61992C0421

Conclusões do advogado-geral Tesauro apresentadas em 27 de Janeiro de 1994. - GABRIELE HABERMANN-BELTERMANN CONTRA ARBEITERWOHLFAHRT, BEZIRKSVERBANK NDB./OPF. E.V.. - PEDIDO DE DECISAO PREJUDICIAL: ARBEITSGERICHT REGENSBURG, LANDSHUT - ALEMANHA. - DIRECTIVA 76/207/CEE - TRABALHO NOCTURNO DE MULHERES GRAVIDAS. - PROCESSO C-421/92.

Colectânea da Jurisprudência 1994 página I-01657


Conclusões do Advogado-Geral


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Senhor Presidente,

Senhores Juízes,

1. As questões prejudiciais submetidas ao Tribunal de Justiça pelo Arbeitsgericht Regensburg incidem sobre a interpretação de determinadas disposições da Directiva 76/207/CEE do Conselho, de 9 de Fevereiro de 1976, relativa à concretização do princípio da igualdade de tratamento entre homens e mulheres no que se refere ao acesso ao emprego, à formação e promoção profissionais e às condições de trabalho (1) (a seguir "directiva").

O órgão jurisdicional nacional pretende, em especial, que se determine se, na acepção e para os efeitos desta directiva, a aplicação de uma regulamentação nacional que, ao proibir a prestação de trabalho nocturno no decurso da gravidez, permite considerar viciado de nulidade ou, em qualquer caso, invocar a invalidade de um contrato de trabalho celebrado entre uma entidade patronal e uma empregada grávida, ignorando ambas a situação de gravidez no momento da celebração do contrato, é incompatível com o princípio da igualdade de tratamento.

2. É necessário um breve resumo dos contextos normativos comunitário e nacional para compreender os termos da questão.

Por força do artigo 2. , n. 1, da directiva, "o princípio da igualdade de tratamento implica a ausência de qualquer discriminação em razão do sexo, quer directa quer indirectamente, nomeadamente pela referência à situação matrimonial ou familiar". A aplicação deste princípio diz, em especial, respeito às "condições de acesso, incluindo os critérios de selecção, a empregos ou postos de trabalho" (artigo 3. , n. 1), bem como "às condições de trabalho, incluindo as condições de despedimento" (artigo 5. , n. 1). Há por fim que recordar que o artigo 2. , n. 3, da directiva precisa que ela "não constitui obstáculo às disposições relativas à protecção da mulher, nomeadamente no que se refere à gravidez e à maternidade".

De entre as disposições nacionais alemãs pertinentes, deve começar por se recordar o artigo 8. , n. 1, da Mutterschutzgesetz (lei relativa à protecção da maternidade), com base no qual "As mulheres grávidas não podem ser contratadas... para trabalhar de noite entre as 20 horas e as 6 horas...". Para o que aqui tem importância, há que recordar em seguida o artigo 119. do código civil alemão, que determina que "Quem, ao prestar uma declaração de vontade, comete um erro sobre o seu conteúdo... pode invocar a invalidade de tal declaração quando se dever considerar que a não teria prestado se tivesse tido conhecimento da situação de facto e tivesse apreciado a questão com discernimento" (n. 1) e que "constitui também erro sobre o conteúdo da declaração o erro sobre as qualidades da pessoa... consideradas essenciais segundo os usos" (n. 2).

Deve finalmente recordar-se o disposto no artigo 134. , segundo o qual "o acto jurídico contrário a uma proibição legal é nulo, a menos que a lei disponha diferentemente".

3. Regressemos aos factos na origem do presente processo. Em 23 de Março de 1992, G. Habermann, prestadora de cuidados de saúde diplomada em geriatria, foi contratada pelo Arbeiterwohlfahrt, Bezirksverband Niederbayern/Oberpfalz (a seguir "Arbeiterwohlfahrt") para prestar serviço nocturno num lar para a terceira idade. O contrato de trabalho em questão, por força do qual G. Habermann tinha obrigação de efectuar trabalho exclusivamente nocturno, produziu efeitos a partir de 1 de Abril. Um certificado médico de 29 de Maio de 1992 revelou que G. Habermann, que interrompera o seu trabalho por motivo de doença desde o precedente 29 de Abril, estava grávida. Segundo foi determinado pelo órgão jurisdicional nacional, a gravidez teve início em 11 de Março de 1992, isto é, doze dias antes da celebração do contrato de trabalho.

Reportando-se ao artigo 8. , n. 1, da lei relativa à protecção da maternidade, que proíbe às trabalhadoras grávidas a prestação de trabalho nocturno, o Arbeiterwohlfahrt informou G. Habermann, por carta de 4 de Junho de 1992, que considerava nulo o contrato de trabalho celebrado em 23 de Março de 1992.

4. Resulta do despacho de reenvio que a doutrina e a jurisprudência alemãs são unânimes em considerar que a violação da proibição de trabalho nocturno acarreta, na ausência de uma norma derrogatória especial, a nulidade do contrato por força do artigo 134. do código civil alemão. No mesmo despacho, o órgão jurisdicional faz ainda notar que a referida carta de 4 de Junho de 1992 poderia também ser interpretada como rescisão do contrato de trabalho, atendendo a que, com base no artigo 119. , alínea 2), do código civil alemão, o contrato pode ser impugnado pela entidade patronal, o que acarreta a sua cessação, por motivo de erro relativo à existência da situação de gravidez no momento da celebração do contrato, erro que incide sobre uma qualidade da pessoa que é considerada essencial.

Tendo dúvidas sobre a compatibilidade com o princípio da igualdade de tratamento, tal como estabelecido pela directiva comunitária, da prática jurisprudencial que da proibição de trabalho nocturno para as mulheres grávidas faz decorrer a nulidade do contrato de trabalho ou, pelo menos, permite a sua impugnação, o órgão jurisdicional nacional considerou oportuno efectuar um reenvio prejudicial para o Tribunal de Justiça.

5. Mais precisamente, questiona:

"1) Os princípios desenvolvidos no acórdão do Tribunal de Justiça de 8 de Novembro de 1990, no processo C-177/88, sobre a interpretação da Directiva 76/207/CEE do Conselho, de 9 de Fevereiro de 1976 (JO L 39, p. 40) e o princípio da igualdade de tratamento consagrado no n. 1 do artigo 2. da mesma directiva, relativa à concretização do princípio da igualdade de tratamento entre homens e mulheres no que se refere ao acesso ao emprego, à formação e promoção profissionais, e às condições de trabalho, devem ser interpretados no sentido de que um contrato de trabalho celebrado entre a entidade patronal e uma trabalhadora grávida, com desconhecimento recíproco do facto de esta se encontrar grávida, não pode ser considerado inválido com base na existente proibição de ocupação (trabalho nocturno) decorrente da gravidez?

2) Haverá, em particular, violação do princípio da igualdade de tratamento consagrado nos n.os 1 dos artigos 3. e 5. da Directiva 76/207

a) no caso de o contrato de trabalho celebrado com a trabalhadora grávida ser considerado nulo por violação da proibição da ocupação (trabalho nocturno) vigente durante o período da gravidez para proteger as trabalhadoras grávidas;

b) no caso de a entidade patronal poder invocar a invalidade do contrato de trabalho, dando assim origem à sua cessação devido ao seu erro relativamente à existência de gravidez no momento da sua celebração?"

Como se deduz facilmente da sua formulação, estas duas questões não requerem duas respostas distintas, dado que a primeira coloca em termos mais gerais as interrogações que são seguidamente especificadas na segunda. Consideramos, portanto, que bastará que nos limitemos ao exame desta última, na medida em que ela coloca o problema da compatibilidade com o princípio da igualdade de tratamento tanto da possibilidade de considerar o contrato de trabalho (celebrado com uma mulher grávida que, no momento da sua celebração, ignorava a gravidez) viciado por nulidade, por força do artigo 134. do código civil [hipótese formulada na alínea a)], como da possibilidade de a entidade patronal, ao abrigo do artigo 119. desse mesmo código, impugnar o contrato em questão e, assim, pedir a sua rescisão [hipótese formulada na alínea b)].

6. Precisado isto, é necessário que nos detenhamos, para começar, numa questão de princípio suscitada pelo Arbeiterwohlfahrt, que argumenta que não seria possível fazer depender a solução do litígio principal da Directiva 76/207/CEE, uma vez que se trata de um litígio entre dois particulares e o Tribunal de Justiça excluiu, até agora, o efeito directo horizontal das directivas.

Ora, dado que, como já dissemos, a possibilidade de invocar a nulidade do contrato de trabalho num caso como o que nos ocupa depende da interpretação que os supremos tribunais nacionais alemães fizeram das normas adoptadas em aplicação da Directiva 76/207/CEE (a qual, segundo o que resulta do processo, foi correctamente transposta), não nos parece correcto colocar o problema em termos de "efeitos horizontais" da directiva.

Com efeito, salientamos que, no caso que nos ocupa, o órgão jurisdicional nacional é chamado a determinar se a mulher tem, ou não, direito a conservar o seu emprego por força do princípio da igualdade de tratamento, tal como formulado na Directiva 76/207/CEE, e, em consequência, por força das disposições nacionais adoptadas em aplicação desta directiva. Numa situação deste tipo, como o Tribunal de Justiça já há muito afirmou, "independentemente dos efeitos da directiva, a sua interpretação pode ser útil ao juiz nacional para garantir à lei adoptada para aplicação da directiva uma interpretação e uma aplicação conformes às exigências do direito comunitário" (2).

Acrescentemos a isto que, como o Tribunal de Justiça já precisou, "ao aplicar o direito nacional, o órgão jurisdicional nacional chamado a interpretá-lo é obrigado a fazê-lo, na medida do possível, à luz do texto e da finalidade da directiva, para atingir o resultado por ela prosseguido e cumprir desta forma o artigo 189. , terceiro parágrafo, do Tratado" (3).

Em definitivo, um caso como o que nos ocupa não coloca um problema de efeitos "horizontais" da directiva em questão, uma vez que o juiz nacional, ao aplicar as normas nacionais e, em especial, o artigo 8. da lei relativa à protecção da maternidade, é obrigado a interpretá-las à luz do texto da directiva e das finalidades por ela prosseguidas.

7. Passemos agora à questão de fundo. O órgão jurisdicional nacional afirma que o facto de considerar nulo o contrato de trabalho com uma trabalhadora grávida, por motivo de, durante a gravidez, ela não poder efectuar a prestação de trabalho a que está obrigada por contrato, pode ser susceptível de impedir as mulheres, em razão do sexo, de aceder a determinados empregos, uma vez que a gravidez existente (mas ignorada) no momento da celebração do contrato acarretaria a sua nulidade. Por motivo da gravidez, em consequência, ver-se-iam impedidas de aceder a determinados empregos, ainda que a prestação de trabalho só provisoriamente não possa ser efectuada.

Nesta perspectiva, a declaração de nulidade, na medida em que produz efeitos ex tunc e, por consequência, exactamente o mesmo efeito que um contrato nunca celebrado, equivaleria à recusa de contratação do trabalhador. A declaração de invalidade do contrato, efectuada por motivo de erro quanto à existência da situação de gravidez, acarretando a cessação da relação de trabalho com efeitos ex nunc, deveria, pelo contrário, ser assimilada ao despedimento.

8. É bem certo que, para além da qualificação jurídica formal, ambos os casos acarretam, de facto, a perda do emprego pela mulher em causa. Consideramos no entanto necessário examinar o problema separadamente, em relação às duas hipóteses, como solicita o órgão jurisdicional nacional.

No que respeita à hipótese de recusa de contratação do trabalhador, a norma pertinente é a do artigo 3. , n. 1, da directiva, que estabelece o princípio da igualdade de tratamento quanto às condições de acesso a empregos, incluindo os critérios de selecção. No acórdão Dekker, ao qual o próprio órgão jurisdicional nacional faz referência na sua primeira questão, o Tribunal de Justiça, ao pronunciar-se sobre a interpretação desta disposição, afirmou que "uma recusa de contratação por motivo de gravidez só pode ser feita às mulheres e constitui, assim, uma discriminação directa em razão do sexo" (4), como tal incompatível com a directiva. A situação de gravidez não pode, pois, ser tomada em consideração para recusar a contratação: e isto, evidentemente, independentemente do tipo de actividade.

9. É exacto que o caso que nos ocupa difere do do processo Dekker, pelo menos à primeira vista, por a recusa de contratação não constituir uma consequência directa e imediata da gravidez, mas da proibição do trabalho nocturno para as mulheres grávidas, que é imposta em função da gravidez. Seria, pois, a inobservância da proibição do trabalho nocturno que determinaria, enquanto consequência posterior, o vício inicial da relação de trabalho.

Atendendo a que a efectuação de trabalho nocturno constituiria uma violação de uma norma penal, foi consequentemente sustentado, no decurso do processo, que num caso deste tipo não seria possível falar de discriminação directa baseada no sexo, tanto mais que o artigo 2. , n. 3, da directiva concede aos Estados-membros a faculdade de adoptar ou de manter em vigor medidas destinadas a proteger a mulher no que respeita "à gravidez e à maternidade".

10. Nesta altura, é necessário precisar que, no que se refere ao artigo 2. , n. 3, da directiva, a legalidade da regulamentação alemã que proíbe o trabalho nocturno das mulheres grávidas é absolutamente incontestável. Trata-se, com efeito, de uma regulamentação que concede uma protecção especial às trabalhadoras que se encontram nessa situação e que, por consequência, se engloba certamente entre as derrogações previstas pela directiva.

Para os fins que agora nos ocupam, é no entanto necessário colocar a questão de saber se a derrogação em questão pode legitimamente ser aplicada de modo a permitir a declaração de nulidade ou, pelo menos, a invocação da invalidade de um contrato de trabalho celebrado com uma trabalhadora grávida. Esta é a questão de princípio colocada pelo caso que nos ocupa.

11. A este respeito, começaremos por observar que, como o Tribunal de Justiça já sublinhou (5), é a situação específica da mulher no decurso do período precedente e imediatamente seguinte ao parto que é objecto de uma protecção especial e, assim, da possível desigualdade de tratamento. Para bem considerar a questão, as disposições adoptadas em aplicação do artigo 2. , n. 3, da directiva não podem, a não ser impropriamente, ser qualificadas como derrogações ao princípio da igualdade, uma vez que tendem preferencialmente a garantir a efectividade substancial do princípio da igualdade, ao permitir as "desigualdades" necessárias para a realizar. Trata-se, em definitivo, de uma hipótese em que um tratamento diferente é autorizado ou imposto a favor e com vista à protecção dos trabalhadores, a fim de se chegar a uma igualdade substancial e não apenas formal, que seria, esta, a negação da igualdade.

Sendo incontestavelmente esta a ratio da norma, parece-nos que se deve excluir, pelo menos em princípio, que "discriminações" autorizadas para ter em conta a maternidade, e assim para proteger as mulheres, possam ser aplicadas de modo a exluí-las do mercado de trabalho. Com efeito, é evidente que, se se devesse chegar a uma tal conclusão, daí resultaria que tanto a finalidade da directiva (garantir a igualdade de tratamento homem/mulher) como a da derrogação (admitir uma disparidade de tratamento a favor de mulheres grávidas para proteger a especificidade desta situação) seriam completamente traídas. A igualdade substancial homem/mulher no plano do trabalho exige, com efeito, que um acontecimento que - por definição - atinge unicamente as mulheres não seja tomado em consideração, nem mesmo no que respeita ao momento de acesso ao trabalho. Seria paradoxal, é necessário repeti-lo, que o reconhecimento da função social da maternidade e, em consequência, a protecção das mulheres grávidas se efectuasse excluindo-as do mercado de trabalho.

12. As considerações que precedem incitam-nos a concluir que a proibição do trabalho nocturno, em si mesma legítima, não pode ser aplicada de modo a comprometer a validade de um contrato de trabalho nocturno celebrado com uma mulher grávida, mas apenas como uma proibição de prestar efectivamente o trabalho nocturno (6). Noutros termos, a impossibilidade temporária de efectuar um trabalho nocturno, consequência da protecção especial concedida às mulheres grávidas, não pode ser invocada para justificar uma recusa de contratação e não pode ter o efeito de impedir a constituição válida de uma relação laboral.

Em definitivo, o princípio da igualdade de tratamento, tal como previsto no artigo 3. , n. 1, da directiva, exclui que a situação de gravidez possa ser tomada em consideração para recusar a contratação, mesmo para um trabalho nocturno. Isto implica ainda que o conhecimento de tal situação no momento da constituição da relação laboral é desprovido de qualquer importância; e que, a fortiori, não é possível considerar legítima a invalidação de um contrato de trabalho celebrado quando a interessada não tinha conhecimento do seu estado.

13. No que respeita à hipótese de invalidação do contrato, o artigo 5. , n. 1, da directiva, disposição que impõe a inexistência de discriminações baseadas no sexo no que respeita às condições inerentes ao despedimento, tem também importância. A este respeito, o Tribunal de Justiça precisou, no acórdão Hertz, que "o despedimento de um trabalhador feminino em razão da sua gravidez constitui uma discriminação directa em razão do sexo" (7). O despedimento em razão da gravidez da trabalhadora foi pois, também ele, considerado pelo Tribunal de Justiça uma discriminação directa baseada no sexo e, portanto, incompatível com a directiva.

Ora, a rescisão de um contrato de trabalho pelo único fundamento de a trabalhadora em questão estar grávida só pode constituir, ao menos em princípio, uma discriminação directa baseada no sexo: o que é particularmente evidente no caso que nos ocupa. A este respeito, basta, com efeito, realçar que o facto de permitir a invalidação do contrato por motivo de erro relativo a uma qualidade essencial inerente à pessoa, quando a qualidade em questão é precisamente a situação de gravidez, implica necessariamente que apenas as mulheres se possam encontrar em tal situação (8). Aliás, como o órgão jurisdicional a quo sublinhou no seu despacho de reenvio, a própria lei alemã em matéria de protecção da maternidade exclui a hipótese de despedimento por motivo de gravidez (artigo 9. ).

14. A Directiva 92/85/CEE do Conselho, de 19 de Outubro de 1992, relativa à implementação de medidas destinadas a promover a melhoria da segurança e da saúde das trabalhadoras grávidas, puérperas ou lactantes no trabalho (9), é igualmente significativa a este respeito. Ela determina, com efeito, que o direito de ser transferida para um serviço diurno ou de obter um período de licença (artigo 7. ) deve ser reconhecido a uma mulher grávida que efectue um trabalho nocturno, sem que isso possa em qualquer caso implicar a perda do emprego (artigo 10. ).

Se bem que esta directiva ainda não tenha entrado em vigor (a transposição para as ordens jurídicas internas deverá ser efectuada o mais tardar até Outubro de 1994), as disposições acima referidas confirmam a interpretação aqui dada do artigo 5. , n. 1, da directiva: isto é, que a anulação do contrato de trabalho por motivo da situação de gravidez não é autorizada, mesmo na presença de uma proibição legal do trabalho nocturno.

15. Foi também sustentado, no decurso do processo, que a declaração de nulidade do contrato de trabalho ou o despedimento não deveriam, num caso como o que nos ocupa, ser considerados discriminações directas baseadas no sexo, uma vez que seriam motivados por um elemento (a proibição legal de um certo tipo de actividade) que acarretaria as mesmas consequências para um trabalhador do sexo masculino que se encontrasse na mesma situação.

Diremos imediatamente que esta tese aparece desprovida de fundamento e que não nos parece possível invocar utilmente a este respeito o acórdão Hertz (10), no qual o Tribunal de Justiça considerou que o despedimento de uma trabalhadora por motivo de repetidas faltas por doença, mesmo tratando-se de doença ligada a uma gravidez ou um parto, não constitui uma discriminação directa baseada no sexo, se tais faltas forem posteriores ao período de licença por maternidade e provocarem também, nas mesmas condições, o despedimento de um trabalhador do sexo masculino. Nesse caso, com efeito, as mesmas condições (um certo número de faltas durante um lapso de tempo determinado) eram aplicáveis aos trabalhadores dos dois sexos. Pelo contrário, no caso que nos ocupa, a cessação da relação de trabalho é devida a uma condição (o estado de gravidez) certamente aplicável apenas às mulheres.

16. Basta ainda sublinhar apenas que também não seria possível invocar, para justificar a discriminação observada, o prejuízo financeiro sofrido pela entidade patronal pelo facto de empregar uma pessoa que não trabalhará durante todo o período da gravidez, ainda que se deva reconhecer que a manutenção da relação de trabalho, numa situação como a que nos ocupa, acarreta um aumento dos encargos financeiros que se pode revelar particularmente sensível para as pequenas empresas.

O Tribunal de Justiça, que já se pronunciou sobre este aspecto no acórdão Dekker, definiu, com efeito, que "uma recusa de contratação devida às consequências financeiras de uma ausência por motivo de gravidez deve considerar-se baseada essencialmente no facto da gravidez. Essa discriminação não pode ser justificada por razões baseadas no prejuízo financeiro sofrido pelo empregador em caso de contratação de uma mulher grávida, durante o período da sua licença por maternidade" (11). Estas considerações valem igualmente para o caso que nos ocupa, já que o facto de, sendo mais longo o período de ausência de trabalho, os prejuízos financeiros serem mais importantes, não tem qualquer importância, nesta óptica.

17. Finalmente, parece-nos que também não deve ser dada qualquer importância ao argumento do Arbeiterwohlfahrt de que a solução aqui definida poderia levar a abusos por parte das mulheres. Com efeito, é fácil de ver que não é sequer possível falar de abusos quando se reconhece que as mulheres grávidas não perdem - por esse único motivo - o direito de serem contratadas e de conservar o seu emprego.

Aliás, se se partir da ideia de que uma mulher "programa" o nascimento de um filho em função de uma possibilidade de trabalho nocturno, seria ainda necessário reconhecer-lhe a capacidade de efectuar cálculos que levassem a que só engravidasse após a assinatura do contrato, o que lhe evitaria os problemas sofridos por G. Habermann. Com efeito, basta chamar a atenção sobre o facto de que teria sido suficiente que a sua gravidez tivesse tido início não em 11 mas em 24 de Março, dia seguinte ao da assinatura do contrato, para que ela estivesse ao abrigo de qualquer contestação. Em definitivo, cremos que não se pode resolver o problema jurídico que nos ocupa baseando-nos na possibilidade, eventual e pouco provável, de abusos.

18. À luz das considerações que precedem, propomos pois que se responda do seguinte modo às questões submetidas pelo Arbeitsgericht Regensburg:

"1) Os artigos 2. , n. 1, e 3. , n. 1, da Directiva 76/207/CEE opõem-se a uma interpretação do direito nacional que acarrete a nulidade de um contrato de trabalho celebrado com uma mulher grávida, quando tal nulidade for unicamente consequência da proibição de efectuar trabalho nocturno imposta para proteger as mulheres grávidas.

2) Os artigos 2. , n. 1, e 5. , n. 1, da Directiva 76/207/CEE devem ser interpretados no sentido de que proíbem que um contrato de trabalho celebrado com uma mulher grávida possa ser declarado inválido por motivo de erro quanto à existência da gravidez."

(*) Língua original: italiano.

(1) - JO L 39, p. 40; EE 05 F2 p. 70.

(2) - Acórdão de 20 de Maio de 1976, Mazzalai (111/75, Recueil, p. 657, n. 10).

(3) - Acórdão de 13 de Novembro de 1990, Marleasing (C-106/89, Colect., p. I-4135, n. 8).

(4) - Acórdão de 8 de Novembro de 1990, Dekker (C-177/88, Colect., p. I-3941, n. 12).

(5) - Acórdão de 12 de Julho de 1984, Hoffmann (184/83, Recueil, p. 3047, n. 25).

(6) - A própria norma nacional estabelece, aliás, a proibição de afectar as mulheres grávidas a um trabalho nocturno e não a proibição de contratar as mulheres que se encontram em tal situação.

(7) - Acórdão de 8 de Novembro de 1990, Handels-og Kontorfunktionaerernes Forbund (C-179/88, Colect., p. I-3979, n. 13).

(8) - A este respeito, não é inútil recordo que, referindo-se precisamente ao acórdão Hertz, já referido, o Bundesarbeitsgericht considerou, assim alterando a sua anterior jurisprudência, que uma entidade patronal não pode obter, baseando-se no artigo 119. , n. 2, do código civil, a declaração de invalidade dum contrato de trabalho celebrado com uma mulher grávida, argumentando que fora intencionalmente induzida em erro quanto à existência da situação de gravidez (acórdão de 15 de Outubro de 1992, 2 AZR 227/92).

(9) - JO L 348, p. 1.

(10) - Acórdão de 8 de Novembro de 1990, já referido, em especial os n.os 14-17.

(11) - Acórdão de 8 de Novembro de 1990, já referido, n. 12.