RELATÓRIO PARA AUDIÊNCIA

apresentado no processo C-157/89 ( *1 )

I — Enquadramento jurídico

1. Regulamentação comunitária

A Directiva 79/409/CEE, na redacção da Directiva 81/854/CEE do Conselho, de 19 de Outubro de 1981, que adapta, na sequência da adesão da Grécia, a Directiva 79/409/CEE relativa à conservação das aves selvagens (JO L 319, p. 3; EE 15 F3 p. 62; a partir de agora, «directiva»), determina, no n.o 1 do artigo 18.o, que os Esta-dos-membros porão em vigor as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para darem cumprimento à directiva no prazo de dois anos a contar da sua notificação, e que desse facto informarão imediatamente a Comissão. Tendo a directiva sido notificada em 6 de Abril de 1979, o prazo fixado no artigo 18.o expirou em 6 de Abril de 1981.

O n.o 4 do artigo 7.o da directiva impõe aos Estados-membros o dever de proibir a caça a aves selvagens durante o período nidícola e durante os diferentes estádios de reprodução e de dependência. Além disso, os Estados-membros estão obrigados a velar pela proibição da caça de espécies migradoras durante os períodos de reprodução e de retorno ao local de nidificação. Esta disposição está redigida nos seguintes termos:

«Os Estados-membros certificam-se de que a prática da caça, incluindo, quando necessário, a falcoaria, tal como decorre da aplicação das medidas nacionais em vigor, respeita os princípios de uma utilização razoável e de uma regulamentação equilibrada do ponto de vista ecológico das espécies de aves a que diz respeito, e que esta prática seja compatível, no que diz respeito à população destas espécies, nomeadamente das espécies migradoras, com as disposições decorrentes do artigo 2.o

Velarão particularmente para que as espécies às quais se aplica a legislação da caça não sejam caçadas durante o período nidícola nem durante os diferentes estádios de reprodução e de dependência. Quando se trate de espécies migradoras, velarão particularmente para que as espécies às quais se aplica a legislação da caça não sejam caçadas durante o seu período de reprodução e durante o período de retorno ao seu local de nidificação. Os Estados-membros transmitem à Comissão todas as informações úteis que digam respeito à aplicação prática da sua legislação de caça.»

2. Regulamentação italiana

As disposições nacionais objecto do presente processo são as seguintes.

Nos termos do artigo 11.o da Lei n.o 968/77, de 27 de Dezembro de 1977, intitulada «Princípios gerais e disposições para salvaguarda da fauna e regulamentação da caça» (GURI n.o 3, de 4.1.1978), modificada pelos decretos do presidente do Conselho de Ministros de 20 de Dezembro de 1979 (GURI n.o 1, de 2.1.1980) e de 4 de Junho de 1982 (GURI n.o 155, de 8.6.1982), relativos à lista das espécies que podem ser caçadas e aos períodos de caça, é proibido abater, capturar, prender ou comercializar espécimes de espécies de aves que pertençam à fauna selvagem italiana. Podem ser objecto de actos de caça, em derrogação a estas proibições, as seguintes espécies de aves nos períodos adiante indicados:

espécies que podem ser caçadas entre 18 de Agosto e 31 de Dezembro:

codorniz (Coturnix coturnix),

rola comum (Setreptopelia turtur),

melro preto (Turdus merula);

espécies que podem ser caçadas entre 18 de Agosto e 28 de Fevereiro:

pato real (Anas platyrhínchos),

galeirão comum (Fulica atra),

galinha-d'água (Gallínula chloropus),

pardal montes (Passer montanas),

marrequinho (Anas crecca),

frisada (Anas streperà),

pato trombeteiro (Anas clypeata),

zarro (Ay thy a ferina),

maçarico real (Numenius arquata),

maçarico de bico direito (Limosa limosa),

perna-vermelha (Tringa totanus),

combatente (Philomacbus pugnax);

espécies que podem ser caçadas entre 18 de Agosto e 10 de Março:

pardal italiano (Passer Italiae),

pardal ladrão (Passer domesticas),

estorninho malhado (Stirnius vulgaris),

franga-ďágua (Rallus aquáticas),

piadeira (Anas penepole),

arrabio (Anas acuta),

marreco (Anas querquedula),

negrinha (Aythya Juligula),

narceja comum (gallinago gallinago),

pombo torcaz (Columba palumbus),

narceja galega (Lymocryptes minimus),

tarambola dourada (Charadrius apricarius);

espécies que podem ser caçadas entre o terceiro domingo de Setembro e 31 de Dezembro:

lagópode branco (Lagopus mutus),

galo-lira (Lyrurus tetrix),

tetraz ( Tetrao orogallus),

perdiz grega (Alectorisgraeca),

perdiz moura (Alectoris barbara),

perdiz comum (Alectoris rufa),

perdiz cinzenta (Perdis perdix),

faisão (Phasianus colchicus),

colino de mascarilha da Virgínia;

espécies que podem ser caçadas entre o terceiro domingo de Setembro e 10 de Março :

galinhola (Scolopax rusticóla),

tordo zornal (Trūdus pilaris);

espécies que podem ser caçadas entre o terceiro domingo de Setembro e 10 de Março :

laverca (Alauda arvensis),

tordo comum (Trudus philomelos),

tordo ruivo (Trudus iliacus),

gralha de nuca cinzenta (Coloeus monedula),

gralha calva (Corvus frugilegus),

gralha preta (Corvus corone),

ave-fria (Vanellus vanellus).

De acordo com a mesma disposição da Lei n.o 968/77, podem ser introduzidas modificações na lista das espécies que podem ser objecto de actos de caça por decreto do presidente do Conselho de Ministros, seguindo pareceres do Instituto Nacional de Biologia das Espécies Animais Selvagens e do Comité Técnico Venatorio Nacional.

O primeiro parágrafo do artigo 12.o da Lei n.o 968/77 autoriza as regiões italianas a «proibir ou limitar, em períodos preestabelecidos, a caça de determinadas espécies de animais referidas no artigo 11.o, por razões importantes e justificadas ligadas à densidade de fauna ou pela superveniencia de condições particulares ambientais, sazonais ou climáticas, ou na sequência de doenças ou autras calamidades».

Os calendários cinegéticos regionais para a época de caça 1989/1990 apresentam-se da seguinte forma:

Regiões

Data de abertura

Abruzzo

terceiro domingo de Setembro

Basilicata

20 de Agosto

Calábria

20 de Agosto

Campania

20 de Agosto

Emilia-Romagna

17 de Setembro

Lácio

terceiro domingo de Setembro

Ligúria

terceiro domingo de Setembro

Lombardia

17 de Setembro (não migratória)

 

17 de Setembro (migratória)

Marche

18 de Agosto

Molise

 

Província de Campobasso

19 de Agosto

Província de Isernia

17 de Setembro

Puglia

20 de Agosto

Piemonte

20 de Setembro

Toscânia

terceiro domingo de Setembro

Veneto

terceiro domingo de Setembro

Umbria

17 de Setembro

Friuli-Veneto

 

Província de Trieste

13 de Agosto (migratória)

 

1 de O utubro ( não migratória)

Província de Udine

13 de Agosto (migratória)

 

17 de Setembro (não migratória)

Província de Gorizia

13 de Agosto (migratória)

 

1 de Outubro (não migratória)

Província de Pordenone

13 de Agosto (migratória)

 

8 de Outubro (não migratória)

Sicília

27 de Agosto: codorniz, rola, melro, pardal, carriça, estorninho, pega, marrequinho, frisada, piádéira, arrabio, marreco, pato trombeteiro, narceja galega, negrinha, pombo torcaz

 

24 de Setembro: perdiz grega, pato real, galcirão comum, galinha-ďágua, narceja comum, calhandra, tordo zornal, tordo comum, tordo ruivo, gralha pequena, gralha, ave-fria

Sardenha

6 de Agosto

Valle d'Aosta

19 de Setembro

Província Autónoma de Bolzano

1 de Setembro

Província Autónoma de Trento

10 de Setembro

II — Antecedentes do processo

Por carta de 9 de Dezembro de 1987, a Comissão, entendendo que certas disposições da legislação italiana sobre caça de aves não estavam em conformidade com a Directiva 79/409, convidou a República Italiana, nos termos do artigo 169.o do Tratado, a apresentar-lhe as suas observações sobre o assunto. Esta carta não teve resposta. A Comissão formulou então, em carta de 5 de Maio de 1988, o parecer fundamentado previsto naquele artigo. Esta carta também não teve resposta.

III — Tramitação do processo

Por requerimento entrado na Secretaria do Tribunal de Justiça em 2 de Maio de 1989, a Comissão, nos termos do artigo 169.o do Tratado, dirigiu ao Tribunal de Justiça o pedido de que se pronunciasse sobre os incumprimentos imputados à República Italiana no domínio da conservação de aves selvagens.

Com base no relatório preliminar do juiz relator e ouvido o advogado-geral, o Tribunal decidiu iniciar a fase oral do processo sem instrução. Todavia, pediu às partes que precisassem, com base em publicações científicas, as alegações em matéria de facto relativas aos períodos de reprodução e de dependência, bem como aos fluxos migratórios das espécies de aves em causa. As partes responderam a esta solicitação dentro do prazo fixado.

IV — Conclusões das partes

A Comissão conclui pedindo ao Tribunal que se digne:

declarar que a República Italiana, ao autorizar a caça de diversas espécies de aves selvagens durante o período nidícola ou durante os diversos estádios de reprodução e de dependência, bem como de diversas espécies migradoras durante o período de regresso ao local de nidificação, violou as obrigações a que está sujeita por força da Directiva 79/409 do Conselho, de 2 de Abril de 1979, relativa à conservação das aves selvagens;

condenar a República Italiana nas despesas do processo.

O Governo italiano conclui pedindo ao Tribunal que se digne:

negar provimento ao pedido da Comissão;

condenar a demandante nas despesas do processo.

V — Fundamentos e argumentos das partes

Quanto à admissibilidade

1.

O Governo italiano entende que as acusações em causa nesta acção já tinham sido formuladas pela Comissão no processo 262/85, sobre o qual o Tribunal de Justiça proferiu acórdão em 8 de Julho de 1987 (Colect., p. 3073). Alega que o Tribunal rejeitou os dois aspectos da terceira acusação desta acção. Em consequência, o princípio non bis in idem impede a repetição do exame destas questões em novo litígio.

2.

A Comissão precisa que, no presente caso, o requerimento não respeita à existência na legislação italiana de datas de abertura e encerramento da caça diferentes, em atenção aos diversos períodos durante os quais as aves devem ser protegidas, mas ao acerto das datas escolhidas pelo legislador italiano para os diferentes períodos de caça em relação a certas espécies de aves.

A Comissão recorda que a terceira acusação do processo 262/85, que deu lugar ao já referido acórdão do Tribunal de Justiça de 8 de Julho de 1987, incluía duas questões, uma referente à falta de diversificação de datas de abertura e encerramento do período de caça, tendo o Tribunal rejeitado esta questão por falta de fundamento, e a outra referente à oportunidade de abrir a época de caça em certas datas, tendo este aspecto sido excluído do litígio por ir alargar o âmbito da acusação que tinha sido objecto da fase pré-contenciosa do processo e do requerimento inicial.

Quanto ao mérito

1.

A Comissão entende que a legislação italiana não toma em consideração os imperativos decorrentes do n.o 4 do artigo 7.o da directiva ao fixar a data da abertura e encerramento da época de caça de certas espécies de aves.

a) Primeira acusação

A Comissão afirma que a referida norma é infringida pelas disposições nacionais que autorizam a caça ao galeirão comum, à gali-nha-d'água, ao pato real e ao melro a partir de 18 de Agosto, dado que o período de reprodução e de dependência destas aves ainda não terá terminado.

Em relação a estas aves, a Comissão fornece as seguintes indicações:

galeirão comum: esta espécie põe, na Europa meridional, até meados de Julho, e o período de dependência das ninhadas dura entre 55 e 60 dias;

galinha-ďágua: esta espécie põe, na Europa meridional, até ao mês de Julho, e o período de dependência das ninhadas dura entre 52 e 99 dias;

pato real: esta espécie põe entre Março e começos de Julho, por vezes mesmo mais tarde. As ninhadas tornam-se independentes entre 50.o e o 60.o dia posterior à eclosão;

melro: esta espécie põe normalmente várias vezes por ano. As reproduções mais tardias estão ainda em curso no momento da abertura da época de caça.

b) Segunda acusação

A Comissão entende que a directiva é violada pelas normas nacionais que autorizam a caça até 28 de Fevereiro e, mesmo, até 10 de Março para algumas espécies migradoras que atravessam a Itália, durante os meses de Janeiro, Fevereiro e Março, para se deslocarem para os respectivos locais de nidificação na Europa central e setentrional. Trata-se das seguintes aves:

caça autorizada até 25 de Fevereiro:

galeirão comum (Fulica atra),

frisada (Anas strepera),

marrequinho (Anas crecca),

pato real (Anas platyrhinchos)

pato trombeteiro (Anas clypeata)

zarro (Aythya ferina),

perna-vermelha (Tringa totanus),

combatente (Philomacus pugnax),

maçarico real (Numenius àrquata),

tordo zornal (Turdus pilaris);

caça autorizada até 10 de Março:

piádéira (Anas penolope),

arrábio (Anas acuta),

marreco (Anas querquedula),

negrinha (Aythya fuligola),

tarambola dourada (Charadrius apricarius),

narceja comum (Gallinago gallinago),

maçarico de bico direito (Limosa limosa),

tordo comum (Turdus philomelus),

tordo ruivo (Turdus iliacus).

2.

O Governo italiano entende que a acção carece de fundamento, dado que as acusações assentam em factos (períodos de reprodução e de dependência até 18 de Agosto das especies a que respeita a primeira crítica; passagem pela Itália nos meses de Janeiro, Fevereiro e Março daqueles sobre que incide a segunda) cuja prova incumbe à Comissão. Entende, por outro lado, que a prova daqueles factos não pode resultar da bibliografia citada no requerimento inicial.

a) Quanto à primeira acusação

Segundo o Governo italiano, a afirmação da Comissão de que o galeirãò comum, a galinha-d'água, o pato real e o melro, em relação aos quais é aberta a caça em Itália a partir de 18 de Agosto, nesta data se encontram ainda em período de reprodução e de dependência, se baseia exclusivamente na bibliografia, citada no requerimento, inicial, a qual, todavia, é de carácter geral e não se pode aplicar à situação italiana dada a sua especificidade.

De acordo com aquele Governo, as espécies em questão são potencialmente independentes a partir de 18 de Agosto. Todavia, pode acontecer que se verifiquem posturas e incubações tardias que impliquem, em alguns casos, dependência das ninhadas durante a segunda metade do mês de Agosto, mas trata-se de uma circunstância que não pode ser generalizada a todo o território nacional e que tem carácter excepcional.

O Governo italiano, alega que o legislador nacional teve em devida consideração a necessidade de protecção de todas as espécies durante o período nidícola, bem como durante os períodos de reprodução e dependência. Afirma que a Lei n.o 968/77 abordou esta necessidade em termos científicos que dizem respeito especificamente à Itália, tendo adoptado um calendário cinegético que prevê a diversificação dos períodos de caça, precisamente para assegurar a protecção das diversas espécies de aves nas fases delicadas da nidificação, reprodução e dependência.

O Governo italiano acrescenta que as regiões podem providenciar quanto a estas situações excepcionais e não generalizadas exercendo o poder atribuído pelo primeiro parágrafo do artigo 12.o da Lei n.o 968/77. Assim, a ordem jurídica italiana dispõe de instrumentos que permitem retardar a abertura da caça nas zonas onde se verificam os factos excepcionais referidos.

O referido governo observa que mais de metade das regiões italianas diferiram para meados de Setembro, ou mesmo para mais tarde, a abertura geral da caça no respectivo território por razões diferentes das enunciadas no primeiro parágrafo do artigo 12.o, da Lei n.o 968/77, sobretudo por razões turísticas e agrícolas. Em consequência, o perigo de caça está, de facto, excluído em mais de metade das regiões italianas, em conformidade com os calendários cinegéticos vigentes.

Aquele governo explica que, graças a derrogações daquele tipo, a protecção das aves nos períodos habituais e normais de nidificação, reprodução e dependência pode ser reforçada através da intervenção das regiões que, em determinados casos, se o referido período for alterado por condições sazonais ou climáticas particulares, podem alterar o calendário venatorio local de modo a garantir a tutela que é geralmente assegurada pela lei, também nessas condições particulares e específicas.

O governo sublinha que, em Itália, o período de reprodução do galeirão, da gali-nha-d'água e do melro não corresponde, em princípio, ao período da abertura de caça. Só o pato real se pode encontrar, em algumas regiões de Itália, potencialmente dependente na primeira fase da época de caça. O território nacional é atravessado por um fluxo migratório pós-reprodutivo muito acentuado de patos reais, sendo mínima a proporção da população desta espécie que nidifica anualmente em Itália. Assim, só algumas populações locais se podem encontrar na última fase do ciclo reprodutivo durante os períodos de abertura da caça previstos pelo calendário nacional, e isto apenas em determinadas zonas da península.

b) Quanto à segunda acusação

O Governo italiano sustenta que a afirmação de que as espécies de aves migradoras mencionadas no requerimento inicial atravessam a Itália nos meses de Janeiro, Fevereiro e Março em direcção às áreas de nidificação na Europa central e setentrional, de modo que estas espécies devem ser protegidas a partir do mês de Janeiro, mas que podem, pelo contrário, ser caçadas em Itália até 28 de Fevereiro ou 10 de Março, assenta também exclusivamente na bibliografia citada no requerimento inicial.

Aquele governo precisa que a regulamentação nacional em questão adaptou os períodos de abertura e encerramento da época de caça às prescrições da Convenção Internacional para a Protecção das Aves, adoptada em Paris em 18 de Outubro de 1950, após a adesão da Itália a esta convenção (Lei n.o 812/78, de 24 de Novembro de 1978). A alínea a) do artigo 2.o desta convenção prevê a protecção das aves migradoras durante o trajecto de regresso ao local de nidificação, nomeadamente em Março, Abril, Maio, Junho e Julho.

O Governo italiano chama a atenção para o facto de o decreto de 20 de Dezembro de 1979, que fixou como datas de fecho da caça às espécies referidas no requerimento inicial 28 de Fevereiro e 10 de Março, foi aprovado depois de consulta ao Istituto nazionale di biologia della selvaggina (Instituto Nacional de Biologia da Caça) e ao Comitato tecnico venatorio nazionale (Comité Técnico Venatorio Nacional). Este decreto, referente à situação específica da Itália, pôs o calendário cinegético nacional em conformidade com a convenção de 1950 e ordena o encerramento da época de caça em função das tendências naturais e das exigências migratórias de cada espécie.

O Governo italiano sustenta que, na falta de indicações normativas em contrário na Directiva 79/409 e de provas específicas em contrário, que incidam sobre a situação específica da Itália, as normas em causa da Convenção de Paris podem ser consideradas como parâmetros de uma protecção adequada das aves migradoras, adaptadas aos objectivos do n.o 4 do artigo 7.o daquela directiva.

Por outro lado, o Governo italiano chama a atenção para os considerandos do decreto de 20 de Dezembro de 1979, segundo os quais a Itália não é, pelo menos nos primeiros dez dias de Março, afectada por fenónemos migratórios relevantes, não tendo os indivíduos dessas espécies, normalmente, começado ainda a viagem de regresso para os locais de nidificação. Estas considerações aplicam-se, por maioria de razão, ao mês de Fevereiro e confirmam que a migração maciça só tem lugar a partir da segunda metade de Março.

No entender do Governo italiano, a expressão «durante o período de retorno ao local de nidificação», contida no n.o 4 do artigo 7o da directiva, deixa alguma margem para a individualização deste período, em absoluto e nos vários Estados-membros. Nestas circunstâncias, e em relação a este aspecto, parece poder concluir-se que a directiva e a convenção se inspiram nas mesmas exigências em matéria de protecção das espécies migradoras durante o regresso ao local de nidificação. Em consequência, estando conforme com as exigências de protecção enunciadas na Convenção de Paris, a legislação nacional em causa está também conforme com as mesmas exigências expressas na Directiva 79/409.

O Governo italiano acrescenta que situações particulares das espécies migradoras podem também ser objecto de protecção reforçada por parte das regiões, nos termos do artigo 12.o da Lei n.o 968/77.

3.

A Comissão observa, no que respeita à base científica das suas alegações, que as obras citadas no requerimento inicial, particularmente a de Cramp e Simmons, Handbook of the Birds of Europe, the Middle East and North Africa (Oxford University Press, 1980-1988, 5 volumes, 4400 páginas), constituem referências indispensáveis e incontestadas no meio científico internacional, não podendo o seu valor ser infirmado pela simples afirmação do Governo italiano, aliás não corroborada por qualquer referência bibliográfica, de que aquela literatura científica, que se ocupa da Europa meridional, não se aplica à Itália, devido à particularidade e à complexidade geográfica desta.

Pelo contrário, segundo a Comissão, a pertinência da obra de Cramp e Simmons em relação à situação italiana, particularmente quanto à migração primaveril de aves protegidas, é confirmada pelo relatório apresentado em Maio de 1986 ao Congresso Internacional «Wildtiere und Umwelt» de Nuremberga pelo Istituto nazionale di biologia della selvaggina, ou seja, precisamente pela instituição citada no preâmbulo dos decretos de 20 de Dezembro de 1979 e de 4 de Junho de 1982.

A Comissão sublinha que o citado relatório, intitulado «Problemas de Conservação das Aves Migradoras, tendo particularmente em atenção as capturas venatorias efectuadas durante o regresso às zonas de nidificação», se refere em várias ocasiões à obra de Cramps e Simmons.

Por outro lado, quanto à situação das espécies migratórias que atravessam as zonas mediterrânicas, o relatório expõe o seguinte:

«As pertubações devidas à caça determinam, no seio dos grupos, uma situação de stress permanente que leva os animais a consagrarem a maior parte das suas energias a deslocar-se e a fugir, e que tende, simultaneamente, a reduzir sensivelmente o tempo que estes podem dedicar à alimentação. Estes dois factores têm repercussões negativas no balanço energético de cada indivíduo, podendo, assim, contribuir indirectamente para o crescimento da taxa de mortalidade das populações submetidas a pressões duradouras decorrentes da caça. Este fenómeno é relativamente grave em situações ou períodos em que os animais se encontram enfraquecidos ou têm uma necessidade absoluta de se sobrealimentarem para acumular energia suficiente para suportar a migração.

Na segunda metade do Inverno, a preparação para a viagem de regresso constitui a actividade principal dos migradores e, além disso, para diversas espécies, é cumulada com a corte e a formação de pares. Uma intervenção cinegética, mesmo limitada, no decurso deste período pode ter efeitos negativos sobre a produtividade no decorrer da época de nidificação seguinte.

Durante a viagem para as zonas de Verão, os animais que repousam são geralmente obrigados a fazê-lo por necessidades alimentares; com efeito, esta migração é, regra geral, mais rápida do que a migração de Outono devido a fenómenos hormonais importantes. As zonas mediterrânicas como a Itália, sobretudo, constituem o primeiro local apropriado de paragem para numerosas espécies de grandes migradores que vêm de África. Com efeito, diversas espécies, que seguem rotas mais ocidentais no Outono, atravessam o Sara e o Mediterrâneo para chegar mais rapidamente às zonas de nidificação.

...

A actividade cinegética excessivamente prolongada influencia negativamente, não só as espécies que são objecto de caça, mas ainda, devido às perturbações que provoca, diversas espécies que não são caçadas mas que frequentam os mesmos meios, e pode ser considerada factor de limitação das possibilidades de colonização de novos territórios por espécies migratórias pioneiras. Pode mencionar-se, a este respeito, o exemplo da colonização recente, por diversas espécies, de certas zonas do Piemonte, no seguimento do fecho antecipado da época de caça nesta região.»

O relatório contém uma «nota sobre as migrações das espécies que são actualmente objecto de caça em Itália, tendo particularmente em atenção a fenologia do regresso às zonas de nidificação através da Itália» com uma análise sintética da fenologia da migração de regresso às zonas de nidificação da maior parte das espécies caçadas neste Estado.

De acordo com o relatório, a análise dos dados arquivados no Instituto nazionale di biologia della selvaggina (programa nacional de anilhagem) relativos às aves anilhadas no estrangeiro e capturadas ou assinaladas naquele país forneceu informações mais detalhadas a respeito da Itália. Foram estudadas, no total, 3300 fichas relativas a 17 espécies, quer exclusivamente migrantes através da Itália quer parcialmente migrantes e parcialmente hibernantes. O relatório contém em anexo uma representação gráfica da evolução temporal das recolhas relativas às espécies em causa. O período analisado vai de Janeiro a Abril, para as espécies exclusivamente migrantes, e de Setembro a Abril, para as espécies que passam um período de hibernagem importante.

Constam desta lista a piádéira (Anas penepole), a frisada (Ana strepera), o marrequinho (Anas creced), ó pato real (Anas plathyrinhos), o arrábio (Anas acuta), o marreco (Anas querquedula), ó pato trombeteiro (Anas clypeata), o zariro (Aythya ferina), a negrinha (Aythya fuligula), o galeirão comum (Fulica atra), a tarambola dourada (Pluvialis apricaria), a ave-fria (Vanellus vanellus), o combatente (Philomacus pugnax), a narceja comum (Gallinago gallinago), o maçarico de bico direito (Limosa limosa), o maçarico real (Numenius arquata), o perna-vermelha (Tringa totanus), o estorninho malhado (Stumus vulgaris), o melro preto (Turdus merula), o tordo comum (Turdus philomelos), e o tordo ruivo (Turdus iliacus).

A Comissão conclui que, de acordo com o Istituto nazionale di biologia della selvaggina, as capturas venatorias devem terminar a meio do Inverno, e que considerações de ordem geográfica, climática e ecológica indicam o que se deve entender por meio do Inverno nas diversas latitudes. O instituto em questão fixou a data correspondente em 31 de Janeiro, o mais tardar, para a Europa meridional.

A Comissão conclui que a literatura científica internacional por ele citada constitui prova suficiente dos factos alegados no requerimento inicial, cuja fiabilidade não pode ser infirmada por afirmações não apoiadas em provas.

4.

O Governo italiano entende que compete à demandante demonstrar a alegada inadequação da protecção dispensada pela legislação nacional às diversas especies de aves migrantes e à situação geográfica da Itália. Ora, as acusações são apresentadas em termos genéricos e indistintos, sem ter em conta a situação particular de cada espécie migrante.

Aquele afirma que as teses contidas naqueles estudos não podem ser sustentadas como se constituíssem elementos objectivos de valor irrefutável, quando referidas a realidades particulares e específicas. No seu entender, não basta estabelecer um modelo da realidade científica geral da Europa meridional e aplicá-lo em termos indiferenciados à situação italiana, assimilando a Itália, apesar da sua geografia particular e complexa, a outros países do sul da Europa.

Diez de Velasco

Juiz relator


( *1 ) Língua do processo: italiano.


ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

17 de Janeiro de 1991 ( *1 )

No processo C-157/89,

Comissão das Comunidades Europeias, representada por E. de March e T. Van Rijn, membros do seu Serviço Jurídico, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de G. Berardis, membro do mesmo serviço, Centre Wagner, Kirchberg,

demandante,

contra

República Italiana, representada por I. M. Braguglia, avvocato dello Stato, na qualidade de agente, com domicílio escolhido no Luxemburgo na Embaixada de Itália, 5, rue Marie-Adélaïde,

demandada,

que tem por objecto a declaração de que ao autorizar a caça de diversas espécies de aves durante o período nidícola e durante os diversos estádios de reprodução e de dependência, bem como a caça a diversas espécies migradoras durante o trajecto de regresso ao local de nidificação, a República Italiana não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força da Directiva 79/409/CEE do Conselho, de 2 de Abril de 1979, relativa à conservação das aves selvagens (JO L 103, p. 1; EE 15 F2 p. 125),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

composto por O. Due, presidente, G. F. Mancini, T. F. O'Higgins, G. C. Rodríguez Iglesias e M. Diez de Velasco, presidentes de secção, Sir Gordon Slynn, C. N. Kakouris, R. Joliet e F. A. Schockweiler, juízes,

advogado-geral : W. Van Gerven

secretário: H.-A. Rühl, administrador principal

visto o relatório para audiência e após a realização desta em 11 de Outubro de 1990

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 8 de Novembro de 1990,

profere o presente

Acórdão

1

Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal de Justiça em 2 de Maio de 1989, a Comissão das Comunidades Europeias intentou, nos termos do artigo 169.o do Tratado CEE, uma acção destinada a obter a declaração de que ao autorizar a caça de diversas espécies de aves durante o período nidícola e durante os diversos estádios de reprodução e de dependência, bem como a caça a diversas espécies migradoras durante o trajecto de regresso ao local de nidificação, a República Italiana não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força da Directiva 79/409/CEE do Conselho, de 2 de Abril de 1979, relativa à conservação das aves selvagens (JO L 103, p. 1; EE 15 F25 p. 125).

2

A Comissão afirma que a legislação italiana em matéria de caça é incompatível com as segunda e terceira frases do n.o 4 do artigo 7o da directiva, na medida em que autoriza, em primeiro lugar, a caça de algumas espécies de aves a partir de 18 de Agosto, se bem que estas espécies se encontrem ainda nesta altura em estado de reprodução e de dependência e, em segundo lugar, a caça a certas aves migradoras até 28 de Fevereiro ou 10 de Março, consoante o caso, se bem que estas aves sobrevoem já nesta altura o território italiano no trajecto de regresso ao local de nidificação.

3

Em apoio destas alegações, a Comissão refere-se a um certo número de publicações científicas, nomeadamente ao Handbook of the Birds of Europe, the Middle East and North Africa, publicado por Cramp & Simmons, bem como a um relatório sobre a migração primaveril das aves, elaborado pelo Istituto nazionale di biologia della selvaggina (Bolonha).

4

Para mais ampla exposição do enquadramento jurídico e dos factos da causa, da tramitação e dos fundamentos e argumentos das partes, remete-se para o relatório para audiência. Estes elementos do processo apenas serão adiante retomados na medida do necessário para a fundamentação da decisão do Tribunal.

Quanto à admissibilidade

5

O Governo italiano entende que o Tribunal de Justiça já julgou, no acórdão de 8 de Julho de 1987, Comissão/Itália (262/85, Colect., p. 3073), improcedentes os pedidos formulados nesta acção, pelo que não são susceptíveis de ser suscitados de novo.

6

A Comissão afirma, em contrapartida, que, neste caso, a acção não se destina a obter do Tribunal de Justiça a declaração de que a legislação italiana não teve em conta os diferentes períodos de protecção indicados no n.o 4 do artigo 7.o da directiva para fixar as datas de abertura da época de caça, mas sim que as datas escolhidas pelo Governo italiano para os diferentes períodos de caça não estão em conformidade com as prescrições desta disposição. No processo 262/85 aquela acusação tinha sido formulada pela Comissão na réplica. Nestas circunstâncias, a única razão para a sua rejeição pelo Tribunal de Justiça residiu no facto de não ter sido formulada no decurso da fase pré-contenciosa do processo nem na petição inicial.

7

A questão prévia suscitada pelo Governo italiano não pode ser julgada procedente. Com efeito, resulta do referido acórdão que a acusação respeitante à necessidade de proibir a caça durante determinados períodos foi desatendida naquele processo por motivos processuais. O Tribunal não se pronunciou, portanto, sobre o mérito daquela acusação.

Quanto ao mérito da causa

8

O Governo italiano sustenta antes de mais que a regulamentação nacional respeita as exigências colocadas pelas segunda e terceira frases do n.o 4 do artigo 7.o da directiva, pois a maior parte das aves jovens das espécies em causa são normalmente independentes a partir de 18 de Agosto, por um lado, e, por outro, as aves migradoras em questão normalmente não sobrevoam em número significativo o território italiano antes de 28 de Fevereiro ou 10 de Março, consoante o caso.

9

O Governo italiano entende também que as obras citadas pela Comissão são de carácter geral, não tendo em conta a especificidade da situação italiana. Afirma que a Comissão não provou a pertinência dos dados ornitológicos constantes daquelas obras em relação às espécies referidas na petição inicial.

10

Finalmente, observa que as regiões podem modificar as datas de abertura e encerramento da época de caça fixadas pela regulamentação nacional, de modo a ter em conta ciclos nidicolas ou movimentos migratórios particulares.

Quanto às questões de princípio

11

A argumentação do Governo italiano levanta assim três questões de princípio: o alcance das disposições citadas da directiva, a natureza dos elementos científicos necessários para satisfazer as exigências de prova em matéria de avifauna e a questão de saber em que medida pode a transposição da citada disposição ser assegurada pelas autoridades regionais dos Estados-membros.

12

Quanto à primeira questão, ou seja, a interpretação das segunda e terceira frases do n.o 4 do artigo 7.o da directiva, resulta do processo que os ciclos reprodutivos e os movimentos migratorios das aves se caracterizam por uma certa variabilidade que, devido a circunstâncias meteorológicas, afecta nomeadamente os períodos no decorrer dos quais se produzem estes fenómenos. Assim, certas aves jovens de determinada espécie podem encontrar-se ainda no ninho ou em estado de dependência alimentar em data posterior ao período médio de reprodução. De igual modo, pode suceder que certo número de aves migradoras iniciem o trajecto de regresso ao local de nidificação em data relativamente precoce em relação aos fluxos migratórios médios.

13

Está assim em questão saber os Estados-membros podem autorizar a caça a partir do momento em que a maioria das aves jovens de determinada espécie atingiram a independência alimentar, e enquanto a maior parte das aves de determinada espécie migradora não sobrevoar ainda os respectivos territórios no caminho para o local de nidificação, ou se o legislador nacional deve acrescentar ao período habitual de reprodução e de dependência, bem como ao de migração, um período suplementar para ter em conta as variações acima referidas.

14

Terá que se sublinhar, a este respeito, que as disposições citadas têm por finalidade assegurar um regime completo de protecção durante os períodos no decorrer dos quais se encontra particularmente ameaçada a sobrevivência das aves selvagens. Em consequência, a protecção contra as actividades de caça não se pode limitar à maioria das aves de determinada espécie, definida de acordo com a média do ciclos reprodutivos e dos movimentos migratórios. A inexistência da protecção prevista em relação a parte da população de determinada espécie, em situações marcadas por dependência prolongada das aves jovens e por migração precoce, seria incompatível com os objectivos da directiva.

15

No que respeita à segunda questão, ou seja, a natureza da prova a produzir nesta matéria e a pertinência das publicações científicas citadas pela Comissão, é pacífico que as obras em causa constituem textos de referência fundamentais no domínio da avifauna. Em relação ao argumento do Governo italiano de que os dados apresentados pela Comissão não respeitam especificamente à situação italiana, é necessário observar que, no caso de não haver qualquer literatura científica disponível relativa ao território do Estado-membro em causa, a Comissão pode tomar por base obras ornitológicas que tratem da área geral de distribuição em que aquele se insere. De qualquer modo, o Governo italiano não apresentou estudos científicos alternativos para contestar as indicações fornecidas pela Comissão.

16

Quanto à terceira questão, que incide sobre a possibilidade de a execução da directiva ser efectuada por atribuição às regiões italianas da possibilidade de derrogarem os períodos de caça fixados pela regulamentação nacional e, em certas condições, proibirem ou limitarem a caça, terá que se sublinhar que uma regulamentação nacional que declare a época de caça a certas espécies aberta, em princípio, sem prejuízo de disposições contrárias emanadas das autoridades regionais, não responde às exigências de protecção resultantes da directiva.

17

Com efeito, como resulta dos acórdãos do Tribunal de Justiça de 8 de Julho de 1987, Comissão/Bélgica (247/85, Colect., p. 3029 e Comissão/Itália (262/85, Colect., p. 3073), a possibilidade de os Estados-membros invocarem o poder regulamentar das autoridades regionais para justificar legislações nacionais que não respeitem as proibições previstas em determinada directiva seria contrária ao princípio da segurança jurídica.

Quanto à acusação relativa à abertura da caça a quatro espécies a partir de 18 de Agosto

18

A Comissão sustenta que, as disposições nacionais que autorizam a caça ao galeirão comum, à galinha-d'água, ao pato real e ao melro a partir de 18 de Agosto são incompatíveis com a segunda frase do n.o 4 do artigo 7.o da directiva, dado que o período de reprodução e de dependência destas espécies não terminou ainda naquela data.

19

Deve reconhecer-se que, de acordo com as indicações científicas fornecidas pela Comissão em relação às espécies referidas, é possível que uma parte importante das aves jovens de três das espécies citadas: galeirão comum, galinha-d'água e pato real, se encontrem ainda no ninho ou em estado de dependência alimentar em 18 de Agosto. Em contrapartida, resulta dos mesmos dados que os melros jovens atingem a independência antes daquela data.

20

Decorre do exposto que deve ser julgada procedente a primeira acusação da Comissão, excepto no que se refere ao melro.

Quanto à acusação relativa à autorização da caça a dezanove espécies até 28 de Fevereiro ou 10 de Março

21

A Comissão entende, em segundo lugar, que as disposições nacionais que autorizam a caça até 28 de Fevereiro e 10 de Março a dez e nove espécies, respectivamente, que atravessam a Itália nos meses de Janeiro, Fevereiro e Março com destino aos locais de nidificação na Europa central e setentrional não estão em conformidade com a terceira frase do n.o 4 do artigo 7o da directiva.

22

Para refutar esta acusação, o Governo italiano afirma que a regulamentação nacional adaptou os períodos de caça às prescrições relativas à protecção das aves migradoras da Convenção Internacional para a Protecção das Aves, de 18 de Outubro de 1950. Sublinha que, na falta de indicações normativas concretas na directiva, as prescrições da referida convenção podem ser admitidas como criterios de protecção adequada das aves migradoras no quadro da directiva.

23

Basta observar que a convenção em causa, que exige que as aves migradoras sejam protegidas em particular no mês de Março, não pode constituir um elemento fundamental para interpretação da directiva, que contém exigencias mais severas.

24

Deve reconhecer-se que, segundo as indicações científicas relativas às espécies migradoras referidas na petição inicial, fornecidas pela Comissão, nomeadamente o relatório do Istituto nazionale di biologia della selvaggina, é possível que uma parte importante daquelas espécies atravesse o referido território italiano já no mês de Fevereiro, pelo que a legislação italiana não está conforme com a disposição citada da directiva.

25

Todavia, e vendo em pormenor as diversas espécies, impõe-se sublinhar que não foi demonstrado o desrespeito pela directiva em relação a duas delas, o perna-vermelha e o maçarico real. Com efeito, indica-se no referido relatório que o perna-vermelha só sobrevoa o território italiano a partir da primeira metade do mês de Março e que o maçarico real sobrevoa o território italiano entre fins de Março e começo de Abril.

26

Decorre do exposto que a segunda acusação da Comissão deve ser julgada procedente, excepto no que se refere ao perna-vermelha e ao maçarico real.

27

Deve, portanto, declarar-se verificado que, ao permitir a caça de diversas espécies de aves selvagens durante o período nidícola e durante os estádios de reprodução e de dependência, e ainda de diversas espécies migradoras durante o período de regresso ao local de nidificação, a República Italiana não cumpriu as obrigações decorrentes da Directiva 79/409 do Conselho, de 2 de Abril de 1979, relativa à conservação das aves selvagens.

Quanto às despesas

28

Por força do disposto no n.o 2 do artigo 69.o do Regulamento Processual a parte vencida deve ser condenada nas despesas. Tendo a República Italiana sido vencida no essencial, há que condená-la nas despesas.

 

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA

declara:

 

1)

Ao permitir a caça de diversas espécies de aves selvagens durante o período nidícola e durante os estádios de reprodução e de dependência, e ainda de diversas espécies migradoras durante o período de regresso ao local de nidificação, a República Italiana não cumpriu as obrigações decorrentes da Directiva 79/409/CEE do Conselho, de 2 de Abril de 1979, relativa à conservação das aves selvagens.

 

2)

A República Italiana é condenada nas despesas.

 

Due

Mancini

O'Higgins

Rodríguez Iglesias

Diez de Velasco

Slynn

Kakouris

Joliet

Schockweiler

Proferido em audiencia pública no Luxemburgo, em 17 de Janeiro de 1991.

O secretário

J.-G. Giraud

O presidente

O. Due


( *1 ) Língua do processo: italiano.