61993J0418

Acórdão do Tribunal (Quinta Secção) de 20 de Junho de 1996. - Semeraro Casa Uno Srl contra Sindaco del Comune di Erbusco (C-418/93), Semeraro Mobili SpA contra Sindaco del Comune di Erbusco (C-419/93), RB Arredamento Srl contra Sindaco del Comune di Stezzano (C-420/93), Città Convenienza Milano Srl contra Sindaco del Comune di Trezzano sul Naviglio (C-421/93), Città Convenienza Bergamo Srl contra Sindaco del Comune di Stezzano (C-460/93), Centro Italiano Mobili Srl contra Sindaco del Comune di Pineto (C-461/93), Il 3C Centro Convenienza Casa Srl contra Sindaco del Comune di Roveredo in Piano (C-462/93), Benelli Confezioni SNC contra Sindaco del Comune di Capena (C-464/93), M. Quattordici Srl contra Commissario straordinario del Comune di Terlizzi (C-9/94), Società Italiana Elettronica Srl (SIEL) contra Sindaco del Comune di Dozza (C-10/94), Modaffari Srl contra Sindaco del Comune di Trezzano sul Naviglio (C-11/94), Modaffari Srl contra Comune di Cinisello Balsamo (C-14/94), Cologno Srl contra Sindaco del Comune di Cologno Monzese (C-15/94), Modaffari Srl contra Sindaco del Comune di Osio Sopra (C-23/94), M. Dieci Srl contra Sindaco del Comune di Madignano (C-24/94) e Consorzio Centro Commerciale "Il Porto" contra Sindaco del Comune di Adria (C-332/94). - Pedido de decisão prejudicial: Pretura circondariale di Roma - Itália. - Interpretação dos artigos 30.º, 36.º e 52.º do Tratado CE e das Directivas 64/223/CEE e 83/189/CEE - Proibição de exercer certas actividades comerciais aos domingos e dias feriados. - Processos apensos C-418/93, C-419/93, C-420/93, C-421/93, C-460/93, C-461/93, C-462/93, C-464/93, C-9/94, C-10/94, C-11/94, C-14/94, C-15/94, C-23/94, C-24/94 e C-332/94.

Colectânea da Jurisprudência 1996 página I-02975


Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


++++

Livre circulação de mercadorias ° Restrições quantitativas ° Medidas de efeito equivalente ° Conceito ° Obstáculos resultantes de disposições nacionais que regulamentam de modo não discriminatório as modalidades de venda ° Não aplicabilidade do artigo 30. do Tratado ° Regulamentação relativa ao horário de abertura do comércio ° Igualdade de tratamento entre produtos nacionais e importados ° Critérios de apreciação ° Admissibilidade da regulamentação face ao artigo 52. do Tratado e à Directiva 64/223 ° Não aplicabilidade da Directiva 83/189

(Tratado CE, artigos 30. e 52. ; Directivas 64/223 e 83/189 do Conselho)

Não é susceptível de entravar directa ou indirectamente, actual ou potencialmente, o comércio intracomunitário a aplicação a produtos provenientes de outros Estados-Membros de disposições nacionais que limitam ou proíbem determinadas modalidades de venda, desde que as mesmas se apliquem a todos os operadores interessados que exerçam a sua actividade no território nacional, e desde que afectem da mesma forma, tanto juridicamente como de facto, a comercialização dos produtos nacionais e dos provenientes de outros Estados-Membros. Com efeito, desde que essas condições se encontrem satisfeitas, a aplicação de regulamentações desse tipo à venda de produtos provenientes de outro Estado-Membro que obedeçam às regras aprovadas por esse Estado não é susceptível de impedir o seu acesso ao mercado ou de o dificultar mais do que dificulta o dos produtos nacionais. Essas regulamentações escapam, portanto, ao âmbito de aplicação do artigo 30. do Tratado.

Daqui resulta que o artigo 30. do Tratado deve ser interpretado no sentido de que não se aplica a uma regulamentação nacional em matéria de horário de abertura do comércio que é oponível a todos os operadores económicos que exercem actividades no território nacional e que afecta do mesmo modo, de direito e de facto, a comercialização dos produtos nacionais e a dos produtos em proveniência de outros Estados-Membros.

Esta última condição encontra-se preenchida quando não se afigure que a regulamentação controvertida tem por objecto regular o comércio de mercadorias entre Estados-Membros ou que, considerada no seu conjunto, possa implicar uma desigualdade de tratamento entre produtos nacionais e produtos importados no que diz respeito ao seu acesso ao mercado. A este respeito, as regulamentações nacionais que restringem em geral o comércio de um produto e, em consequência, a sua importação não podem ser, só por este motivo, consideradas como limitando a possibilidade de estes produtos importados terem acesso ao mercado em mais larga medida que os produtos nacionais análogos, e o facto de uma legislação nacional ser susceptível de restringir, num plano geral, o volume das vendas e, por conseguinte, o dos produtos em proveniência de outros Estados-Membros não basta para qualificar a referida legislação de medida de efeito equivalente a uma restrição quantitativa à importação. Além disso, as regulamentações nacionais que restringem a abertura dos estabelecimentos comerciais ao domingo constituem a expressão de determinadas opções relacionadas com as especificidades socioculturais nacionais ou regionais e incumbe aos Estados-Membros proceder a essas opções no respeito das exigências impostas pelo direito comunitário.

Não se opõem, por outro lado, à referida regulamentação nem o artigo 52. do Tratado nem a Directiva 64/223 relativa à realização da liberdade de estabelecimento e da livre prestação de serviços nas actividades relacionados com o comércio por grosso. A Directiva 83/189, relativa a um procedimento de informação no domínio das normas e regulamentações técnicas, na redacção dada pela Directiva 88/182, não se aplica a tal regulamentação.

Partes


Nos processos apensos C-418/93, C-419/93, C-420/93, C-421/93, C-460/93, C-461/93, C-462/93, C-464/93, C-9/94, C-10/94, C-11/94, C-14/94, C-15/94, C-23/94, C-24/94 e C-332/94,

que têm por objecto pedidos dirigidos ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 177. do Tratado CE, pela Pretura circondariale di Roma, sezione distaccata di Castelnuovo di Porto, destinados a obter, nos litígios pendentes neste órgão jurisdicional entre

Semeraro Casa Uno Srl

e

Sindaco del Comune di Erbusco (C-418/93),

e entre

Semeraro Mobili SpA

e

Sindaco del Comune di Erbusco (C-419/93),

e entre

RB Arredamento Srl

e

Sindaco del Comune di Stezzano (C-420/93),

e entre

Città Convenienza Milano Srl

e

Sindaco del Comune di Trezzano sul Naviglio (C-421/93),

e entre

Città Convenienza Bergamo Srl

e

Sindaco del Comune di Stezzano (C-460/93),

e entre

Centro Italiano Mobili Srl

e

Sindaco del Comune di Pineto (C-461/93),

e entre

Il 3C Centro Convenienza Casa Srl

e

Sindaco del Comune di Roveredo in Piano (C-462/93),

e entre

Benelli Confezioni SNC

e

Sindaco del Comune di Capena (C-464/93),

e entre

M. Quattordici Srl

e

Commissario straordinario del Comune di Terlizzi (C-9/94),

e entre

Società Italiana Elettronica Srl (SIEL)

e

Sindaco del Comune di Dozza (C-10/94),

e entre

Modaffari Srl

e

Sindaco del Comune di Trezzano sul Naviglio (C-11/94),

e entre

Modaffari Srl

e

Comune di Cinisello Balsamo (C-14/94),

e entre

Cologno Srl

e

Sindaco del Comune di Cologno Monzese (C-15/94),

e entre

Modaffari Srl

e

Sindaco del Comune di Osio Sopra (C-23/94),

e entre

M. Dieci Srl

e

Sindaco del Comune di Madignano (C-24/94),

e entre

Consorzio Centro Commerciale "Il Porto"

e

Sindaco del Comune di Adria (C-332/94),

uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação dos artigos 30. , 36. e 52. do Tratado CE, da Directiva 64/223/CEE do Conselho, de 25 de Fevereiro de 1964, relativa à realização da liberdade de estabelecimento e da livre prestação de serviços nas actividades relacionadas com o comércio por grosso (JO 1964, 56, p. 863; EE 06 F1 p. 30), e da Directiva 83/189/CEE do Conselho, de 28 de Março de 1983, relativa a um procedimento de informação no domínio das normas e regulamentações técnicas (JO L 109, p. 8; EE 13 F14 p. 34), na redacção dada pela Directiva 88/182/CEE do Conselho, de 22 de Março de 1988 (JO L 81, p. 75),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção),

composto por: D. A. O. Edward, presidente de secção, C. Gulmann (relator), P. Jann, L. Sevón e M. Wathelet, juízes,

advogado-geral: G. Cosmas,

secretário: L. Hewlett, administradora,

vistas as observações escritas apresentadas:

° em representação da Semeraro Caso Uno Srl, Semeraro Mobili SpA, Città Convenienza Bergamo Srl e Il 3C Centro Convenienza Casa Srl, respectivamente demandantes nos processos C-418/93, C-419/93, C-460/93 e C-462/93, por Franco di Maria, Gianfranco Maestosi, Federico Tedeschini e Arturo Mancini, advogados no foro de Roma,

° em representação do Consorzio Centro Commerciale "Il Porto", demandante no processo C-332/94, por Franco di Maria, Gianfranco Maestosi e Federico Tedeschini, advogados no foro de Roma,

° em representação da Comune di Terlizzi, demandada no processo C-9/94, por Grazia Serini, advogada no foro de Bari, e Antonio Mancini, advogado no foro de Roma,

° em representação do Governo helénico, por Vassileios Kontolaimos, consultor jurídico adjunto no Conselho Jurídico do Estado, e Christina Sitara, mandatária judiciária no Conselho Jurídico do Estado, na qualidade de agentes,

° em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por Richard Wainwright, consultor jurídico principal, e Antonio Aresu, membro do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes,

visto o relatório para audiência,

ouvidas as alegações da Semeraro Casa Uno Srl, Semeraro Mobili SpA, Città Convenienza Bergamo Srl, Il 3C Centro Convenienza Casa Srl e Consorzio Centro Commerciale "Il Porto", representados por G. Maestosi e F. Tedeschini, do Sindaco del Comune di Adria, representado por G. Ricapito, advogado no foro de Roma, do Governo helénico, representado por V. Kontolaimos, e da Comissão, representada por A. Aresu, na audiência de 23 de Novembro de 1995,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 25 de Janeiro de 1996,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por despachos de 18 de Julho, 28 de Outubro, 11 de Novembro, 2 e 16 de Dezembro de 1993, bem como de 10 de Outubro de 1994, entrados no Tribunal de Justiça entre 13 de Outubro de 1993 e 13 de Dezembro de 1994, a Pretura circondariale di Roma, sezione distaccata di Castelnuovo di Porto, colocou, nos termos do artigo 177. do Tratado CE, questões prejudiciais relativas à interpretação dos artigos 30. , 36. e 52. do mesmo Tratado, da Directiva 64/223/CEE do Conselho, de 25 de Fevereiro de 1964, relativa à realização da liberdade de estabelecimento e da livre prestação de serviços nas actividades relacionadas com o comércio por grosso (JO 1964, 56, p. 863: EE 06 F1 p. 30, a seguir "Directiva 64/223"), e da Directiva 83/189/CEE do Conselho, de 28 de Março de 1983, relativa a um procedimento de informação no domínio das normas e regulamentações técnicas (JO L 109, p. 8; EE 13 F14 p. 34), na redacção dada pela Directiva 88/182/CEE do Conselho, de 22 de Março de 1988 (JO L 81, p. 75, a seguir "Directiva 83/189").

2 Estas questões foram suscitadas no âmbito de medidas de autoridade pública tomadas contra exploradores de grandes centros comerciais por terem infringido a regulamentação italiana relativa ao encerramento do comércio retalhista aos domingos e dias feriados.

3 A Lei italiana n. 558, de 28 de Julho de 1971, regulamenta as horas de abertura do comércio e as actividades de venda a retalho. O artigo 1. , n. 2, alínea a), desta lei prevê o encerramento total do comércio aos domingos e dias feriados, salvo em casos excepcionais previstos pela mesma lei. As disposições especiais respeitantes às horas de abertura são fixadas pelas regiões. O artigo 10. desta lei prevê sanções administrativas em caso de infracção. A fiscalização do respeito das regras em vigor é confiada aos presidentes das comunas em causa, que podem aplicar sanções.

4 Os demandantes nos processos principais (a seguir "demandantes") exploram grandes centros comerciais situados no território de diferentes comunas. Tendo estes centros comerciais estado abertos certos domingos e dias feriados, os presidentes das comunas em causa pronunciaram sanções administrativas contra os demandantes.

5 Estes submeteram então o assunto à apreciação do órgão jurisdicional de reenvio. Alegaram que uma parte importante do volume de negócios realizado nos centros comerciais em questão respeitava a produtos provenientes de outros Estados-Membros da Comunidade. Em sua opinião, as disposições nacionais em causa são assim incompatíveis com o direito comunitário, e nomeadamente com o artigo 30. do Tratado.

6 Nestas condições, o órgão jurisdicional de reenvio suspendeu a instância e colocou, nos processos apensos C-418/93, C-419/93, C-420/93, C-421/93, C-460/93, C-461/93, C-462/93, C-464/93, C-9/94, C-10/94, C-11/94, C-14/94, C-15/94, C-23/94 e C-24/94, as seguintes questões prejudiciais:

"1) Uma disposição de direito nacional que impõe (excepto em relação a alguns produtos) ao comércio retalhista o encerramento aos domingos e dias feriados (mas que não proíbe o exercício da actividade laboral no âmbito daquele mesmo nesses dias), e que aplica a sanção de encerramento coercivo a quem transgredir tal obrigação, provocando assim um decréscimo sensível das vendas efectuadas no exercício daquela actividade, incluindo as vendas de mercadorias produzidas noutros Estados-Membros da Comunidade, com a consequente redução do volume das importações em proveniência dos referidos Estados, constitui:

a) uma medida de efeito equivalente a uma restrição à importação na acepção do artigo 30. do Tratado CEE e das disposições de direito comunitário derivado adoptadas em aplicação dos princípios enunciados nesse artigo, ou

b) uma forma de discriminação arbitrária ou uma restrição dissimulada ao comércio entre Estados-Membros, ou

c) uma medida desproporcionada ou inadequada em relação ao objectivo de natureza social e/ou moral prosseguido pela disposição de direito nacional,

posto que:

° a grande distribuição e a distribuição organizada (categoria em que se incluem os demandantes) vendem, em média, uma quantidade de produtos importados dos outros Estados-Membros superior à que é vendida pelos pequenos e médios estabelecimentos comerciais;

° o volume de negócios que a grande distribuição e a distribuição organizada realizam ao domingo não pode ser compensado por compras substitutivas efectuadas pela clientela nos outros dias da semana, orientando-se estas compras, em consequência, para uma rede comercial que, no seu conjunto, se abastece junto dos produtores nacionais?

2) No caso de resposta afirmativa à primeira questão, a medida adoptada pela disposição nacional em causa está compreendida nas derrogações ao artigo 30. previstas no artigo 36. do Tratado CEE, ou noutras derrogações previstas pela regulamentação comunitária?"

7 No processo C-332/94, o órgão jurisdicional nacional colocou as seguintes questões:

"Considerando que

° a grande distribuição e a distribuição organizada, cujos estabelecimentos se encontram, na sua maior parte, situados na periferia e fora das cidades, oferecem e vendem, em média, uma quantidade de produtos importados dos outros Estados-Membros da Comunidade Europeia superior à oferecida e vendida pelos pequenos e médios estabelecimentos comerciais, espalhados ° ao contrário dos primeiros ° em todo o território, urbano e não urbano;

° as vendas efectuadas ao domingo pela grande distribuição e pela distribuição organizada, nos breves períodos em que essa venda é autorizada nesse dia, excedem só por si as vendas registadas nessas estruturas durante os dias úteis da semana;

° as vendas que a grande distribuição e a distribuição organizada não podem fazer nos dias feriados não são compensadas por aquelas que são efectuadas nessas estruturas nos dias úteis e, consequentemente, a procura que assim não é satisfeita é dirigida para outros circuitos comerciais (os das pequenas e médias empresas, mais próximas dos consumidores e facilmente acessíveis, mesmo nos dias úteis) que, no seu conjunto, se abastecem de produtos nacionais.

1) Uma disposição de direito nacional que impõe (excepto em relação a alguns produtos) ao comércio retalhista o encerramento aos domingos e dias feriados, mas que não proíbe o exercício da actividade laboral no âmbito daquele mesmo nesses dias, e que aplica a sanção de encerramento coercivo e de revogação da licença a quem transgredir tal obrigação, constitui:

a) uma medida de efeito equivalente a uma restrição à importação na acepção do artigo 30. do Tratado CEE e das disposições de direito comunitário derivado adoptadas em aplicação dos princípios enunciados nesse artigo, ou

b) uma forma de discriminação arbitrária ou uma restrição dissimulada ao comércio entre Estados-Membros, ou

c) uma medida desproporcionada ou inadequada em relação ao objectivo de natureza social e/ou moral prosseguido pela disposição de direito nacional, ou

d) uma violação das disposições do artigo 52. do Tratado CEE sobre a liberdade de estabelecimento e das normas posteriores de direito comunitário adoptadas em aplicação deste princípio, ou, pelo menos,

e) uma violação do n. 2 do artigo 2. da Directiva 64/223/CEE relativa à realização da liberdade de estabelecimento e da livre prestação de serviços nas actividades relacionadas com o comércio por grosso, ou

f) uma violação das Directivas 83/189/CEE e 88/182/CEE relativas à eliminação das barreiras técnicas ao comércio entre Estados-Membros, tendo em conta o facto de que a proibição de abertura dominical do comércio só é uma proibição generalizada em aparência, posto que, na prática, é objecto de derrogações para uma série de produtos que são, salvo casos raríssimos e inevitáveis, exclusivamente de origem nacional?

2) No caso de resposta afirmativa à primeira questão, em todos os seus elementos, a medida adoptada pela disposição nacional em causa pode ser incluída nas derrogações ao artigo 30. previstas no artigo 36. do Tratado CEE ou noutras disposições do direito comunitário?"

8 Por despachos do presidente do Tribunal de Justiça de 10 de Novembro de 1993, 27 de Janeiro e 23 de Fevereiro de 1994, alguns destes processos foram apensos para efeitos da fase escrita e oral e do acórdão. Por despacho do presidente da Quinta Secção do Tribunal de Justiça de 19 de Outubro de 1995, todos os processos foram apensos para efeitos da fase oral e do acórdão.

Quanto ao artigo 30. do Tratado

9 A título preliminar, cabe recordar que, no seu acórdão de 2 de Junho de 1994, Punto Casa e PPV (C-69/93 e C-258/93, Colect., p. I-2355), o Tribunal pronunciou-se sobre questões emanadas do mesmo órgão jurisdicional nacional que eram na sua essência idênticas às colocadas nos presentes processos, salvo, no processo C-332/94, quanto à primeira questão, alíneas d) a f).

10 No acórdão Punto Casa e PPV, já referido, o Tribunal aplicou a sua jurisprudência Keck e Mithouard (acórdão de 24 de Novembro de 1993, C-267/91 e C-268/91, Colect., p. I-6097).

11 No acórdão Keck e Mithouard, já referido, que dizia respeito a uma legislação nacional que proibia de um modo geral a revenda com prejuízo, o Tribunal verificou que essa legislação era susceptível de restringir o volume das vendas e, por conseguinte, o volume das vendas de produtos provenientes de outros Estados-Membros, na medida em que privava os operadores de um método de promoção das vendas. Ora, o Tribunal questionou-se sobre se essa eventualidade bastava para qualificar a legislação em causa de medida de efeito equivalente a uma restrição quantitativa à importação na acepção do artigo 30. do Tratado (n. 13).

12 A este respeito, o Tribunal considerou que não é susceptível de entravar directa ou indirectamente, actual ou potencialmente, o comércio intracomunitário, na acepção da jurisprudência Dassonville (acórdão de 11 de Julho de 1974, 8/74, Colect., p. 423, n. 5), a aplicação a produtos provenientes de outros Estados-Membros de disposições nacionais que limitam ou proíbem determinadas modalidades de venda, desde que as mesmas se apliquem a todos os operadores interessados que exerçam a sua actividade no território nacional, e desde que afectem da mesma forma, tanto juridicamente como de facto, a comercialização dos produtos nacionais e dos provenientes de outros Estados-Membros (n. 16).

13 O Tribunal salientou que, desde que essas condições se encontrem satisfeitas, a aplicação de regulamentações desse tipo à venda de produtos provenientes de outro Estado-Membro que obedeçam às regras aprovadas por esse Estado não é susceptível de impedir o seu acesso ao mercado ou de o dificultar mais do que dificulta o dos produtos nacionais. Essas regulamentações escapam, portanto, ao âmbito de aplicação do artigo 30. do Tratado (n. 17).

14 No acórdão Punto Casa e PPV, já referido, o Tribunal de Justiça verificou antes de mais que, tratando-se de uma regulamentação que dizia respeito às circunstâncias em que as mercadorias podiam ser vendidas aos consumidores, como a que estava em causa, estavam reunidas no caso de figura as condições exigidas para a aplicação do acórdão Keck e Mithouard, já referido (n. 13). O Tribunal verificou em seguida que a regulamentação em causa se aplicava, sem distinguir consoante a origem dos produtos em causa, a todos os operadores em questão e não afectava a comercialização dos produtos em proveniência de outros Estados-Membros de modo diferente da dos produtos nacionais (n. 14).

15 Nestas circunstâncias, o Tribunal declarou que o artigo 30. do Tratado CEE deve ser interpretado no sentido de que não se aplica a uma regulamentação nacional em matéria de horário de abertura do comércio que é oponível a todos os operadores económicos que exercem actividades no território nacional e que afecta do mesmo modo, de direito e de facto, a comercialização dos produtos nacionais e a dos produtos em proveniência de outros Estados-Membros.

16 Na sequência da prolação do acórdão Punto Casa e PPV, já referido, o Tribunal de Justiça perguntou ao órgão jurisdicional nacional se o referido acórdão respondia inteiramente às questões por ele suscitadas nos processos C-418/93, C-419/93, C-420/93, C-421/93, C-460/93, C-461/93, C-462/93, C-464/93, C-9/94, C-10/94, C-11/94, C-14/94, C-15/94, C-23/94 e C-24/94, suspensos na pendência do acórdão Punto Casa e PPV.

17 Na sua resposta, o órgão jurisdicional nacional pediu a prossecução da instância nos processos pendentes no Tribunal de Justiça, indicando, no essencial, que, devido à fisionomia particular do mercado comercial italiano, a regulamentação em causa exerce uma discriminação em relação às mercadorias importadas.

18 O órgão jurisdicional nacional salientou nomeadamente que o mercado italiano se caracteriza, por um lado, pela existência de um grande número de pequenos estabelecimentos dirigidos a um público muito limitado e, por outro, pela existência de grandes centros comerciais situados na periferia ou fora das cidades. Tendo em conta o pouco tempo livre de que o consumidor dispõe durante os dias úteis, estes grandes centros só são facilmente acessíveis à clientela aos domingos e a impossibilidade de ter acesso a estes centros com uma facilidade e uma frequência suficientes tem como consequência o desvio da procura para os pequenos estabelecimentos, mais próximos do consumidor, e portanto para os produtos nacionais, porque, nestes pequenos estabelecimentos, não se encontram geralmente as mesmas variedades e quantidades de produtos estrangeiros.

19 Nestas circunstâncias, o órgão jurisdicional nacional considerou que a regulamentação em causa não afectava de facto do mesmo modo a comercialização dos produtos nacionais e a dos produtos em proveniência de outros Estados-Membros.

20 Foi nesta mesma ordem de ideias que o órgão jurisdicional nacional fundamentou e formulou as suas questões no processo C-332/94.

21 Segundo os demandantes, a legislação nacional produz efectivamente os efeitos descritos pelo órgão jurisdicional nacional não estando assim satisfeitas as condições enunciadas no acórdão Keck e Mithouard.

22 A Comune di Terlizzi, demandada no processo C-9/94, o Governo helénico e a Comissão consideram em contrapartida que o acórdão Punto Casa e PPV, já referido, dá uma resposta exaustiva e correcta à questão relativa ao artigo 30. colocada pelo órgão jurisdicional nacional.

23 Convém a este respeito salientar que, nos presentes processos, as observações apresentadas pelo órgão jurisdicional nacional quanto aos efeitos da regulamentação nacional em causa são no essencial idênticas às que tinha apresentado nos processos que deram origem ao acórdão Punto Casa e PPV, já referido.

24 Nestas circunstâncias, cabe observar que não se afigura que a regulamentação controvertida tenha por objecto regular o comércio de mercadorias entre Estados-Membros ou que, considerada no seu conjunto, possa implicar uma desigualdade de tratamento entre produtos nacionais e produtos importados no que diz respeito ao seu acesso ao mercado. A este respeito, recorde-se que as regulamentações nacionais que restringem em geral o comércio de um produto e, em consequência, a sua importação, não podem ser, só por este motivo, consideradas como limitando a possibilidade de estes produtos importados terem acesso ao mercado em mais larga medida que os produtos nacionais análogos. Como o Tribunal salientou no n. 13 do acórdão Keck e Mithouard, já referido, o facto de uma legislação nacional ser susceptível de restringir, num plano geral, o volume das vendas e, por conseguinte, o dos produtos em proveniência de outros Estados-Membros não basta para qualificar a referida legislação de medida de efeito equivalente a uma restrição quantitativa à importação.

25 Além disso, o Tribunal de Justiça tem reiteradamente reconhecido que uma regulamentação nacional como a aqui em causa prossegue um objectivo que se justifica à luz do direito comunitário. Com efeito, as regulamentações nacionais que restringem a abertura dos estabelecimentos comerciais ao domingo constituem a expressão de determinadas opções relacionadas com as especificidades socioculturais nacionais ou regionais. Incumbe aos Estados-Membros proceder a essas opções no respeito das exigências impostas pelo direito comunitário (v., nomeadamente, acórdão de 16 de Dezembro de 1992, B & Q, C-169/91, Colect., p. I-6635, n. 11).

26 A este respeito, o Tribunal declarou, no acórdão B & Q, já referido, que a proibição prevista no artigo 30. não se aplica a uma regulamentação nacional que proíbe os estabelecimentos de comércio a retalho de abrirem ao domingo.

27 Cabe, por fim, verificar que, na presente instância, não foi apresentado qualquer elemento novo que possa eventualmente justificar uma apreciação diferente da feita pelo Tribunal nos acórdãos Punto Casa e PPV, e B & Q, já referidos.

28 Convém, portanto, responder ao órgão jurisdicional nacional que o artigo 30. do Tratado deve ser interpretado no sentido de que não se aplica a uma regulamentação nacional em matéria de horário de abertura do comércio que é oponível a todos os operadores económicos que exercem actividades no território nacional e que afecta do mesmo modo, de direito e de facto, a comercialização dos produtos nacionais e a dos produtos em proveniência de outros Estados-Membros.

Quanto ao artigo 52. do Tratado e à Directiva 64/223

29 No processo C-332/94, o juiz nacional pergunta além disso se o artigo 52. do Tratado ou a Directiva 64/223, relativa à realização da liberdade de estabelecimento e da livre prestação de serviços nas actividades relacionadas com o comércio por grosso, se opõem a uma regulamentação nacional em matéria de horário de abertura do comércio como a que está em causa no processo principal.

30 Tratando-se da Directiva 64/223, convém salientar que a mesma tem por objecto a realização, no domínio das actividades relacionadas com o comércio por grosso, da liberdade de estabelecimento, tal como é garantida, com efeito directo após o termo do período de transição, pelo artigo 52. do Tratado (v., neste sentido, acórdão de 12 de Novembro de 1987, Conradi e o., 198/86, Colect., p. 4469, n. 8).

31 Daqui resulta que, no caso de figura, não há que examinar a Directiva 64/223 independentemente do artigo 52. do Tratado.

32 No que diz respeito ao artigo 52. , basta verificar que, como já foi salientado, a legislação em causa é oponível a todos os operadores que exercem actividades no território nacional, que não tem, além disso, por objecto regular as condições relativas ao estabelecimento das empresas em causa e que, por fim, os efeitos restritivos que possa produzir na liberdade de estabelecimento são demasiado aleatórios e demasiado indirectos para que se possa considerar que a obrigação imposta pela mesma é susceptível de entravar esta liberdade.

33 Daqui resulta que nem o artigo 52. do Tratado nem a Directiva 64/223 se opõem a uma regulamentação em matéria de horário de abertura do comércio como a que está em causa no processo principal.

Quanto à Directiva 83/189

34 No processo C-332/94, o órgão jurisdicional nacional procura enfim saber se a Directiva 83/189, relativa a um procedimento de informação no domínio das normas e regulamentações técnicas, na redacção dada pela Directiva 88/182, se aplica a uma regulamentação nacional em matéria de horário de abertura do comércio como a que está em causa no processo principal.

35 A este respeito, basta verificar que, independentemente da aplicabilidade da directiva na altura dos factos controvertidos, a mesma não se aplica ratione materiae a uma regulamentação nacional em matéria de horário de abertura do comércio como a que está em causa no processo principal.

36 Com efeito, a obrigação de comunicação prévia aplica-se, segundo o artigo 8. da directiva, a qualquer projecto de regra técnica.

37 O conceito de "regra técnica" é definido no artigo 1. , alínea 5), da Directiva 83/189 como visando "as especificações técnicas, incluindo as disposições administrativas que se lhes referem, cujo respeito é obrigatório, de jure ou de facto, para a comercialização ou a utilização num Estado-Membro ou numa parte importante deste Estado, com excepção das fixadas pelas autoridades locais". Em conformidade com a alínea 1) do mesmo artigo, a expressão "especificação técnica" visa "a especificação que consta de um documento que define as características exigidas de um produto, tais como os níveis de qualidade ou de propriedade de utilização, a segurança, as dimensões, incluindo as prescrições aplicáveis ao produto no que respeita à terminologia, aos símbolos, aos ensaios e métodos de ensaio, à embalagem, à marcação e à rotulagem...".

38 Assim, a obrigação de comunicação prevista pela directiva não se aplica a uma regulamentação nacional que não rege as características exigidas de um produto, mas se limita a regular o horário de abertura do comércio.

39 Daqui resulta que a Directiva 83/189 não se aplica a uma regulamentação nacional em matéria de horário de abertura do comércio como a que está em causa no processo principal.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

40 As despesas efectuadas pelo Governo helénico e pela Comissão das Comunidades Europeias, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção),

pronunciando-se sobre as questões submetidas pela Pretura circondariale di Roma, sezione distaccata di Castelnuovo di Porto, por despachos de 18 de Julho, 28 de Outubro, 11 de Novembro, 2 e 16 de Dezembro de 1993, bem como de 10 de Outubro de 1994, declara:

1) O artigo 30. do Tratado CE deve ser interpretado no sentido de que não se aplica a uma regulamentação nacional em matéria de horário de abertura do comércio que é oponível a todos os operadores económicos que exercem actividades no território nacional e que afecta do mesmo modo, de direito e de facto, a comercialização dos produtos nacionais e a dos produtos em proveniência de outros Estados-Membros.

2) O artigo 52. do Tratado CE e a Directiva 64/223/CEE do Conselho, de 25 de Fevereiro de 1964, relativa à realização da liberdade de estabelecimento e da livre prestação de serviços nas actividades relacionadas com o comércio por grosso, não se opõem a uma regulamentação em matéria de horário de abertura do comércio como a que está em causa no processo principal.

3) A Directiva 83/189/CEE do Conselho, de 28 de Março de 1983, relativa a um procedimento de informação no domínio das normas e regulamentações técnicas, na redacção dada pela Directiva 88/182/CEE do Conselho, de 22 de Março de 1988, não se aplica a uma regulamentação nacional em matéria de horário de abertura do comércio como a que está em causa no processo principal.