61994C0214

Conclusões do advogado-geral Léger apresentadas em 14 de Novembro de 1995. - Ingrid Boukhalfa contra Bundesrepublik Deutschland. - Pedido de decisão prejudicial: Bundesarbeitsgericht - Alemanha. - Nacional de um Estado-Membro estabelecido num Estado terceiro - Emprego, na qualidade de agente local, na representação externa de outro Estado-Membro nesse Estado terceiro - Tratamento diferente relativamente aos agentes locais nacionais do Estado-Membro de que depende a representação externa - Aplicabilidade do direito comunitário - Não discriminação em razão da nacionalidade. - Processo C-214/94.

Colectânea da Jurisprudência 1996 página I-02253


Conclusões do Advogado-Geral


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1 Uma nacional de um Estado-Membro, empregada na embaixada de outro Estado-Membro no território de um Estado terceiro, pode invocar o benefício das disposições comunitárias relativas ao princípio da não discriminação em razão da nacionalidade? É esta, em substância, a questão submetida pelo Bundesarbeitsgericht, por ocasião de um litígio cujo quadro factual e jurídico é o seguinte.

2 A Gesetz ueber den Auswaertigen Dienst (lei alemã relativa ao pessoal empregado pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros, a seguir «GAD») prevê que o pessoal das representações externas alemãs se compõe de funcionários do Ministério em destacamento e de funcionários não destacados. Estes últimos são designados como «agentes locais».

3 Faz-se uma distinção entre os agentes locais de nacionalidade alemã e os agentes locais que não têm essa nacionalidade. Nos termos do § 32 da GAD, a situação jurídica dos agentes locais de nacionalidade alemã é determinada pelas convenções colectivas (alemãs) e pelas outras disposições (do direito alemão) que lhes são aplicáveis. As condições de trabalho dos agentes locais que não têm a nacionalidade alemã são, inversamente, por força do § 33 da GAD, «determinadas em função [...] do direito do país de acolhimento e tendo em conta os usos locais. São-lhes garantidas condições sociais adequadas, tendo em conta a situação local.»

4 É ao regime previsto por esta última disposição que está sujeita I. Boukhalfa, recorrente na causa principal.

5 I. Boukhalfa, de nacionalidade belga, trabalha desde 1 de Abril de 1982 na Embaixada da Alemanha em Argel, na qualidade de agente auxiliar, no serviço de passaportes. O seu contrato de trabalho foi celebrado em Argel, local onde anteriormente já residia de forma permanente. Paga cotizações para a caixa de seguros de pensão legal alemã (1) e está sujeita, quanto aos seus rendimentos provenientes dos fundos públicos nacionais, a um imposto limitado sobre o rendimento, em conformidade com as disposições alemãs (2).

6 Por carta de 19 de Novembro de 1991, a recorrente no processo principal protestou contra a aplicação que lhe foi feita das disposições aplicáveis aos agentes locais que não têm a nacionalidade alemã, e pediu à sua entidade patronal, a República Federal da Alemanha (a seguir «recorrida no processo principal»), o benefício do tratamento dado aos agentes locais de nacionalidade alemã, que, nos termos do § 32 da GAD, estão sujeitos ao regime mais favorável instituído pela convenção colectiva de 28 de Setembro de 1973, que rege as condições de trabalho dos funcionários alemães não destacados empregados nas representações externas da República Federal da Alemanha (convenção colectiva dos funcionários no estrangeiro).

7 Tendo a República Federal da Alemanha indeferido esse pedido, a recorrente no processo principal recorreu para o Arbeitsgericht. Em apoio do seu recurso, sustentou que é contrário à proibição de discriminação em razão da nacionalidade, contida no artigo 48._, n._ 2, do Tratado CE e no artigo 7._, n.os 1 e 4, do Regulamento (CEE) n._ 1612/68 do Conselho, de 15 de Outubro de 1968, relativo à livre circulação dos trabalhadores na Comunidade (3) aplicar-lhe o tratamento menos favorável reservado aos agentes locais que não têm a nacionalidade alemã.

8 A recorrida no processo principal pediu que fosse negado provimento ao recurso, alegando que a recorrente não pode invocar o benefício das referidas disposições comunitárias, uma vez que se está fora do seu âmbito de aplicação territorial, limitado, em conformidade com o artigo 227._ do Tratado CE, ao território dos Estados-Membros da União Europeia.

9 O órgão jurisdicional de primeira instância deu provimento ao recurso de I. Boukhalfa, mas o Landesarbeitsgericht, para o qual a recorrida no processo principal interpôs recurso, negou-lhe provimento. Interposto recurso de «Revision», o Bundesarbeitsgericht considera que a distinção efectuada entre os agentes locais alemães e os que têm nacionalidade estrangeira pode justificar-se em direito alemão, mas interroga-se sobre a eventualidade de uma discriminação em razão da nacionalidade, contrária ao direito comunitário (4). Assim, submete ao Tribunal de Justiça a seguinte questão:

«O n._ 2 do artigo 48._ do Tratado CE e os n.os 1 e 4 do artigo 7._ do Regulamento n._ 1612/68 devem ser interpretados no sentido de que, relativamente às condições de trabalho, uma nacional belga, com residência fixa na Argélia, que trabalha no serviço de passaportes da Embaixada da Alemanha em Argel e cuja relação de trabalho aí se constituiu e exclusivamente aí prossegue, não deve sofrer um tratamento discriminatório em razão da nacionalidade ?»

Discussão

10 A questão ora submetida ao Tribunal é importante; para além do âmbito restrito da interrogação do órgão jurisdicional de reenvio, a resposta que for dada será susceptível de interessar a totalidade do pessoal comunitário empregado num Estado terceiro numa representação externa de um Estado-Membro, cuja nacionalidade ele não possui (5). É por isso que a questão poderia ser reformulada em termos mais genéricos: as disposições comunitárias relativas à liberdade de circulação de trabalhadores, e mais especialmente as que proíbem qualquer discriminação em razão da nacionalidade no que respeita às condições de trabalho, são aplicáveis à situação dos trabalhadores comunitários empregados num Estado terceiro numa representação externa de um Estado-Membro cuja nacionalidade não possuem ?

11 Como se depreende, o raciocínio seguido pelo tribunal de reenvio decompõe-se em duas partes, sendo que a segunda não levanta verdadeiramente dificuldades. Trata-se antes de mais de se chegar a acordo quanto à questão de saber se as disposições comunitárias são aplicáveis «ratione territorii» a tal situação. Em caso afirmativo, haverá então que determinar, para cada situação, se o trabalhador em questão se encontra numa situação discriminatória em razão da sua nacionalidade.

Ponto prévio quanto à existência de discriminação

12 Para maior comodidade, podemos examinar desde já sucintamente este último ponto, que não faz formalmente parte da questão submetida, sendo certo que o seu estudo pelo juiz de reenvio só terá interesse se as disposições comunitárias relevantes forem efectivamente aplicáveis.

13 O artigo 48._, n._ 2, do Tratado dispõe:

«[A livre circulação dos trabalhadores] implica a abolição de toda e qualquer discriminação em razão da nacionalidade, entre os trabalhadores dos Estados-Membros, no que diz respeito ao emprego, à remuneração e demais condições de trabalho.»

14 O artigo 7._, n.os 1 e 4, do Regulamento n._ 1612/68 está redigido nos seguintes termos:

«1. O trabalhador nacional de um Estado-Membro não pode, no território de outros Estados-Membros, sofrer, em razão da sua nacionalidade, tratamento diferente daquele que é concedido aos trabalhadores nacionais no que respeita a todas as condições de emprego e de trabalho, nomeadamente em matéria de remuneração, de despedimento e de reintegração profissional ou de reemprego, se ficar desempregado.

[...]

4. São nulas todas e quaisquer cláusulas de convenção colectiva ou individual ou de qualquer outra regulamentação colectiva respeitantes ao acesso ao emprego, ao emprego, à remuneração e às outras condições de trabalho e de despedimento, na medida em que prevejam ou autorizem condições discriminatórias relativamente aos trabalhadores nacionais de outros Estados-Membros.»

15 Estas duas disposições concretizam o «direito fundamental» (6) dos trabalhadores comunitários à livre circulação. O artigo 48._, n._ 2, do Tratado concretiza mais particularmente o princípio geral de proibição de discriminações em razão da nacionalidade, tal como está previsto no artigo 6._ do Tratado CE, ao conferir aos trabalhadores migrantes a igualdade de tratamento com os nacionais do país de acolhimento «[...] no que diz respeito ao emprego, à remuneração e demais condições de trabalho». O artigo 7._ do Regulamento n._ 1612/68 recorda, por seu lado, este princípio geral (n._ 1), ao mesmo tempo que especifica, no n._ 4, que qualquer cláusula de uma convenção colectiva é nula se previr ou autorizar condições discriminatórias relativamente aos trabalhadores nacionais dos outros Estados-Membros.

16 Por força destas disposições, qualquer nacional de um Estado-Membro que trabalhe no território de outro Estado-Membro deve, portanto, ser tratado da mesma forma que os nacionais do Estado-Membro de acolhimento. Assim, são inaplicáveis as disposições jurídicas ou as práticas administrativas de um Estado que limitam o acesso ao emprego e o seu exercício pelos estrangeiros que tenham a nacionalidade de outro Estado-Membro, ou que os façam depender de condições não previstas para os nacionais.

17 A recorrente no processo principal é sem dúvida um «trabalhador nacional de um Estado-Membro», na acepção destas disposições, e este conceito reveste, segundo a jurisprudência constante do Tribunal, um alcance comunitário, não devendo ser deixado à apreciação do direito interno (7). Empregada na qualidade de agente auxiliar no serviço de passaportes numa embaixada, ela exerce actividades reais e efectivas, que constituem prestações com um valor económico inegável, e que são feitas a favor de outra pessoa e sob a direcção desta, recebendo como contrapartida uma remuneração (8). Além disso, a natureza (seja ela de direito privado ou de direito público) da sua relação de trabalho não tem relevância (9). Assim, ela inclui-se efectivamente, na sua qualidade de trabalhadora nacional de um Estado-Membro, no âmbito de aplicação pessoal destas disposições.

18 Resta, pois, examinar se ela sofre efectivamente uma discriminação em razão da sua nacionalidade, contrária aos textos comunitários. A este respeito, verifica-se que, em aplicação da lei alemã, para os agentes locais empregados, como a recorrente no processo principal, numa representação externa alemã, as condições de trabalho estão sujeitas a um regime diferente, consoante sejam ou não de nacionalidade alemã (10). O critério que está na origem desta diferença de tratamento efectuada entre trabalhadores com o mesmo estatuto é assim, claramente, o da nacionalidade. Se esta diferença só fosse feita entre os agentes locais alemães e os agentes locais argelinos (ou que tivessem a nacionalidade de um Estado terceiro em relação à Comunidade), as disposições comunitárias relativas à não discriminação em relação à nacionalidade não poderiam evidentemente aplicar-se. Em contrapartida, quando essa diferença seja estabelecida, apenas em razão do critério da nacionalidade, entre dois trabalhadores nacionais comunitários que se encontrem na mesma situação, ela constitui sem dúvida alguma uma discriminação directa em razão da nacionalidade, contrária ao direito comunitário.

19 Note-se que a existência de uma discriminação não é, no caso presente, posta em causa pelo n._ 4 do artigo 48._ do Tratado, nos termos do qual:

«O disposto no presente artigo não é aplicável aos empregos na administração pública.»

Ainda que, efectivamente, se considerasse que a recorrente no processo principal ocupa um lugar na administração pública, o Tribunal interpreta esta disposição no sentido de que ela «[...] não poderia justificar, desde que outros trabalhadores de outros Estados-Membros fossem admitidos a ocupar estes cargos, medidas discriminatórias a seu respeito em matéria de remuneração ou de outras condições de trabalho» (11).

20 Resulta do que antecede que, se a situação de I. Boukhalfa pudesse estar sujeita ao direito comunitário, ela poderia em princípio queixar-se, no que respeita às condições de trabalho, de uma discriminação directa em razão da sua nacionalidade, contrária ao direito comunitário.

21 Feito este esclarecimento, haverá ainda que nos certificarmos da aplicabilidade das disposições comunitárias à situação da recorrente no processo principal, condição sem a qual não poderia apurar-se qualquer discriminação.

Aplicabilidade do direito comunitário

22 É este o verdadeiro problema suscitado pelo presente caso. Toda a dificuldade provém, evidentemente, do elemento de extraterritorialidade existente: o facto de a localização da relação de trabalho ser num país terceiro em relação à União Europeia. Bem se percebe que o problema não se poria se estivéssemos perante a mesma relação de trabalho, mas localizada no território de um dos Estados-Membros. Assim, a aplicação das normas comunitárias à situação de um trabalhador belga empregado na Embaixada da Alemanha em França, por exemplo, não suscitaria qualquer dúvida.

A extraterritorialidade não exclui a aplicação do direito comunitário

23 Há um primeiro ponto que merece ser examinado: o facto de a relação de trabalho se situar fora do território da União Europeia basta para excluir a aplicação do direito comunitário ?

24 A este respeito, há que apurar se, na acepção estritamente geográfica do termo, existe um critério de territorialidade relacionado com a aplicação do direito comunitário. Em apoio desta tese, a recorrida no processo principal invocava perante o tribunal de reenvio o artigo 227._ do Tratado, cujo n._ 1 está assim redigido:

«1. O presente Tratado é aplicável ao Reino da Bélgica, ao Reino da Dinamarca, à República Federal da Alemanha, à República Helénica, ao Reino de Espanha, à República Francesa, à Irlanda, à República Italiana, ao Grão-Ducado do Luxemburgo, ao Reino dos Países Baixos, à República da Áustria, à República Portuguesa, à República da Finlândia, ao Reino da Suécia e ao Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte.»

25 Deverá ver-se nesta enumeração dos Estados partes na União relativamente aos quais se aplica o direito comunitário uma delimitação puramente geográfica do seu âmbito de aplicação ?

26 Note-se desde já que, se se adoptasse esta concepção, o direito primário e derivado só se aplicaria no interior das fronteiras de cada um dos Estados-Membros. Nesse caso, as representações externas dos países membros, situadas por definição fora desse âmbito territorial, estariam sempre numa esfera de «não-direito comunitário». De facto - e isto não é contestado (12) -, as instalações de uma representação externa não podem ser consideradas como fazendo parte do território nacional do Estado representado. Quando muito, essas instalações são invioláveis e gozam de imunidade, nos termos do artigo 22._, n.os 1 e 3, da Convenção de Viena de 18 de Abril de 1961 sobre as relações diplomáticas (13). Uma representação externa está sempre situada, de qualquer modo, no território do Estado de acolhimento, como salienta o artigo 21._ da Convenção de Viena:

«1. O Estado acreditador deve, ou facilitar a aquisição no seu território, no âmbito da sua legislação, pelo Estado acreditado, das instalações necessárias à sua missão, ou ajudar o Estado acreditado a obter as suas instalações de outra forma» (14).

27 Todavia, não nos parece que se deva inferir do texto do artigo 227._ do Tratado que o direito primário (e, por extensão, o direito derivado) comunitário tem um âmbito de aplicação meramente espacial.

28 Com efeito, este artigo limita-se a dispor de forma perfeitamente lacunar e em termos de enumeração que o Tratado CE se aplica aos Estados-Membros. Ora, embora seja certo que o território é um dos elementos constitutivos da definição clássica em Direito Internacional Público do conceito de Estado (e o Regulamento n._ 1612/68, aliás, faz referência a isso de modo quase sistemático em cada um dos seus artigos, referindo que se aplica «no território de outros Estados-Membros» (15) ou «na Comunidade» (16)), trata-se apenas de um dos elementos, entre outros, dessa definição (17).

29 Note-se, aliás, que se encontram no próprio corpo do Tratado disposições aplicáveis fora do território comunitário, considerado no sentido estritamente geográfico do termo. É o que se passa com a Parte IV do Tratado CE, relativa à «Associação dos países e territórios ultramarinos», que prevê a aplicação do mesmo regime previsto no Tratado, por exemplo nas trocas comerciais com esses países terceiros (artigo 132._) ou relativamente à supressão dos direitos aduaneiros aplicáveis às trocas com estes (artigo 133._).

Outro exemplo de aplicação extraterritorial pode encontrar-se no artigo 8._ C do Tratado CE, que concretiza o princípio da cidadania da União fora das fronteiras comunitárias:

«Qualquer cidadão da União beneficia, no território de países terceiros em que o Estado-Membro de que é nacional não se encontre representado, de protecção por parte das autoridades diplomáticas e consulares de qualquer Estado-Membro, nas mesmas condições que os nacionais desse Estado.»

30 Verifica-se também que, contrariamente ao artigo 227._ do Tratado, os artigos 198._, primeiro parágrafo, do Tratado Euratom, e 79._ do Tratado CECA circunscrevem de forma expressa a aplicação de cada um destes Tratados aos estritos limites dos «territórios» dos Estados-Membros. Em nosso entender (18), não se pode interpretar a ausência de qualquer referência a este termo no artigo 227._ como um simples esquecimento dos redactores, que aliás tiveram o cuidado de lhe fazer referência nos outros Tratados.

31 Observe-se, por fim, atendo-nos apenas às disposições do Tratado relativas à livre circulação de pessoas, que aqui nos ocupam mais especialmente, que todas elas enunciam a obrigação fundamental de tratar os nacionais de todos os Estados-Membros da mesma forma que os nacionais do Estado interessado. Com isso, correspondem à preocupação, mais geral, de promover o desenvolvimento do sentimento de pertença a uma entidade comum, consagrado pela expressão «Europa dos cidadãos» frequentemente utilizada, e pela inclusão, através do Tratado da União Europeia, de uma «cidadania da União» no Tratado CE (19). Ora, qual seria a efectividade desse sentimento de pertença ou dessa cidadania se eles desaparecessem mal fossem atravessadas as fronteiras geográficas da União ?

32 Deve, portanto, considerar-se que, «[...] ao dispor que o Tratado CEE se aplica aos Estados partes, o artigo 227._ define a esfera de aplicação das normas estabelecidas pelo Tratado, ou por força do Tratado, sem referência à base da competência estatal territorial. A dimensão espacial da ordem jurídica comunitária ultrapassa, portanto, a soma dos territórios dos Estados-Membros, que sem qualquer dúvida engloba [...]» (20).

33 Foi esta, em todo o caso, a posição adoptada pelo Tribunal de Justiça já em 1976, no acórdão Kramer e o. (21), que se pronunciou sobre a questão da aplicação do direito comunitário à pesca no alto mar. Apesar de a zona geográfica considerada (o alto mar) se encontrar fora das fronteiras territoriais dos Estados-Membros, o Tribunal decidiu que:

«[...] embora o artigo 5._ do Regulamento n._ 2141/70 só seja aplicável a uma zona de pesca geograficamente limitada, resulta todavia do artigo 102._ do Acto de Adesão, do artigo 1._ do referido regulamento e da própria natureza das coisas que a competência regulamentar ratione materiae da Comunidade se estende igualmente - na medida em que caiba aos Estados uma competência análoga, por força do Direito Internacional Público - à pesca no alto mar» (22).

34 Esta posição está, por outro lado, na origem da jurisprudência constante do Tribunal relativa ao domínio específico que nos ocupa no caso presente: o da livre circulação dos trabalhadores, considerado fora das fronteiras da União. Efectivamente, o Tribunal entendeu que:

«[...] a mera circunstância de a actividade dum trabalhador ser exercida fora do território da Comunidade não é suficiente para impedir a aplicação das regras comunitárias relativas à livre circulação dos trabalhadores [...]» (23).

Critérios jurisprudenciais de aplicação extraterritorial

35 A jurisprudência do Tribunal de Justiça merece ser brevemente recordada, para que se possam dela retirar os ensinamentos aptos a elucidar o problema que nos ocupa.

36 Um dos primeiros processos na origem dessa jurisprudência punha designadamente a questão de saber em que medida o princípio da não discriminação em razão da nacionalidade (artigos 48._, 59._ e, subsidiariamente, 7._ (24) do Tratado CEE) pode ser aplicado a relações jurídicas criadas no âmbito das actividades de uma federação desportiva de envergadura mundial (a Union Cycliste Internationale).

A resposta que o Tribunal lhe deu no acórdão de 12 de Dezembro de 1974, Walrave e Koch (25), tem o valor de princípio:

«a regra da não discriminação, pelo facto de ser imperativa, impõe-se para a apreciação de todas as relações jurídicas, em toda a medida em que essas relações, em razão do local onde são estabelecidas ou do local onde produzem os seus efeitos, possam ser localizadas no território da Comunidade;

compete ao juiz nacional apreciar essa localização considerando as circunstâncias de cada caso concreto e retirar, no que respeita ao efeito jurídico dessas relações, as consequências de uma eventual violação da regra de não discriminação» (26).

37 O acórdão de 12 de Julho de 1984, Prodest (27), foi a ocasião para confirmar, mas também para esclarecer, essa jurisprudência. Tratava-se aí de determinar se um nacional belga, residente em França, empregado por uma sociedade francesa de trabalho temporário, tinha direito à manutenção da sua inscrição no regime geral de segurança social francês enquanto durasse a sua missão na Nigéria, ao abrigo do Regulamento n._ 1612/68. A esse respeito, o Tribunal começou por declarar:

«[...] em princípio, um caso desta natureza prende-se com as disposições comunitárias sobre a livre circulação dos trabalhadores no interior da Comunidade» (28).

E continuou, esclarecendo, com base na jurisprudência Walrave e Koch:

«[...] que o exercício temporário das actividades fora da Comunidade não basta para afastar a aplicação deste princípio, quando a relação de trabalho conserve ainda assim uma conexão suficientemente estreita com esse território» (29).

Por fim, o Tribunal identificou, para o juiz a quo, os primeiros indícios aptos a demonstrar a existência dessa «conexão suficientemente estreita»:

«Num caso como o presente, essa conexão reside no facto de o trabalhador comunitário ter sido contratado por uma empresa de outro Estado-Membro e, por isso, ter estado inscrito no regime de segurança social desse Estado, e de continuar a exercer as suas actividades por conta da empresa comunitária, mesmo durante o destacamento no país terceiro» (30).

38 O marco seguinte dessa jurisprudência foi o acórdão de 27 de Setembro de 1989, Lopes da Veiga (31). Perguntava-se aí ao Tribunal designadamente se um marinheiro de nacionalidade portuguesa, que trabalhava de forma permanente para uma sociedade neerlandesa, em navios que arvoravam bandeira neerlandesa, podia invocar o benefício dos artigos 7._ e seguintes do Regulamento n._ 1612/68.

Enquanto os acórdãos anteriores só tinham até então definido o critério da «conexão suficientemente estreita com o território da Comunidade» para o aplicar às relações jurídicas de trabalho exercido parcial ou temporariamente, o Tribunal esclareceu nesse acórdão que:

«Este critério do vínculo de conexão deve aplicar-se igualmente na hipótese de um trabalhador nacional de um Estado-Membro exercer, a título permanente, uma actividade assalariada [...]» (32).

De um modo que já se tornou clássico, o Tribunal remetia então para o juiz nacional a apreciação deste critério, ao mesmo tempo que lhe sugeria que tomasse em consideração para esse efeito «nomeadamente» um determinado número de indícios, tal como decorriam do processo principal:

«o requerente no processo principal trabalha num navio registado nos Países Baixos, ao serviço de uma sociedade armadora de direito neerlandês estabelecida nos Países Baixos; foi contratado nos Países Baixos e a relação laboral que o vincula ao seu empregador está sujeita à lei neerlandesa; o interessado está segurado ao abrigo do regime da segurança social nos Países Baixos, estando aí sujeito também ao imposto sobre o rendimento» (33).

39 Por fim, o acórdão Aldewereld, já referido, respondia a interrogações semelhantes. Perguntava-se aí se a um nacional neerlandês, que residia nos Países Baixos quando foi contratado por uma empresa alemã que o enviara imediatamente para a Tailândia, podiam aplicar-se as disposições comunitárias relativas à livre circulação de trabalhadores, e em especial o Regulamento (CEE) n._ 1408/71 (34).

A fundamentação que o Tribunal adoptou aí foi a mesma seguida até então:

«Resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça (v. neste sentido, designadamente, o acórdão de 12 de Julho de 1984, Prodest, 237/83, Recueil, p. 3153/56, n._ 6) que a mera circunstância de a actividade dum trabalhador ser exercida [exclusivamente] fora do território da Comunidade não é suficiente para impedir a aplicação das regras comunitárias relativas à livre circulação dos trabalhadores, desde que a relação de trabalho mantenha uma conexão suficientemente estreita com o território da Comunidade. Num caso como o dos autos, essa conexão encontra-se na circunstância de o trabalhador comunitário ter sido contratado por uma empresa doutro Estado-Membro e, por esse facto, estar inscrito no regime de segurança social desse Estado» (35).

40 Mencionaremos, para sermos exaustivo, o mais recente acórdão de 6 de Junho de 1995, Bozkurt (36), em que o Tribunal confirma a tal ponto a posição adoptada até então que a transpõe para uma hipótese diametralmente oposta, a de um trabalhador nacional de um Estado terceiro que exerce as suas actividades por conta de uma empresa comunitária:

«[...] para verificar a integração de um trabalhador turco que exerce uma actividade de camionista internacional no mercado regular do emprego de um Estado-Membro, na acepção do artigo 6._, n._ 1, da Decisão n._ 1/80, cabe ao órgão jurisdicional nacional apreciar se a relação de trabalho do interessado apresenta um elo de conexão suficientemente estreito com o território do Estado-Membro, tomando em consideração nomeadamente o lugar da contratação, o território a partir do qual a actividade assalariada é exercida e a legislação nacional aplicável em matéria de direito do trabalho e da segurança social» (37).

41 O rememorar dessa jurisprudência permite extrair dela os ensinamentos que se seguem.

42 Numa relação laboral entre uma empresa «comunitária» e um nacional de outro Estado-Membro, as normas relativas à livre circulação de trabalhadores (e designadamente as que incidem sobre o princípio da não discriminação em razão da nacionalidade) são, evidentemente, aplicáveis em princípio.

43 O princípio da sua aplicação não é afectado pelo facto de essa relação laboral se exercer no estrangeiro, seja de forma temporária e ocasional (acórdão Walrave e Koch e acórdão Prodest, já referidos) ou de forma permanente e exclusiva (acórdãos Lopes da Veiga e Aldewereld, já referidos).

44 O critério de aplicação dessas normas a uma relação laboral localizada no estrangeiro é a existência de um «elo de conexão suficientemente estreito com o território da Comunidade».

45 A determinação da efectividade dessa conexão é da competência do juiz nacional, que é quem está em melhores condições para a apreciar, à luz da especificidade de cada caso que tem de conhecer.

46 Para isso, o juiz comunitário recomenda-lhe que tome como referência aquilo a que se poderia chamar um «feixe de indícios». Assim, o Tribunal já detectou um determinado número de elementos de facto susceptíveis de ajudar o juiz a quo na sua tarefa:

- relação laboral constituída entre um trabalhador comunitário e uma empresa de outro Estado-Membro;

- recrutamento desse trabalhador comunitário num Estado-Membro;

- trabalhador comunitário estabelecido num Estado-Membro no momento da sua contratação;

- estabelecimento do empregador no Estado-Membro de que é nacional;

- sujeição do empregador à ordem jurídica de um Estado-Membro;

- sujeição da relação laboral ao direito do Estado-Membro de que o empregador é nacional;

- trabalhador comunitário que exerce a sua actividade por conta da empresa que o emprega, mesmo que essa actividade seja exercida num país terceiro;

- inscrição desse trabalhador comunitário no regime de segurança social do Estado-Membro de que é nacional a empresa que o emprega;

- sujeição desse trabalhador ao imposto sobre o rendimento do Estado-Membro de que é nacional a empresa que o emprega.

47 Saliente-se que a rememoração destes elementos permite simplesmente dar uma ideia geral dos indícios que o juiz nacional pode «nomeadamente» (38) tomar como referência. Deve chamar-se a atenção para o facto de esta lista não ser de modo algum exaustiva. Além disso, não parece que a existência de um ou outro destes indícios seja determinante. Quando muito, estar-se-á sempre na hipótese de uma relação laboral entre um nacional comunitário e uma empresa nacional de outro Estado-Membro, exercida num país terceiro por conta dessa empresa. Note-se, por fim, à luz das últimas evoluções jurisprudenciais, e muito especialmente do acórdão Aldewereld, já referido, que não é a quantidade de indícios que é determinante. Não se trata de elaborar duas listas, uma contendo os elementos a favor da conexão e a outra os elementos contra, para as confrontar a fim de determinar para que lado pende a decisão. É mais a pertinência dos elementos favoráveis à tese da conexão que deve, em cada caso concreto, ser procurada.

Transposição dos critérios jurisprudenciais para o presente caso: procura da existência de um «elo de conexão suficientemente estreito»

48 A transposição dessa jurisprudência para o caso que nos ocupa leva a considerar que a aplicação das regras comunitárias relativas ao princípio da não discriminação em razão da nacionalidade, no que respeita às condições de trabalho da recorrente no processo principal, não está excluída só pelo facto de a relação laboral desta última se exercer no estrangeiro.

49 Isto assente, compete em princípio ao juiz a quo tomar como referência um «feixe de indícios» susceptível de demonstrar que a relação laboral conserva um «elo de conexão suficientemente estreito com o território comunitário».

50 A este respeito, e à luz dos indícios identificados pela jurisprudência do Tribunal, encontram-se no caso presente alguns elementos desfavoráveis ao reconhecimento da existência dessa conexão (39). Assim:

- o contrato de trabalho da recorrente no processo principal foi celebrado num país terceiro;

- as suas condições de trabalho são determinadas pelo «direito do país de acolhimento e tendo em conta os usos locais», em conformidade com o § 33 da GAD (40);

- ela tem a sua residência permanente no país terceiro onde exerce as suas actividades, desde antes da celebração do contrato.

Em contrapartida, o facto de I. Boukhalfa trabalhar na Argélia de modo permanente, e não de modo temporário ou parcial, não é, à luz da jurisprudência do Tribunal - como vimos - um elemento desfavorável à existência de um elo de conexão, ao contrário do que parece pensar o Bundesarbeitsgericht (41).

51 Mas parece-nos sobretudo que outros elementos dos autos militam a favor de uma tese favorável à existência de um «elo de conexão suficientemente estreito com o território comunitário».

52 Alguns deles já foram apontados pela jurisprudência do Tribunal.

53 Assim, a relação laboral que está em causa no presente processo foi constituída entre um trabalhador que tem a nacionalidade de um Estado-Membro e um empregador que por definição é nacional comunitário, uma vez que se trata de um Estado-Membro. Verifica-se também que a recorrente no processo principal continua a exercer as suas actividades para esse empregador, embora a sua localização seja em território estrangeiro. Além disso, está inscrita no regime de segurança social alemão, pelo menos no que respeita ao seguro de pensão. Está também sujeita, embora de forma limitada, ao imposto alemão sobre o rendimento (42). Mas, sobretudo, o seu contrato de trabalho foi celebrado nos termos do direito alemão, e mais especialmente da GAD. Com efeito, é apenas por aplicação da GAD que as condições de trabalho da recorrente são determinadas em função do direito argelino, menos favorável. Em definitivo, isto significa que a recorrente no processo principal está sujeita ao regime jurídico de um Estado-Membro.

54 Este último ponto parece-nos decisivo. Aliás, é corroborado por outras constatações de facto atinentes à particularidade da relação laboral, e que são assim susceptíveis de se encontrar na maior parte das relações laborais a que estão sujeitos os nacionais comunitários empregados num país terceiro numa representação externa de um Estado-Membro de que não têm a nacionalidade. Os elementos factuais seguintes parecem-nos, portanto, aptos a constituir novos indícios que o juiz nacional poderá tomar como referência.

55 Antes de mais, o contrato celebrado entre as duas partes contém uma cláusula atributiva de jurisdição, que designa Bona, e posteriormente Berlim, como jurisdição competente (43). Este elemento sublinha também a conexão estreita da situação contratual com o sistema jurídico alemão.

56 Por outro lado, diversamente dos factos que o Tribunal teve de conhecer até então, o empregador neste caso não é um simples particular, mas uma entidade pública, a mais importante de todas: o Estado. Esta simples constatação basta para considerar que todos os indícios que o Tribunal apontou relativamente ao empregador - local de estabelecimento deste, ordem jurídica de que depende - se encontram reunidos quando o empregador é o próprio Estado. Com efeito, em tal situação, detecta-se inevitavelmente um «clima» de conexão com a ordem jurídica desse Estado.

57 Note-se em seguida que a natureza da actividade exercida pelo pessoal das representações externas é muito especial. Sem chegar ao ponto de admitir que esses trabalhadores exercem funções soberanas por conta do Estado empregador, pode pelo menos considerar-se que participam no exercício, pelo Estado-Membro que os emprega, de funções soberanas. Os actos que praticam no exercício das suas funções são imputados ao Estado por conta do qual actuam. As suas funções implicam a utilização de prerrogativas de poder público. É esse muito especialmente o caso, em nosso entender, de uma pessoa empregada, como a recorrente no processo principal, no serviço encarregado da emissão de passaportes. Este sector prende-se indiscutivelmente com o exercício de funções soberanas de um Estado.

58 Observe-se por fim que o local de exercício da relação laboral tem a sua importância. Como recordámos acima, as representações externas situam-se no território do Estado de acolhimento. Todavia, não se pode ignorar que a função dessas missões consiste designadamente, nos termos do artigo 3._ da Convenção de Viena, em:

«a) representar o Estado acreditado junto do Estado acreditador;

b) proteger no Estado acreditador os interesses do Estado acreditado e dos seus nacionais;

c) negociar com o Governo do Estado acreditador;

d) informar-se, por todos os meios lícitos, da situação e da evolução dos acontecimentos no Estado acreditador e informar a esse respeito o Governo do Estado acreditado;

e) promover relações de amizade e desenvolver as relações económicas, culturais e científicas entre o Estado acreditado e o Estado acreditador.»

O exercício destas funções, que salientam o facto de um Estado manter efectivamente por intermédio dos seus agentes e em pé de igualdade relações diplomáticas com outros Estados soberanos e de ele estar representado junto desses outros Estados, é sem dúvida um dos critérios mais seguros da soberania de um Estado.

59 Os diferentes elementos acima enumerados põem em evidência o facto de o Estado-Membro, na sua qualidade de empregador, exercer a sua soberania e jurisdição nas relações contratuais de trabalho que o vinculam aos nacionais comunitários que trabalham por sua conta nas representações externas localizadas num país terceiro.

60 Ora, parece-nos que a sujeição de uma relação de trabalho à soberania e à jurisdição de um Estado-Membro constitui um critério forte de «conexão com o território comunitário», na acepção da jurisprudência do Tribunal, mesmo para além da existência de outros indícios existentes no caso presente e que mencionámos.

61 A nossa posição coincide, aliás, com a de uma parte da doutrina, que considera que «[...] o Tratado é aplicável aos Estados-Membros onde quer que - mesmo em espaços internacionais - exerçam a sua soberania ou a sua jurisdição sobre um objecto que entre na esfera material do direito comunitário» (44), ou que «[...] o Tratado e o direito derivado se aplicam não só no território dos Estados-Membros [...] mas ainda em todos os locais onde os Estados exerçam, nos termos do Direito Internacional, determinados 'direitos soberanos', mesmo limitados» (45).

62 A nossa posição também não se afasta da jurisprudência do Tribunal. Com efeito, já recordámos que a ordem jurídica de um Estado-Membro - tanto aquele de que depende o empregador como o que rege as relações contratuais de trabalho - é um dos critérios que o Tribunal sugere que os órgãos jurisdicionais nacionais tomem como referência na procura de um «elo de conexão suficiente».

63 Seja-nos permitida uma última observação. O Tribunal ainda não teve ocasião para se pronunciar sobre o «novo» conceito de cidadania europeia introduzido no Tratado da União Europeia. O reconhecimento dessa cidadania, consagrada pelos artigos 8._ a 8._ E do Tratado CE, tem um forte valor simbólico e constitui provavelmente um dos avanços da construção europeia que mais atraíram a atenção da opinião pública. É certo que este conceito abrange na realidade aspectos já adquiridos, na sua maior parte, pela evolução do direito comunitário, e como tal constitui uma consolidação do acervo comunitário. Mas compete ao Tribunal dar-lhe pleno significado. Ora, se se inferirem todas as consequências que se prendem com esse conceito, todos os cidadãos da União, qualquer que seja a sua nacionalidade, devem gozar exactamente dos mesmos direitos e estar sujeitos aos mesmos deveres. Levado ao extremo das suas consequências, tal conceito deveria permitir chegar a uma equiparação perfeita dos cidadãos da União, qualquer que seja a sua nacionalidade. Essa equiparação deveria operar da mesma forma que a que existe entre os nacionais de um mesmo Estado. Assim, não se concebe, numa situação como a que temos de apreciar no presente processo, que certos agentes locais alemães possam ter um tratamento diferente do que é dado a outros agentes locais alemães na mesma situação. Porque se haveria de imaginar isso para um agente local de nacionalidade belga...?

64 Por conseguinte, propomos que se responda da seguinte forma ao órgão jurisdicional de reenvio:

«Os artigos 48._, n._ 2, do Tratado CE, e 7._, n.os 1 e 4, do Regulamento (CEE) n._ 1612/68 do Conselho, de 15 de Outubro de 1968, relativo à livre circulação dos trabalhadores na Comunidade, devem ser interpretados no sentido de que o princípio da não discriminação em razão da nacionalidade se aplica às condições de trabalho dos nacionais da União Europeia empregados por um Estado-Membro numa das suas representações externas estabelecida num país terceiro, quando essas condições de trabalho, sujeitas à jurisdição e à soberania do Estado-Membro representado, conservem um elo de conexão suficientemente estreito com o território comunitário.»

(1) - Apesar de, como esclareceu o representante da República Federal da Alemanha na audiência, o pagamento dessas cotizações se ter feito sem fundamento jurídico, inicialmente por erro, e depois por tolerância (v. também a nota 7 das observações da Comissão).

(2) - N._ 6 das observações da Comissão.

(3) - JO L 257, p. 2; EE 05 F1 p. 77.

(4) - V. o n._ 1 do acórdão de reenvio.

(5) - V., também neste sentido, as observações da Comissão, n._ s 12 e segs.

(6) - V. o preâmbulo do Regulamento n._ 1612/68.

(7) - Acórdão de 4 de Dezembro de 1974, Van Duyn (41/74, Recueil, p. 1337).

(8) - Quanto ao conceito de trabalhador, que o Tribunal interpreta em sentido amplo, v., por exemplo, os acórdãos de 21 de Junho de 1988, Brown (197/86, Colect., p. 3205, n._ 21), e de 26 de Fevereiro de 1992, Raulin (C-357/89, Colect., p. I-1027, n._ 10).

(9) - Acórdão de 3 de Julho de 1986, Lawrie-Blum (66/85, Colect., p. 2121).

(10) - V. as disposições da GAD, recordadas no n._ 2 das presentes conclusões.

(11) - Acórdão de 16 de Junho de 1987, Comissão/Itália (225/85, Colect., p. 2625, n._ 11).

(12) - V. os n._ 2, segundo parágrafo, das observações da recorrente, 3 das observações da recorrida, 18 das observações da Comissão, e a p. 7 do acórdão de reenvio. V. igualmente, neste sentido, a doutrina dominante e, por exemplo, Nguyen Quoc Dinh, Daillier P. e Pellet A.: Droit International Public, 3.° edição, LGDJ, 1987 n._ 468: «A missão diplomática permanente, qualificada geralmente de embaixada e por vezes de legação, é um serviço público do Estado acreditado instalado permanentemente no território do Estado acreditador» (sublinhado nosso); Thierry H. Combacau J., Sur S. e Vallée Ch: Droit International Public, précis Domat, ed. Montchrestien, 1975, p. 427: «[...] por definição, a embaixada situa-se em território estrangeiro».

(13) - Recueil des Traités das Nations Unies, volume 500, n._ 7310, p. 95

(14) - Sublinhado nosso.

(15) - V., por exemplo, o artigo 7._, n._ 1.

(16) - V., por exemplo, o primeiro considerando.

(17) - Em Direito Internacional Público, a doutrina considera essencialmente que, para que haja Estado, é necessária a reunião de pelo menos três elementos: população, território e Governo (ou poder político), mas que, para além destes três elementos, deve ser procurado outro critério distintivo, na maior parte dos casos o da soberania (v. por exemplo, Rousseau, Ch.: Droit International Public, vol. II, ed. Sirey, 1974, ponto 7; Nguyen Quoc Dinh, Daillier P. e Pellet A., op. cit., n._ 270; Thierry H., Combacau J., Sur S. e Vallée Ch., op. cit., p. 226).

(18) - V., também neste sentido, Coussirat-Coustère, V.: «Article 227, Commentaire», em Traité Instituant la CEE, Commentaire article par article, ed. Economica, 1992, p. 1419, ponto 2; Van Der Mensbrugghe, Y.: «La CEE et le plateau continental des États membres», em Mélanges Fernand Dehousse, vol. 2, 1979, p. 311, ponto 1; Dewost, J.-L.: «L'application territoriale du droit communautaire: disparition et résurgence de la notion de frontière», em La Frontière (colóquio de Poitiers da Société Française pour le Droit International), ed. Pedone, pp. 253, 254.

(19) - Parte II do Tratado CE, artigos 8._ a 8._ E.

(20) - Coussirat-Coustère V., op. cit., ponto 1. V., também neste sentido, Dewost, J.-L., op. cit., p. 261.

(21) - Acórdão de 14 de Julho de 1976 (3/76, 4/76 e 6/76, Recueil, p. 1279).

(22) - N._ 31.

(23) - Acórdão de 29 de Junho de 1994, Aldewereld (C-60/93, Colect., p. I-2991, n._ 14).

(24) - Actual artigo 6._ do Tratado CE.

(25) - 36/74, Recueil, p. 1405.

(26) - N.os 28 e 29, sublinhados nossos.

(27) - 237/83, Recueil, p. 3153.

(28) - N._ 5.

(29) - N._ 6, sublinhado nosso.

(30) - N._ 7.

(31) - 9/88, Colect., p. 2989.

(32) - N._ 16, sublinhado nosso.

(33) - N._ 17.

(34) - Regulamento do Conselho de 14 de Junho de 1971, relativo à aplicação dos regimes de segurança social aos trabalhadores assalariados e aos membros da sua família que se deslocam no interior da Comunidade (JO L 149, p. 2; EE 05 F1 p. 96).

(35) - N._ 14.

(36) - C-434/93, ainda não publicado na Colectânea.

(37) - N._ 24.

(38) - A palavra «nomeadamente» figura aliás expressamente nos acórdãos Lopes da Veiga e Bozkurt, já referidos (respectivamente nos n._ s 17 e 24).

(39) - V., neste sentido, a opinião do órgão jurisdicional de reenvio, na p. 7 da tradução francesa do seu acórdão.

(40) - V. o n._ 3 das presentes conclusões.

(41) - P. 7 da tradução francesa do acórdão de reenvio.

(42) - A Comissão nota com razão nas suas observações ( n._ 28) que, mesmo que essa sujeição ao regime alemão de tributação desaparecesse se se aplicasse a convenção belga-alemã sobre a dupla tributação, a sujeição ao regime belga de tributação nem por isso deixaria de constituir uma conexão com o território comunitário.

(43) - N._ 28 das observações da Comissão.

(44) - Coussirat-Coustère, V., op. cit. n._ 12.

(45) - Dewost, J.-L., op. cit., p. 255.