ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Terceira Secção)

7 de Fevereiro de 1991 ( *1 )

No processo T-167/89,

Jan Robert de Rijk, funcionário da Comissão das Comunidades Europeias, residente em Tervuren (Bélgica), representado por Jean-Noël Louis, advogado no foro de Bruxelas, com domicílio escolhido no Luxemburgo na Fiduciaire Myson SARL, 1, rue Glesener,

recorrente,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada por J. Griesmar, consultor jurídico, na qualidade de agente, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de Guido Berardis, membro do seu Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,

recorrida,

que tem por objecto a anulação da decisão da Comissão de 17 de Fevereiro de 1989 que procede, nos termos do artigo 67.°, n.° 2, do Estatuto dos Funcionários das Comunidades Europeias, ao cálculo rectificativo da remuneração paga ao recorrente durante o período compreendido entre Outubro de 1987 e Fevereiro de 1989,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Terceira Secção),

composto por A. Saggio, presidente, B. Vesterdorf e K. Lenaerts, juízes,

secretário: B. Pastor, administradora

tendo em conta a fase escrita do processo e após a realização da audiência de 17 de Janeiro de 1991,

profere o presente

Acórdão

Factos na origem do recurso

1

O recorrente, funcionário de nacionalidade neerlandesa da Comissão, afecto a Bruxelas, tem dois filhos, pelos quais recebe abono por filho a cargo e abono escolar, ambos previstos no artigo 67.° do Estatuto dos Funcionários das Comunidades Europeias (a seguir «Estatuto») e nos artigos 2.° e 3.° do anexo VII do Estatuto. O mais velho frequenta, desde o Verão de 1987, o ensino superior nos Países Baixos, pelo que o abono escolar recebido em relação a ele foi duplicado em aplicação do artigo 3.°, terceiro parágrafo, segundo travessão, do anexo VII do Estatuto.

2

Tendo o recorrente declarado mais tarde que o seu filho beneficiava desde Outubro de 1987 de uma bolsa de estudos («basisbeurs») nos termos da lei neerlandesa, a administração decidiu, em conformidade com o artigo 67.°, n.° 2, do Estatuto, efectuar sobre o montante das prestações familiares anteriormente pagas ao interessado por força do Estatuto uma dedução correspondente ao montante das «prestações da mesma natureza, recebidas de outra proveniência», ou seja, o montante da «basisbeurs» (605,40 HFL por mês), sendo as importâncias assim recebidas convertidas em francos belgas às sucessivas taxas de câmbio a que se refere o artigo 63.° do Estatuto e aplicando-se-lhe em seguida um coeficiente igual à relação entre o coeficiente de correcção para a Bélgica (local de afectação do funcionário) e o coeficiente de correcção para os Países Baixos em vigor para cada mês considerado. Foi nesta base que a autoridade investida do poder de nomeação (a seguir «AIPN») procedeu, através da decisão de 7 de Fevereiro de 1989, ora impugnada, à liquidação dos montantes sujeitos a reposição.

3

Como indicava a decisão impugnada, o montante de 191614 BFR sujeito a reposição veio a ser descontado nas remunerações do recorrente, à razão de seis prestações de 30000 BFR de Abril a Setembro de 1989, inclusive, e de uma última prestação de 11614 BFR em Outubro de 1989.

4

Por reclamação de 16 de Maio de 1989, o recorrente contestou o modo de liquidação dos montantes sujeitos a reposição, alegando uma aplicação ilegal do coeficiente de correcção para os Países Baixos aos montantes a repor.

5

Na falta de resposta da administração, a reclamação do recorrente foi tacitamente indeferida em 16 de Setembro de 1989.

Quanto ao processo

6

Foi nestas circunstâncias que, por petição apresentada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 18 de Dezembro de 1989 e registada no dia seguinte, o recorrente pediu a este Tribunal que se pronunciasse sobre o litígio. Com base no relatório preliminar do juiz-relator o Tribunal (Terceira Secção) decidiu iniciar a fase oral do processo sem instrução.

7

Todavia, por carta do seu secretário de 19 de Novembro de 1990, o Tribunal convidou a Comissão a responder por escrito, até 5 de Janeiro de 1991, a cinco questões relativas à sua prática administrativa e à das outras instituições acerca da aplicação do artigo 67.°, n.° 2, do Estatuto.

8

Por carta entregue na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 4 de Janeiro de 1991 e registada no dia 7 do mesmo mês, a Comissão respondeu às questões colocadas pelo Tribunal.

9

A audiência teve lugar em 17 de Janeiro de 1991. Os representantes das partes foram ouvidos em alegações e nas respostas às questões colocadas pelo Tribunal.

Pedidos das partes

10

O recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

declarar o recurso admissível e procedente;

em consequência, anular a decisão da Comissão de 17 de Fevereiro de 1989 de proceder ao cálculo rectificativo da remuneração que lhe foi paga no período compreendido entre Outubro de 1987 e Fevereiro de 1989;

anular, na medida do necessário, a decisão tácita de indeferimento da reclamação apresentada em 16 de Maio de 1989;

condenar a recorrida nas despesas do processo.

A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne :

negar provimento ao recurso,

decidir sobre as despesas como for de direito.

Quanto à admissibilidade

11

A Comissão suscitou, na réplica, a inadmissibilidade do fundamento do recorrente assente na violação do artigo 67.°, n.° 2, do Estatuto, dado ter sido apresentado, pela primeira vez, na réplica, tratando-se, por conseguinte, de um fundamento novo na acepção do artigo 42.°, n.° 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça. A Comissão afirma que a petição, ao contrário do que aconteceu com a reclamação pré-contenciosa e com a réplica, assentou exclusivamente na violação do artigo 67.°, n.° 4, do Estatuto.

12

O Tribunal de Primeira Instância sublinha que a questão prévia de inadmissibilidade suscitada pela Comissão ignora o teor da argumentação exposta na petição, cujo primeiro fundamento é a violação do artigo 67.° do Estatuto, no seu conjunto, e que menciona, como «quadro jurídico do litígio, o artigo 67.°, segundo parágrafo». A referência feita pelo recorrente, ao artigo 67.°, n.° 4, do Estatuto teve como único objectivo contestar que tal disposição fosse aplicável ao caso vertente, dado que as prestações familiares comunitárias são pagas ao recorrente e não a outra pessoa.

13

A questão prévia de inadmissibilidade deve, por conseguinte, ser rejeitada.

Mérito da causa

14

Em apoio do seu recurso, o recorrente invoca dois fundamentos: por um lado, a violação do artigo 67.° do Estatuto e, por outro, a violação do princípio da igualdade de tratamento entre os funcionários e do princípio da boa administração, fundamentos que, em parte, se confundem.

15

No primeiro fundamento o recorrente afirma que a decisão impugnada não encontra justificação em nenhuma disposição estatutária para aplicar ao montante da «basisbeurs», a deduzir dos abonos comunitários por filho a cargo e escolar, o coeficiente que toma em consideração o coeficiente de correcção para os Países Baixos. O artigo 67.°, n.°2, do Estatuto, por força do qual o montante da «basisbeurs» foi deduzido, não prevê, de nenhum modo, que os montantes a deduzir a título de abonos da mesma natureza que as prestações familiares sejam afectados de qualquer coeficiente. Segundo o recorrente, resulta deste silêncio que se impõe, em vez disso, aplicar, ao caso vertente, a regra geral expressa no artigo 64.°, primeiro parágrafo, do Estatuto. Segundo essa disposição, a remuneração do funcionário, de que fazem parte as prestações familiares nos termos do artigo 62.° do Estatuto, é afectada de um coeficiente de correcção consoante as condições de vida dos diferentes locais de afectação. O recorrente alega que desta circunstancia decorre que as diferentes disposições estatutarias que, prevêem a aplicação de um coeficiente de correcção diferente do do local de afectação constituem excepções à regra geral devendo, por conseguinte, ser interpretadas restritivamente. Por outro lado, a existência de tais excepções mostra, segundo o recorrente, que sempre que o legislador comunitário pretendeu introduzir excepções à regra geral o fez expressamente.

16

O recorrente acrescenta, ao desenvolver o seu segundo fundamento, ser vítima de uma discriminação em relação aos funcionários que não beneficiam de um abono nacional da mesma natureza que as prestações familiares, dado que a estes últimos não é aplicado qualquer coeficiente à parte das prestações comunitárias correspondente ao abono nacional, mesmo que se prove que o seu filho estuda noutro Es-tado-membro.

17

A Comissão admite que o artigo 67.°, n.° 2, do Estatuto, não prevê expressamente a aplicação de um coeficiente, que tome em conta o coeficiente de correcção do país em que o abono é pago ou gasto, ao montante dos abonos nacionais da mesma natureza que as prestações familiares comunitárias que sejam deduzidos destas últimas. Sublinha, no entanto, que esta disposição tão-pouco impede a aplicação de tal coeficiente a essas importâncias. Por essa razão, a Comissão entende que tinha legitimidade para basear a sua decisão no artigo 67.°, n.° 2, do Estatuto, interpretado em conformidade com o princípio da igualdade de tratamento entre funcionários, qualquer que seja o seu local de afectação, consagrado enquanto princípio superior de direito da função pública comunitária (ver acórdão do Tribunal de Justiça de 31 de Maio de 1979, Newth/Comissão, 156/78, Recueil, p. 1941). A este propósito, a Comissão afirma que, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça (acórdãos de 31 de Maio de 1979, 156/78, acima citado, e de 20 de Março de 1984, Razzouk e Beydoun/Comissão, 75/82 e 117/82, Recueil, p. 1509), a administração tem a obrigação de fazer prevalecer este princípio sobre disposições estatutárias explícitas e claras, quando tais disposições conduzam a resultados discriminatórios. A Comissão alega que, a fortiori, o mesmo deve acontecer quando a administração se encontra perante um texto neutro, susceptível de duas interpretações, uma compatível com o princípio da igualdade de tratamento e outra contrária a tal princípio.

18

Por outro lado, a Comissão defende que a existência de disposições estatutárias que prevêem expressamente a aplicação de um coeficiente diferente do coeficiente de correcção do local de afectação demonstra a existência do princípio superior da igualdade no direito da função pública comunitária.

19

A Comissão afirma que só se poderia afirmar que ignora o princípio da igualdade de tratamento, concebida em termos de poder de compra efectivamente facultado, entre os funcionários com diferentes locais de afectação, se não aplicasse o coeficiente impugnado pelo recorrente, e em relação ao qual a Comissão, na sua resposta escrita às questões do Tribunal, afirmou que ele mais não é, na realidade, do que uma «taxa-transferência» utilizada para efeito das transferências para fora do país de afectação de uma parte da remuneração, prevista no artigo 17.°, n.° 3, do anexo VII do Estatuto. Efectivamente, segundo a Comissão, dado que é suposto que qualquer abono tome em consideração o custo de vida do país no qual é pago, tal como é traduzido pelo coeficiente de correcção desse país, convém, com vista a preservar a igualdade de tratamento concebida em termos de poder de compra efectivamente facultado pelo abono no local em que é gasto, aplicar o coeficiente «taxa-transferência», que permite converter o poder de compra facultado por determinado abono num local diferente do local de afectação, em termos de poder de compra facultado no local de afectação.

20

Deste modo, a Comissão assinala que, no caso vertente, se não tivesse aplicado à «basisbeurs», recebida nos Países Baixos pelo filho do recorrente afecto a Bruxelas, o coeficiente «taxa-transferência» a fim de tomar em consideração o poder de compra facultado nos Países Baixos por esse abono, ter-se-ia verificado uma discriminação em termos de poder de compra entre, por um lado, o recorrente, que gasta o seu abono num país onde o custo de vida é baixo e, por outro lado, por exemplo, um funcionário dinamarquês cujo filho recebesse na Dinamarca (coeficente de correcção em vigor na época = 129,2), e aí o gastasse, um abono do mesmo montante.

21

Consequentemente, a Comissão considera que o método aplicado na decisão impugnada permite salvaguardar plenamente a igualdade de tratamento entre os funcionários, quaisquer que sejam o seu local de afectação e aquele em que o filho estuda e recebe abonos nacionais.

22

Por outro lado, a Comissão entende que a discriminação alegada pelo recorrente no seu segundo fundamento não o é na verdade. Efectivamente, o recorrente que recebe um abono nacional não se encontra numa situação idêntica ou comparável à dos funcionários que não recebem qualquer abono nacional, situação que lhe permitiria reivindicar um tratamento idêntico. A Comissão acrescenta que esta diferença na situação de facto destas duas categorias de funcionários não lhe é imputável, antes o sendo ou aos funcionários que não pedem os abonos nacionais a que têm direito, ou aos Estados-membro que não criaram tal tipo de abonos. Na audiência, a Comissão esclareceu que o método aplicado ao recorrente não era susceptível de engendrar qualquer discriminação entre os funcionários que beneficiam e os que não beneficam de um abono nacional, dado que estes últimos, pelo facto de beneficarem de abonos comunitários integrais, poderão colher vantagens da aplicação da «taxa-transferência» prevista no artigo 17.°, n.° 3, do anexo VII do Estatuto, que lhes permita adaptar o montante dos seus abonos comunitários ao custo de vida do local em que estes são gastos pelos seus filhos.

23

Impõe-se, em primeiro lugar, recordar que resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça (ver acórdão de 31 de Maio de 1979, Newth, 156/78, acima citado, n.° 13) que uma disposição estatutária deve ser interpretada no sentido de que, se a sua aplicação for susceptível de provocar uma violação de uma regra superior de direito, a AIPN tem a obrigação, para evitar tal consequência, de não proceder à sua aplicação. Consequentemente, há que verificar se o respeito pelo princípio superior da igualdade de tratamento impunha, na falta de disposição estatutária nesse sentido, a aplicação de um coeficiente, correspondente à «taxa-transferência» prevista no artigo 17.°, n.° 3, do anexo VII do Estatuto, ao montante do abono nacional da mesma natureza que as prestações familiares comunitárias sujeitas a repetição, por força do artigo 67.°, n.° 2, do Estatuto. Deste modo, há que averiguar se o método aplicado pela Comissão conduz, em qualquer circunstância, a uma igualdade de tratamento, como afirmou a Comissão.

24

O Tribunal verifica que o método aplicado pela Comissão permite preservar a igualdade de tratamento, concebida em termos de poder de compra entre todos os funcionários, quer recebam ou não um abono nacional, desde que o coeficiente de correcção do local de afectação seja inferior ao coeficiente de correcção do local de despesa. Efectivamente, nessa hipótese, o método da Comissão é favorável aos funcionários que recebem um abono nacional da mesma natureza que as prestações familiares comunitárias, uma vez que, dado que este último é gasto num país em que o custo de vida é mais elevado do que no local de afectação, o abono nacional proporcionará naquele um poder de compra inferior ao que teria no local de afectação, o que terá por consequência que a importância a ser deduzida das prestações comunitárias será inferior ao montante nominal do abono nacional recebido. Os funcionários que não beneficiam de um abono nacional da mesma natureza recorrerão, por seu lado, ao mecanismo da «taxa-transferência» previsto no artigo 17.° do anexo VII do Estatuto, como sublinhou a Comissão na audiência, o que lhes permitirá obter o pagamento, no local de estudos do seu filho, do abono comunitário, o qual será aumentado tendo em conta o custo de vida mais elevado do que no local de afectação.

25

Deste modo, o funcionário afecto à Bélgica (coeficiente de correcção = 100), que receba e gaste na Dinamarca (coeficente de correcção em vigor na época = 129,2) um abono da mesma natureza que as prestações familiares, no montante de 250 ecus, verá ser-lhe deduzido um montante de 193,49845 ecus [250 x (100: 129,2)], ao passo que, se não tivesse recebido abono nacional da mesma natureza teria disposto daquele montante e tê-lo-ia transferido em seguida da Bélgica para a Dinamarca recorrendo ao mecanismo da «taxa-transferência», o que lhe teria permitido dispor na Dinamarca de 250 ecus [193,49845 x (129,2: 100)], que corresponde ao montante do abono nacional.

26

Em contrapartida, num caso como o do presente processo, como a pròpria Comissão reconheceu na audiencia, o método aplicado pela Comissão não permite preservar a igualdade de tratamento, concebida em termos de poder de compra efectivamente facultado, entre os funcionarios que recebem e os que não recebem abono nacional da mesma natureza e, por identidade de razões, entre os funcionarios que recebam abono nacional de montante diferente, no caso de o coeficiente de correcção do local de afectação ser superior ao coeficiente de correcção do local da despesa. Efectivamente, nessa hipótese, o método da Comissão é desfavorável para os funcionários que recebem um abono nacional da mesma natureza, uma vez que, dado que este último é gasto num país em que o custo de vida é menos elevado do que no local de afectação, o abono nacional facultará naquele local um poder de compra maior do que no local de afectação, o que terá por consequência que a importância deduzida das prestações comunitárias será superior ao montante nominal do abono nacional recebido. Pelo contrário, os funcionários que não recebem abonos nacionais e que recebem, por conseguinte, as prestações comunitárias integralmente poderão conservá-las na sua totalidade. Efectivamente, como a Comissão admitiu na audiência, não lhes será aplicado qualquer outro coeficente para além do do seu local de afectação, em razão do carácter puramente facultativo do mecanismo da «taxa-transferência» previsto no artigo 17.° do anexo VII do Estatuto, caracter facultativo esse que tem como consequência que os funcionários só podem recorrer a ele quando o coeficiente de correcção do local de afectação for inferior ao coeficiente do local para onde o dinheiro é transferido e onde é gasto.

27

Deste modo, o funcionário que, como o recorrente, estiver colocado na Bélgica (coeficiente de correcção = 100), que receba e gaste nos Países Baixos (coeficente de correcção = 91) um abono da mesma natureza que as prestações familiares no montante de 250 ecus, verá ser-lhe deduzida uma importância de 274,72527 ecus [250 x (100: 91)], correspondente ao poder de compra facultado no local de afectação pelo abono nacional pago nos Países Baixos, ao passo que, se não tivesse recebido o abono nacional da mesma natureza, teria disposto dessa mesma importância na Bélgica mas teria podido transferi-la, fosse de que modo fosse, para os Países Baixos sem recorrer ao mecanismo facultativo da «taxa-transferência», o que lhe teria permitido aí dispor de uma importância de 274,72527 ecus, superior aos 250 ecus do abono nacional. Observe-se que, nesta última hipótese, o artigo 3.°, terceiro parágrafo, segundo travessão, do anexo VII do Estatuto não toma em consideração o local em que o abono escolar é gasto com vista a aplicar a este abono comunitário um coeficiente distinto do coeficiente de correcção do local de afectação, mesmo estando legalmente provado que esse local é diferente do local de afectação.

28

Por outro lado, sublinhe-se que só se pode afirmar que o método da Comissão respeita o princípio da igualdade, se se partir da suposição que o local de pagamento do abono nacional — da mesma natureza que as prestações familiares — corresponde ao local em que ele é gasto. Ora, a Comissão reconheceu na resposta escrita às questões do Tribunal e na audiência, que não renuncia a esse pressuposto e que continua a aplicar o coeficiente «taxa-transferência» tomando em conta o coeficiente de correcção do local de pagamento do abono nacional, mesmo quando esteja legalmente provado que ele não corresponde ao local da despesa.

29

Consequentemente, o Tribunal de Primeira Instância conclui que a Comissão não pode afirmar que respeita o princípio da igualdade de tratamento entre os funcionários, concebido em termos de poder de compra realmente facultado pelo abono nacional, uma vez que toma exclusivamente em consideração o local em que o abono nacional é pago, independentemente do local em que esse abono é gasto e, portanto, independentemente do poder de compra que efectivamente faculta aos funcionários.

30

Finalmente, há que sublinhar, a título marginal, como a Comissão indicou na sua resposta escrita a uma questão colocada pelo Tribunal, que o sistema impugnado pelo recorrente só é aplicado desde Outubro de 1987 e que, se o Tribunal de Justiça, o Parlamento e o Tribunal de Contas aplicam o mesmo método, o mesmo não acontece com o Conselho, que não aplica qualquer coeficiente de correcção aos abonos nacionais da mesma natureza que as prestações familiares comunitárias, recebidos num Estado-membro diferente do país de afectação.

31

Resulta de tudo quanto precede que a decisão impugnada, pelo facto de aplicar um coeficente correspondente à «taxa-transferência» prevista no artigo 17.°, n.° 3, do anexo VII do Estatuto, não se funda em nenhuma disposição estatutária nem no princípio superior de direito da igualdade de tratamento. A decisão deve, consequentemente, ser anulada sem que seja necessário examinar os outros argumentos constantes do segundo fundamento invocado em apoio do recurso.

Quanto às despesas

32

Por força do disposto no n.° 2 do artigo 69.° do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, aplicável mutatis mutandis ao processo perante o Tribunal de Primeira Instância, a parte vencida deve ser condenada nas despesas, se isso tiver sido requerido. Tendo a Comissão sido vencida, há que condená-la nas despesas.

 

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Terceira Secção)

decide:

 

1)

A decisão da Comissão é anulada.

 

2)

A Comissão é condenada nas despesas.

 

Saggio

Vesterdorf

Lenaerts

Proferido em audiência pública no Luxemburgo em 7 de Fevereiro de 1991.

O secretário

H. Jung

O presidente

A. Saggio


( *1 ) Língua do processo: francês.