RELATÓRIO PARA AUDIÊNCIA

apresentado no processo C-179/88 ( *1 )

I — Enquadramento jurídico

A — A Directiva 76/207/CEE

A Directiva 76/207/CEE do Conselho, de 9 de Fevereiro de 1976 (JO L 39, p. 40; EE 05 F2 p. 70, adiante «directiva»), tem em vista, nos termos do seu artigo 1.o, n.o 1, a realização, nos Estados-membros, do princípio da igualdade de tratamento entre homens e mulheres no que se refere ao acesso ao emprego, à formação e promoção profissionais e às condições de trabalho.

O artigo 2.o, n.o 1, desta directiva define o princípio da igualdade de tratamento como a ausência de qualquer discriminação em razão do sexo, quer directa quer indirectamente, nomeadamente pela referência à situação matrimonial ou familiar.

Todavia, o n.o 3 deste artigo estabelece que a directiva não constitui obstáculo às disposições relativas à protecção da mulher, nomeadamente no que se refere à gravidez e à maternidade.

O artigo 5.o, n.o 1, da directiva precisa que o princípio da igualdade de tratamento assim definido se aplica às condições de trabalho, incluindo as condições de despedimento.

Finalmente, o artigo 9.o, n.o 1, primeiro parágrafo, prevê que os Estados-membros devem adoptar as disposições legislativas regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento à presente directiva no prazo de trinta meses a contar da sua notificação, ou seja, a contar de 12 de Fevereiro de 1976, de forma que as referidas medidas deviam ser adoptadas até 12 de Agosto de 1978.

B — A lei nacional

A directiva foi transposta para o direito interno na Dinamarca pela Lei n.o 161, de 12 de Abril de 1978, relativa à igualdade de tratamento entre homens e mulheres no que se refere ao emprego, etc. (adiante «lei dinamarquesa relativa à igualdade de tratamento»), «lov om ligebehandling af mænd og kvinder med hensyn til beskæftigelse m. v.») e pela Lei n.o 162, de 12 de Abril de 1978, que altera algumas disposições relativas à igualdade de tratamento entre homens e mulheres no que se refere ao emprego, etc, «lov om ændring af forskellige bestemmelser om ligebehandling af mænd og kvinder med hensyn til beskæftigelse m. v.».

A lei dinamarquesa relativa à igualdade de tratamento entrou em vigor em 1 de Julho de 1978.

As disposições desta lei a tomar em consideração no caso em apreço são o artigo 1.o, n.os 1 e 2, o artigo 4.o e o artigo 8.o, que estabelecem o seguinte:

«Artigo 1.o

1.

A igualdade de tratamento entre homens e mulheres, na acepção da presente lei, implica a ausência de discriminação em razão do sexo. Isto abrange tanto as discriminações directas como as discriminações indirectas, nomeadamente as referentes à gravidez ou à situação matrimonial ou familiar.

2.

A presente lei não constitui obstáculo às disposições relativas à protecção das mulheres, nomeadamente no que se refere à gravidez e à maternidade.

Artigo 4.o

Qualquer entidade patronal que empregue homens e mulheres deve garantir-lhes as mesmas condições de trabalho. O mesmo sucede no que se refere às condições de despedimento.

Artigo 8.o

As pessoas cujas direitos foram lesados por infracção aos artigos 2.o e 5.o da presente lei têm direito a uma indemnização.»

II — Factos e tramitação processual

Em 15 de Julho de 1982, a Sr.a Hertz foi contratada como empregada de caixa a tempo parcial no estabelecimento Aldi Marked.

Em Junho de 1983, deu à luz uma criança no termo de uma gravidez com complicações, durante a qual, de acordo com a sua entidade patronal, estivera com baixa por doença.

No termo da sua licença por maternidade, a qual, segundo a lei dinamarquesa relativa à licença por maternidade, é de quatro semanas antes da data presumível do parto e de vinte e quatro semanas após o nascimento, a Sr.a Hertz, em fins de 1983, retomou o seu trabalho e não teve qualquer baixa por doença antes do mês de Junho de 1984.

Entre Junho de 1984 e Junho de 1985, esteve com baixa por doença durante 100 dias úteis.

Por carta de 27 de Junho de 1985, Aldi Marked notificou-a do seu despedimento com o pré-aviso legal de quatro meses. A sua entidade patronal precisou, seguidamente, que a causa do despedimento residia nas ausências da Sr.a Hertz e que era uso corrente despedir os trabalhadores frequentemente doentes.

É facto admitido por ambas as partes que a causa das ausencias da Sr.1 Hertz entre Junho de 1984 e Junho de 1985 residia em complicações resultantes do seu parto em Junho de 1983.

Por decisão de 14 de Agosto de 1987, o Sø-og Handelsretten de Copenhaga julgou improcedente a acção proposta pela Sr.a Hertz impugnando o despedimento, na qual sustentava, nomeadamente, que o seu despedimento era contrário aos artigos 1.o e 4.o da lei relativa à igualdade de tratamento.

A Sr.a Hertz interpôs recurso desta decisão para o Højesteret dinamarquês baseando-se unicamente na lei relativa à igualdade de tratamento. Neste órgão jurisdicional, o processo incide sobre a questão de saber se o despedimento da Sr.a Hertz pela Aldi Marked infringe o artigo 1.o, n.o 1, e o artigo 4.o da lei sobre a igualdade de tratamento, de forma a que, nos termos do artigo 8.o da lei, a interessada possa pedir uma indemnização pelo despedimento.

A recorrente sustenta que o seu despedimento viola a proibição de discriminação indirecta estabelecida no artigo 1.o, n.o 1, ponto 2, da referida lei. A este respeito, invoca um parecer emitido em 22 de Dezembro de 1986 pelo Conselho Dinamarquês para a Igualdade de Oportunidades, organismo criado em 1978 pelo legislador para promover a igualdade entre homens e mulheres na sociedade e para emitir pareceres sobre a aplicação da lei sobre a igualdade de tratamento, em que aquele conselho exprimia as suas dúvidas sobre a questão de saber se um despedimento baseado em ausências por doença devidas a um relaxamento pélvico derivado de um parto era compatível, nomeadamente, com as disposições da lei sobre a igualdade de tratamento.

A recorrida alegou, antes de mais, que a proibição de discriminação em razão do sexo não se aplica à hipótese de, como no caso em apreço, o despedimento se fundamentar numa ausência por doença que ocorre mais de um ano após o parto, quer esta seja devida, ou não, a complicações li gadas ao parto. A este respeito, remeteu nomeadamente para a circular n.o 155 do Ministério das Finanças, de 3 de Outubro de 1984, relativa às licenças por maternidade e outras, cujo conteúdo foi retomado por um ofício do Ministério do Emprego, de 20 de Setembro de 1985, mencionado no citado parecer de 22 de Dezembro de 1986 do Conselho Dinamarquês para a Igualdade de Oportunidades. Aí se afirma que, quando se trata de decidir sobre um eventual despedimento resultante de doença, a ausência após o fim da licença por maternidade prevista na lei é normalmente tomada em conta no número de dias de doença no caso de a trabalhadora se ter declarado doente, quer seja por gravidez ou maternidade, ou por qualquer outra doença.

Seguidamente, a Aldi Marked sustenta que a questão de saber de que protecção beneficiam as mulheres em caso de gravidez ou de parto está regulada na lei relativa à licença por maternidade, que trata de forma exaustiva, no seu artigo 3.o, a questão do despedimento em razão de gravidez ou de parto e que deve ser considerada como uma protecção especial das mulheres na acepção do artigo 2.o, n.o 3, da Directiva 76/207 do Conselho, que deixa aos Estados-membros a incumbência de determinar a amplitude desta protecção.

O Højesteret, considerando que o processo suscita questões relativas à interpretação da Directiva 76/207 do Conselho que podem influir sobre a interpretação da lei dinamarquesa de transposição, por despacho de 30 de Junho de 1988, submeteu, nos termos do artigo 177.o do Tratado CEE, as seguintes questões prejudiciais ao Tribunal de Justiça:

«1)

O disposto no artigo 5.o, n.o 1, conjugado com o artigo 2.o, n.o 1, da directiva do Conselho de 9 de Fevereiro de 1976 relativa à concretização do princípio de igualdade de tratamento entre homens e mulheres no que se refere ao acesso ao emprego, à formação e promoção profissionais e às condições de trabalho (76/207 /CEE) abrange os despedimentos que são consequência de ausências devidas a uma doença que tem a sua origem na gravidez ou no parto?

2)

Em caso de resposta afirmativa, a protecção contra os despedimentos devidos a uma doença causada por gravidez ou por parto é válida sem limite de tempo?»

O despacho de reenvio deu entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 4 de Julho de 1988.

Em conformidade com o artigo 20.o do Protocolo relativo ao Estatuto do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, foram apresentadas observações escritas pelo Handels- og Kontorfunktionærernes Forbund i Danmark (adiante «HK»), na qualidade de mandatário da Sr.a Birthe Vibeke Hertz, recorrente na causa principal, representada pelo advogado L. S. Andersen, de Århus, pela Dansk Arbejdsgiverforening (adiante «DA»), na qualidade de mandatária de Aldi Marked K/S, recorrida na causa principal, representada pelo advogado J. P. Buhl, de Copenhaga, pelo Governo do Reino Unido, representado pela Sr.a J. A. Gensmantel, do Treasury Solicitor's Department, na qualidade de agente, pelo Governo italiano, representado pelo advogado P. G. Ferri, avvocato dello Stato, e pela Comissão das Comunidades Europeias, representada pela Sr.a I. Langermann, membro do seu Serviço Jurídico.

Com base no relatório preliminar do juiz relator, ouvido o advogado-geral, o Tribunal decidiu, em 7 de Junho de 1989, iniciar a fase oral do processo sem instrução. Todavia, convidou as partes a responder a uma questão e dirigiu ao Governo dinamarquês um pedido, nos termos do artigo 21.o, segundo parágrafo, do estatuto CEE, solicitando-lhe que fornecesse ao Tribunal o parecer emitido em 22 de Dezembro de 1986 pelo Conselho Dinamarquês para a Igualdade de Oportunidades, assim como o ofício do Ministério do Emprego, de 20 de Setembro de 1985, referido neste parecer.

III — Resumo das observações escritas apresentadas no Tribunal

Quanto à primeira questão

A recorrente na causa principal, HK, o Governo italiano e a Comissão e ainda o Governo britânico, este último sob determinadas condições, sugerem que se responda afirmativamente à primeira questão. Em contrapartida, a recorrida na causa principal, DA, propõe uma resposta negativa a esta questão.

a)

HK alega que uma doença ligada à gravidez não pode dar origem a despedimento em consequência das faltas que provoca, sem que tal despedimento seja contrário aos artigos 2.o e 5.o da Directiva 76/207 e às disposições correlativas de transposição da lei dinamarquesa sobre a igualdade de tratamento, a saber, o artigo 1.o, n.o 1, e o artigo 4.o

A este propósito, cita um parecer emitido em 20 de Setembro de 1985 pelo Conselho Dinamarquês para a Igualdade de Oportunidades, no qual este declarou, antes de mais, que não partilhava a opinião do Ministério do Trabalho, segundo a qual a protecção garantida pelas disposições da lei sobre a igualdade de tratamento contra os despedimentos baseados em doença, que se manifestou em ligação com a gravidez ou o parto, deixa de existir após o termo do período legal de licença por maternidade e, seguidamente, que a proibição de despedimento em razão de uma doença devida a uma gravidez se aplica, em princípio, seja qual for a duração da doença, uma vez que o princípio da igualdade de tratamento não pode ser limitado no tempo pelas disposições aleatórias que a este respeito existem em cada um dos Estados-membros.

Sublinha que a protecção pretendida pela directiva no seu artigo 2.o, n.o 1, tem o mesmo alcance que a prevista na lei sobre a igualdade de tratamento no seu artigo 1.o, n.o 1, mesmo se esta última disposição menciona expressamente, também, a gravidez, que coloca em pé de igualdade com o estado matrimonial ou familiar.

Segundo a recorrente, esta menção limita-se a precisar a necessidade específica de protecção que existe relativamente à gravidez, necessidade esclarecida pelo artigo 2.o, n.o 3, da Directiva 76/207.

b)

A DA sustenta, antes de mais, que o artigo 5.o, n.o 1, conjugado com o artigo 2.o, n.o 1, da Directiva 76/207, não abrange os despedimentos que são consequência de faltas devidas a uma doença que tem a sua origem na gravidez ou no parto.

Segundo a recorrida, estas disposições limitam-se a estabelecer um princípio superior de igualdade de tratamento. Daí resulta que este princípio pode ser invocado em cada despedimento, mas que a simples verificação de um nexo entre o despedimento e a gravidez ou o parto não basta para estabelecer uma violação deste princípio. As regras aplicáveis a tais situações devem ser elaboradas respeitando este princípio no âmbito nacional, pois a directiva não visa, aliás, regulamentar detalhadamente a formulação destas regras, uma vez que se caracteriza pela ausência de indicação positiva no que se refere à maneira de promover a aplicação do princípio da igualdade de tratamento, como revelam os seus trabalhos preparatórios e a existência do seu artigo 2.o, n.o 3.

Sustenta, em seguida, que, mesmo que seja de considerar que as disposições em causa da directiva obrigam os Estados-membros a promover a aplicação das normas de direito positivo que protegem as mulheres no que respeita à gravidez ou à maternidade, o alcance destas disposições não poderá ser alargado de forma a abranger a situação visada na primeira questão.

Segundo a recorrida, a existência do artigo 2.o, n.o 3, da directiva é reveladora do facto de, embora a directiva ter pretendido dar a possibilidade de serem introduzidas regras específicas, ter evitado, em contrapartida, dar orientações quanto à forma precisa de tais regras.

Considera a recorrida que a explicação de um tal estado de coisas se encontra no reconhecimento, como foi salientado pela Comissão e pelo Conselho Económico e Social nos trabalhos preparatórios da Directiva 76/207, de que só uma modificação da atitude geral das entidades patronais em relação aos trabalhadores do sexo feminino permitirá dar aplicação, nas melhores condições, ao princípio superior da igualdade de tratamento e que a aplicação de regras de protecção específicas baseadas no artigo 2.o, n.o 3, pode constituir um obstáculo decisivo à evolução positiva e desejável da atitude das entidades patronais relativamente aos trabalhadores do sexo feminino.

Assim, a recorrida sublinha que, uma vez que, quando da adopção da directiva, não se procedeu à ponderação, por um lado, da melhor protecção possível das mulheres grávidas e, por outro lado, da evolução, tão decisiva para a igualdade de tratamento, da atitude das entidades patronais relativamente aos trabalhadores do sexo feminino, a introdução e a formulação de medidas de protecção positiva com vista a efectuar esta ponderação foi deixada pela directiva à competência do legislador nacional.

O alcance do artigo 5.o, n.o 1, conjugado com o artigo 2.o, n.o 1, só poderá, assim, ser extensivo ao despedimento resultante de faltas devidas a uma doença que tem a sua origem na gravidez após uma confrontação escrupulosa destes dois interesses.

Relativamente às faltas que ocorreram antes do termo do período da licença por maternidade, a regulamentação de cada Estado-membro em matéria de licença por maternidade procedeu a esta confrontação.

Se tal ponderação não foi feita separadamente relativamente às faltas posteriores a este período, a directiva não poderá ter como consequência tornar extensiva a aplicação das regras de protecção nacionais a estes casos, sob pena de entravar a evolução positiva que está em curso na atitude das entidades patronais relativamente aos trabalhadores do sexo feminino.

A DA considera que, portanto, é deixando à lei nacional a incumbência de estruturar a protecção dos despedimentos devidos a faltas que resultam de uma doença causada pela gravidez ou pelo parto que se obterão as melhores condições possíveis de aplicação do princípio da igualdade de tratamento.

c)

O Governo italiano sublinha que, se a faculdade da entidade patronal despedir um empregado em virtude de um número elevado de faltas devidas a doença fosse também aplicável ao caso da trabalhadora atingida por uma doença na sequência da gravidez ou do parto, esta trabalhadora perderia o seu emprego em razão de um acontecimento determinado por uma causa, a maternidade, que constitui um elemento próprio da condição feminina.

No seu ponto de vista, tal constatação não pode ser afastada pela consideração de que a protecção concedida à trabalhadora no que respeita à maternidade encontra o seu limite na aplicação das disposições nacionais adoptadas com base no artigo 2.o, n.o 3, da directiva, que regulam as faltas ao trabalho nos períodos pré e pós-natais com duração variável conforme os Estados-membros.

Com efeito, estas legislações regulam o caso da maternidade através de prescrições que incidem sobre o processo fisiológico da gravidez e do parto e prosseguem uma finalidade social, a protecção da maternidade, que não se identifica com a protecção da igualdade de tratamento entre homens e mulheres, e que fazem mesmo abstracção deste princípio no caso da licença por maternidade.

Portanto, o Governo italiano é da opinião que o artigo 5.o da directiva se deve necessariamente aplicar a uma norma de despedimento cuja aplicação é susceptível de implicar uma discriminação relativamente à mulher. No caso concreto, a discriminação potencial do despedimento motivado pela doença do trabalhador parece existir na medida em que a trabalhadora está mais exposta aos riscos de perda do seu emprego, dado que esta poderá ocorrer em razão de condições patológicas que afectam exclusivamente a mulher no caso da maternidade.

d)

Segundo o Governo britânico, as disposições conjugadas do artigo 5.o, n.o 1, e do artigo 2.o, n.o 1, da direttiva proíbem que seja aplicado a uma mulher ausente do seu trabalho, em razão de uma doença com origem na gravidez ou no parto, um tratamento menos favorável que a um homem ausente do trabalho por doença.

Daí resulta que, no caso de uma entidade patronal ter despedido uma mulher naquela situação, ao passo que não teria despedido um homem ausente com baixa por doença durante cem dias de trabalho no decurso de um ano, há que considerar que esta mulher foi tratada de forma incompatível com o princípio da igualdade de tratamento.

Sublinha o Governo britânico que, ainda que seja este o único alcance da Direttiva 76/207, o artigo 2.o, n.o 3, da mesma direttiva permite, todavia, aos Estados-membros a existência de disposições em matéria de gravidez e de parto em benefício específico das mulheres. Portanto, esta disposição permite aos Estados-membros a existência de disposições legais que proíbam a uma entidade patronal despedir uma mulher no caso de este despedimento ser consequência de faltas devidas a uma doença com origem na gravidez ou no parto. Todavia, se um Estado-membro não possuir tais disposições, a directiva não lhe impõe que as adopte.

e)

Após ter formulado algumas observações sobre a estrutura da direttiva, nomeadamente sobre o seu artigo 2.o, n.o 3, e negado que esta disposição possa revestir importância no caso em apreço, a Comissão sustenta que a questão essencial é a de saber se estamos em presença de uma discriminação directa ou indirecta em razão do sexo na acepção do artigo 2.o, n.o 1, da directiva, e que lhe parece razoável, com vista a responder a esta questão, considerar a ausência da Sr.a Hertz devida a uma doença e não à gravidez e à maternidade.

Verificando que o despedimento da Sr.a Hertz se baseia numa norma nacional segundo a qual os assalariados que estiveram doentes frequentemente são despedidos, a Comissão considera que tal regra não cai no âmbito da proibição de qualquer discriminação em razão do sexo, prevista na directiva, uma vez que se baseia num critério aplicável indistintamente aos dois sexos, a saber, a frequência das faltas por doença.

Quanto à proibição de qualquer discriminação indirecta em razão do sexo, prevista na directiva, a Comissão, citando os acórdãos de 31 de Março de 1981, Jenkins (96/80, Recueil, p. 911), e de 13 de Maio de 1986, Bilka-Kaufhaus (170/84, Colect, p. 1607), considera que, para determinar se estamos em presença de tal discriminação, há que seguir três etapas:

1)

determinar a disposição, o critério ou a prática em causa;

2)

analisar se este critério atinge um número muito mais elevado de mulheres do que de homens, cabendo à pessoa despedida estabelecer a respectiva presunção;

3)

uma vez a presunção estabelecida, apreciar se a entidade patronal está em condições de provar que o critério em questão pode, não obstante, explicar-se por factores estranhos a qualquer discriminação em razão do sexo e analisar se os meios escolhidos pela entidade patronal correspondem a uma verdadeira necessidade da empresa e são adequados e necessários com vista à realização do objectivo prosseguido por esta.

Para uso do órgão jurisdicional nacional, o único competente para apreciar se, com referência a estas orientações, existe uma discriminação indirecta no caso em apreço, a Comissão refere ainda que o critério em questão no litígio na causa principal é a norma que prevê o despedimento quando o empregado está frequentemente doente, no caso concreto, cem dias úteis por ano.

Acrescenta a Comissão, a propósito do segundo critério de discriminação indirecta, antes de mais, que nada permite supor que as mulheres se ausentem do seu trabalho por doença mais frequentemente do que os homens ou reciprocamente, uma vez que a gravidez não é assimilada a uma doença e, além disso, que não possui qualquer elemento que revele que o despedimento após um número determinado de dias de ausência atinja um número mais elevado de mulheres do que de homens.

Na sua opinião, a melhor comparação num processo como o da causa principal, em que a doença em questão apenas atinge as mulheres, uma vez que é devida à gravidez e ao parto, estaria, por um lado, entre as doenças que atingem as mulheres, incluindo as devidas à gravidez e ao parto e, por outro lado, as que apenas afectam os homens.

Se o órgão jurisdicional nacional considerar preenchido este segundo critério, a Comissão entende que a DA deverá fazer a prova de que a norma aplicada está objectivamente justificada, prova que incidirá sobre a capacidade da entidade patronal para manter a sua empresa em actividade em caso de doença de longa duração dos trabalhadores.

Quanto à segunda questão: eventual limitação no tempo da protecção contra os despedimentos devidos a uma doença causada pela gravidez

a)

A HK sustenta que a protecção contra os despedimentos devidos a uma doença derivada da gravidez é válida sem limitação no tempo.

A necessidade de proteger um assalariado do sexo feminino contra o despedimento após o termo da licença por maternidade, no caso de as complicações supervenientes a um nascimento ainda subsistirem, é tão importante como a necessidade de protecção durante a gravidez ou o parto, pois que a tendência das entidades patronais para conservar o substituto ou a substituta em caso de prolongamento do período de maternidade aumenta a necessidade de protecção da assalariada que dá à luz.

Por outro lado, nada nos trabalhos preparatórios da lei sobre a igualdade de tratamento, nem na própria lei ou na directiva, indica que a protecção só seria de aplicar até ao termo da licença por maternidade.

Reconhecendo que, à primeira vista, pode parecer inaceitável impor um tal encargo à entidade patronal, a HK sublinha que a apreciação da legitimidade de um despedimento após uma doença devida à gravidez ou ao parto, suscitada pelo órgão jurisdicional nacional, serve para determinar a importância da indemnização que uma empregada despedida pode pretender.

Segundo HK, o artigo 8.o da lei sobre a igualdade de tratamento, ao usar o verbo «pode» mostra que, ao proceder a uma tal apreciação, o órgão jurisdicional terá também em conta os inconvenientes que para a entidade patronal resultam destas faltas e poderá, se for caso disso, decidir não indemnizar a assalariada.

Acrescenta que o facto de a Sr.a Hertz se ter restabelecido durante o período do pré-aviso de despedimento e de estar em condições, se for caso disso, de retomar a relação de trabalho poderá igualmente desempenhar uma certa função nesta apreciação.

b)

A DA sustenta que as considerações expendidas a propósito da primeira questão militam ainda mais fortemente a favor de uma resposta negativa à segunda questão.

Sublinha que uma resposta positiva às duas questões apresentadas conduziria a que o recrutamento de trabalhadores do sexo feminino acabasse por comportar o risco de uma situação totalmente imprevisível para a entidade patronal, situação que comprometeria gravemente a evolução positiva da atitude das entidades patronais em relação aos trabalhadores do sexo feminino, quando a Comissão reconheceu que esta evolução constituía o elemento mais importante no processo de realização da igualdade de tratamento.

c)

Segundo o Governo italiano, o problema de uma eventual limitação no tempo da proibição de despedimento coloca-se em relação ao período posterior ao parto, uma vez que pode suceder que doenças ligadas à maternidade sejam diagnosticadas e, portanto, tratadas ulteriormente. Na sua opinião, em tal caso, a necessidade de proteger o trabalhador contra as discriminações deve ser adaptada ao princípio geral da certeza do direito e das obrigações que incumbem à entidade patronal no âmbito da relação de trabalho.

Em consequência, a protecção não deverá ser ilimitada, mas limitada a um período após o parto suficiente, todavia, para diagnosticar as doenças em questão e tratá-las, sem que o período dito «da licença por maternidade» possa ser considerado, a este respeito, como o período adequado.

d)

O Governo britânico sustenta que um Estado-membro cuja legislação proíbe a uma entidade patronal despedir uma mulher quando o seu despedimento é consequência de faltas devidas a uma doença com origem na gravidez ou no parto, disposição permitida pelo artigo 2.o, n.o 3, da directiva, pode, se o julgar conveniente, limitar no tempo a protecção que instituiu contra o despedimento.

e)

Por seu turno, a Comissão avança que resulta dos elementos expostos a propósito da primeira questão que a resposta à questão de saber se existe uma indiscriminação indirecta em razão do sexo depende das circunstâncias concretas e, nomeadamente, da duração do período de doença antes do despedimento da empregada, da base de comparação, da questão de saber se o critério diz respeito, de facto, a um número muito mais elevado de mulheres do que de homens e, finalmente, da eventual justificação objectiva.

Assim, a Comissão considera, nessas condições, que não pode ser dada uma resposta geral à segunda questão, pois que a resposta dependerá das circunstâncias concretas em cada caso específico.

A Comissão sugere, assim, que se responda da forma seguinte:

«Compete ao órgão jurisdicional nacional determinar se a aplicação por uma empresa de uma norma que prevê o despedimento após uma ausência prolongada por doença atinge um número muito mais elevado de mulheres do que de homens. Na afirmativa, haverá discriminação indirecta em razão do sexo, proibida nos termos da directiva, a menos que a empresa prove que a referida medida se explica por factores objectivamente justificados e estranhos a qualquer discriminação em razão do sexo, por corresponder a uma verdadeira necessidade da empresa e ser a priori necessária com vista à realização do objectivo por esta prosseguido.»

IV — Respostas às questões colocadas pelo Tribunal de Justiça

Tendo sido solicitada para esclarecer se uma causa de despedimento como a invocada, em relação à Sr.a Hertz, pela Aldi Marked, a saber, a frequência das ausências por doença, está prevista num texto da lei ou se corresponde a uma prática corrente consagrada no decurso dos anos pela jurisprudência dos órgãos jurisdicionais do trabalho, a União dos Empregados do Comércio e de Escritório da Dinamarca, HK, respondeu da forma seguinte:

A Sr.a Hertz, quando estava empregada na Aldi Marked, estava abrangida pela lei dinamarquesa aplicável aos empregados, cujo artigo 5.o, n.o 1, estabelece que, «se um empregado não estiver em condições, em razão de doença, de desempenhar as suas funções, a falta ao serviço daí resultante será considerada como justificada por um impedimento legítimo do empregado...».

Assim, esta disposição estabelece o princípio de que a doença constitui um impedimento legítimo;

o artigo 5.o comporta no seu n.o 2 uma derrogação que prevê que, «na relação individual de trabalho, pode contudo ser estipulado por convenção escrita que o empregado pode ser despedido com pré-aviso de um mês, de forma a cessar as suas funções num fim de mês, quando o empregado recebeu uma remuneração em caso de doença por um total de 120 dias no decurso de um período de 12 meses consecutivos. A validade do despedimento está dependente do facto de ele ocorrer em ligação directa com o termo dos 120 dias de doença, e estando o empregado ainda doente; pelo contrário, a sua validade não é afectada pelo facto de o empregado ter voltado ao trabalho após a ocorrência do despedimento»;

no caso em apreço, não foi celebrado qualquer acordo relativo a uma duração de pré-aviso mais curta em caso de despedimento após 120 dias de doença, do tipo daquele a que esta disposição abre a possibilidade.

A HK esclarece ainda que não existe jurisprudência uniforme consagrada no decorrer dos anos no que diz respeito ao caracter justificado do despedimento de um empregado em razão da frequência das suas faltas por doença.

Acrescenta que, se não deixa de ser exacto reconhecer que a doutrina se inclina a pensar que um despedimento resultante de doença de longa duração ou de faltas frequentes por doença pode ser considerado como justificado pela situação da empresa e não dar direito a indemnização por despedimento abusivo, não será possível dizer, com certeza, quando nos encontramos perante uma tal situação. Segundo a HK, a regra dos 120 dias pode constituir um indício da referida situação, mas a legitimidade do despedimento dependerá também de outras circunstâncias, entre as quais a natureza pública ou privada da empresa, o número de empregados, o encargo que para esta representa o facto de estar privada do assalariado em questão, a antiguidade do assalariado na empresa, o facto de saber se o restabelecimento é incerto ou se a sua probabilidade pode ser determinada com precisão, etc.

Em resposta à mesma questão, a Confederação das Entidades Patronais Dinamarquesas, DA, respondeu da forma seguinte.

A lei dinamarquesa é regida pelo princípio segundo o qual a rescisão do contrato de trabalho celebrado entre uma entidade patronal e um assalariado é livre. Este princípio vem enunciado no artigo 2o da lei relativa aos empregados, nos termos do qual:

«1.

Só pode ser posto termo, por rescisão, a um contrato de trabalho celebrado entre uma entidade patronal e um empregado, após um termo de um período de pré-aviso em conformidade com as disposições seguintes.

2.

A rescisão por parte da entidade patronal deverá ser precedida

1)

...

2)

de um pré-aviso de três meses no mínimo, de forma a que o empregado cesse as suas funções num fim de mês, quando este tiver mais de seis meses de antiguidade na empresa.

3.

O período de pré-aviso fixado no n.o 2, ponto 2, é aumentado de um mês por cada período de emprego de três anos, sem todavia poder exceder seis meses.»

No caso em apreço, a Sr.a Hertz, que estava empregada há três anos na altura do despedimento, foi despedida com o pré-aviso de quatro meses a que tinha direito nos termos do referido artigo 2o Foi-lhe pago o salário integral por este período.

Seguidamente, a DA esclarece que resulta do citado artigo 5.o, n.o 1, da lei relativa aos empregados que, em princípio, a entidade patronal não pode pôr termo ao contrato de trabalho através de um despedimento com fundamento em doença do empregado. Todavia, existe uma derrogação a esta regra, que figura no citado artigo 5.o, n.o 2, da lei relativa aos empregados.

Sobre este último ponto, a DA considera dever rectificar as afirmações feitas pela HK quanto aos factos do processo. O contrato de trabalho celebrado entre a Sr.a Hertz e a Aldi Marked previa, com base no artigo 5.o, n.o 2, a possibilidade de despedimento com um período de pré-aviso mais curto em caso de doença. Sobre este ponto, a DA remete para o contrato de trabalho de 1 de Julho de 1982, de que junta uma cópia.

A DA sublinha que é pacífico, tanto na doutrina como na jurisprudência dinamarquesa, que os 120 dias previstos no artigo 5.o, n.o 2, não correspondem a 120 dias de trabalho, pois abrangem também os domingos, dias feriados e dias úteis de folga. No caso em apreço, a Sr.a Hertz tinha estado ausente por doença durante 100 dias úteis no período compreendido entre Junho de 1984 e Junho de 1985.

Não obstante a existência da cláusula estipulada em conformidade com o artigo 5.o, n.o 2, a Aldi Marked denunciou o contrato de trabalho com um pré-aviso de quatro meses conforme é exigido pelo artigo 2o da lei relativa aos empregados, e não de um mês como vem previsto no citado artigo 5.o, n.o 2. Assim, a Aldi Marked não pôs termo ao contrato de trabalho em virtude de uma falta cometida pela Sr.a Hertz, tendo-se contentado em denunciar o contrato de trabalho com o pré-aviso habitual, uma vez que esta sociedade costuma despedir os assalariados cujas faltas por doença correspondem às da Sr.a Hertz no momento do seu despedimento.

A DA acrescenta que, não obstante o facto de o contrato de trabalho ter cessado por um despedimento com pré-aviso de uma duração em conformidade com a que está fixada na lei relativa aos empregados, o empregado tem direito, em certos casos enumerados no artigo 2.o b desta lei, a indemnizações especiais que acrescem aos salários devidos até ao momento da cessação das funções.

Este artigo 2.o b prevê:

«1.

No caso de o despedimento de um empregado, que já completou 18 anos e que esteve empregado na empresa de forma ininterrupta durante pelo menos um ano antes do despedimento, não poder ser considerado como justificado pela situação da empresa ou do empregado, a entidade patronal pagará uma indemnização. Esta indemnização é fixada em função da antiguidade do empregado e das outras circunstâncias próprias da situação concreta, mas não pode exceder o salário recebido pelo empregado num período correspondente à metade da duração do pré-aviso de despedimento a que o interessado tem direito em conformidade com o artigo 2.o, n.os 2 e 3. Todavia, no caso de o empregado já ter completado 30 anos na altura do seu despedimento, a indemnização pode elevar-se a três meses de salário no máximo.

2.

...

3.

...»

Segundo a DA, no caso de uma entidade patronal não se ter fundado em critérios objectivos quando do despedimento de um assalariado, pode ser atribuída uma indemnização ao empregado em conformidade com o artigo 2.o b, mas o despedimento ocorrido não pode, em contrapartida, ser anulado segundo a lei dinamarquesa.

A DA sublinha que foram principalmente as disposições desse artigo que foram invocadas pela Sr.a Hertz em apoio do seu pedido de indemnização no Sø- og Handelsretten. O artigo 2.o b, todavia, não precisa os casos em que um despedimento não poderá ser considerado como justificado pela situação da empresa ou do empregado.

No caso em apreço, é facto assente entre as partes que o despedimento tinha como única causa as faltas por doença da Sr.a Hertz e que o despedimento não podia portanto ser atribuído a outra causa real. A DA sublinha que nem a legislação nem a jurisprudência dinamarquesas publicadas até este momento tomaram posição quanto à questão, não resolvida pelo artigo 2.o b, de saber se um despedimento, que tem como causa numerosas faltas por doença, pode ser considerado como justificado pela situação da empresa ou do empregado. A doutrina inclina-se, pelo contrário, a pensar que tais faltas podem justificar o despedimento de um empregado; portanto, tal despedimento não é sancionado pela obrigação de pagar a indemnização prevista no artigo 2.o b. Sublinha, nomeadamente, que um despedimento decidido nos termos do citado artigo 5.o, n.o 2, nunca terá como efeito a obrigação de pagar a indemnização prevista no artigo 2.o b.

A DA considera que se deve relacionar esta situação com o facto de o despedimento em causa não ter ocorrido nos termos do artigo 5.o, n.o 2, com um mês de pré-aviso, mas, pelo contrário, com quatro meses de pré-aviso em conformidade com o artigo 2.o Segundo a DA, portanto, a conclusão que se impõe é a de que a legislação dinamarquesa consagra o princípio segundo o qual o despedimento pode ser livremente decidido.

Assim, a entidade patronal não é obrigada a invocar uma causa específica de despedimento. Se, como no caso em apreço, for invocado em apoio da decisão de despedimento um motivo como a frequência das faltas por doença, o efeito jurídico inerente a esta situação só pode incidir sobre a questão de saber se, em conformidade com o artigo 2o b da lei relativa aos empregados, o empregado tem direito a uma indemnização no caso de o despedimento que lhe foi notificado não ser justificado pela situação da empresa ou do empregado. A legislação, todavia, não tomou posição sobre a questão de saber se um tal despedimento podia ser considerado como justificado pela situação da empresa ou do assalariado e não podia, portanto, dar lugar a um pedido fundado no artigo 2.o b.

A jurisprudência dinamarquesa publicada também não tomou posição sobre o ponto de vista teórico emitido pela doutrina segundo o qual um despedimento com fundamento em faltas por doença frequentes não pode conferir direito a uma indemnização nos termos do artigo 2.o b. No que respeita à jurisprudência não publicada, existe uma decisão proferida por unanimidade pelo Sø-og Handelsretten no presente processo, segundo o qual a Sr.a Hertz não tinha direito a esta indemnização, na sequência do despedimento ocorrido. Atendendo a que a questão da concessão de uma indemnização nos termos do artigo 2.o b não foi suscitada perante o Højesteret, a decisão não é objecto de recurso sobre este ponto.

G. Slynn

Juiz relator


( *1 ) Língua do processo: dinamarquês.


ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

8 de Novembro de 1990 ( *1 )

No processo C-179/88,

que tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 177.o do Tratado CEE, pelo Højesteret, destinado a obter, no processo pendente neste órgão jurisdicional entre

Handels- og Kontorfunktionærernes Forbund i Danmark, na qualidade de mandatária de Birthe Vibeke Hertz,

e

Dansk Arbejdsgiverforening, na qualidade de mandatária de Aldi Marked K/S,

uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação da Directiva 76/207/CEE do Conselho, de 9 de Fevereiro de 1976, relativa à concretização do princípio da igualdade de tratamento entre homens e mulheres no que se refere ao acesso ao emprego, à formação e promoção profissionais e às condições de trabalho (JO L 39, p. 40; EE 05 F2 p. 70),

O TRIBUNAL,

constituído pelos Srs. O. Due, presidente, J. C. Moitinho de Almeida, G. C. Rodríguez Iglesias e M. Diez de Velasco, presidentes de secção, Sir Gordon Slynn, C. N. Kakouris e F. Grévisse, juízes,

advogado-geral: M. Darmon

secretano: B. Pastor, administradora

vistas as observações escritas apresentadas:

em representação da Handels- og Kontorfunktionærernes Forbund i Danmark, na qualidade de mandatária de Birthe Vibeke Hertz, recorrente na causa principal, pelo advogado L. S. Andersen, do foro de Århus,

em representação da Dansk Arbejdsgiverforening, na qualidade de mandatária de Aldi Marked K/S, recorrida na causa principal, pelo advogado J. P. Buhl, do foro de Copenhaga,

em representação do Governo do Reino Unido, por J. A. Gensmantel, do Treasury Solicitor's Department, na qualidade de agente,

em representação do Governo italiano, pelo advogado P. G. Ferri, avvocato dello Stato, na qualidade de agente,

em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por I. Langermann, membro do Serviço Jurídico, na qualidade de agente,

visto o relatório para audiência,

ouvidas as alegações da Handels- og Kontorfunktionærernes Forbund i Danmark, da Dansk Arbejdsgiverforening, do Reino Unido, do Governo italiano e da Comissão na audiencia de 3 de Outubro de 1989,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 14 de Novembro de 1989,

profere o presente

Acórdão

1

Por despacho de 30 de Junho de 1988, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 4 de Julho seguinte, o Højesteret da Dinamarca colocou, nos termos do artigo 177.o do Tratado CEE, duas questões prejudiciais sobre a interpretação da Directiva 76/207/CEE do Conselho, de 9 de Fevereiro de 1976, relativa à concretização do princípio da igualdade de tratamento entre homens e mulheres no que se refere ao acesso ao emprego, à formação e promoção profissionais e às condições de trabalho (JO L 39, p. 40; EE 05 F2 p. 70, adiante «directiva»).

2

Estas questões foram suscitadas no àmbito de um litígio que opõe Birthe Vibeke Hertz, empregada de caixa a tempo parcial, à sua antiga entidade patronal, Aldi Marked K/S. A Sr.a Hertz, contratada pela Aldi Marked em 15 de Julho de 1982, deu à luz, em Junho de 1983, uma criança no termo de uma gravidez «com complicações» e, no essencial e de acordo com a sua entidade patronal, entrou em situação de baixa por doença.

3

No termo da sua licença por maternidade, que, segundo as disposições da lei dinamarquesa aplicável, era de vinte e quatro semanas após o nascimento, a Sr.a Hertz retomou o seu trabalho no fim do ano de 1983. Não teve qualquer problema de saúde até Junho de 1984. Ao invés, entre Junho de 1984 e Junho de 1985, voltou à situação de baixa por doença durante cem dias úteis. É facto assente entre as partes que a doença da Sr.a Hertz constituía uma sequela da gravidez e do parto.

4

Por carta de 27 de Junho de 1987, a Aldi Marked comunicou à Sr.a Hertz que punha fim ao seu contrato de trabalho com o pré-aviso legal de quatro meses. Na sequência, a Aldi Marked esclareceu que as faltas da Sr.a Hertz eram a causa do seu despedimento e que era de uso corrente despedir os trabalhadores frequentemente ausentes por doença.

5

Tendo o Sø- og Handelsretten julgado improcedente a acção proposta pela Sr.a Herz, impugnando o despedimento, aquela recorreu desta decisão para o Højesteret. Neste órgão jurisdicional, a Handels- og Kontorfunktionærernes Forbund i Danmark (União dos Empregados de Comércio e de Escritório da Dinamarca) apresentou-se na qualidade de mandatária da Sr.a Herz, e a Dansk Arbejdsgiverforening (Confederação das Entidades Patronais Dinamarquesas) na qualidade de mandatária de Aldi Marked. Considerando que este recurso suscitava problemas de interpretação da Directiva 76/207 do Conselho, o Højesteret decidiu submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

O disposto no artigo 5.o, n.o 1, conjugado com o artigo 2.o, n.o 1, da directiva do Conselho de 9 de Fevereiro de 1976 relativa à concretização do princípio de igualdade de tratamento entre homens e mulheres no que se refere ao acesso ao emprego, à formação e promoção profissionais e às condições de trabalho (76/207/CEE) abrange os despedimentos que são consequência de ausências devidas a uma doença que tem a sua origem na gravidez ou no parto?

2)

Em caso de resposta afirmativa, a protecção contra os despedimentos devidos a uma doença causada por gravidez ou por parto é válida sem limite de tempo?»

6

Para uma mais ampla exposição dos factos do litígio na causa principal, da tramitação processual e das observações escritas apresentadas ao Tribunal de Justiça, remete-se para o relatório para audiência. Estes elementos dos autos apenas serão adiante retomados na medida do necessário para a fundamentação da decisão do Tribunal.

Quanto à primeira questão

7

As observações apresentadas no Tribunal de Justiça revelam as dificuldades suscitadas pela questão colocada pelo tribunal nacional.

8

Por um lado, sustenta-se que o despedimento de uma mulher por motivos de gravidez, de parto ou de faltas repetidas devidas a uma doença com origem na gravidez ou no parto, seja qual for o momento em que esta doença ocorra, é contrário ao princípio da igualdade de tratamento, uma vez que tais perturbações não podem atingir um trabalhador masculino e, em consequência, este último não poderia ser despedido pela mesma razão.

9

Por outro lado, é alegado que não se pode proibir uma entidade patronal de despedir um trabalhador feminino com fundamento nas suas numerosas baixas por doença apenas pela razão de a doença ter origem na gravidez ou no parto. Um despedimento com este fundamento não basta para constituir uma violação do princípio da igualdade de tratamento. Com efeito, tal proibição, onerando uma entidade patronal, numerosos anos após o parto, correria o risco de implicar não apenas dificuldades de gestão e consequências iníquas para as entidades patronais, mas também efeitos negativos relativamente ao emprego das mulheres. Além disso, se bem que o artigo 2.o, n.o 3, da directiva permita aos Estados-membros a introdução de regras com vista à protecção das mulheres no que respeita à gravidez e à maternidade, não dá qualquer orientação relativamente ao conteúdo preciso de tais regras.

10

Deve-se recordar, antes de mais, que nos termos do seu artigo 1.o, n.o 1, a directiva têm em vista a realização, nos Estados-membros, do princípio da igualdade de tratamento entre homens e mulheres no que se refere ao acesso ao emprego, à formação e promoção profissionais e às condições de trabalho.

11

O artigo 2.o, n.o 1, da directiva precisa que «o princípio da igualdade de tratamento... implica a ausência de qualquer discriminação em razão do sexo, quer directa quer indirecta, nomeadamente pela referência à situação matrimonial ou familiar». Nos termos do artigo 5.o, n.o 1, «a aplicação do princípio da igualdade de tratamento no que se refere às condições de trabalho, incluindo as condições de despedimento, implica que sejam asseguradas aos homens e às mulheres as mesmas condições, sem discriminação em razão do sexo».

12

O artigo 2.o, n.o 3, da directiva precisa que «a presente directiva não constitui obstáculo às disposições relativas à protecção da mulher, nomeadamente no que se refere à gravidez e à maternidade».

13

Resulta das citadas disposições da directiva que o despedimento de um trabalhador feminino em razão da sua gravidez constitui uma discriminação directa em razão do sexo, como o é igualmente a recusa de empregar uma mulher grávida (ver acórdão deste mesmo dia, Dekker, C-177/88, Colect., p. I-3941).

14

Em contrapartida, o despedimento de um trabalhador feminino com fundamento em baixas por doença repetidas que não têm origem na gravidez ou no parto não constitui uma discriminação directa em razão do sexo, na medida em que tais baixas por doença implicarão o despedimento do trabalhador masculino nas mesmas condições.

15

Há que referir que a directiva não contempla a hipótese da doença com origem na gravidez ou no parto. Todavia, permite a existência de disposições nacionais que garantam às mulheres direitos específicos em razão da gravidez e da maternidade, tais como a licença por maternidade. Daqui resulta que durante a licença por maternidade, de que beneficia nos termos da lei nacional, a mulher está protegida contra os despedimentos fundados na sua ausência. Compete a cada Estado-membro fixar os períodos de licença por maternidade de forma a permitir aos trabalhadores femininos faltarem durante o período no decurso do qual as perturbações inerentes à gravidez e ao parto ocorrem.

16

Tratando-se de uma doença que surge após a licença por maternidade, não há que distinguir a doença que tem a sua origem na gravidez ou no parto de qualquer outra doença. Tal estado patológico, portanto, está abrangido pelo regime geral aplicável em caso de doença.

17

Com efeito, os trabalhadores femininos e masculinos estão igualmente expostos à doença. Mesmo sendo verdade que algumas perturbações são próprias de um ou de outro sexo, a única questão é, pois, a de saber se uma mulher é despedida com fundamento em faltas devidas a doença nas mesmas condições que um homem; se tal for o caso, não existe discriminação directa em razão do sexo.

18

Da mesma forma, em tal caso, não se põe a questão de saber se as mulheres estão mais vezes ausentes por doença do que os homens, nem, por consequência, sobre a existência de uma eventual discriminação indirecta.

19

Portanto, deve ser respondido à primeira questão que, sob reserva das disposições da lei nacional adoptadas em aplicação do artigo 2.o, n.o 3, da Directiva 76/207 do Conselho, de 9 de Fevereiro de 1976, relativa à concretização do princípio de igualdade de tratamento entre homens e mulheres no que respeita ao acesso ao emprego, à formação e promoção profissionais e às condições de trabalho, as disposições conjugadas do artigo 5.o, n.o 1, e do artigo 2.o, n.o 1, desta directiva não se opõem aos despedimentos que são consequência de faltas devidas a uma doença com origem na gravidez ou no parto.

Quanto à segunda questão

20

Perante a resposta dada à primeira questão, não há que decidir sobre a segunda questão.

Quanto às despesas

21

As despesas efectuadas pelos governos britânico e italiano, assim como pela Comissão das Comunidades Europeias, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de um incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir sobre as despesas.

 

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL,

pronunciando-se sobre as questões que lhe foram submetidas pelo Højesteret da Dinamarca, por despacho de 30 de Junho de 1988, declara:

 

Sob reserva das disposições da lei nacional adoptadas em aplicação do artigo 2o, n.o 3, da Directiva 76/207/CEE do Conselho, de 9 de Fevereiro de 1976, relativa à concretização do princípio de igualdade de tratamento entre homens e mulheres no que respeita ao acesso ao emprego, à formação e promoção profissionais e às condições de traballio, as disposições conjugadas do artigo 5.o, n.o 1, e do artigo 2o, n.o 1, desta directiva não se opõem aos despedimentos que são consequência de faltas devidas a uma doença com origem na gravidez ou no parto.

 

Due

Moitinho de Almeida

Rodríguez Iglesias

Diez de Velasco

Slynn

Kakouris

Grévisse

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 8 de Novembro de 1990.

O secretário

J.-G. Giraud

O presidente

O. Due


( *1 ) Língua do processo: dinamarquês.