61992J0012

ACORDAO DO TRIBUNAL (QUINTA SECCAO) DE 7 DE DEZEMBRO DE 1993. - PROCESSO-CRIME CONTRA EDMOND HUYGEN E OUTROS. - PEDIDO DE DECISAO PREJUDICIAL: HOF VAN CASSATIE - BELGICA. - ACORDO DE COMERCIO LIVRE CEE-AUSTRIA - CONCEITO DE PRODUTO ORIGINARIO - METODOS DE COOPERACAO ADMINISTRATIVA. - PROCESSO C-12/92.

Colectânea da Jurisprudência 1993 página I-06381


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


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Acordos internacionais ° Acordo CEE-Áustria ° Protocolo n. 3 ° Origem das mercadorias ° Prova através do certificado EUR.1 ° Controlo a posteriori do certificado não conducente a um resultado positivo ° Consequências ° Tomada em consideração de outras provas ou possibilidade de o importador invocar o princípio de força maior ° Condições

(Acordo CEE-Áustria, protocolo n. 3)

Sumário


O protocolo n. 3, relativo à definição da noção de "produtos originários" e aos métodos de cooperação administrativa, anexo ao acordo entre a Comunidade Económica Europeia e a República da Áustria, que institui, no âmbito do comércio livre que o acordo visa concretizar, um regime preferencial para os produtos originários da Áustria ou da Comunidade, deve ser interpretado no sentido de que quando o Estado de exportação, a quem é pedido o controlo a posteriori do certificado de origem EUR.1, não chega a determinar a origem exacta da mercadoria, deve concluir que esta é de origem desconhecida e que, por isso, o certificado EUR.1 e a pauta preferencial foram concedidos indevidamente.

Todavia, numa situação em que as autoridades aduaneiras do Estado de exportação, face à impossibilidade de fornecer a prova normal da origem da mercadoria prevista no protocolo, não estão em condições de efectuar regularmente o referido controlo, o Estado de importação não fica definitivamente vinculado, para efeitos de reclamação do pagamento dos direitos aduaneiros não satisfeitos, pelo resultado negativo deste controlo, podendo tomar em consideração outras provas da origem das mercadorias.

Um importador pode, aliás, segundo as circunstâncias, invocar a título de força maior a impossibilidade em que se encontram as autoridades aduaneiras do Estado de exportação, em virtude da sua própria negligência, de determinar a exactidão da origem duma mercadoria no âmbito dum controlo a posteriori. Cabe ao órgão jurisdicional nacional apreciar o conjunto dos factos invocados a esse respeito.

Partes


No processo C-12/92,

que tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 177. do Tratado CEE, pela Hof van Cassatie van België, destinado a obter, no processo penal pendente neste órgão jurisdicional contra

Edmond Huygen e o.,

uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação do acordo entre a Comunidade Económica Europeia e a República da Áustria, assinado em Bruxelas em 22 de Julho de 1972, concluído e aprovado, em nome da Comunidade, por força do Regulamento (CEE) n. 2836/72 do Conselho, de 19 de Dezembro de 1972 (JO L 300, p. 1; EE 11 F2 p. 3) e do protocolo n. 3 que lhe está anexo,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção),

composto por: J. C. Moitinho de Almeida, presidente de secção, R. Joliet e G. C. Rodríguez Iglesias, juízes,

advogado-geral: C. Gulmann,

secretário: H. A. Ruehl, administrador principal,

vistas as observações escritas apresentadas:

° em representação do Governo belga, por Ignace Claeys Bouuaert, advogado junto da Cour de cassation da Bélgica,

° em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por Marie-Josée Jonczy, consultora jurídica, e Ben Smulders, membro do serviço jurídico, na qualidade de agentes,

visto o relatório para audiência,

ouvidas as alegações de E. Huygen e o., representados por Ch. Kremer, advogado do foro do Luxemburgo, do Governo belga, e da Comissão, na audiência de 1 de Abril de 1993,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 18 de Maio de 1993,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por despacho de 7 de Janeiro de 1992, entrado na Secretaria do Tribunal de Justiça em 13 de Janeiro seguinte, a Hof van Cassatie van België submeteu, nos termos do artigo 177. do Tratado CEE, três questões prejudiciais sobre a interpretação do acordo entre a Comunidade Económica Europeia e a República da Áustria, assinado em Bruxelas em 22 de Julho de 1972, concluído e aprovado, em nome da Comunidade, por força do Regulamento (CEE) n. 2836/72 do Conselho, de 19 de Dezembro de 1972 (JO L 300, p. 1; EE 11 F2 p. 3, a seguir "acordo CEE-Áustria") e, em especial, do protocolo n. 3, que lhe está anexo, relativo à definição da noção de "produtos originários" e aos métodos de cooperação administrativa. Este protocolo foi alterado pelo acordo sob a forma de troca de cartas, posto em vigor na Comunidade pelo Conselho nos termos do Regulamento (CEE) n. 3386/84 do Conselho, de 3 de Outubro de 1984, relativo à conclusão do acordo sob forma de troca de cartas que codifica e altera o texto do protocolo n. 3 do acordo entre a Comunidade Económica Europeia e a República da Áustria (JO L 323, p. 1; EE 02 F 11 p. 108).

2 Estas questões foram suscitadas no âmbito de um processo penal instaurado pelo Estado belga contra o director de uma sociedade belga que tinha importado da Áustria, em 1985, uma máquina de colar caixas de expedição desdobráveis, e contra dois empregados da sociedade que tinha efectuado as formalidades de importação.

3 A máquina em causa tinha sido fabricada pela empresa alemã Jagenberg Werke e exportada para a Áustria na sequência da sua compra em 1970 pela empresa austríaca Ernst Schausberger & Co. Em 1985, a máquina foi comprada de novo pela sociedade belga Grafimat, que a importou para a Bélgica. As formalidades de importação foram efectuadas pela sociedade anónima belga E. Depaire.

4 Em 7 de Março de 1985, E Huygen e J.-M. Verraes, empregados da sociedade E. Dupaire, e A. Blockeel, gerente da Grafimat, declararam a mercadoria na alfândega de Courtrai (Bélgica). Para este fim, apresentaram o certificado EUR. 1 n. D 0326846 emitido pela alfândega austríaca ° que indicava que a máquina era originária da Alemanha Ocidental ° para obter uma isenção dos direitos aduaneiros nos termos do regime preferencial instituído pelo acordo CEE-Áustria.

5 Com base nas disposições do protocolo n. 3, anexo a esse acordo, os serviços belgas pediram, no âmbito de um controlo dos dados constantes do certificado EUR.1, informações sobre a origem da máquina às autoridades austríacas. A administração austríaca respondeu por carta de 26 de Março de 1987 que já não podia ser fornecida uma prova concreta da origem das mercadorias pelo exportador alemão da época e que, consequentemente, se devia considerar a mercadoria como um produto de origem indeterminada, relativamente à qual não podia manter-se o certificado.

6 A administração belga decidiu então que o regime preferencial não podia ser aplicado e que as mercadorias em causa deviam ser tributadas com os direitos previstos para o caso da importação de mercadorias de origem desconhecida; consequentemente, a administração belga decidiu exigir o pagamento dos direitos aduaneiros correspondentes. Além disso, E. Huygen, J.-M. Verraes e A. Blockeel foram acusados no Correctionele Rechtbank te Kortrijk com fundamento em violação, por um lado, dos artigos 202. , n.os 1 e 2, e 259. da lei geral relativa às alfândegas e impostos indirectos, reformulada pelo decreto real de 18 de Julho de 1977, confirmado pela lei de 6 de Julho de 1978 e, por outro lado, dos artigos 8. , n. 1, alínea a), 9. , n.os 1 e 2, e 10. , n. 2, do protocolo n. 3 do acordo CEE-Áustria. As sociedades E. Depaire e Grafimat foram demandadas como partes civilmente responsáveis.

7 A sentença proferida na primeira instância, pela qual os arguidos tinham sido absolvidos e as acções cíveis julgadas improcedentes, foi confirmada por acórdão da Hof van Beroep te Gent, proferido em 20 de Setembro de 1989. Resulta do despacho de reenvio que, neste acórdão, a Hof van Beroep constatou que a alfândega austríaca não tinha, na realidade, feito qualquer contacto com a firma austríaca Schausberger, verificação esta baseada em informações prestadas por esta sociedade e no facto de a administração acusadora ter apresentado no decurso da instância uma factura de 25 de Fevereiro de 1970, dirigida a essa mesma sociedade pelo fabricante alemão Jagenberg que mostra a origem alemã ocidental da máquina. A Hof van Beroep concluiu daí que o controlo da origem da máquina não foi concludente e isso era manifestamente imputável à negligência da autoridade aduaneira austríaca. Decidiu, por isso, que a inacção da autoridade austríaca constituía um caso de força maior relativamente aos arguidos.

8 O Estado belga interpôs recurso desse acórdão para a Hof van Cassatie van België. Considerando que os fundamentos invocados no recurso suscitavam problemas de interpretação do direito comunitário, o órgão jurisdicional nacional submeteu ao Tribunal de Justiça as questões prejudiciais seguintes:

"O acordo entre a CEE e a Áustria (Regulamento n. 2886/72 de 19 de Dezembro de 1972, e protocolo n. 3 que lhe está anexo) concede uma pauta preferencial às mercadorias originárias da Áustria ou da Comunidade. A aplicação deste regime preferencial está ligada à origem das mercadorias, o que torna a verificação deste regime um elemento indispensável do sistema:

1) Quando o Estado beneficiário (no caso vertente, a Áustria), a quem se pede para controlar o certificado EUR.1, não pode determinar a origem exacta da mercadoria, deve daí concluir que é de origem desconhecida, de modo que o certificado EUR.1 e a pauta preferencial teriam sido indevidamente atribuídos?

2) Em caso de resposta afirmativa, o Estado importador (no caso vertente, a Bélgica) deve em seguida exigir o pagamento dos direitos aduaneiros não pagos na altura da importação?

3) A impossibilidade em que se encontra a autoridade aduaneira austríaca, em virtude da sua negligência, seja ela 'voluntária' ou não, de provar a exactidão da origem mencionada no certificado EUR.1 por si emitido, constitui um caso de força maior para o importador do Estado-membro de importação (no caso vertente, a Bélgica)?"

9 Para mais ampla exposição dos factos e do enquadramento jurídico do litígio no processo principal, da tramitação processual, bem como das observações escritas apresentadas ao Tribunal de Justiça, remete-se para o relatório para audiência. Estes elementos apenas serão adiante retomados na medida do necessário para a fundamentação da decisão do Tribunal.

Quanto às normas de origem do regime previsto pelo acordo CEE-Áustria

10 Antes de responder às questões submetidas pelo órgão jurisdicional nacional, deve, a título liminar, recordar-se a função e o conteúdo das normas essenciais do acordo e do protocolo relativos à determinação da origem das mercadorias e do controlo a posteriori.

11 O acordo CEE-Áustria, que prevê um regime de comércio livre de mercadorias, aplica-se, segundo o seu artigo 2. , sob reserva de certas especificações, "aos produtos originários da Comunidade e da Áustria". O artigo 11. do acordo prevê que "o protocolo n. 3 estabelece as regras de origem".

12 Nos termos do artigo 1. , n. 2, do protocolo n. 3, devem considerar-se como produtos originários da Comunidade, entre outros, "os produtos inteiramente obtidos na Comunidade" e como produtos originários da Áustria, entre outros, "os produtos inteiramente obtidos na Áustria".

13 Segundo o artigo 8. , n. 1, do protocolo n. 3, os produtos originários na acepção do artigo 1. do protocolo são admitidos ao benefício das disposições do acordo, na importação na Comunidade ou na Áustria, mediante a apresentação de um certificado de circulação das mercadorias denominado "certificado EUR.1". Por força do n. 3, segundo parágrafo, do artigo 9. , este certificado é emitido "pelas autoridades aduaneiras de cada um dos países onde as mercadorias tenham quer permanecido antes de serem reexportadas no estado em que foram importadas, quer sido submetidas às operações ou transformações referidas no artigo 2. deste protocolo, em face da apresentação dos certificados EUR.1 emitidos anteriormente".

14 Nos termos do artigo 10. , n. 3, do protocolo, "dado que o certificado EUR.1 constitui o título justificativo que permite a aplicação do regime pautal e de contingente preferencial previsto no acordo, compete às autoridades aduaneiras do país de exportação tomarem as disposições necessárias para a verificação da origem das mercadorias e para o controlo dos outros elementos enunciados no certificado".

15 Além deste controlo que as autoridades do país de exportação exercem na altura da emissão do certificado EUR.1, o protocolo n. 3 prevê no seu artigo 17. a possibilidade de um controlo a posteriori dos certificados EUR.1, "a título de sondagem ou sempre que as autoridades aduaneiras do país de importação tenham dúvidas fundamentadas quanto à autenticidade do documento ou à exactidão dos esclarecimentos relativos à origem real da mercadoria em causa". O controlo a posteriori é efectuado, a pedido das autoridades aduaneiras do Estado de importação, pelas autoridades aduaneiras do Estado de exportação, as quais comunicam àquelas os resultados.

Quanto à primeira questão

16 Resulta das disposições do acordo e do protocolo acima referidos que só as mercadorias originárias da CEE ou da Áustria beneficiam do regime preferencial previsto pelo acordo e que o certificado EUR.1 constitui o título justificativo dessa origem. O objecto essencial do processo de controlo a posteriori é o de verificar a exactidão da origem indicada em tal certificado, anteriormente emitido.

17 Resulta daí que, quando um tal controlo não permite confirmar a origem da mercadoria indicada no certificado EUR.1, deve concluir-se que este certificado foi indevidamente emitido pelo Estado de exportação e que, consequentemente, esta mercadoria não pode beneficiar do regime preferencial previsto pelo acordo.

18 Deve, pois, responder-se à primeira questão que o protocolo n. 3 do acordo CEE-Áustria deve interpretar-se no sentido de que, quando o Estado de exportação, a quem é pedido o controlo do certificado de origem EUR.1, não chega a determinar a origem exacta da mercadoria, deve concluir que esta é de origem desconhecida e que, por isso, o certificado EUR.1 e a pauta preferencial foram concedidos indevidamente.

Quanto à segunda questão

19 Deve recordar-se, a título liminar, que, em princípio, a reclamação pelo Estado de importação do pagamento dos direitos aduaneiros não safisfeitos na altura de importação é a consequência normal do resultado negativo do controlo a posteriori.

20 Porém, a questão submetida pelo órgão jurisdicional nacional deve ser compreendida à luz das circunstâncias do caso em apreço no processo principal.

21 Estas circunstâncias são caracterizadas nomeadamente, por um lado, pela verificação de facto feita pela Hof van Beroep te Gent e que vincula o órgão jurisdicional de reenvio, segundo a qual há um documento que prova a origem comunitária da mercadoria em causa e, por outro, pela impossibilidade, posta em relevo pela Comissão nas suas observações, de fornecer a prova normal da origem da mercadoria prevista pelo artigo 9. , n. 3, do protocolo n. 3, a saber, o certificado EUR.1 emitido anteriormente, em virtude de a exportação da Alemanha para a Áustria ter ocorrido antes da entrada em vigor do acordo, razão por que o dito certificado não podia ter sido emitido.

22 A segunda questão deve, pois, ser entendida no sentido de que visa substancialmente saber se, em circunstâncias idênticas às do caso em apreço no processo principal, o Estado de importação está definitivamente vinculado, para efeitos de reclamação do pagamento dos direitos aduaneiros não satisfeitos, pelo resultado negativo do controlo a posteriori ou se tem a possibilidade de tomar em consideração outras provas da origem da mercadoria.

23 O artigo 16. , n. 1, do protocolo n. 3 do acordo CEE-Áustria prevê, tendo em vista assegurar a aplicação correcta do protocolo, que as partes do acordo prestam-se mútua assistência para o controlo da autenticidade e da exactidão dos certificados EUR.1. O artigo 17. , n. 3, dispõe que os resultados do controlo a posteriori são dados a conhecer às autoridades aduaneiras do Estado de importação. Devem permitir determinar se o certificado contestado é aplicável às mercadorias realmente exportadas e se estas podem efectivamente dar lugar à aplicação do regime preferencial. Além disso, o segundo parágrafo do mesmo número prevê que, quando estas contestações não puderem ser resolvidas entre as autoridades aduaneiras do Estado de importação e as do Estado de exportação, ou quando levantarem problemas de interpretação deste protocolo, serão submetidas ao comité aduaneiro.

24 Tal como o Tribunal de Justiça declarou no âmbito da interpretação do acordo de comércio livre entre a Comunidade Económica Europeia e a Confederação Helvética, assinado em Bruxelas em 22 de Julho de 1972, concluído e aprovado, em nome da Comunidade, nos termos do Regulamento (CEE) n. 2840/72 do Conselho, de 19 de Dezembro de 1972 (JO L 300, p. 188; EE 11 F2 p. 190), que contém um protocolo n. 3 semelhante ao do acordo CEE-Áustria, a determinação da origem das mercadorias está baseada numa repartição das competências entre as autoridades aduaneiras das partes no acordo, no sentido de que a origem é determinada pelas autoridades do Estado de exportação, sendo o controlo do funcionamento desse regime assegurado graças à cooperação entre as administrações interessadas (acórdão de 12 de Julho de 1984, Les Rapides Savoyards, 218/83, Recueil, p. 3105, n. 26).

25 Neste acórdão, o Tribunal de Justiça pôs em relevo que tal sistema se justifica pelo facto de as autoridades do Estado de exportação estarem mais bem colocadas para verificar directamente os factos que condicionam a origem e este sistema se basear numa repartição de tarefas entre as administrações aduaneiras das partes no acordo de comércio livre e na confiança devida aos actos praticados por essas administrações no âmbito das suas competências respectivas, só podendo funcionar o mecanismo previsto se a administração aduaneira do Estado de importação reconhecer as apreciações efectuadas legalmente pelas autoridades do Estado de exportação.

26 Deve observar-se, todavia, que a finalidade do controlo a posteriori consiste em verificar a exactidão dos certificados EUR.1. É normalmente nos casos em que as autoridades aduaneiras do Estado de importação têm fundadas dúvidas quanto à autenticidade do documento ou à exactidão dos esclarecimentos relativos à origem real da mercadoria em causa que o Estado de exportação deve efectuar esse controlo (artigo 17. , n. 1). O n. 3, terceiro parágrafo, do mesmo artigo prevê que, para efeitos do controlo a posteriori dos certificados EUR.1, os documentos de exportação ou as cópias dos certificados EUR.1 que os substituíram devem ser conservados pelas autoridades aduaneiras do país de exportação, pelo menos durante dois anos.

27 Numa situação como a do caso em apreço no processo principal, em que as autoridades aduaneiras do Estado de exportação não estão em condições de efectuar regularmente o controlo a posteriori previsto pelo protocolo, nenhuma disposição deste comporta a proibição, para as autoridades do Estado de importação, de atingir a finalidade visada pelo referido controlo ° isto é, verificar a autenticidade e a exactidão do certificado EUR.1 ° tomando em consideração outras provas da origem das mercadorias.

28 Deve, pois, responder-se à segunda questão que o protocolo n. 3 do acordo CEE-Áustria deve ser interpretado no sentido de que, em circunstâncias idênticas às do caso em apreço no processo principal, o Estado de importação não fica definitivamente vinculado, para efeitos de reclamação do pagamento dos direitos aduaneiros não satisfeitos, pelo resultado negativo do controlo a posteriori, podendo tomar em consideração outras provas da origem das mercadorias.

Quanto à terceira questão

29 A terceira questão destina-se a saber se um importador pode invocar, a título de força maior, a impossibilidade na qual se encontram as autoridades aduaneiras do Estado de exportação, por causa da sua própria negligência, de provar a exactidão da origem de uma mercadoria no âmbito de um controlo a posteriori.

30 A este propósito, deve recordar-se que, segundo jurisprudência constante, a noção de força maior não tem o mesmo conteúdo nos diversos domínios de aplicação do direito comunitário, devendo o seu significado ser determinado em função do quadro legal no qual está destinado a produzir os seus efeitos (v., por último, o acórdão de 13 de Outubro de 1993, An Bord Bainne Co-operative e Compagnie Inter-Agra, C-124/92, Colect., p. I-5061, n. 10).

31 No caso vertente, deve pôr-se em relevo, por um lado, que a força maior só está expressamente prevista no protocolo n. 3 no seu artigo 12. , relativo ao prazo de apresentação do certificado EUR.1, e que, por outro lado, nenhuma disposição do acordo ou do protocolo prevê as consequências de irregularidades idênticas às verificadas pelo órgão jurisdicional nacional. Na ausência de disposições específicas, o reconhecimento de um caso de força maior pressupõe que a causa exterior invocada pelos sujeitos jurídicos tenha consequências irresistíveis e inevitáveis, de modo a tornar objectivamente impossível, para as pessoas em causa, a observância das suas obrigações (acórdão de 18 de Março de 1980, Valsabbia e.o./Comissão, 154/78, 205/78, 206/78, 226/78 a 228/78, 263/78 e 264/78, 39/79, 31/79, 83/79 e 85/79, Recueil, p. 907, n. 140). O conceito de força maior deve ser entendido no sentido de circunstâncias estranhas ao operador em causa, anormais e imprevisíveis, cujas consequências não poderiam ter sido ser evitadas apesar de toda a diligência empregue, de tal modo que certos comportamentos das autoridades públicas podem constituir, conforme as circunstâncias, caso de força maior (v., nomeadamente, o acórdão de 18 de Março de 1993, Firma Molkerei-Zentrale Sued, C-50/92, Colect., p. I-1035).

32 No âmbito do protocolo n. 3 e, mais especificamente, de um controlo a posteriori, o facto de as autoridades aduaneiras do Estado de exportação não estarem em condições de determinar a exactidão da origem de uma mercadoria constitui, em princípio, uma circunstância anormal, imprevisível e estranha ao importador.

33 No que respeita à condição referente ao facto de o comportamento das autoridades do Estado de exportação ter tido consequências para o importador no sentido de que, apesar de toda a sua diligência, estas só teriam podido ser evitadas à custa de sacrifícios excessivos, compete ao órgão jurisdicional nacional verificar a realidade dos esforços pretensamente desenvolvidos pelo operador económico em causa, à luz das obrigações que o vinculam por força do protocolo n. 3.

34 A este respeito, há que relevar que, embora no sistema previsto pelo acordo e pelo protocolo n. 3, tanto o exportador como o importador sejam responsáveis perante as autoridades aduaneiras pela realidade das suas transacções e pela veracidade das suas declarações, não é menos certo que, como sublinharam a justo título a Comissão e o advogado-geral no ponto 29 das suas conclusões, a obrigação de estar na posse dos documentos justificativos da origem da mercadoria incumbe unicamente ao exportador.

35 Deve, por isso, responder-se à terceira questão que o importador pode, segundo as circunstâncias, invocar a título de força maior a impossibilidade em que se encontram as autoridades aduaneiras do Estado de exportação, em virtude da sua própria negligência, de determinar a exactidão da origem de uma mercadoria no âmbito de um controlo a posteriori. Cabe ao órgão jurisdicional nacional apreciar o conjunto dos factos invocados a esse respeito.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

36 As despesas efectuadas pelo Governo belga e pela Comissão das Comunidades Europeias, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza do incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção),

pronunciando-se sobre as questões submetidas pela Hof van Cassatie van België, por despacho de 7 de Janeiro de 1992, declara:

1) O protocolo n. 3 do acordo CEE-Áustria, assinado em Bruxelas em 22 de Julho de 1972, concluído e aprovado, em nome da Comunidade, nos termos do Regulamento (CEE) n. 2836/72 do Conselho, de 19 de Dezembro de 1972, deve ser interpretado no sentido de que, quando o Estado de exportação, a quem é pedido o controlo do certificado de origem EUR.1, não chega a determinar a origem exacta da mercadoria, deve concluir que esta é de origem desconhecida e que, por isso, o certificado EUR.1 e a pauta preferencial foram indevidamente concedidos.

2) O protocolo n. 3 do acordo CEE-Áustria deve interpretar-se no sentido de que, em circunstâncias idênticas às do caso em apreço no processo principal, o Estado de importação não fica definitivamente vinculado, para efeitos da reclamação do pagamento dos direitos aduaneiros não satisfeitos, pelo resultado negativo do controlo a posteriori, podendo tomar em consideração outras provas da origem da mercadoria.

3) Um importador pode, conforme as circunstâncias, invocar a título de força maior a impossibilidade em que se encontram as autoridades aduaneiras do Estado de exportação, em virtude da sua própria negligência, de determinar a exactidão da origem de uma mercadoria no âmbito de um controlo a posteriori. Cabe ao órgão jurisdicional nacional apreciar o conjunto dos factos invocados a este respeito.