CONCLUSÕES DO ADVOGADO-GERAL

JEAN MISCHO

apresentadas em 23 de Abril de 1991 ( *1 )

Senhor Presidente,

Senhores Juízes,

1. 

A questão prejudicial que é objecto das presentes conclusões foi colocada pela High Court da Irlanda no quadro de um litígio provocado pelo facto de a Irlanda não ter transposto, dentro do prazo, a Directiva 79/7/CEE do Conselho, de 19 de Dezembro de 1978, relativa à realização progressiva do principio da igualdade de tratamento entre homens e mulheres em matéria de segurança social ( 1 ), que deveria ter sido transposta o mais tardar até 23 de Dezembro de 1984 e que, na realidade, só o foi através do Social Weifare Act de 16 de Julho de 1985. Todavia, as disposições desta lei só entraram em vigor em diferentes datas do ano de 1986.

2. 

T. Emmott, requerente no processo principal, casada, beneficiou a partir de Dezembro de 1983 de um subsídio de invalidez ao abrigo da legislação irlandesa em matéria de segurança social. Até 18 de Maio de 1986 recebeu esse subsídio à taxa reduzida aplicável ao tempo a todas as mulheres casadas. Em 19 de Maio de 1986 procedeu-se a um primeiro ajustamento desse subsídio com base na nova legislação, adoptada em execução da directiva; a partir desse momento, T. Emmott passou a receber o subsídio de invalidez à taxa aplicável a um homem que não tivesse adultos nem filhos a cargo. A partir de 17 de Novembro de 1986, o subsídio foi aumentado, passando a considerar-se a circunstância de a requerente ter três filhos a cargo. Em Junho de 1988 procedeu-se a um terceiro ajustamento.

3. 

Parece que T. Emmott ignorou a existência da directiva até ao momento em que tomou conhecimento, através da imprensa, da entrada em vigor da legislação irlandesa que assegurou a respectiva transposição.

4. 

Todavia, segundo sabemos, só após o acórdão do Tribunal de Justiça de 24 de Março de 1987 ( 2 ), McDermott e Cotter (a seguir «acórdão McDermott e Cotter I»), tomou conhecimento de que a directiva lhe conferia um direito à igualdade de tratamento desde 23 de Dezembro de 1984. Alguns dias depois de este último acórdão ter sido proferido, iniciou uma troca de correspondência com o Minister for Social Welfare a fim de obter a aplicação ao seu caso, com efeitos a 23 de Dezembro de 1984, das disposições da directiva. As autoridades irlandesas responderam indicando que, enquanto a High Court não se pronunciasse sobre a questão da retroactividade do subsídio a 23 de Dezembro de 1984 no processo McDermott e Cotter, nenhuma decisão poderia ser tomada no seu caso; simultaneamente, deixavam entender que o seu pedido seria analisado assim que o referido processo fosse decidido.

5. 

Em Janeiro de 1988, a requerente solicitou finalmente aos seus advogados que actuassem judicialmente, tendo estes obtido, no mês de Julho, autorização para apresentarem um pedido de fiscalização jurisdicional perante a High Court, sem prejuízo do direito dos requeridos invocarem o desrespeito pelos prazos processuais. Tendo estes últimos feito uso dessa possibilidade, o juiz nacional coloca-nos a seguinte questão:

«Deve o acórdão do Tribunal de Justiça de 24 de Março de 1987, McDermott e Cotter (286/85, Colect., p. 1453), no qual o Tribunal de Justiça respondeu às questões apresentadas ao abrigo do artigo 177.° do Tratado CEE pela High Court, interpretando o disposto no artigo 4.°, n.° 1, da Directiva 79/7/CEE do Conselho, de 19 de Dezembro de 1978, da forma seguinte:

“1)

O artigo 4.°, n.° 1, da Directiva 79/7/CEE do Conselho, de 19 de Dezembro de 1978, relativa à proibição de qualquer discriminação em razão do sexo em matéria de segurança social podia, na ausência de execução da directiva, ser invocado a partir de 23 de Dezembro de 1984 para afastar a aplicação de qualquer norma nacional não conforme com o referido artigo 4.°, n.° 1.

2)

Na falta de medidas de aplicação do artigo 4.°, n.° 1, da directiva, as mulheres têm direito a que lhes seja aplicado o mesmo regime que aos homens que se encontrem em situação análoga, regime que permanece, na falta de execução da referida directiva, o único sistema de referência válido.”

ser interpretado no sentido de que quando, em acção intentada perante um órgão jurisdicional nacional, com fundamento no n.° 1 do artigo 4.° dessa directiva, uma mulher casada pede para ser tratada de forma igual e que lhe seja paga uma compensação pela discriminação de que, alegadamente, foi vítima em virtude de não lhe terem sido aplicadas as normas aplicáveis aos homens que se encontrem na mesma situação, é contrária aos princípios gerais do direito comunitário a invocação pelas autoridades competentes do Estado-membro de normas processuais internas, em especial as relativas aos prazos, para se oporem a esses pedidos, de modo a restringirem ou recusarem essa compensação?»

6. 

E com razão que a Comissão observa que não se deve buscar uma resposta à questão colocada na interpretação do citado acórdão. Efectivamente, este debruça-se sobre o direito conferido enquanto tal e não sobre a questão de saber se um Estado-membro pode invocar uma regra processual nacional, concretamente uma regra sobre prazos, para evitar deferir um pedido assente no direito comunitário, que é o problema que aqui se coloca.

7. 

As partes estão de acordo em considerar que a regra nacional em causa é a Secção 84, artigo 21.°, n.° 1, do regulamento de processo dos tribunais superiores de 1986, que regula as práticas e a tramitação processual da High Court e da Supreme Court irlandesas, cuja redacção é a seguinte:

«O pedido de autorização para uma “judicial review” (fiscalização jurisdicional) deve ser apresentado num prazo curto e, em qualquer caso, no prazo de três meses a contar da data em que os fundamentos do pedido se revelaram pela primeira vez, ou de seis meses quando se tratar de um pedido de “certiorari”, a menos que o tribunal considere que não há lugar à prorrogação do prazo.»

8. 

Por conseguinte, há que analisar:

se é lícito que o Estado irlandês invoque o incumprimento de um prazo por parte de T. Emmott,

em caso afirmativo, qual pode ser a duração desse prazo e a partir de que momento é que ele pode começar a correr.

9. 

T. Emmott considera que permitir às autoridades nacionais invocar a extemporaneidade na apresentação do seu pedido equivaleria a dar a essas autoridades a possibilidade de beneficiarem com os seus próprios incumprimentos.

10. 

Considera que outra razão pela qual os requeridos não deveriam poder invocar a extemporaneidade do seu pedido reside na circunstância de que proceder desse modo equivaleria a não aplicar o princípio da igualdade de tratamento entre homens e mulheres. Entre 23 de Dezembro de 1984 e 18 de Novembro de 1986, todos os homens casados beneficiaram de uma taxa mais elevada e de um tratamento mais favorável em relação às pessoas a seu cargo do que as mulheres casadas. O Minister for Social Welfare concedeu esse tratamento aos homens casados independentemente de eles recorrerem aos tribunais para o obter; pretendem agora que o mesmo tratamento só seja aplicável às mulheres casadas se elas tiverem encetado imediatamente as diligências necessárias para o obter. Permitir aos requeridos defender com sucesso tal posição tradu-zir-se-ia em impor às mulheres casadas uma condição prévia difícil de preencher, isto é, a necessidade de actuarem de imediato judicialmente no caso de pretenderem obter a igualdade de tratamento. Semelhante concepção permitiria ao requerido e ao Estado irlandês tratar as mulheres casadas discriminatoriamente.

11. 

Efectivamente, podemo-nos interrogar se não resulta do acórdão do Tribunal de Justiça de 13 de Março de 1991, Cotter e McDermott (C-377/89, Colect., p. I-1155, a seguir «acórdão McDermott e Cotter II»), que o Estado irlandês não pode invocar o incumprimento de um prazo por parte de T. Emmott, seja qual for a data a partir da qual esse prazo comece a correr. Efectivamente, no n.° 19 desse acórdão pode-se 1er:

«se, a partir de 23 de Dezembro de 1984, um homem casado beneficiou automaticamente de acréscimos dos subsídios por pessoas ditas “a cargo”, sem ter de fazer prova de que as pessoas em questão estavam efectivamente a seu cargo, a mulher casada que se encontrava na mesma situação que esse homem tinha também o direito a esses acréscimos sem que pudesse ser exigida qualquer outra condição suplementar apenas às mulheres casadas».

12. 

O Tribunal considerou que esta regra devia ser aplicada com um automatismo absoluto, mesmo correndo o risco de uma duplicação, isto é, de uma atribuição simultânea de subsídios por pessoas a cargo ao marido e à mulher.

13. 

Se assim não se procedesse, acrescentou o Tribunal, permitir-se-ia às autoridades nacionais fundar-se no seu próprio comportamento ilegal para pôr em causa o pleno efeito do n.° 1 do artigo 4.° da directiva.

14. 

Por conseguinte, é possível que o Tribunal de Justiça considere que o Estado irlandês, ao impor o respeito de um prazo às mulheres casadas, viola esses princípios.

15. 

Não estou, porém, persuadido de que a aplicação das regras processuais nacionais tenha carácter discriminatório. Efectivamente, tais regras são aplicáveis qualquer que seja o sexo do requerente e seriam igualmente aplicáveis a um homem que tivesse um litígio com os requeridos por considerar que não tinha recebido aquilo a que tinha direito. Além disso, seria contrário ao princípio da segurança jurídica obrigar os órgãos jurisdicionais irlandeses a ainda aceitar dentro de dez ou vinte anos pedidos de pagamento relativos ao período compreendido entre 23 de Dezembro de 1984 e 16 de Novembro de 1986.

16. 

Tal como as autoridades irlandesas recorridas, os governos neerlandês e do Reino Unido e a Comissão, entendo que é possível aplicar neste caso a vossa jurisprudência assente relativa à repetição do indevido. Esta também respeita a situações em que um Es-tado-membro tenha incorrido, por acção ou por omissão, num incumprimento ao direito comunitário. Isto não nos impediu porém de considerar que os particulares deviam respeitar as regras processuais nacionais, incluindo as relativas aos prazos, se pretendessem obter o que o direito comunitário lhes concede.

17. 

Entre os numerosos acórdãos citados ao longo deste processo ( 3 ), é provavelmente o acórdão Rewe de 16 de Dezembro de 1976 que melhor expressa a vossa doutrina na matéria; permita-se-me, assim, citar uma larga passagem do n.° 5 do referido acórdão:

«assim, em aplicação do princípio de cooperação, enunciado no artigo 5.° do Tratado, é confiado aos órgãos jurisdicionais nacionais o cuidado de garantir a protecção jurídica decorrente, para os cidadãos, do efeito directo das normas de direito comunitário;

consequentemente, na falta de regulamentação comunitária na matéria, compete à ordem jurídica interna de cada Estado-membro designar os órgãos jurisdicionais competentes e regular as modalidades processuais das acções judiciais destinadas a garantir a protecção dos direitos que decorrem, para os cidadãos, do efeito directo do direito comunitário, modalidades que, obviamente, não podem ser menos favoráveis do que as modalidades relativas a acções análogas de natureza interna;

os artigos 100.° a 102.° e 235.° do Tratado permitem a adopção, sendo caso disso, das medidas necessárias para remediar as disparidades das disposições legislativas, regulamentares ou administrativas dos Estados-membros nesta matéria, quando tais disparidades sejam susceptíveis de provocar distorções ou de prejudicar o funcionamento do mercado comum;

na falta de tais medidas de harmonização, os direitos decorrentes do direito comunitário devem ser exercidos, perante os órgãos jurisdicionais nacionais, segundo as modalidades determinadas pela legislação nacional;

uma outra solução só seria possível se estas modalidades e os prazos tornassem impossível, na prática, o exercício de direitos que os órgãos jurisdicionais nacionais têm a obrigação de proteger;

não é este o caso da fixação de prazos razoáveis de recurso, sob pena de exclusão do direito;

com efeito, a fixação de prazos deste tipo, no que respeita a recursos de natureza fiscal, traduz a aplicação do princípio fundamental da segurança jurídica, que protege simultaneamente o contribuinte e a administração interessada».

18. 

A aplicação destes princípios ao presente caso suscita as seguintes observações.

19. 

Nos termos do artigo 173.° do Tratado CEE, as pessoas singulares ou colectivas têm um prazo de dois meses para interpor recurso para o Tribunal de Justiça. O prazo de três meses previsto pela legislação irlandesa é assim certamente um «prazo razoável» na acepção da jurisprudência deste Tribunal. Mas o artigo 21.°, n.° 1, do regulamento de processo irlandês prevê que o «pedido de autorização para uma judicial review deve ser apresentado num prazo curto e, em qualquer caso, no prazo de três meses...». Se isto significasse que um pedido apresentado menos de dois meses após a data em que os elementos que lhe servem de fundamento se revelaram pela primeira vez pode ser indeferido, então tal possibilidade seria incompatível com o critério do «prazo razoável».

20. 

Em segundo lugar, de acordo com a citada jurisprudência, as regras processuais nacionais aplicáveis aos recursos judiciais destinados a assegurar a protecção dos direitos que para os cidadãos resultam do efeito directo do direito comunitário não devem ser menos favoráveis do que as aplicáveis a recursos internos idênticos.

21. 

Como a Secção 84, artigo 21.°, n.° 1, do regulamento de processo dos tribunais superiores irlandeses parece aplicar-se indistintamente aos pedidos internos e aos pedidos baseados no direito comunitário, não deveria haver problemas a este propósito. Todavia, compete ao juiz nacional verificar se não existirão em direito nacional espécies de acções judiciais de alcance análogo ao pedido de T. Emmott, que não estejam sujeitos à observância de um prazo. Na audiência foram evocadas, a este propósito, certas reivindicações directamente fundadas na Constituição.

22. 

Em terceiro lugar, as modalidades e prazos previstos pela legislação nacional não devem tornar impossível, na prática, o exercício dos direitos que os órgãos jurisdicionais nacionais têm a obrigação de proteger. Se assim acontecesse, as autoridades irlandesas competentes não teriam qualquer direito de invocar essas modalidades e prazos e, sobretudo, o juiz nacional não os poderia aplicar. Por conseguinte, o Tribunal de Justiça não aceitou a aplicação pura e simples, sem qualquer restrição, do direito nacional, declarando que esse direito apenas se aplica desde que não impossibilite, na prática, a protecção dos direitos que para os cidadãos resultam do efeito directo do direito comunitário. Esta condição é fundamental, uma vez que demonstra que é o princípio do efeito útil do direito comunitário que está na base da jurisprudência em causa e que deve inspirar a resposta à questão colocada.

A importância deste princípio em matéria de aplicação de directivas foi, de resto, sublinhada pelo Tribunal de Justiça no acórdão Grad ( 4 ).

23. 

Ora, a possibilidade ou a impossibilidade de exercer esses direitos depende, em larga medida, da data em que o «prazo razoável» começa a correr. E surpreendente que os requeridos no processo principal, que pretendem invocar uma excepção baseada na regra nacional relativa aos prazos, em lado nenhum indiquem qual seria essa data. Além disso, não tomam em conta, na resposta que propõem para a questão prejudicial, a condição segundo a qual a regra nacional não deve impossibilitar, na prática, o exercício dos direitos decorrentes do direito comunitário.

24. 

Será que, neste caso, a data em que a existência dos fundamentos do pedido pela primeira vez se revelou poderia ser a data a partir da qual a directiva deveria ter sido transposta? O acórdão McDermott e Cotter I declara, efectivamente, que as mulheres têm direito à igualdade de tratamento a partir de 23 de Dezembro de 1984. Aliás, o juiz de reenvio faz especificamente alusão a essa data. Deverá concluir-se que as mulheres que se considerassem vítimas de uma discriminação deveriam ter apresentado um pedido antes de 23 de Março de 1985 ou, pelo menos, no prazo de três meses a contar da primeira vez que, após 23 de Dezembro de 1984, lhes foi recusada a igualdade de tratamento?

25. 

Sou de opinião que o prazo só pode ter começado a correr a partir da data em que a directiva deveria ter sido transposta no caso de se poder provar perante o juiz nacional que a requerente tomou conhecimento, nessa data, de que poderia invocar directamente o princípio da igualdade de tratamento consagrado no artigo 4.° da directiva.

26. 

No caso contrário, entendo que a própria natureza da directiva se opõe a que essa data seja tomada em consideração. Efectivamente, o princípio de que «o desconhecimento da lei não aproveita a ninguém» não pode ser oposto aos particulares, tratando-se de uma directiva ainda não transposta. Uma directiva apenas vincula o Es-tado-membro; não se dirige aos particulares. Por conseguinte, da directiva enquanto tal não podem resultar obrigações para os particulares ( 5 ). Assim, a directiva não pode igualmente servir de ponto de partida para um prazo oponível a estes últimos.

27. 

Pode-se igualmente recordar a este propósito que a publicação das directivas no Jornal Oficial das Comunidades Europeias, invocada na audiência pelos requeridos, é fundamentalmente diferente da que se utiliza em relação aos actos obrigatórios para os particulares. Não se trata de uma «publicação legal», com efeitos jurídicos, como no caso dos regulamentos, mas unicamente de uma publicação para informação.

28. 

Será aliás interessante assinalar que o texto da directiva publicada não permite aos particulares conhecer exactamente a data limite para a respectiva transposição. Efectivamente, esse texto apenas menciona a existência de um prazo antes de cujo termo o Estado-membro, destinatário da directiva, a deverá transpor, bem como o facto de que esse prazo começa a correr na data da notificação da directiva ao Estado-membro. Ora, essa data não figura na presente directiva e não existe qualquer razão para supor que ela é do conhecimento dos particulares.

29. 

Além disso, se é certo que a interpretação dada pelo Tribunal de Justiça num acórdão prejudicial tem efeitos retroactivos uma vez que determina como é que a norma interpretada deveria ter sido entendida desde o início, é igualmente indiscutível que, antes de o Tribunal de Justiça se pronunciar sobre a questão, não é certo que a directiva, ou um ou outro dos seus artigos, tenha efeito directo.

30. 

Coloca-se, portanto, a questão de saber a partir de que momento é que seria justo que o prazo começasse a correr. Como a Comissão, considero que a justiça manda que se diga que esse momento não se pode situar antes daquele em que o requerente tenha razoavelmente podido tomar conhecimento do efeito directo da disposição de que pretende beneficiar e, se necessário, do alcance exacto desta quando ele não fosse evidente. No presente caso, colocam-se, de facto, dois problemas distintos, isto é, o da concessão dos subsídios devidos retroactivamente a 23 de Dezembro de 1984 (decidido no acórdão McDermott e Cotter I) e o do direito de as mulheres casadas receberem subsídio por pessoas a cargo ou pagamentos transitórios (decidido no acórdão McDermott e Cotter II, que data apenas de 13 de Março de 1991).

31. 

Aliás, esta solução tem um paralelo no artigo 173.°, terceiro parágrafo, do Tratado CEE, que dispõe que o prazo para interpor um recurso de anulação começa a correr a partir do dia em que o recorrente tenha tomado conhecimento do acto impugnado.

32. 

T. Emmott recordou também o acórdão Adams ( 6 ), em cujo n.° 50 o Tribunal de Justiça declarou, a propósito do prazo de prescrição de cinco anos que figura no artigo 43.° do Estatuto do Tribunal de Justiça, que «a prescrição não pode ser oposta à vítima de um prejuízo que só tardiamente tenha podido tomar conhecimento do facto gerador desse prejuízo, não tendo, assim, podido dispor de um prazo razoável para apresentar o seu requerimento ou pedido antes de expirar o prazo de prescrição».

33. 

E evidente que há um momento a partir do qual o requerente não pode razoavelmente afirmar que sempre ignorou os direitos que lhe conferia a disposição em causa. Esse momento será necessariamente variável consoante os factos do processo, competindo portanto ao juiz nacional determiná-lo à luz das circunstâncias.

34. 

Finalmente, há que examinar um último aspecto do problema, sobre o qual a Comissão insistiu bastante, aliás com toda a razão: o de que não deveria ser permitido à autoridade competente, que afirmou não estar ainda em condições de se pronunciar sobre o pedido e que deixou entender que seria tomada uma decisão assim que o órgão jurisdicional ao qual o problema fora submetido se pronunciasse sobre a matéria, suscitar uma excepção relativa a um prazo quando o interessado se decide finalmente a recorrer aos tribunais.

35. 

Numa cana do departamento irlandês dos Assuntos Sociais de 26 de Junho de 1987, anexa à decisão de reenvio, pode-se efectivamente 1er que

«no action can be taken on anyone's claim as the Directive is still the subject of High Court Proceedings.

When a decision is given by the High Court, the necessary action will be taken to deal with it, and your case will be dealt with immediately».

36. 

Compete ao juiz de reenvio pronunciar-se sobre o alcance desta carta e da globalidade da correspondência trocada.

37. 

Exceptuando as considerações de direito irlandês que poderiam entrar em linha de conta, o direito comunitário poderia fornecer a solução do problema no sentido de que o comportamento da administração pode ter sido susceptível de impossibilitar, na prática, o exercício dos direitos de T. Emmott.

Conclusão

38.

Por todas estas razões, sugiro que se responda do seguinte modo à questão colocada:

«No contexto de um pedido como o descrito na questão prejudicial, as autoridades competentes de um Estado-membro, ao invocarem as regras processuais nacionais, designadamente as relativas aos prazos, não violam o direito comunitário na condição de que os mesmos prazos se apliquem aos pedidos com idêntico alcance de direito interno. Esses prazos devem igualmente ter uma duração razoável, só devem ser calculados a partir do momento em que o interessado possa razoavelmente ter tomado conhecimento dos seus direitos e o exercício destes não deve ser impossibilitado, na prática, pela atitude da autoridade competente.»


( *1 ) Língua original: francis.

( 1 ) JO 1979, L 6, p. 24; EE 05 F2 p. 174.

( 2 ) Acórdão dc 24 de Março de 1987, McDermott e Cotter (286/85, Coleo., p. 1453).

( 3 ) Ver o acórdão de 19 de Dezembro de 1968, Salgou (13/68, Recueil, p. 661); os acórdãos de 16 de Dezembro de 1976, Rewe (33/76, Recueil, p. 1989), e Comet (45/76, Recueil, p. 2043); os acórdãos de 27 de Março de 1980, Denkavit (61/79, Recueil, p. 1205), de 9 de Novembro de 1983, San Giorgio (199/82, Recueil, p. 3595), de 2 de Fevereiro de 1988, Barra (309/85, Colect., p. 355), de 29 de Junho de 1988, Deville (240/87, Colect., p. 3513) e de 9 de Novembro de 1989, Bessin e Salson (386/87, Colect., p. 3551).

( 4 ) Acórdão de 6 de Novembro de 1970, Grad (9/70, Recueil, p. 825).

( 5 ) Ver acórdão de 26 de Fevereiro de 1986, Marshall (152/84, Colect., p. 723).

( 6 ) Acórdão de 7 de Novembro de 1985, Adams/Comissäo (145/83, Recueil, p. 3539,3591).