61991J0132

ACORDAO DO TRIBUNAL DE 16 DE DEZEMBRO DE 1992. - GRIGORIOS KATSIKAS CONTRA ANGELOS KONSTANTINIDIS E UWE SKREB E GUENTER SCHROLL CONTRA PCO STAUEREIBETRIEB PAETZ & CO. NACHFOLGER GMBH. - PEDIDOS DE DECISAO PREJUDICIAL: ARBEITSGERICHT BAMBERG E ARBEITSGERICHT HAMBURG - ALEMANHA. - MANUTENCAO DOS DIREITOS DOS TRABALHADORES EM CASO DE TRANSFERENCIA DE EMPRESA. - PROCESSOS APENSOS C-132/91, C-138/91 E C-139/91.

Colectânea da Jurisprudência 1992 página I-06577
Edição especial sueca página I-00213
Edição especial finlandesa página I-00225


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


++++

1. Política social - Aproximação das legislações - Transferências de empresas - Directiva 77/187 - Oposição do trabalhador à transferência do seu contrato para o cessionário - Admissibilidade - Obrigação de os Estados-membros preverem a manutenção do contrato com o cedente na hipótese de recusa em trabalhar para o cessionário - Inexistência

(Directiva 77/187 do Conselho, artigo 3. , n. 1)

2. Política social - Aproximação das legislações - Transferências de empresas - Directiva 77/187 - Disposições legislativas, regulamentares ou administrativas nacionais na acepção do artigo 7. - Conceito - Tomada em consideração da interpretação dos textos legais pelos órgãos jurisdicionais nacionais

(Directiva 77/187 do Conselho, artigo 7. )

Sumário


1. As disposições do n. 1 do artigo 3. da Directiva 77/187, relativa à aproximação das legislações dos Estados-membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas, devem ser interpretadas no sentido de que não obstam a que um trabalhador empregado pelo cedente à data da transferência da empresa, na acepção do n. 1 do artigo 1. da directiva, se oponha à transferência do seu contrato ou da sua relação laboral para o cessionário.

A directiva não obriga, no entanto, os Estados-membros a prever que, na hipótese de o trabalhador decidir livremente não manter o contrato ou a relação laboral com o cessionário, o contrato ou a relação de trabalho se mantêm com o cedente. Também não se opõe a isso. No caso vertente, compete aos Estados-membros determinar o destino reservado ao contrato ou à relação laboral com o cedente.

2. Deve entender-se por "disposições legislativas, regulamentares ou administrativas", na acepção do artigo 7. da Directiva 77/187, relativa à aproximação das legislações dos Estados-membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas, as disposições legislativas, regulamentares ou administrativas de um Estado-membro, tal como são interpretadas pelos órgãos jurisdicionais nacionais.

Partes


Nos processos apensos C-132/91, C-138/91 e C-139/91,

que têm por objecto pedidos dirigidos ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 177. do Tratado CEE, pelo Arbeitsgericht Bamberg (processo C-132/91) e pelo Arbeitsgericht Hamburg (processos C-138/91 e C-139/91) (República Federal da Alemanha), destinados a obter, nos litígios pendentes nestes órgãos jurisdicionais entre

Grigorios Katsikas

e

Angelos Konstantinidis,

e entre

Uwe Skreb

e

PCO Stauereibetrieb Paetz & Co. Nfl. GmbH,

e entre

Guenther Schroll

e

PCO Stauereibetrieb Paetz & Co. Nfl. GmbH,

uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação dos artigos 3. , n. 1, e 7. da Directiva 77/187/CEE do Conselho, de 14 de Fevereiro de 1977, relativa à aproximação das legislações dos Estados-membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas, estabelecimentos ou partes de estabelecimentos (JO L 61, p. 26; EE 05 F2 p. 122),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

composto por: O. Due, presidente, C. N. Kakouris, G. C. Rodríguez Iglesias e M. Zuleeg, presidentes de secção, R. Joliet, J. C. Moitinho de Almeida e F. Grévisse, juízes,

advogado-geral: W. Van Gerven

secretário: L. Hewlett, administradora

vistas as observações escritas apresentadas:

- nos processos C-138/91 e C-139/91, em representação dos demandantes no processo principal, por Klaus Bertelsmann, advogado no foro de Hamburgo,

- nos processos C-138/91 e C-139/91, em representação do Governo alemão, por Ernst Roeder, Ministerialrat no Ministério federal dos Assuntos Económicos, na qualidade de agente,

- no processo C-132/91, em representação do Governo alemão, por Ernst Roeder e Joachim Karl, Regierungsdirektor no mesmo ministério, na qualidade de agentes,

- nos três processos, em representação da Comissão, por Karen Banks e Bernd Langeheine, membros do seu Serviço Jurídico, na qualidade de agentes,

visto o relatório para audiência,

ouvidas as alegações dos demandantes no processo principal, Uwe Skreb e Guenther Schroll, da PCO Stauereibetrieb Paetz & Co. Nfl. GmbH, representada por Manfred Confurius, advogado no foro de Hamburgo, e da Comissão, na audiência de 7 de Outubro de 1992,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 10 de Novembro de 1992,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por despacho de 7 de Maio de 1991, que deu entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 22 de Maio seguinte, o Arbeitsgericht Bamberg (Kammer Coburg) submeteu, nos termos do artigo 177. do Tratado CEE, no processo C-132/91, quatro questões prejudiciais relativas à interpretação dos artigos 3. , n. 1, e 7. da Directiva 77/187/CEE do Conselho, de 14 de Fevereiro de 1977, relativa à aproximação das legislações dos Estados-membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas, estabelecimentos ou partes de estabelecimentos (JO L 61, p. 26; EE 05 F2 p. 122, a seguir "directiva").

2 Por despachos de 4 de Abril de 1991, que deram entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 27 de Maio seguinte, o Arbeitsgericht Hamburg submeteu, nos termos do artigo 177. do Tratado CEE, duas questões prejudiciais, idênticas em ambos os processos apensos C-138/91 e C-139/91, relativas à interpretação do artigo 7. da directiva.

3 As questões submetidas pelo Arbeitsgericht Bamberg foram suscitadas no âmbito de um litígio que opõe Grigorios Katsikas à sua antiga entidade patronal, Angelos Konstantinidis, a propósito do pagamento de várias importâncias relativas ao período anterior ao seu despedimento, que teve lugar em 26 de Junho de 1990.

4 Resulta dos autos que o Sr. Katsikas era empregado num restaurante explorado pelo Sr. Konstantinidis, sublocado por este último ao Sr. Mitossis, a partir de 2 de Abril de 1990. No contrato de sublocação, o Sr. Mitossis comprometeu-se, designadamente, a exonerar o Sr. Konstantinidis de todas as obrigações decorrentes da exploração do restaurante e, em especial, das relativas ao pagamento dos salários e remunerações acessórias.

5 O Sr. Katsikas recusou-se a trabalhar para o Sr. Mitossis. Foi então despedido pelo Sr. Konstantinidis, em 26 de Junho de 1990.

6 O Sr. Konstantinidis sustentou, no Arbeitsgericht Bamberg, já não ser a entidade patronal do Sr. Katsikas, a partir de 2 de Abril de 1990, dado ter transferido nessa data a sua empresa para o Sr. Mitossis. Afirmou que, nessas condições, não podia aparecer como demandado perante o órgão jurisdicional nacional.

7 O Arbeitsgericht Bamberg decidiu assim submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

"1) Face ao n. 1 do artigo 3. da Directiva 77/187/CEE do Conselho, de 14 de Fevereiro de 1977, relativa à aproximação das legislações dos Estados-membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas, estabelecimentos ou partes de estabelecimentos, um trabalhador empregado na empresa do cedente à data da cessão, na acepção do n. 1 do artigo 1. daquela directiva, pode opor-se à transferência dos direitos e obrigações do cedente para o cessionário, com a consequência de aquela transferência não ter lugar?

2) No caso de a resposta à primeira questão ser negativa:

Um direito de oposição no sentido atrás exposto, previsto no direito nacional de um Estado-membro, constitui uma regulamentação mais favorável aos trabalhadores, na acepção do artigo 7. da Directiva 77/187/CEE?

3) No caso de a resposta à segunda questão ser afirmativa:

O artigo 7. da Directiva 77/187/CEE deve ser interpretado no sentido de que as disposições legislativas, regulamentares ou administrativas (mais favoráveis) a que se refere devem ser explícitas?

4) No caso de a resposta à terceira questão ser negativa:

O artigo 7. da Directiva 77/187/CEE deve ser interpretado no sentido de que os órgãos jurisdicionais dos Estados-membros podem criar uma 'regulamentação' mais favorável aos trabalhadores, na acepção do artigo 7. da Directiva 77/187/CEE, através da interpretação de disposições legislativas, regulamentares ou administrativas nacionais?"

8 As questões submetidas pelo Arbeitsgericht Hamburg foram suscitadas no âmbito de litígios que opõem Uwe Skreb (processo C-138/91) e Guenther Schroll (processo C-139/91) à sua entidade patronal, a sociedade PCO Stauereibetrieb Paetz (a seguir "PCO"), a respeito do seu despedimento.

9 O Sr. Skreb e o Sr. Schroll foram despedidos pela PCO após terem recusado a transferência da sua relação laboral para a sociedade Carl Tiedemann, à qual a PCO tinha cedido o ramo "carga/descarga", onde estavam afectos, a título principal, os interessados.

10 No Arbeitsgericht Hamburg, ambos os empregados alegaram, designadamente, que o disposto no § 613a do Buergerliches Gesetzbuch (Código Civil alemão, a seguir "BGB"), com a interpretação que lhe é dada pela jurisprudência do Bundesarbeitsgericht, permite-lhes opor-se à transferência da sua relação laboral. A PCO respondeu que esse direito de oposição é contrário às disposições da directiva, as quais prevêem a transferência automática da relação de trabalho para a nova entidade patronal.

11 O Arbeitsgericht Hamburg realça que, segundo a jurisprudência constante do Bundesarbeitsgericht relativa ao § 613a do BGB, "se uma parte da empresa for transferida por negócio jurídico para outro proprietário, a oposição de um trabalhador empregado nessa parte da empresa obsta à transferência da sua relação de trabalho para o cessionário, e mantém-se a relação de trabalho com o cedente".

12 O Arbeitsgericht Hamburg interroga-se, assim, sobre a compatibilidade da jurisprudência do Bundesarbeitsgericht com as disposições da directiva, em especial as do artigo 7. , que permitem aos Estados-membros aplicar ou introduzir disposições legislativas, regulamentares ou administrativas mais favoráveis para os trabalhadores.

13 Assim, nos dois processos, apresentou ao Tribunal de Justiça a seguinte questão:

"A concessão, por uma regulamentação nacional, de um direito de oposição do trabalhador que lhe permita impedir a transferência da sua relação de trabalho para o adquirente em caso de transferência de exploração constitui uma regulamentação mais favorável, na acepção do artigo 7. da Directiva 77/187/CEE?"

14 Para mais ampla exposição dos factos no processo principal, da tramitação processual, bem como das observações escritas apresentadas ao Tribunal, remete-se para o relatório para a audiência. Estes elementos apenas serão adiante retomados na medida do necessário para a fundamentação da decisão do Tribunal.

15 As questões submetidas pelo Arbeitsgericht Hamburg bem como as submetidas pelo Arbeitsgericht Bamberg pretendem, no essencial, saber se as disposições do artigo 3. , n. 1, ou as do artigo 7. da directiva permitem que um órgão jurisdicional nacional interprete uma disposição do direito nacional no sentido de reconhecer aos trabalhadores empregados pelo cedente à data da transferência da empresa o direito de se oporem à transferência para o cessionário do seu contrato ou da sua relação de trabalho.

16 A este respeito, as questões do Arbeitsgericht Bamberg desenvolvem e precisam os diversos aspectos da questão submetida pelo Arbeitsgericht Hamburg nos processos C-138/91 e C-139/91. Consequentemente, essas questões devem ser examinadas em conjunto e ser objecto de uma resposta comum.

17 Na realidade, estas questões colocam dois problemas distintos.

18 Antes de mais, os órgãos jurisdicionais de reenvio perguntam se o artigo 3. , n. 1, da directiva deve ser interpretado no sentido de que um trabalhador empregado pelo cedente à data da transferência, na acepção do artigo 1. , n. 1, da directiva, se não pode opor à transferência para o cessionário do seu contrato ou da sua relação de trabalho.

19 Seguidamente, se o trabalhador não se pode opor à transferência do seu contrato ou da sua relação de trabalho nos termos do artigo 3. , n. 1, da directiva, os órgãos jurisdicionais nacionais perguntam se o artigo 7. da directiva deve ser interpretado no sentido de que a interpretação por via jurisprudencial de uma disposição do direito nacional, segundo a qual os trabalhadores têm o direito de se opor à transferência para o cessionário do seu contrato ou da sua relação de trabalho, se inclui entre as "disposições legislativas, regulamentares ou administrativas mais favoráveis aos trabalhadores", referidas neste artigo.

Quanto ao artigo 3. , n. 1, da directiva

20 Nos termos do artigo 3. , n. 1, da directiva:

"Os direitos e obrigações do cedente emergentes de um contrato de trabalho ou de uma relação de trabalho existentes à data da transferência na acepção do n. 1 do artigo 1. são, por este facto, transferidos para o cessionário.

Os Estados-membros podem prever que, mesmo após a data de transferência na acepção do n. 1 do artigo 1. , o cedente seja co-responsável pelas obrigações resultantes de um contrato de trabalho ou de uma relação juntamente com o cessionário."

21 De maneira constante, o Tribunal de Justiça tem decidido (v. acórdão de 25 de Julho de 1991, D' Urso, n. 9, C-362/89, Colect., p. I-4105) que a directiva tem por objectivo assegurar a manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de mudança de empresário, permitindo-lhes ficar ao serviço do novo empresário, nas mesmas condições que as acordadas com o cedente. As regras aplicáveis em caso de transferência de uma empresa ou de um estabelecimento para outro empresário destinam-se a salvaguardar, no interesse dos trabalhadores e na medida do possível, as relações de trabalho existentes que fazem parte do conjunto económico transferido.

22 Tal como o Arbeitsgericht Hamburg realçou na fundamentação dos seus despachos, o Tribunal de Justiça, no acórdão de 5 de Maio de 1988, Berg, n. 14 (144/87 e 145/87, Colect., p. 2559), afirmou que o artigo 3. , n. 1, da directiva deve ser interpretado no sentido de que, após a data da transferência, o cedente fica exonerado das suas obrigações resultantes do contrato ou da relação de trabalho pelo simples facto da transferência, ainda que os trabalhadores da empresa não dêem o seu acordo ou se lhe oponham, sob reserva, todavia, da faculdade de os Estados-membros imporem a responsabilidade solidária do cedente e do cessionário após a data da transferência.

23 Nesse processo, o Hoge Raad der Nederlanden dirigiu-se ao Tribunal de Justiça a fim de saber se o acordo dos trabalhadores em causa era necessário para que o cedente fosse exonerado das obrigações que para ele resultam dos contratos ou das relações de trabalho nos quais era parte anteriormente à transferência quando esses contratos ou essas relações de trabalho fossem transferidos para o novo empresário.

24 Assim, a questão colocada visava apenas o caso, diferente do que no presente processo os órgãos jurisdicionais alemães têm em vista, em que o trabalhador, sem se opor à transferência do seu contrato ou da sua relação de trabalho, se opõe à transmissão das obrigações que o cedente contraíra em relação a ele antes da transferência, por força do contrato ou da relação de trabalho.

25 Nas observações que apresentou no processo C-132/91, a Comissão salientou também que, no acórdão de 10 de Fevereiro de 1988, Tellerup, dito "Daddy' s Dance Hall", n. 15 (324/86, Colect., p. 739), o Tribunal de Justiça decidiu que a protecção prevista pela directiva está subtraída à vontade das partes no contrato de trabalho.

26 Nesse processo, foi submetida ao Tribunal de Justiça pelo Hoejesteret a questão de saber se um trabalhador pode aceitar uma alteração da sua relação de trabalho com o novo empresário, mesmo se os inconvenientes que para si resultam dessa alteração forem compensados por benefícios tais que, globalmente, não o colocam numa situação menos favorável.

27 Este acórdão visou portanto, também ele, um caso diferente do considerado no presente processo pelos órgãos jurisdicionais alemães, ou seja, aquele em que o trabalhador, sem se opor à transferência do seu contrato ou da sua relação de trabalho, aceita alterações do contrato ou da relação que o vinculam ao novo empresário.

28 Para responder à questão submetida pelo Hoejesteret, o Tribunal de Justiça, nos n.os 14 e 15 do acórdão Daddy' s Dance Hall, já referido, salientou que, sendo de ordem pública a protecção que a directiva pretende garantir aos trabalhadores e, portanto, subtraída à vontade das partes no contrato de trabalho, as normas da directiva devem ser consideradas como imperativas, no sentido de que não podem ser derrogadas de forma desfavorável para os trabalhadores. Daqui concluiu que os trabalhadores em causa não tinham a faculdade de renunciar aos direitos que a directiva lhes confere e que, mesmo com o seu consentimento, não é admitida uma diminuição destes direitos.

29 O Tribunal de Justiça, em ambos os acórdãos referidos, não entendeu que as disposições do artigo 3. , n. 1, da directiva devem ser interpretadas no sentido de que o trabalhador não se pode opor à transferência do seu contrato ou da sua relação de trabalho.

30 Pelo contrário, no n. 16 do acórdão de 11 de Julho de 1985, Danmols Inventar (105/84, Recueil, p. 2639), o Tribunal de Justiça afirmou que a protecção que a directiva pretende garantir carece de objecto se o próprio interessado, na sequência de uma decisão por si livremente assumida, decide não continuar, após a transferência, a relação de trabalho com o novo empresário. Numa situação desse tipo, não se aplica o artigo 3. , n. 1, da directiva.

31 Com efeito, se a directiva, que apenas procede a uma harmonização parcial da matéria em causa (v. acórdão Daddy' s Dance Hall, já referido, n. 16), permite que o trabalhador fique ao serviço do novo empresário nas mesmas condições que as acordadas com o cedente, não pode ser interpretada como obrigando o trabalhador a manter a relação de trabalho com o cessionário.

32 Uma tal obrigação poria em causa os direitos fundamentais do trabalhador, que deve ser livre de escolher a sua entidade patronal e não pode ser obrigado a trabalhar para uma entidade patronal que não escolheu livremente.

33 Daqui resulta que as disposições do artigo 3. , n. 1, da directiva não constituem obstáculo a que um trabalhador decida opor-se à transferência do seu contrato ou da sua relação de trabalho e, desse modo, não beneficie da protecção que lhe concede a directiva.

34 Contudo, tal como decidiu o Tribunal de Justiça (acórdão Berg, já referido, n. 12), a directiva não visa manter o contrato ou a relação laboral com o cedente no caso de o trabalhador empregado na empresa não pretender continuar ao serviço do cessionário.

35 Daí decorre que, na hipótese de o trabalhador decidir livremente não continuar o contrato ou a relação de trabalho com o cessionário, a directiva não obriga os Estados-membros a determinar que o contrato ou relação de trabalho se mantenham com o cedente. Nessa hipótese, compete aos Estados-membros decidir do destino reservado ao contrato ou à relação de trabalho.

36 Em particular, os Estados-membros podem prever que, neste caso, o contrato ou a relação de trabalho devam ser considerados como rescindidos, quer por iniciativa do empregado quer por iniciativa da entidade patronal. Podem também prever que o contrato ou a relação de trabalho se mantenham com o cedente.

37 Convém assim responder à parte das questões do Arbeitsgericht Bamberg e do Arbeitsgericht Hamburg relativa ao artigo 3. , n. 1, da directiva que as disposições deste artigo devem ser interpretadas no sentido de que não obstam a que um trabalhador empregado pelo cedente à data da transferência da empresa, na acepção do n. 1 do artigo 1. da directiva, se oponha à transferência do seu contrato ou da sua relação laboral para o cessionário. A directiva não obriga, no entanto, os Estados-membros a prever que, na hipótese de o trabalhador decidir livremente não manter o contrato ou a relação laboral com o cessionário, o contrato ou a relação de trabalho se mantêm com o cedente. Também não se opõe a isso. No caso vertente, compete aos Estados-membros determinar o destino reservado ao contrato ou à relação laboral com o cedente.

Quanto ao artigo 7. da directiva

38 As questões do Arbeitsgericht Bamberg e do Arbeitsgericht Hamburg visam, por um lado, saber se a expressão "disposições legislativas, regulamentares ou administrativas", que consta do artigo 7. da directiva, abrange também a interpretação dada pelos órgãos jurisdicionais nacionais de disposições legislativas, regulamentares ou administrativas de direito nacional e, por outro, se uma interpretação deste tipo, que reconhece ao trabalhador o direito de oposição à transferência do seu contrato ou da sua relação de trabalho, constitui uma disposição "mais favorável aos trabalhadores" na acepção do artigo 7. da directiva.

39 Quanto ao primeiro ponto, há que recordar que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça (v. acórdão de 16 de Abril de 1991, Eurim-Pharm, n. 15, C-347/89, Colect., p. I-1747), o alcance das disposições legislativas, regulamentares ou administrativas nacionais deve ser apreciado tendo em conta a interpretação que delas fazem os órgãos jurisdicionais nacionais.

40 Daqui decorre que deve entender-se por "disposições legislativas, regulamentares ou administrativas", na acepção do artigo 7. da directiva, as disposições legislativas, regulamentares ou administrativas de um Estado-membro, tal como são interpretadas pelos órgãos jurisdicionais nacionais.

41 Quanto ao segundo ponto, basta salientar, por um lado, que o Arbeitsgericht Bamberg referiu expressamente que apenas submetia uma questão a este respeito se o Tribunal de Justiça respondesse que o artigo 3. , n. 1, da directiva proibia o trabalhador de se opor à transferência do seu contrato ou da sua relação de trabalho para o cessionário, e, por outro, que resulta dos fundamentos dos despachos do Arbeitsgericht Hamburg que este órgão jurisdicional apenas submeteu questões ao Tribunal de Justiça por considerar que o artigo 3. , n. 1, da directiva obstava ao direito de oposição do trabalhador.

42 Tendo o Tribunal de Justiça, no n. 37 do presente acórdão, respondido que as disposições do artigo 3. , n. 1, da directiva não obstam a que um trabalhador empregado pelo cedente se oponha à transferência do seu contrato ou da sua relação de trabalho para o cessionário, não há que responder às questões relativas ao alcance da expressão "disposições... mais favoráveis aos trabalhadores" que consta do artigo 7. da directiva.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

43 As despesas efectuadas pelo Governo alemão e pela Comissão das Comunidades Europeias, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante os órgãos jurisdicionais nacionais, compete a estes decidir quanto às despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

pronunciando-se sobre as questões submetidas pelo Arbeitsgericht Bamberg, por despacho de 7 de Maio de 1991, e pelo Arbeitsgericht Hamburg, por dois despachos de 4 de Abril de 1991, declara:

1) As disposições do n. 1 do artigo 3. da Directiva 77/187/CEE do Conselho, de 14 de Fevereiro de 1977, relativa à aproximação das legislações dos Estados-membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas, estabelecimentos ou partes de estabelecimentos, devem ser interpretadas no sentido de que não obstam a que um trabalhador empregado pelo cedente à data da transferência da empresa, na acepção do n. 1 do artigo 1. da directiva, se oponha à transferência do seu contrato ou da sua relação laboral para o cessionário. A directiva não obriga, no entanto, os Estados-membros a prever que, na hipótese de o trabalhador decidir livremente não manter o contrato ou a relação laboral com o cessionário, o contrato ou a relação de trabalho se mantêm com o cedente. Também não se opõe a isso. No caso vertente, compete aos Estados-membros determinar o destino reservado ao contrato ou à relação laboral com o cedente.

2) Deve entender-se por "disposições legislativas, regulamentares e administrativas", na acepção do artigo 7. da directiva, as disposições legislativas, regulamentares ou administrativas de um Estado-membro, tal como são interpretadas pelos órgãos jurisdicionais nacionais.