61991B0081

DESPACHO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTANCIA (QUARTA SECCAO) DE 9 DE JUNHO DE 1992. - JACQUES FELTZ CONTRA PARLAMENTO EUROPEU. - EXTINCAO DA INSTANCIA. - PROCESSO T-81/91.

Colectânea da Jurisprudência 1992 página II-01827


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Parte decisória

Palavras-chave


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Processo - Despesas - Recurso sem objecto - Não desistência do recorrente - Aplicação das normas previstas para o caso de inutilidade superveniente da lide

(Regulamento de Processo, artigo 87. , n.os 5 e 6)

Sumário


Quando um recurso admissível no momento da sua interposição ficar sem objecto, tendo o recorrente obtido satisfação da parte recorrida, e na falta de desistência, tendo o recorrente pedido que o Tribunal de Primeira Instância se digne declarar que o processo prossiga até à decisão de mérito, pelo menos quanto às despesas, há que decidir das mesmas de acordo não com as disposições do artigo 87. , n. 5, do Regulamento de Processo, mas com as do artigo 87. , n. 6, do referido regulamento que dispõe que, no caso de não haver lugar à decisão de mérito, o Tribunal de Primeira Instância decide livremente quanto às despesas.

Partes


No processo T-81/91,

Jacques Feltz, funcionário do Parlamento Europeu, com domicílio em Greiveldange (Grão-Ducado do Luxemburgo), representado por Jean-Noël Louis, advogado no foro de Bruxelas, com domicílio escolhido no Luxemburgo na SARL fiduciaire Myson, 1, rue Glesener,

recorrente,

contra

Parlamento Europeu, representado por Jorge Campinos, jurisconsulto, e por Kieran Bradley, membro do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo no Secretariado-Geral do Parlamento Europeu, Kirchberg,

recorrido,

que tem por objecto a anulação da decisão do Parlamento Europeu de 4 de Fevereiro de 1991 de reduzir a duração de antiguidade a tomar em consideração para efeitos da transferência para o regime comunitário dos direitos à pensão nacionais do recorrente,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Quarta Secção),

composto por: R. García-Valdecasas, presidente, R. Schintgen e C. P. Briët, juízes

secretário: H. Jung

profere o presente

Despacho

Fundamentação jurídica do acórdão


Os factos na origem do recurso

1 O recorrente, funcionário do Parlamento Europeu (a seguir "Parlamento"), foi titularizado em 1 de Julho de 1976 no grau C 4, escalão 1. Antes de entrar ao serviço do Parlamento tinha pago contribuições para dois organismos de segurança social luxemburguesa, a Caisse de pensions des employés privés e o Établissement d' assurance contre la vieillesse et l' invalidité (a seguir, respectivamente, "CPEP" e "AVI").

2 Em 1979, o recorrente pediu a transferência dos direitos à pensão para o regime comunitário.

3 Em nota de 15 de Outubro de 1979, os serviços do Parlamento, por aplicação do artigo 11. , n. 2, do anexo VIII do Estatuto dos Funcionários das Comunidades Europeias (a seguir "Estatuto"), transmitiram-lhe o cálculo das anuidades da pensão resultante da transferência dos direitos que tinha adquirido junto da CPEP, três anos, três meses e dois dias. Em nota de 5 de Fevereiro de 1980, a administração do Parlamento transmitiu também o cálculo das anuidades da pensão resultante da transferência dos seus direitos junto da AVI, cinco anos, três meses e vinte dias. O recorrente, nessa altura, não deu sequência ao pedido de transferência dos seus direitos à pensão.

4 Em 1985, pediu novamente a transferência dos seus direitos à pensão para o regime comunitário e, apesar da intempestividade do pedido, as duas Caixas procederam à mesma, sob insistente intervenção da administração do Parlamento, sem contudo acrescentarem ao capital indicado em 1979 juros vencidos no período de 1980 a 1985.

5 Em nota de 31 de Maio de 1985, o AVI informou o Parlamento de que o montante de 369 907 LFR lhe seria transferido a título das contribuições de J. Feltz.

6 Em nota de 18 de Junho de 1985, o Parlamento comunicou ao recorrente uma proposta de transferência dos direitos que tinha adquirido junto da CPEP, que se traduzia numa bonificação de dois anos, nove meses e vinte e dois dias. Esta transferência foi efectuada em Setembro de 1985.

7 Em nota de 19 de Setembro de 1985, comunicada ao recorrente a 20 de Setembro do mesmo ano, os serviços do Parlamento fixaram o número de anuidades a tomar em consideração, aquando da transferência dos direitos à pensão adquiridos pelo recorrente junto da AVI, em quatro anos, quatro meses e vinte e quatro dias. Esta nota indicava também 6 de Agosto de 1971 como data de antiguidade.

8 Em Outubro de 1985, o Parlamento pediu informações à CPEP a propósito do pagamento dos juros sobre as cotizações do recorrente entre Abril de 1980 e Setembro de 1985.

9 Em carta de 22 de Abril de 1986, o Parlamento foi informado pela CPEP de que os juros suplementares sendo devidos se elevavam a 51 685 LFR.

10 A 5 de Maio de 1986, o Parlamento adoptou nova decisão que, tendo em conta os juros pagos pela CPEP, fixava a data de antiguidade em 13 de Dezembro de 1967 e o número de anuidades da pensão a tomar em consideração em três anos, cinco meses e vinte e sete dias.

11 A 5 de Outubro de 1990, o AVI transferiu, por seu turno, o montante correspondente aos juros que eram devidos. Esta transferência implicou novos cálculos.

12 Em Outubro de 1990, o Parlamentro reabriu o processo de pensão do recorrente e elevou o número de anuidades a ter em consideração a título dos direitos adquiridos junto do AVI, de quatro anos, quatro meses e vinte e quatro dias para três anos, seis meses e vinte e dois dias. A administração do Parlamento comunicou estes novos cálculos ao recorrente a 4 de Fevereiro de 1991, acrescentando também os cálculos relativos aos direitos adquiridos junto da CPEP, que reduziam o número de anuidades a tomar em conta de três anos, cinco meses e vinte e sete dias para dois anos, dois meses e dezassete dias.

13 O recorrente sustenta que este resultado é a consequência da aplicação, pela primeira vez, pela administração de um coeficiente corrector. Os cálculos que tinham sido comunicados ao recorrente em 1979 e 1980 estavam errados, porque os serviços competentes tinham omitido afectar o vencimento-base do recorrente, na altura da sua titularização, do coeficiente corrector aplicável. Este erro apenas foi detectado na altura do cálculo da transferência efectuada, em Outubro de 1990, pelo AVI.

14 Em 3 de Maio de 1991, o recorrente apresentou uma reclamação, nos termos do artigo 90. , n. 2, do Estatuto, na qual pedia que "a administração anule a decisão notificada por carta de 4 de Fevereiro de 1991, que lhe comunicava novo cálculo da bonificação dos direitos à pensão e exigindo-lhe uma escolha sem lhe ter fornecido os elementos que lhe permitissem verificar os cálculos de bonificação indicados e as razões pelas quais este terceiro cálculo é mais correcto que os dois precedentes, que lhe eram mais favoráveis". Acrescenta que "importa, por conseguinte, substituir a decisão impugnada por uma nova que fixe o cálculo exacto, preciso e fundamentado da bonificação de antiguidade dos direitos adquiridos antes da sua entrada em funções e que lhe permita escolher, com conhecimento de todos os elementos em causa, o regime mais favorável. Para o fazer, a administração está obrigada a conceder-lhe oficiosamente, face ao seu dever de solicitude, as dificuldades técnicas deste processo e os princípios enunciados no acórdão Schneemann, assistência técnica e financeira que lhe permita efectuar a opção (sic) a tomar".

15 A 5 de Setembro de 1991, o Secretariado-Geral do Parlamento, enquanto autoridade investida do poder de decisão, respondeu à reclamação nos seguintes termos:

"... após exame do processo, verifica-se que os cálculos transmitidos em 1985, na altura em que tinha decidido transferir os seus direitos à pensão nacionais para o regime comunitário, estavam errados.

Por conseguinte, dei as instruções necessárias à administração para lhe fornecer o cálculo dos direitos à pensão a que teria direito, se não tivesse feito a transferência em 1985...".

Tramitação

16 É nestas circunstâncias que, por requerimento entrado na Secretaria do Tribunal em 15 de Novembro de 1991, J. Feltz interpôs o presente recurso, que foi registado sob o número T-81/91, no qual pede que o Tribunal se digne:

"declarar que:

a administração está obrigada a conceder-lhe oficiosamente a assistência técnica e financeira que lhe permita exercer com total conhecimento de causa o direito que lhe é reconhecido pelo artigo 11. , n. 2, do anexo VIII, do Estatuto.

declarar:

1) a decisão do Parlamento Europeu de 4 de Fevereiro de 1991 de reduzir a antiguidade a tomar em consideração no âmbito da transferência dos seus direitos à pensão nacional para o regime comunitário é anulada;

2) o recorrido é condenado nas despesas."

17 A 21 de Novembro de 1991, a administração do Parlamento remeteu uma carta para as duas Caixas nacionais, a CPEP e o AVI, perguntando-lhes em que condições aceitariam a transferência e qual o montante da pensão diferido que teria sido pago por estes organismos a J. Feltz na hipótese de a transferência não ter ocorrido.

18 A 27 de Novembro de 1991, o AVI respondeu que não aceitava a retransferência dos direitos à pensão do recorrente. O AVI forneceu igualmente o cálculo do montante da pensão a que o recorrente teria direito se a transferência não tivesse lugar em 1985. A CPEP informou a administração que não seria possível uma nova transferência.

19 A 15 de Janeiro de 1992, o Secretariado-Geral do Parlamento escreveu ao recorrente nos seguintes termos:

"Os serviços informaram-me que a Caisse de pensions des Employés privés (CPEP) bem como o Établissement d' assurance contre la vieillesse et l' invalidité (AVI) recusaram aceitar a transferência eventual dos montantes anteriormente transferidos para o Parlamento Europeu a título de transferências do direito à pensão.

Com efeito, não existe qualquer disposição legal que permita a anulação de tal transferência. Além disso, a CPEP recusou efectuar, a título informativo, o cálculo da pensão ao qual poderia pretender se a transferência não tivesse tido lugar, considerando que era redundante proceder a uma avaliação para um antigo inscrito cuja situação perante o seguro estava liquidada.

Dado que tinha assinalado que o pedido de obtenção de resgate dos direitos a pensão com base no cálculo das anuidades da pensão efectuada em 18.6.1985 para a CPEP e 20.6.1985 para a AVI, e consciente da complexidade das operações aritméticas do cálculo do resgate dos direitos à pensão, pedi aos serviços para reconhecerem os cálculos efectuados em 1985 como definitivos. Apenas os juros transferidos em 1990 pelo AVI permanecerão convertidos em anuidades de pensão comunitária com base nos cálculos cujo coeficiente corrector era e continua aplicável.

Por conseguinte, considerados nulos os cálculos reformulados em 17 de Outubro de 1990, de 4 de Fevereiro de 1991, pode beneficiar da taxa máxima de pensão desde a idade de sessenta anos e dois meses."

20 Em 20 de Janeiro de 1992, o Parlamento suscitou uma questão prévia de inadmissibilidade do recurso pelo facto de a carta do seu secretário-geral de 5 de Setembro de 1991 constituir uma decisão explícita de deferimento da reclamação do recorrente de 3 de Maio de 1991. Com esta questão prévia, o Parlamento pede que o Tribunal se digne declarar o presente recurso sem objecto e inadmissível e decidir nos termos legais quanto às despesas. O Parlamento precisou, no momento em que suscitou esta questão prévia, que o seu secretário-geral tinha remetido instruções aos seus serviços, em 5 de Setembro de 1991, isto é, no mesmo dia do envio da resposta à reclamação redigida nestes termos:

"Como resulta do processo transmitido ao Serviço Jurídico relativamente a esta reclamação, todos os cálculos da bonificação dos direitos à pensão comunicados ao recorrente entre 1979 e 1990 estavam errados, por falta de afectação do seu vencimento-base do coeficiente corrector.

A fim de corrigir os efeitos prejudiciais deste erro, peço que forneçam ao recorrente o cálculo dos direitos à pensão nacionais a que teria direito se não tivesse feito a transferência em 1985, e negociar, sendo caso disso, a retransferência dos seus direitos para o regime nacional."

21 O recorrente apresentou, a 9 de Março de 1992, as suas observações quanto à referida questão prévia, alegando que uma vez que os serviços do Parlamento lhe comunicaram, a 4 de Fevereiro de 1991, um cálculo rectificativo das anuidades tomadas em consideração no âmbito da transferência dos seus direitos à pensão, é porque consideravam os anteriores cálculos errados. Assim, a carta de 5 de Setembro de 1991 mais não fez que confirmar o erro dos cálculos de 1985, sem todavia pôr em causa os cálculos notificados a 4 de Fevereiro de 1991. Aliás, o recorrente entende que se tivesse podido tomar conhecimento das instruções fornecidas pelo secretário-geral aos serviços do Parlamento, teria podido solicitar aos mesmos que precisassem o sentido da resposta de 5 de Setembro de 1991 e não se teria visto forçado a apresentar o presente recurso de anulação. Na opinião do recorrente, a administração do Parlamento só parece ter retomado o estudo do processo posteriormente à notificação do seu recurso. O recorrente sustenta que apenas por decisão de 15 de Janeiro de 1992 o Parlamento acolheu favoravelmente a sua reclamação de 3 de Maio de 1991 e, por esse facto, conclui pedindo que o Tribunal se digne rejeitar a questão prévia de inadmissibilidade suscitada pelo recorrido e, por conseguinte, determine que o processo continue até à decisão de mérito, pelo menos quanto às despesas.

Quanto à ausência de objecto do litígio e às despesas

22 O Tribunal entende que a carta do secretário-geral do Parlamento de 5 de Setembro de 1991 não pode ser considerada como decisão de deferimento da reclamação do recorrente. É verdade que o secretário-geral indica ter dado as instruções necessárias aos seus serviços para fornecer ao recorrente o cálculo dos direitos à pensão nacionais a que ele teria direito se não tivesse pedido a transferência em 1985; todavia, a redacção destas instruções não é reproduzida na carta de 5 de Setembro de 1991 e o recorrente só dela teve conhecimento através da citação que dela foi feita pelo Parlamento ao suscitar a questão prévia de inadmissibilidade. Por isso, não se pode deduzir da simples leitura do conteúdo da carta de 5 de Setembro de 1991 que esta constitua uma resposta favorável. Bem pelo contrário, ela reafirma a verificação realizada pelos serviços do Parlamento, a saber, que os cálculos efectuados em 1985 estavam errados.

23 O Tribunal salienta que foi só com a carta de 15 de Janeiro de 1992 que o secretário-geral do Parlamento informou o recorrente de que os cálculos rectificados de 17 de Outubro de 1990 e 4 de Fevereiro de 1991, respectivamente, deviam ser considerados nulos e sem efeito e que tinha pedido aos seus serviços para considerarem definitivos os cálculos efectuados em 1985.

24 Embora reconhecendo que a carta de 15 de Janeiro de 1992 lhe dá satisfação, o recorrente não desistiu do recurso e concluiu pedindo que o Tribunal se digne ordenar que o processo continue até à decisão de mérito, pelo menos no que respeita às despesas.

25 À vista destes elementos, o Tribunal entende, antes de mais, que o recurso era admissível no momento da sua interposição, mas que a decisão do Parlamento de 15 de Janeiro de 1992 retirou objecto ao litígio que opunha o recorrente ao Parlamento. Não há, pois, que conhecer de mérito.

26 Do mesmo modo, salienta que na falta de desistência do recorrente, não há que decidir das despesas em conformidade com as disposições do artigo 87. , n. 5, do Regulamento de Processo, mas em conformidade com o artigo 87. , n. 6, do referido regulamento que dispõe que no caso de não haver lugar à decisão de mérito, o Tribunal decide livremente quanto às despesas.

27 No caso vertente, o Tribunal constata que foi só após a interposição do recurso que os serviços do Parlamento reiniciaram as diligências junto dos organismos de segurança social em questão, diligências que levaram ao resultado negativo acima mencionado e foi apenas em 15 de Janeiro de 1992 que o Parlamento deferiu o pedido do recorrente.

28 Tendo em conta o facto de o recorrente obter decisão favorável por parte do Parlamento após a interposição do recurso, mas que dele não desistiu, o Tribunal entende que, em termos de equidade, o Parlamento deve suportar as suas próprias despesas e dois terços das do recorrente e este suporte um terço das suas despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quarta Secção)

decide:

1) É declarada a inutilidade superveniente da lide.

2) O Parlamento suportará as suas despesas e dois terços das do recorrente, suportando este um terço das suas.

Proferido no Luxemburgo, em 9 de Junho de 1992.