ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quarta Secção)

11 de Julho de 1991 ( *1 )

No processo T-19/90,

Detlef von Hoessle, funcionário do Tribunal de Contas das Comunidades Europeias, residente no Luxemburgo, patrocinado por Jean-Paul Noesen, advogado no foro do Luxemburgo, com domicílio escolhido no escritório deste último, 18, rue des Glacis,

recorrente,

contra

Tribunal de Contas das Comunidades Europeias, representado por Michael Becker e Jean-Marie Stenier, membros do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo, 12, rue Alcide De Gasperi,

recorrido,

que tem por objecto um pedido de reclassificação do recorrente do escalão 1 para o escalão 3 do grau A 7, com efeitos a 1 de Junho de 1989,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quarta Secção),

composto por: R. Schintgen, presidente de secção, D. A. O. Edward e R. García-Valdecasas, juízes,

secretário: H. Jung

vistos os autos e após a audiência de 21 de Março de 1991,

profere o presente

Acórdão

Os factos na origem do recurso

1

O recorrente, Detlef von Hoessle, titular de um diploma de «Finanzwirt» (diploma de gestão financeira, passado por um estabelecimento técnico superior), trabalhou na administração fiscal do Land da Baviera (Alemanha), tendo sido destacado em 1 de Abril de 1980, depois transferido em 1 de Novembro do mesmo ano, para o Bayerischer Oberster Rechnungshof (tribunal superior de contas da Baviera, a seguir «BORH»), onde exerceu, a partir de 2 de Fevereiro de 1981, as funções de «Rechnungsrat» e, a partir de 17 de Fevereiro de 1984, as de «Oberrechnungsrat». Deixou o BORH a 31 de Outubro de 1985, com o grau de «Oberrechnungsrat», que constitui o último grau do «gehobener Dienst» (categoria média superior).

2

Após ter sido aprovado nas provas do concurso n.° CC/B/1982, o recorrente entrou ao serviço do Tribunal de Contas das Comunidades Europeias (a seguir «Tribunal de Conus») a 1 de Novembro de 1985. Por decisão deste de 15 de Outubro de 1985, foi classificado no grau B 3, escalão 3, com efeitos a 1 de Novembro de 1985. Foi titularizado com efeitos a 1 de Agosto de 1986.

3

O recorrente foi aprovado seguidamente no concurso geral n.° EUR/A/17, organizado pela Comissão e pelo Tribunal de Contas para a constituição de uma reserva de recrutamento de administradores. No aviso do concurso, publicado em 25 de Fevereiro de 1988 (JO C 54, p. 13), a «natureza das funções» era descrita, no título I, do seguinte modo:

«Realização, com base em directivas gerais, de tarefas de concepção, de estudo e de controlo relacionadas com a actividade das Comunidades no domínio da auditoria.

As funções implicam a execução de uma ou várias das tarefas seguidamente enumeradas a título indicativo. Esta lista não é exaustiva:

trabalhos de controlo e de verificação documental e in loco das contas e da gestão comunitária;

trabalhos de análise dos sistemas, utilização de técnicas financeiras e contabilísticas;

análises custos/lucros, cálculos financeiros, análises económicas e jurídicas, utilização de técnicas de estatística e de amostragem;

utilização de técnicas informáticas e de bases de dados;

avaliação ex post das intervenções financeiras da Comunidade.»

No título II, B, n.° 2, especificava-se que os candidatos deviam:

«a)

Comprovar ter concluído estudos universitários completos comprovados mediante diploma...

b)

Possuir experiência profissional de nível equivalente ao das funções mencionadas no título I...»

Todavia, no título II, C, indicava-se que seriam «admitidos a concurso os candidatos que, muito embora não preenchendo as condições especiais que constavam do título II, B, n.° 2, alínea b), em 8 de Abril de 1988 sejam funcionários ou agentes das Comunidades Europeias, classificados na categoria B há dois anos e que tenham concluído estudos universitários completos comprovados por diploma».

4

A 19 de Abril de 1989, o Tribunal de Contas publicou o aviso de vaga de lugar n.° CC/A/7/89, relativo a cinco lugares de administrador. Os «diplomas e qualificações» exigidos vinham descritos do seguinte modo:

«—

Estudos completos de nível universitário, comprovados por diploma reconhecido ou experiência profissional equivalente;

experiência profissional suplementar de pelo menos um ano relacionada com a natureza das funções.»

5

Na sequência da publicação deste aviso de vaga, o recorrente foi nomeado administrador, por decisão do recorrido de 19 de Maio de 1989, com efeitos a 1 de Junho de 1989. Foi classificado no grau A 7, escalão 1, com base no artigo 46.° do Estatuto dos Funcionários das Comunidades Europeias (a seguir «Estatuto»).

6

A 10 de Julho de 1989, o presidente do Tribunal de Conus fez publicar a comunicação ao pessoal n.° 32/89, relativa à classificação dos funcionários após passagem de categoria a categoria ou de carreira a carreira após um concurso geral (a seguir «comunicação n.° 32/89»), na qual se reportava, por um lado, à comunicação anterior n.° 15/89, de 19 de Abril de 1989, que tinha o mesmo objecto e, por outro, se decidia que a classificação dos funcionarios aprovados num concurso geral de categoria ou de grau superior seria feita com base nos artigos 32.° ou 46.° do Estatuto, segundo a classificação mais favorável.

7

Após a difusão da comunicação n.° 32/89, o recorrente, em carta de 18 de Julho de 1989, pediu ao recorrido a sua reclassificação do escalão 1 para o escalão 3 do grau A 7, invocando a sua actividade de controlador no BORH durante o período que decorreu entre 1 de Abril de 1980 e 31 de Outubro de 1985, actividade que entendia ter-lhe feito adquirir uma experiência equivalente à de um funcionário de categoria A no Tribunal de Contas.

8

Por carta dirigida em 4 de Setembro de 1989 ao recorrido, o recorrente completou o seu pedido anexando um certificado, emitido em 1 de Agosto de 1989 pelo BORH, no qual as suas função e actividades junto deste organismo eram descritas do seguinte modo:

«—

preparação das verificações (tais como, por exemplo, elaboração de critérios de controlo e questionários, inquéritos analíticos e preparatórios, escolha de documentos objecto de um controlo);

execução de controlos de modo independente ou, aquando das verificações mais importantes, em equipa com um controlador com idênticas funções (nomeadamente controlo de documentos contabilísticos na sede do BORH ou no local, controlo de rentabilidade, avaliação das análises custos/lucros).

Estas verificações pressupõem que o funcionário que as efectua tem, conforme o caso, conhecimentos e uma experiência, nomeadamente no domínio da economia, do orçamento, do tratamento de dados bem como das análises em matéria de necessidades de pessoal.

Redacção de relatórios e de pareceres escritos relativos a problemas específicos que são assinados seguidamente pelos membros bem como a redacção de projectos de relatórios anuais».

9

Por carta de 13 de Setembro de 1989, o recorrido indeferiu o pedido do recorrente, com o fundamento de que resultava do certificado do BORH que a actividade por ele exercida junto deste organismo cabia no «gehobener Dienst» e correspondia às funções de um funcionário da categoria B no Tribunal de Contas.

10

O recorrente protestou contra esta decisão de indeferimento em carta de 15 de Setembro de 1989. Criticava à instituição o facto de não ter procedido a uma comparação efectiva das actividades de um controlador no BORH com as de um controlador no Tribunal de Contas e não ter tomado em consideração a diferente estrutura dos dois organismos.

11

O recorrente, em documento de 15 de Dezembro de 1989, chegado nesse dia ao recorrido, transformou a carta de 15 de Setembro de 1989 em reclamação formal na acepção do artigo 90.°, n.° 2, do Estatuto.

12

Em carta de 17 de Janeiro de 1990, a reclamação foi indeferida pelo recorrido por resultar do processo apresentado pelo recorrente que as funções de «Rechnungsrat» e de «Oberrechnungsrat» que tinha desempenhado junto do BORH correspondiam a cargos de controlador do «gehobener Dienst», sendo os controladores de grau superior classificados no «höherer Dienst» (categoria superior). Por conseguinte, a administração estava no direito de entender que a experiência que tinha sido adquirida no BORH correspondia à de um controlador adjunto no Tribunal de Contas, isto é, à de um funcionário da categoria B.

13

O recorrente apresentou, em 9 de Fevereiro de 1990, novo pedido preciso em nota de 13 de Março de 1990, na qual, embora reconhecendo que o processo pré-contencioso estava encerrado, solicitava uma reconsideração do seu caso. Este pedido foi indeferido por cartas do recorrido de 12 e 21 de Março de 1990.

A tramitação

14

É nestas condições que, por requerimento que deu entrada em 13 de Abril de 1990 na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância, o recorrente interpôs o presente recurso que visa a sua reclassificação do escalão 1 para o escalão 3 do grau A 7.

15

Com base no relatório do juiz-relator, o Tribunal decidiu iniciar a fase oral do processo sem instrução.

16

Contudo, por caru do secretário de 7 de Dezembro 1990, o Tribunal solicitou às partes que respondessem por escrito a duas questões relativas à natureza do recurso e à sua admissibilidade.

17

Por carta entrada na Secretaria do Tribunal em 18 de Janeiro de 1991, o recorrente respondeu às questões colocadas pelo Tribunal. Por carta entrada em 4 de Fevereiro de 1991, o recorrido respondeu às mesmas questões.

18

A fase oral teve lugar a 21 de Março de 1991. Os representantes das partes foram ouvidos nas suas alegações e nas respostas às questões colocadas pelo Tribunal.

19

O recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

a)

declarar que a formação e a experiência que adquiriu, de 1 de Abril de 1980 a 31 de Outubro de 1985, lhe dão direito a uma bonificação de antiguidade de escalão por aplicação do artigo 32.°, segundo parágrafo, do Estatuto;

b)

determinar que o recorrido o classifique no escalão 3 do grau A 7 com efeitos a 1 de Junho de 1989;

c)

constatar que, tendo em consideração a experiência profissional em situações equiparáveis à sua, ao indeferir os seus pedidos, o recorrido violou o princípio da igualdade de tratamento inscrito no artigo 5.°, n.° 3, do Estatuto;

d)

ordenar que o recorrido apresente, na medida do necessário, a prova de que «a actividade de um controlador no BORH é equiparável à de um controlador no Tribunal de Contas das Comunidades Europeias de grau A 6/A 7, quer na perspectiva das exigências em matéria de competência profissional quer na natureza do trabalho»;

e)

ordenar ao recorrido que remeta ao Tribunal os processos individuais de David Ramsay e David Richardson, ou pelo menos os elementos pertinentes para a solução do presente litigio, por forma a apurar quais os elementos da carreira destes funcionários que levaram o recorrido a aceitar o seu pedido de reclassificação no escalão e verificar se a aplicação dos mesmos critérios não justificaria, no seu caso, por analogia, o direito a uma bonificação de antiguidade de escalão;

f)

condenar o recorrido nas despesas.

20

O recorrido conclui pedindo que o Tribunal se digne:

rejeitar o recurso por inadmissível e, se assim o não entender, negar-lhe provimento;

condenar o recorrente nas despesas.

Quanto à admissibilidade

Quanto à intempestividade da reclamação

21

O recorrido, sem suscitar formalmente a questão da inadmissibilidade a este propósito, invocou, na resposta às questões colocadas pelo Tribunal, a intempestividade da reclamação de D. von Hoessle, determinante da inadmissibilidade do recurso. Salientou, a tal propósito, que respondeu a 13 de Setembro de 1990 ao pedido do recorrente que visava a sua reclassificação, enquanto este apenas apresentou a reclamação a 15 de Dezembro de 1990, ou seja, após se ter esgotado o prazo de três meses previsto no artigo 90.°, n.° 2, do Estatuto.

22

No decurso da audiência, o representante do recorrente contestou o facto de D. von Hoessle ter recebido a resposta datada de 13 de Setembro de 1990 no próprio dia. Afirmou que apenas a recebeu em 15 de Setembro de 1990 e daí que o prazo estatutário de três meses tenha sido respeitado.

23

Importa lembrar que os prazos de reclamação e de recurso fixados nos artigos 90.° e 91.° do Estatuto visam salvaguardar a segurança das situações jurídicas. São pois de ordem pública e não podem ser deixados à livre disposição das partes ou do juiz. Nessas condições, o facto de o Tribunal de Contas não ter formalmente invocado a carácter tardio da reclamação e a preclusão do recorrente na interposição de um recurso no Tribunal não significa a derrogação do sistema dos prazos imperativos referidos nos artigos 90.° e 91.° do Estatuto (ver, em último lugar, o acórdão do Tribunal de 6 de Dezembro de 1990, B./Comissão, n.° 16, T-130/89, Colect., p. II-761).

24

Por força do Regulamento de Processo, o Tribunal pode, em qualquer altura, examinar oficiosamente as questões prévias de inadmissibilidade. Incumbe pois ao Tribunal verificar, no caso em apreço, se os prazos de reclamação e de recurso foram respeitados.

25

Quanto a este ponto, importa lembrar que o prazo de três meses, previsto no artigo 90.°, n.° 2, do Estatuto, para a apresentação de uma reclamação, corre desde o dia da notificação da decisão ao destinatário e, de todo o modo, o mais tardar do dia em que o interessado dela teve conhecimento. Resulta, além disso, de jurisprudência assente que cabe à parte que se prevalece da ultrapassagem do prazo provar a data em que o referido prazo começou a correr (ver, por último, o acórdão do Tribunal de 20 de Março de 1991, Pérez-Mínguez Casariego/Comis-são, n.° 37, T-1/90, Colect., p. II-143). Ora, no caso vertente, importa constatar que não há no processo qualquer documento a comprovar que o recorrente tenha recebido a notificação ou tenha tomado conhecimento da resposta dada pelo Tribunal de Contas ao seu pedido em data anterior a 15 de Setembro de 1990. A ultrapassagem do prazo de três meses não se provou, de forma que não é de declarar o recurso inadmissível por intempestividade da reclamação.

Quanto à natureza do recurso

26

Na resposta à questão do Tribunal relativa à natureza do recurso, o recorrido explicou que não tinha suscitado a excepção da inadmissibilidade na fase escrita para permitir ao recorrente apresentar os seus fundamentos quanto ao mérito da questão. Todavia, tendo-o o Tribunal convidado a dar-lhe a conhecer a sua posição sobre esta matéria, vem pedir a inadmissibilidade do recurso com base em que, segundo jurisprudência constante do Tribunal, este, no âmbito do controlo da legalidade, não tem competência para dirigir à administração injunções como as pedidas pelo recorrente. Acresce que deve ser assim, por maioria de razão, no caso vertente, uma vez que o recorrente nem sequer pediu a anulação das decisões que impugna.

27

O recorrente sustenta, na resposta à mesma questão, que o recurso deve ser considerado de anulação. De facto, visando os seus pedidos a reclassificação e a aplicação em seu proveito do princípio da igualdade de tratamento não podem estes ser tomados em consideração a não ser em ligação com a anulação das decisões impugnadas. No decurso da audiência, o representante do recorrente precisou que o recurso de anulação visa a decisão de indeferimento pelo secretário-geral do Tribunal de Contas do seu pedido, recebido em 15 de Setembro de 1989, bem como a decisão de 17 de Janeiro de 1990, que rejeitou a sua reclamação.

28

Se bem que o fundamento da inadmissibilidade invocado pelo recorrido tenha sido suscitado tardiamente, incumbe ao Tribunal examiná-lo oficiosamente, por força do Regulamento de Processo, pois relaciona-se com a competência do Tribunal e reveste, desde logo, carácter de ordem pública (ver acórdão do Tribunal de Justiça de 17 de Fevereiro de 1970, Comissão/Itália, n.° 8, 31/69, Recueil, p. 25).

29

Quanto a este aspecto, o Tribunal constata que os fundamentos e argumentos expostos na petição de recurso põem em causa a legalidade da decisão do recorrido de 13 de Setembro de 1990, que indeferiu o seu pedido de reclassificação, bem como da decisão de 17 de Janeiro de 1990, que indeferiu a sua reclamação. O Tribunal entende, por conseguinte, que os primeiro e terceiro pontos do pedido do recorrente devem ser interpretados no sentido de que têm como verdadeiro objecto a anulação das decisões acima consideradas e que, por conseguinte, há que admitir, no que lhes diz respeito, a admissibilidade do recurso de D. von Hoessle enquanto recurso de anulação.

30

Ao invés, importa relevar que o segundo ponto do pedido, que visa expressamente que o Tribunal ordene ao recorrido que o classifique no escalão 3 do grau A 7 com efeitos a 1 de Junho de 1989, é, em todo o caso, inadmissível, uma vez que não cabe ao Tribunal dirigir injunções às instituições ou substituir-se a estas (ver, por último, o acórdão do Tribunal de 20 de Março de 1991, Pérez-Mínguez Casariego, n.° 91, T-1/90, já citado).

Quanto à não concordância entre a reclamação e o recurso

31

O recorrido, em resposta às questões colocadas pelo Tribunal, conclui pela inadmissibilidade do segundo fundamento invocado na petição de recurso e assente numa pretensa atitude discriminatória da sua parte face ao recorrente, por assentar em causa inteiramente distinta do único fundamento invocado no decurso da fase pré-contenciosa, consistente em pretensa violação do artigo 32.° do Estatuto.

32

No decurso da audiência, o representante do recorrente referiu que, se bem que nao mencionada expressamente, a ideia da violação do princípio da não discriminação figurava, contudo, na reclamação.

33

Embora a questão da admissibilidade deste segundo fundamento não tenha sido suscitada pelo recorrido em tempo oportuno, cabe ao Tribunal suscitá-la oficiosamente por força do Regulamento de Processo. A questão da admissibilidade que se coloca no caso vertente respeita à concordância entre a reclamação administrativa e o recurso jurisdicional. Trata-se de uma questão de ordem publica, na medida em que se reporta à regularidade do processo administrativo, e foi considerada formalidade essencial pelo Tribunal de Justiça no acórdão de 3 de Fevereiro de 1977, De Lacroix/Tribunal de Justiça, n.°s 10 e 11 (91/76, Recueil, p. 225). Mais precisamente, o exame oficioso da questão justifica-se em especial à luz da própria finalidade do processo administrativo, tal como definida por uma jurisprudência constante e, por último, no acórdão do Tribunal de 29 de Março de 1990, Alexan-drakis/Comissão, n.° 8 (T-57/89j Colect., p. II-143), nos termos do qual «o processo pré-contencioso visa permitir uma solução de comum acordo para os diferendos surgidos entre os funcionários ou agentes e a administração. Para que tal processo possa alcançar o seu objectivo, torna-se necessário que a autoridade investida do poder de nomeação tenha a possibilidade de conhecer de forma suficientemente precisa as críticas que os interessados formulam relativamente à decisão impugnada» (ver igualmente os acórdãos do Tribunal de Justiça de 14 de Março de 1989, Casto dei Amo Martinez/Parlamento, n.° 9, 133/88, Colect., p. 689; de 17 de Fevereiro de 1977, Reinarz/Comissão e Conselho, 48/76, Recueil, p. 291; e de 1 de Julho de 1976, Sergy/Comissão, 58/75, Recueil, p. 1139).

34

No caso vertente, importa lembrar que o segundo fundamento referido no decurso da fase escrita perante o Tribunal não foi invocado na fase pré-contenciosa do processo que terminou pela decisão de indeferimento pelo recorrido, em 17 de Janeiro de 1990, da reclamação do recorrente de 15 de Dezembro de 1989. Ora, resulta de uma jurisprudência assente que «nos recursos dos funcionários, os pedidos apresentados ao Tribunal de Justiça têm de ter, por um lado, o mesmo objecto que os expostos na reclamação e, por outro, pontos de contestação que assentem na mesma causa que os invocados na reclamação. Esses pontos de contestação podem ser desenvolvidos, perante o Tribunal de Justiça, através da apresentação de fundamentos e argumentos que não figurem necessariamente na reclamação mas que estejam estreitamente conexos com ela» (ver acórdãos de 7 de Maio de 1986, Rihoux e outros/Comissão, n.° 13, 52/85, Colect., p. 1555; de 20 de Maio de 1987, Geist/Comissão, n.° 9, 242/85, Colect., p. 2181; de 26 de Janeiro de 1989, Koutchoumoff/Comissão, n.° 10, 224/87, Colect., p. 99; de 14 de Março de 1989, Casto del Amo Martinez, n.° 10, 133/88, já citado).

35

A este propósito é de constatar que, no caso vertente, a reclamação administrativa apresentada pelo recorrente em 15 de Dezembro de 1989 não só não se refere ao segundo fundamento, como não contém, segundo a forma utilizada no n.° 13 do acórdão de 14 de Março de 1989, já citado, «nenhum elemento de que o recorrido possa deduzir, mesmo esforçando-se por interpretar a reclamação num espírito de abertura», que pretendia invocar uma violação do princípio da igualdade.

36

Assim, o segundo fundamento deve ser declarado inadmissível.

Quanto ao mérito

37

O recorrente pretende, antes de mais, que, de acordo com a comunicação n.° 32/89, a sua classificação devia ter sido feita com base nas disposições do artigo 32.° do Estatuto, que lhe eram mais favoráveis que as do artigo 46.° nos termos das quais foi classificado.

38

Ora, em sua opinião, o recorrido deu uma interpretação errada ao segundo parágrafo do artigo 32.° do Estatuto e aplicou-o mal. O recorrente acusa, a este propósito, o recorrido de não ter reconhecido a sua formação e a experiência profissional adquiridas no BORH desde 1 de Abril de 1980 a 31 de Outubro de 1985 e de lhe ter recusado, por esse facto, o benefício de uma bonificação de escalão.

39

O recorrente contesta a equiparação de um controlador funcionário do BORH a um funcionário da categoria B no Tribunal de Contas, a que o recorrido procedeu, em sua opinião abstractamente e sem tomar em consideração a sua experiência profissional específica.

40

Sustenta que a estrutura hierárquica do Tribunal de Contas é completamente distinta da dos «Landesrechnungshöfe» (tribunais de contas dos Länder) alemães. Não sendo possível uma comparação das carreiras nos dois organismos, a apreciação da experiência profissional dos interessados apenas se pode fazer com base numa comparação das respectivas funções e atribuições.

41

O recorrente afirma que existe larga correspondência, tanto no que respeita ao conteúdo como aos conhecimentos e à experiência exigidos, entre as funções de administrador do grau A 7/A 6 do Tribunal de Contas, tal como vêm definidas no aviso de concurso n.° EUR/A/17 (ver acima, n.° 3), e as de controlador do BORH, tal como vêm descritas no certificado emitido em 1 de Agosto de 1989 por este organismo (ver acima, n.° 8). Por conseguinte, a equiparação a que procedeu o recorrido entre as funções de um controlador no BORH e as de um funcionário da categoria B, e não as de um funcionário da categoria A, está errada.

42

O recorrente, remetendo para um acórdão do Tribunal de 22 de Maio de 1990, Sparr/Comissão (T-50/89, Colect., p. II-207), observa ainda que a experiência profissional deve ser apreciada face às funções respeitantes ao lugar a prover e não de acordo com a legislação nacional.

43

O recorrente invoca, por fim, os termos do aviso de vaga de lugar n.° CC//A/7/89, na sequência do qual foi nomeado funcionário do grau A 7 (ver, acima, n.° 4). Sustenta que não pôde adquirir «a experiência profissional... relacionada com a natureza das funções de pelo menos um ano» exigida nesse aviso, que seria necessariamente a de um funcionário da categoria A, no quadro das suas actividades como funcionário da categoria B no Tribunal de Contas. Seria necessário, por conseguinte, concluir que o recorrido, aquando da sua nomeação como funcionário da categoria A, tomou em consideração, para efeitos da experiência profissional exigida, as suas actividades junto do BORH.

44

O recorrido reconhece que a classificação do recorrente a contar de 1 de Junho de 1989 no grau A 7, escalão 1, foi feita com base no artigo 46.° do Estatuto. Refere que, apesar de um reexame do processo do recorrente no decurso da fase pré-contenciosa com base nas disposições do artigo 32.° do Estatuto, de acordo com a comunicação n.° 32/89, não foi possível atribuir-lhe outro escalão, dado que já lhe tinha sido dada a classificação mais favorável possível.

45

Na opinião do recorrido nada permite concluir que o recorrente tenha exercido, antes da sua entrada ao serviço das Comunidades Europeias, funções que podiam ser equiparadas às de funcionário da categoria A. Nem o certificado passado pelo BORH em 1 de Agosto de 1989 nem a jurisprudência citada pelo recorrente em apoio da sua argumentação seriam de natureza a sustentar tal conclusão.

46

Para refutar o argumento do recorrente segundo o qual, ao nomeá-lo funcionário A 7 na sequência do aviso de vaga de lugar n.° CC/A/7/89, ele próprio teria reconhecido a equivalência das suas funções no BORH às de um funcionário comunitário da categoria A, o recorrido remete para o aviso de concurso n.° EUR//A/17 (ver acima, n.° 3). Sustenta que, para admitir o recorrente a este concurso, aplicou-lhe as condições específicas descritas no título II, C, n.° 2, do aviso, segundo as quais seriam admitidos a concurso, mesmo não preenchendo as outras condições previstas no título B, os candidatos funcionários das Comunidades Europeias «... classificados na categoria B há dois anos e que (tivessem) feito estudos universitários completos...».

47

Liminarmente, o Tribunal entende que é útil lembrar que, por força do artigo 32.°, segundo parágrafo, do Estatuto, o qual, de acordo com as partes, é aplicável no caso vertente, a autoridade investida do poder de nomeação (a seguir «AIPN») pode, aquando da nomeação de um funcionário recrutado, atribuir-lhe uma bonificação de antiguidade no seu grau, com base na formação e na experiência profissional específica do interessado.

48

A este propósito, importa lembrar que é jurisprudência constante (ver, designadamente, acórdãos do Tribunal de Justiça de 5 de Fevereiro de 1987, Mouzourakis//Parlamento, 280/85, Colect., p. 589; de 1 de Dezembro de 1983, Blomefield//Comissão, 190/82, Colect., p. 3981; de 12 de Julho de 1984, Angelidis/Comissão,17/83, Colea., p. 2907; e acórdãos do Tribunal de 7 de Fevereiro de 1991, Tagaras/Tribunal de Justiça, n.° 65, T-18/89 e T-24/89, Colect., p. II-54; de 7 de Fevereiro de 1991, Ferreira de Freitas/Comissão, n.° 56, T-2/90, Colea., p. II-103; e de 20 de Março de 1991, André/Comissão, n.° 32, T-109/89, Colea., p. II-139), que deve ser reconhecido à AIPN um poder de apreciação relativamente a todos os aspectos susceptíveis de terem importância para o reconhecimento de experiências anteriores, no que respeita tanto à natureza e à duração destas como à relação mais ou menos estreita que podem apresentar com as exigências do lugar a prover.

49

Por conseguinte, no caso vertente, o Tribunal não pode anular as decisões em litígio tomadas pelo recorrido a não ser que este, ao recusar o benefício de bonificação do escalão, tenha manifestamente ignorado a experiência profissional de D. von Hoessle. Trata-se concretamente de apreciar se o recorrente, durante a sua actividade no BORH, exerceu, de facto, funções susceptíveis de serem equiparadas às de um funcionário da categoria A no Tribunal de Contas, sem ter em conta a designação oficial ou a qualidade que lhe tinha sido conferida no BORH de acordo com a legislação nacional alemã. Deve, todavia, salientar-se que o Tribunal não se pode substituir na sua interpretação ao recorrido, salvo se este cometeu um erro manifesto.

50

O exame do processo individual de D. von Hoessle pelo Tribunal não revelou a existência de qualquer elemento de prova que permita considerar que o recorrido não teria sido diligente ao apreciar, no momento da nomeação de D. von Hoessle, a sua experiência anterior. O Tribunal não constata a existência de qualquer elemento que demonstre que a AIPN se teria manifestamente enganado ao considerar que o recorrente adquiriu no BORH uma experiência profissional equiparável às funções exercidas por um funcionário comunitário da categoria B e não às de um da categoria A. Também não se prova que a AIPN se limitou, na sua apreciação, apenas ao documento do BORH apresentado pelo recorrente, sem atentar nas funções efeaivas por ele exercidas junto deste organismo.

51

Face ao poder discricionário de que dispõe a AIPN nesta matéria, esta posição não pode, por conseguinte, ser considerada desrazoável.

52

Aliás, no que respeita ao argumento do recorrente baseado nos termos do aviso de vaga de lugar n.° CC/A/7/89 e à afirmação de que a administração teria ela própria reconhecido a equivalência das suas funções no BORH às de um funcionário comunitário da categoria A, o Tribunal constata que, na rubrica «Títulos e qualificações», o referido aviso exige uma experiência profissional suplementar «relacionada» com a natureza das funções de pelo menos um ano, mas não requer expressamente que essa experiência profissional tenha sido a de um funcionário comunitário da categoria A. O recorrente não pode, por conseguinte, concluir que a administração, ao nomeá-lo administrador do grau A 7 na sequência do aviso de vaga de lugar n.° CC/A/7/89, tenha necessariamente reconhecido que a experiência profissional que adquiriu no BORH correspondia à de um funcionário comunitário da categoria A.

53

Além disso, mesmo supondo que a experiência profissional exigida no referido aviso de vaga de lugar tenha sido a de um funcionário da categoria A, tal não significa que a AIPN esteja obrigada por este facto a conceder ao recorrente o benefício de uma bonificação de escalão, como o permite o artigo 32.°, segundo parágrafo, do Estatuto. Na verdade, o amplo poder de apreciação reconhecido à AIPN no âmbito deste artigo autoriza-a a tomar em consideração um período determinado de experiência profissional para o recrutamento de um candidato para um lugar, recusando, aliás, ter em conta o mesmo período de experiência profissional para atribuição do benefício da bonificação de escalão, na medida em que entende que esta experiência não é suficientemente específica quanto à sua natureza, duração ou relação mais ou menos estreita que pode apresentar com as exigências do lugar a prover.

54

Decorre destas considerações que o argumento baseado nos termos do aviso de vaga de lugar n.° CC/A/7/89 não deve ser acolhido.

55

Nestas condições, o recurso deve ser rejeitado.

Quanto às despesas

56

O recorrente, que sustenta que os seus pedidos foram tratados com indiferença e negligência que o levaram a submeter a questão ao Tribunal para salvaguardar os direitos fundamentais da sua defesa e que todos os seus esforços para evitar um processo jurisdicional foram contrariados, conclui pedindo que o recorrido seja condenado nas despesas.

57

O recorrido, ao invés, pede que as despesas sejam integralmente suportadas pelo recorrente, dado que expôs várias vezes e de forma circunstanciada o seu ponto de vista jurídico ao recorrente designadamente quanto ao facto de os documentos que tinha exibido apenas virem confirmar a sua própria tese.

58

Nos termos do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas, se a parte vencedora o tiver requerido. No entanto, nos termos do mesmo regulamento, as despesas efectuadas pelas instituições ficam a seu cargo nos recursos dos agentes das Comunidades.

59

No caso vertente, o Tribunal considera que não existe razão para se afastar dos princípios que decorrem destas disposições, uma vez que nenhuma das partes conseguiu provar o bom fundamento das suas alegações a esse propósito, nem apresentar prova de elementos susceptíveis de justificar uma excepção às regras que regulam a repartição das despesas.

 

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTANCIA (Quarta Secção)

declara:

 

1)

É negado provimento ao recurso.

 

2)

Cada uma das partes suportará as próprias despesas.

 

Schintgen

Edward

García-Valdecasas

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 11 de Julho de 1991.

O secretário

H. Jung

O presidente da Quarta Secção

R. Schintgen


( *1 ) Língua do processo: alemão.