiva susceptível de perturbar o funcionamento das instituições de crédito instaladas no seu território.
157 Inversamente, a escolha permitida aos Estados-Membros de optarem pelo princípio da liberdade de adesão a um sistema de garantia criaria o risco, dificilmente mensurável, de uma parte importante dos depósitos não ser coberta por qualquer garantia. Na falta de uma harmonização suficiente, os mercados nacionais não dariam toda a segurança que a clientela dos bancos tem o direito de esperar.
158 A obrigação de informação dos clientes sobre a adesão ou não adesão de uma instituição de crédito a um sistema de garantia não me parece poder orientar de modo decisivo os futuros depositantes na escolha do seu banco.
159 Numerosos critérios mais determinantes são dados efectivamente aos futuros clientes aquando da opção por uma instituição de crédito, nomeadamente quando estão na fase da sua escolha em que, aceitando já a ideia de confiar o seu dinheiro a determinado banco, a sua insolvabilidade futura é frequentemente uma preocupação longínqua, e a necessidade de uma adesão a um sistema de garantia uma precaução supérflua.
160 Por último, há que acrescentar que o artigo 3._, n._ 1, da directiva não institui um sistema de obrigação absoluta. Dá aos Estados-Membros a liberdade de criar e de reconhecer no seu território vários sistemas de garantia de depósitos e, assim, permitir às instituições de crédito escolher aquele que melhor lhes convém. Além disso, a directiva dá a possibilidade aos Estados-Membros de dispensar de adesão, sob determinadas condições, as instituições de crédito que pertençam a um sistema que proteja a própria instituição e nomeadamente a sua liquidez e a sua solvabilidade, assegurando, deste modo, aos depositantes, uma protecção pelo menos equivalente à que oferece um sistema de garantia de depósitos (64).
161 Deste modo, não se deve dar provimento ao pedido de anulação do segundo período do primeiro parágrafo do n._ 1 do artigo 3._ da directiva.
162 Em conclusão de tudo o que acima se disse, não penso que o recurso interposto pela República Federal da Alemanha seja fundamentado. Parece-me, pelo contrário, que a directiva contestada prossegue a acção de harmonização do direito bancário ao procurar alcançar um nível elevado de aproximação das legislações dos Estados-Membros, dando um prazo adequado aos Estados-Membros que não dispõem ainda de sistema de garantia de depósitos ou cujo sistema de garantia de depósitos não ofereça ainda um nível de protecção suficiente, sempre no cumprimento das regras comunitárias.
Conclusão
163 Por conseguinte, proponho ao Tribunal de Justiça que:
- negue provimento ao recurso;
- condene o Estado recorrente nas despesas.
(1) - JO L 135, p. 5.
(2) - Recomendação de 22 de Dezembro de 1986, relativa à instituição, na Comunidade, de sistemas de garantia de depósitos (JO 1987, L 33, p. 16).
(3) - JO C 163, p. 6.
(4) - JO C 115, p. 91.
(5) - JO C 178, p. 14.
(6) - JO C 91, p. 85.
(7) - O sublinhado é meu.
(8) - O sublinhado é meu.
(9) - O sublinhado é meu.
(10) - O sublinhado é meu.
(11) - Pp. 6 a 16 da tradução francesa da petição inicial.
(12) - V., por exemplo, os acórdãos de 26 de Março de 1987, Comissão/Conselho (45/86, Colect., p. 1493, n._ 11), e de 11 de Junho de 1991, Comissão/Conselho (C-300/89, Colect., p. I-2867, n._ 10).
(13) - V. o acórdão de 11 de Junho de 1991, Comissão/Conselho (já referido, n._ 13).
(14) - Ibidem, n._ 17.
(15) - V. os acórdãos de 4 de Outubro de 1991, Parlamento/Conselho (C-70/88, Colect., p. I-4529, n._ 17), e de 28 de Junho de 1994, Parlamento/Conselho (C-187/93, Colect., p. I-2857, n._ 25).
(16) - Primeiro considerando.
(17) - Pp. 9 e 10 da tradução francesa da petição inicial.
(18) - V. n._ 42 das presentes conclusões.
(19) - Uma obrigação de informação comparável parece, aliás, existir na Alemanha, segundo a recorrente: v. p. 53, segundo parágrafo, da tradução francesa da petição inicial.
(20) - O sublinhado é meu.
(21) - Pp. 12 a 14 da tradução francesa da petição inicial.
(22) - Pp. 11 e 12 da tradução francesa da réplica.
(23) - Cada um dos textos acima referidos contém a seguinte frase: «... o Conselho adopta... acções de incentivo, com exclusão de qualquer harmonização das disposições legislativas e regulamentares dos Estados-Membros».
(24) - V. o n._ 53 das presentes conclusões.
(25) - Recomendação 87/63, já referida.
(26) - V. o acórdão de 27 de Setembro de 1988, Comissão/Conselho (165/87, Colect., p. 5545, n._ 19).
(27) - Parecer do Comité Económico e Social sobre a proposta de directiva do Conselho relativa aos sistemas de garantia de depósitos de 22 de Outubro de 1992 (JO C 332, p. 13).
(28) - P. 13 da tradução francesa da réplica.
(29) - Nos termos do artigo 3._-B, segundo parágrafo, nos domínios que não sejam das suas atribuições exclusivas, a Comunidade intervém apenas, de acordo com o princípio da subsidiariedade, se e na medida em que os objectivos da acção encarada não possam ser suficientemente realizados pelos Estados-Membros, e possam pois, devido à dimensão ou aos efeitos da acção prevista, ser melhor alcançados ao nível comunitário.
(30) - Pp. 16 a 19 da tradução francesa da petição inicial.
(31) - V., nomeadamente, os acórdãos de 7 de Julho de 1981, Rewe (158/80, Recueil, p. 1805), e de 26 de Março de 1987, Comissão/Conselho (já referido, n._ 5).
(32) - V. o acórdão de 26 de Março de 1987, Comissão/Conselho (já referido, n._ 9).
(33) - Recomendação 87/63, já referida.
(34) - P. 4 da tradução francesa do articulado de intervenção.
(35) - N._ 27 da contestação do Conselho, n.os 24 e segs. da contestação do Parlamento.
(36) - P. 19, segundo parágrafo, da tradução francesa da petição inicial e n._ 4, pp. 16 e segs., da tradução francesa da réplica.
(37) - Pp. 6 e segs. da tradução francesa das observações da recorrente sobre o articulado de intervenção da Comissão.
(38) - O artigo 118._-A do Tratado prevê que «Os Estados-Membros... estabelecem como objectivo a harmonização, no progresso, das condições existentes neste domínio [da segurança e da saúde dos trabalhadores]».
(39) - Acórdão de 12 de Novembro de 1996, Reino Unido/Conselho (C-84/94, Colect., p. I-5755, n._ 47).
(40) - Boletim das Comunidades Europeias, n._ 12, 1992, anexo 1 da parte A, ponto I.15, p. 14.
(41) - «Acordo interinstitucional entre o Parlamento Europeu, o Conselho e a Comissão sobre os procedimentos para a aplicação do princípio da subsidiariedade», Boletim das Comunidades Europeias, n._ 10, 1993, ponto 2.2.2, p. 129.
(42) - Pp. 21 e 22 da tradução francesa da petição inicial.
(43) - V. n._ 71 das presentes conclusões.
(44) - Pp. 23 a 26 da tradução francesa da petição inicial.
(45) - Ibidem, p. 25, segundo parágrafo.
(46) - Ibidem, pp. 26 a 28.
(47) - V. n.os 39 e segs. das presentes conclusões.
(48) - V. n.os 35 e segs. e n._ 104 das presentes conclusões.
(49) - Pp. 28 a 37 da tradução francesa da petição inicial.
(50) - V., nomeadamente, o acórdão de 11 de Julho de 1989, Schräder (265/87, Colect., p. 2237, n._ 21), e, mais recentemente, o acórdão Reino Unido/Conselho(já referido, n._ 57).
(51) - V., nomeadamente, pp. 31 e segs. da tradução francesa da petição inicial.
(52) - V., nomeadamente, o acórdão de 5 de Outubro de 1994, Alemanha/Conselho (C-280/93, Colect., p. I-4973, n._ 90), e, mais recentemente, o acórdão Reino Unido/Conselho (já referido, n._ 58).
(53) - V., nomeadamente, os acórdãos de 21 de Fevereiro de 1990, Wuidart e o. (C-267/88 a C-285/88, Colect., p. I-435, n._ 14), e de 5 de Outubro de 1994, Alemanha/Conselho (já referido, n._ 90).
(54) - Regulamento relativo a medidas a tomar em caso de crise no mercado dos transportes rodoviários de mercadorias (JO L 375, p. 10).
(55) - JO L 178, p. 5.
(56) - Pp. 37 a 49 da tradução francesa da petição inicial.
(57) - N._ 62 da contestação.
(58) - JO L 322, p. 30; EE 06 F2 p. 21.
(59) - Acórdãos de 11 de Junho de 1991, Athanasopoulos e outros (C-251/89, Colect., p. I-2797, n._ 57), e de 27 de Setembro de 1988, Matteucci (235/87, Colect., p. 5589, n._ 19).
(60) - JO L 386, p. 1.
(61) - Pp. 50 a 55 da tradução francesa da petição inicial.
(62) - Boletim das Comunidades Europeias, n._ 12, 1992, anexo 1 da parte A, I.19, p. 15.
(63) - P. 36 da tradução francesa da réplica.
(64) - Artigo 3._, n._ 1, segundo parágrafo, da directiva.