61993J0002

ACORDAO DO TRIBUNAL (SEXTA SECCAO) DE 2 DE JUNHO DE 1994. - EXPORTSLACHTERIJEN VAN OORDEGEM BVBA CONTRA BELGISCHE DIENST VOOR BEDRIJFSLEVEN EN LANDBOUW E GENERALE BANK NV. - PEDIDO DE DECISAO PREJUDICIAL: RECHTBANK VAN EERSTE AANLEG BRUSSEL - BELGICA. - PESTE SUINA - MEDIDAS DE APOIO AO MERCADO - CAUCAO - REGULAMENTO (CEE) NO. 2351/90 DA COMISSAO. - PROCESSO C-2/93.

Colectânea da Jurisprudência 1994 página I-02283


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


++++

1. Agricultura ° Política Agrícola Comum ° Financiamento pelo FEOGA ° Obrigações dos Estados-membros ° Adopção de medidas susceptíveis de garantir a regularidade das despesas ° Criação de um regime de prestação de caução no âmbito do mecanismo instituído pela Comunidade para apoiar o sector da carne de suíno afectado por epizootia ° Admissibilidade

(Tratado CEE, artigo 5. ; Regulamento n. 729/70 do Conselho, artigo 8. , n. 1; Regulamento n. 2351/90 da Comissão)

2. Agricultura ° Organização comum de mercado ° Carne de suíno ° Medidas de apoio ao mercado afectado por epizootia ° Compra de carne, a expensas da Comunidade, pelo organismo nacional de intervenção ° Medida nacional de aplicação que sujeita o pagamento do preço de aquisição à constituição de uma caução ° Inobservância pelo vendedor de uma das suas obrigações principais ° Perda total da caução ° Admissibilidade

(Regulamento n. 2351/90 da Comissão)

Sumário


1. O artigo 8. , n. 1, do Regulamento n. 729/70, que constitui, no domínio da gestão financeira da Política Agrícola Comum, uma expressão das obrigações impostas aos Estados-membros pelo artigo 5. do Tratado, obriga estes últimos a tomarem as medidas necessárias para verificar a realidade e a regularidade das operações financiadas pelo FEOGA, mesmo que tais medidas não estejam expressamente previstas na regulamentação comunitária que aqueles aplicam.

Na adopção dessas medidas, as autoridades nacionais devem proceder com a mesma diligência que empregam para a execução de legislação nacional correspondente, de modo a evitar todo e qualquer entrave à eficácia do direito comunitário e respeitar o princípio da proporcionalidade.

Assim, há que considerar que o citado artigo habilitava um Estado-membro a criar, a nível nacional, no âmbito do mecanismo instituído pela Comunidade para apoiar o sector da carne de suíno afectado por uma epidemia de peste suína, um regime que sujeitava o pagamento aos operadores económicos da carne adquirida, a expensas da Comunidade, pelo organismo de intervenção, à prestação de caução pelos referidos operadores.

2. Dado que a regulamentação comunitária relativa à execução da Política Agrícola Comum prevê normalmente, com toda a justeza, a perda da caução constituída por um operador económico para garantir que seja levada a bom termo uma operação financiada pelos fundos comunitários, quando esse operador não cumpre uma das suas obrigações que possa ser considerada importante e principal, isto é, uma obrigação essencial para alcançar o objectivo prosseguido pela medida em causa, o mesmo tipo de sanção pode ser instituído através de medidas nacionais de execução da Política Agrícola Comum.

Assim, o direito comunitário não se opunha a que as medidas nacionais adoptadas para garantir a aplicação do Regulamento n. 2351/90, que adopta medidas excepcionais de apoio ao mercado no sector da carne de suíno afectado por uma epidemia de peste suína, estabelecessem que a totalidade da caução prestada pelo operador que tivesse beneficiado das medidas de aquisição pelo organismo nacional de intervenção seria considerada perdida em caso de inobservância de uma das suas obrigações principais, designadamente no caso de ser entregue carne não proveniente da zona de produção afectada pela epizootia ou não pertencente às categorias enumeradas nas disposições aplicáveis do citado regulamento.

Partes


No processo C-2/93,

que tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 177. do Tratado CEE, pelo presidente do Rechtbank van eerste aanleg te Brussel, destinado a obter, no litígio pendente neste órgão jurisdicional entre

Exportslachterijen van Oordegem BVBA

e

1) Belgische Dienst voor Bedrijfsleven en Landbouw,

2) Generale Bank NV,

uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação dos Regulamentos (CEE) n. 729/70 do Conselho, de 21 de Abril de 1970, relativo ao financiamento da política agrícola comum (JO L 94, p. 13; EE 03 F3 p. 220), e n. 2351/90 da Comissão, de 9 de Agosto de 1990, que adopta medidas excepcionais de apoio ao mercado no sector da carne de suíno na Bélgica e revoga o Regulamento (CEE) n. 906/90 (JO L 215, p. 9),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sexta Secção),

composto por: G. F. Mancini, presidente de secção, C. N. Kakouris(relator), F. A. Schockweiler, P. J. G. Kapteyn e J. L. Murray, juízes,

advogado-geral: C. O. Lenz

secretário: L. Hewlett, administradora

vistas as observações escritas apresentadas:

- em representação da Exportslachterijen van Oordegem BVBA, por M. Denys, advogado no foro de Bruxelas,

- em representação do Belgische Dienst voor Bedrijfsleven en Landbouw, por M. Fruy e B. De Moor, advogados no foro de Bruxelas,

- em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por Th. van Rijn, membro do Serviço Jurídico, na qualidade de agente,

visto o relatório para audiência,

ouvidas as alegações da Exportslachterijen van Oordegem BVBA, representada por P. Flamey e P. Jongbloet, advogados no foro de Bruxelas, do Belgische Dienst voor Bedrijfsleven en Landbouw e da Comissão, na audiência de 3 de Fevereiro de 1994,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 10 de Março de 1994,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por despacho de 16 de Dezembro de 1992, que deu entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 4 de Janeiro de 1993, o presidente do Rechtbank van eerste aanleg te Brussel colocou, em aplicação do artigo 177. do Tratado CEE, duas questões prejudiciais relativas à interpretação do Regulamento (CEE) n. 729/70 do Conselho, de 21 de Abril de 1970, relativo ao financiamento da política agrícola comum (JO L 94, p. 13; EE 03 F3 p. 220, a seguir "Regulamento n. 729/70") e do Regulamento (CEE) n. 2351/90 da Comissão, de 9 de Agosto de 1990, que adopta medidas excepcionais de apoio ao mercado no sector da carne de suíno na Bélgica e revoga o Regulamento (CEE) n. 906/90 (JO L 215, p. 9, a seguir "Regulamento n. 2351/90").

2 Essas questões foram suscitadas no âmbito de um litígio que opõe a sociedade belga Exportslachterijen van Oordegem ao Belgische Dienst voor Bedrijfsleven en Landbouw (organismo belga da economia e da agricultura, a seguir "OBEA", organismo nacional de intervenção em matéria de aplicação da política agrícola comum, e à sociedade Generale Bank, a propósito da legalidade de uma obrigação de caução instituída pela regulamentação belga.

3 Resulta dos autos que, no início de 1990, em certas regiões da Bélgica de forte concentração de criação de suínos se declarou a peste suína clássica. Para lhe fazer face, o Estado belga e a Comissão das Comunidades Europeias adoptaram um certo número de medidas.

4 No âmbito das medidas que adoptou para evitar a propagação da epizootia, o Estado belga instituiu, designadamente, em função da gravidade da situação, três zonas: uma zona de protecção (I) em redor do foco de infecção, à volta desta, uma zona de vigilância (II) e, em redor desta última, uma zona tampão (III).

5 Em termos comunitários, o Regulamento n. 2351/90 previa diferentes medidas, em função da zona em causa. Em primeiro lugar, os artigos 1. e 3. previam a compra de suínos vivos provenientes da zona de protecção (I), destinados a ser destruídos. Seguidamente, os artigos 4. a 8. eram aplicáveis à carne de suínos provenientes da zona tampão (III) que, após tratamento térmico, podia ser transformada normalmente e utilizada para a alimentação humana. Podiam ser concedidas ajudas financeiras, após a constituição de uma garantia, para a transformação e a armazenagem privada das carnes que não pudessem ser transformadas com suficiente rapidez. Finalmente, os artigos 9. e 10. previam a compra pela OBEA, a expensas da Comunidade, até aos limites das quantidades máximas e aos preços fixados no regulamento em questão, de carne de suíno proveniente da mesma zona tampão. Esta carne destinava-se a ser destruída, ou seja, transformada em produtos impróprios para consumo humano. São estas últimas medidas que estão na origem do litígio no processo principal.

6 Estas medidas excepcionais de apoio ao mercado deixaram de vigorar em Outubro de 1990.

7 Em execução do Regulamento n. 2351/90, a OBEA adoptou as instruções n. 55.200, que regulavam as modalidades de celebração dos contratos de compra das carnes em questão pela OBEA aos matadouros e fixava as condições dessas compras.

8 Os artigos I e IX das instruções previam que, ao apresentar um pedido de compra, o matadouro comprometia-se a preencher, sem reservas nem restrições, todas as obrigações impostas pelas instruções. O artigo XII dispunha finalmente que as facturas relativas ao pagamento da mercadoria deviam ser acompanhadas da prova da constituição de uma garantia igual a 110% do montante exigido (IVA incluído) e que essa garantia seria liberada quando a OBEA dispusesse da prova de que todas as condições previstas nas instruções tinham sido respeitadas.

9 Em Agosto de 1990, a OBEA celebrou com a empresa BVBA Exportslachterijen van Oordegem, que o solicitara, contratos para a aquisição de determinadas quantidades de carne de suíno proveniente da zona tampão (III). Nos termos das instruções n. 55.200, a empresa em questão constituiu junto da sociedade Generale Bank uma garantia a favor da OBEA.

10 Controlos posteriormente efectuados nos entrepostos frigoríficos em que a carne estava armazenada revelaram que esta não correspondia ao produto que a empresa tinha vendido à OBEA ao abrigo dos referidos contratos. Deste modo, a OBEA reclamou a devolução do preço que já pagara à empresa, alegando que, se necessário fosse, se faria pagar pela garantia prestada.

11 A sociedade Exportslachterijen van Oordegem apresentou um pedido de medidas provisórias ao presidente do Rechtban van eerste aanleg te Brussel, requerendo que a Generale Bank fosse proibida de pagar a garantia em questão à OBEA. Em apoio do seu pedido, a empresa afirmou que a constituição da garantia era ilegal, dado não estar prevista na legislação comunitária aplicável.

12 Tendo em conta esta argumentação, o órgão jurisdicional nacional suspendeu a instância e colocou ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

"O Estado belga, através da actuação do Organismo Belga da Economia e da Agricultura (OBEA), viola o Regulamento (CEE) n. 2351/90 da Comissão, de 9 de Agosto de 1990, ao exigir previamente, no artigo XII das instruções n. 55.200, uma caução para pagamento, a expensas da Comunidade Europeia, do preço de compra de carne de porco contaminada pela peste suína?

1) O direito comunitário permite que o organismo de intervenção belga, com base no disposto, entre outros, no artigo 8. do Regulamento (CEE) n. 729/70 do Conselho, de 21 de Abril de 1970, no quadro das medidas tomadas para combater a peste suína, em especial a compra de carne de porco pelo organismo de intervenção, de acordo com o Regulamento (CEE) n. 2351/90 da Comissão, de 9 de Agosto de 1990, exija a prestação prévia de uma caução para pagamento, a expensas da Comunidade Europeia, do preço de compra da carne de porco originária da zona tampão?

2.a) A importância de um combate firme da peste suína e a necessidade de uma rigorosa aplicação das medidas tomadas pala Comissão permitem que, independentemente da importância das desconformidades e/ou ilegalidades, seja exigida e definitivamente adquirida pela parte que a exige a totalidade da garantia?

2.b) O organismo belga de intervenção, o OBEA, caso o Tribunal de Justiça venha a decidir que a referida garantia não pode ser exigida na sua totalidade, pode, atentos os resultados das amostragens realizadas nos controlos das mercadorias vendidas, calcular por extrapolação uma percentagem global que não corresponda às condições de que depende a exigência de restituição das quantias pagas e, se assim for, pode fazer-se pagar pela garantia?"

Quanto à primeira questão

13 Através da primeira questão, pergunta-se no essencial se, no âmbito das medidas tomadas para combater a peste suína, em especial da compra de carne de suíno pelo organismo de intervenção, nos termos do Regulamento n. 2351/90, um Estado-membro está autorizado, com base no artigo 8. do Regulamento n. 729/70, a sujeitar o pagamento, a expensas da Comunidade, do preço de compra da carne de suíno originária da "zona tampão" à prestação de uma caução.

14 Cabe observar que, nos actos específicos que comportam a adopção de medidas de aplicação da política agrícola comum bem como a utilização de meios do Fundo Europeu de Orientação e de Garantia Agrícola (a seguir "FEOGA"), o legislador comunitário não adopta geralmente disposições pormenorizadas em matéria de processos de controlo, deixando aos Estados-membros a liberdade de regularem as modalidades desse controlo em função da sua própria ordem jurídica e sob sua responsabilidade, optando pela solução mais adequada. Esta repartição de competências é, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, conforme às concepções gerais que inspiram a organização comum dos mercados agrícolas (v. acórdão de 6 de Maio de 1982, BayWa/BALM, 146/81, 192/81 e 193/81, Recueil, p. 1503, n.os 20 e 21).

15 No caso vertente, o Regulamento n. 2351/90 da Comissão, que adoptava medidas excepcionais a fim de fazer face a uma situação urgente, não instaurou um sistema completo no que respeita às medidas de apoio ao mercado da carne de suíno no Estado-membro em causa e, designadamente, não previa disposições destinadas a assegurar o respeito pelas obrigações que criava para os operadores económicos que beneficiavam da aquisição, graças a fundos comunitários, da carne proveniente da zona tampão.

16 No que respeita à utilização de fundos comunitários afectos, como no presente caso, à execução da política agrícola comum, o artigo 8. , n. 1, do Regulamento n. 729/70, que constitui a regulamentação de base das obrigações da Comunidade e dos Estados-membros em matéria de financiamento da política agrícola comum, dispõe:

"Os Estados-membros tomarão, de acordo com as disposições legislativas, regulamentares e administrativas nacionais, as medidas necessárias para:

- se assegurar da realidade e da regularidade das operações financiadas pelo Fundo;

- evitar e proceder judicialmente relativamente às irregularidades;

- recuperar as importâncias perdidas após as irregularidades ou negligências.

..."

17 Esta disposição, que constitui, neste domínio específico, uma expressão das obrigações impostas aos Estados-membros pelo artigo 5. do Tratado, define, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, os princípios segundo os quais a Comunidade e os Estados-membros devem organizar a execução das decisões comunitárias de intervenção agrícola financiadas pelo FEOGA, bem como o combate à fraude e às irregularidades relacionadas com estas operações (v. acórdão BayWa, já referido, n. 13).

18 Deste modo, o artigo citado impõe aos Estados-membros a obrigação geral de tomarem as medidas necessárias para verificar a realidade e a regularidade das operações financiadas pelo FEOGA, mesmo que o acto comunitário específico não preveja expressamente a adopção de uma concreta medida de controlo (v. acórdão de 12 de Junho de 1990, Alemanha/Comissão, C-8/88, Colect., p. I-2321, n.os 16 e 17).

19 Importa sublinhar, além disso, no que toca às medidas de controlo adoptadas a nível nacional com vista à aplicação das regras comunitárias em matéria de política agrícola comum, que as autoridades nacionais devem proceder com a mesma diligência que empregam para a execução de legislação nacional correspondente, de modo a evitar todo e qualquer entrave à eficácia do direito comunitário (v. acórdão BayWa, já referido, n. 22).

20 Por outro lado, estas medidas nacionais devem ser conformes ao princípio geral da proporcionalidade, isto é, não devem ultrapassar os limites daquilo que é adequado e necessário para alcançar o objectivo pretendido (v. acórdão de 18 de Fevereiro de 1982, Zuckerfabrik Franken, 77/81, Recueil, p. 681).

21 Coloca-se portanto a questão de saber se as medidas tomadas a nível nacional podem prever a instituição de uma obrigação de caução como a que está em causa no processo principal.

22 Observe-se que um sistema de caução constitui um meio frequentemente utilizado pelos actos comunitários para a execução da política agrícola comum [v., por exemplo, o Regulamento (CEE) n. 1974/80 da Comissão, de 22 de Julho de 1980, que estabelece regras gerais de aplicação para a execução de certas acções de ajuda alimentar sob a forma de cereais e arroz (JO L 192, p. 11; EE 03 F18 p. 202), o Regulamento (CEE) n. 434/82 da Comissão, de 25 de Fevereiro de 1982, relativo a uma adjudicação permanente para a mobilização de açúcar branco comunitário a fornecer à Agência de Assistência e de Obras das Nações Unidas para os Refugiados da Palestina (UNRWA) a título de ajuda alimentar (JO L 55, p. 34) e o Regulamento (CEE) n. 2373/83 da Comissão, de 22 de Agosto de 1983, que estabelece as modalidades de aplicação da destilação referida no artigo 11. do Regulamento (CEE) n. 337/79 para a campanha vitícola 1983/1984 (JO L 232, p. 5]. Consequentemente, os Estados-membros podem igualmente instituir uma medida desse tipo.

23 Sublinhe-se também que, como justamente observa a OBEA, o sistema de caução em causa comportava vantagens para os operadores económicos beneficiários das medidas de apoio comunitárias, uma vez que lhes permitia ser imediatamente pagos, sem terem que esperar os resultados dos posteriores controlos.

24 Assim, há que responder à primeira questão que, no âmbito das medidas tomadas para combater a peste suína, nos termos do Regulamento n. 2351/90 da Comissão, um Estado-membro estava habilitado, com base no artigo 8. do Regulamento n. 729/70, a sujeitar o pagamento, a expensas da Comunidade, do preço de compra da carne de suíno originária da "zona tampão" à prestação de uma caução.

Quanto à segunda questão

25 Através da primeira parte da segunda questão colocada, o juiz nacional pretende saber, no essencial, se os Estados-membros estariam autorizados a prever, quando o operador em questão não cumprisse as obrigações decorrentes do Regulamento n. 2351/90, que a caução fosse totalmente perdida, independentemente da gravidade das irregularidades cometidas.

26 A este propósito, importa assinalar que os actos comunitários que se destinam a dar execução à política agrícola comum prevêem normalmente a perda total da caução exigida em caso de inobservância, por parte do beneficiário de uma medida comunitária, de uma das suas obrigações que possa ser considerada importante e principal, isto é, uma obrigação essencial para alcançar o objectivo prosseguido pela medida em causa.

27 É jurisprudência assente que, em tal caso, a perda total da caução prestada ou, mais genericamente, a circunstância de se ser de todo impedido de beneficiar de uma medida comunitária favorável, se justifica à luz do princípio da proporcionalidade, conforme acima referido (v. acórdão de 2 de Dezembro de 1982, RU-MI, 272/81, Recueil, p. 4167). Consequentemente, a perda total da caução prevista numa regulamentação nacional adoptada em execução de medidas comunitárias deve igualmente considerar-se justificada em situações análogas.

28 Tendo em conta as circunstâncias do processo principal, designadamente os resultados dos controlos efectuados necessariamente por amostragem, neste caso, como justamente observa a Comissão, é de considerar como principal a obrigação que incumbe ao operador económico em causa de entregar à OBEA produtos provenientes exclusivamente da zona do território belga afectada pela peste suína. Esta obrigação é efectivamente inerente à própria natureza e ao objectivo prosseguido pela medida comunitária em questão. Do mesmo modo, impõe-se qualificar como principal a obrigação que incumbe a este mesmo operador de entregar à OBEA produtos pertencentes exclusivamente às categorias enumeradas nas disposições aplicáveis do Regulamento n. 2351/90. De facto, as disposições comunitárias que dão direito a prestações financiadas por fundos comunitários devem ser objecto de interpretação estrita (v. acórdão BayWa, já referido, n. 10).

29 Assim, há que responder à primeira parte da segunda questão que o direito comunitário autorizava os Estados-membros a preverem, no quadro da aplicação do Regulamento n. 2351/90, que a totalidade da caução prestada seria considerada perdida em caso de inobservância de uma das obrigações principais pelo beneficiário das medidas comunitárias em causa.

30 Tendo em conta a resposta dada à primeira parte desta questão, não há que responder à sua segunda parte.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

31 As despesas efectuadas pela Comissão das Comunidades Europeias, que apresentou observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sexta Secção),

pronunciando-se sobre as questões submetidas pelo presidente do Rechtbank van eerste aanleg te Brussel, por despacho de 16 de Dezembro de 1992, declara:

1) No âmbito das medidas tomadas para combater a peste suína, nos termos do Regulamento (CEE) n. 2351/90 da Comissão, de 9 de Agosto de 1990, que adopta medidas excepcionais de apoio ao mercado no sector da carne de suíno na Bélgica e revoga o Regulamento (CEE) n. 906/90, um Estado-membro estava habilitado, com base no artigo 8. do Regulamento (CEE) n. 729/70 do Conselho, de 21 de Abril de 1970, relativo ao financiamento da política agrícola comum, a sujeitar o pagamento, a expensas da Comunidade, do preço de compra da carne de suíno originária da "zona tampão" à prestação de uma caução.

2) O direito comunitário autorizava os Estados-membros a preverem, no quadro da aplicação do Regulamento (CEE) n. 2351/90, que a totalidade da caução prestada seria considerada perdida em caso de inobservância de uma das obrigações principais pelo beneficiário das medidas comunitárias em causa.