61987J0097

ACORDAO DO TRIBUNAL DE 17 DE OUTUBRO DE 1989. - DOW CHEMICAL IBERICA SA E ALCUDIA, EMPRESA PARA LA INDUSTRIA QUIMICA, SA E EMPRESA NACIONAL DEL PETROLEO SA CONTRA COMISSAO DAS COMUNIDADES EUROPEIAS. - CONCORRENCIA - RECURSO DE ANULACAO - DIREITO DA CONCORRENCIA - REGULAMENTO NO. 17 - DILIGENCIAS DE INSTRUCAO - DIREITO FUNDAMENTAL A INVIOLABILIDADE DO DOMICILIO - FUNDAMENTACAO - PROVAS - ADESAO. - PROCESSOS APENSOS 97/87, 98/87 E 99/87.

Colectânea da Jurisprudência 1989 página 03165
Edição especial sueca página 00165
Edição especial finlandesa página 00179


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


++++

1. Direito comunitário - Princípios - Direitos da defesa - Respeito no âmbito dos processos administrativos

(Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 14.°)

2. Direito comunitário - Princípios - Direitos fundamentais - Direito das pessoas singulares à inviolabilidade do domicílio - Inaplicabilidade às empresas - Protecção face às intervenções arbitrárias ou desproporcionadas do poder público

(Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 14.°)

3. Concorrência - Processo administrativo - Poderes da Comissão para proceder a diligências de intrução - Alcance - Acesso às instalações das empresas - Limites - Indicação do objecto e da finalidade das diligências de instrução

(Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 14.°)

4. Concorrência - Processo administrativo - Poderes da Comissão para proceder a diligências de instrução - Limites - Situações que necessitam da assistência das autoridades nacionais

(Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 14.°)

5. Concorrência - Processo administrativo - Poderes da Comissão para proceder a diligências de instrução - Assistência das autoridades nacionais - Definição das modalidades processuais pelo direito nacional - Fiscalização das autoridades nacionais - Limites

(Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 14.°, n.° 6)

6. Actos das instituições - Decisão - Validade - Apreciação independentemente de eventuais irregularidades na sua execução

7. Actos das instituições - Validade - Apreciação apenas em função do direito comunitário

8. Actos das instituições - Fundamentação - Obrigação - Alcance - Decisão que ordena a realização de diligências de instrução em aplicação do n.° 3 do artigo 14.° do Regulamento n.° 17

(Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 14.°, n.° 3)

9. Concorrência - Processo administrativo - Decisão que ordena diligências de instrução - Adopção com base em habilitação - Legalidade

(Tratado de fusão, artigo 17.°; Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 14.°, n.° 3)

10. Adesão de novos Estados-membros às Comunidades - Espanha - Concorrência - Inexistência de derrogação - Aplicabilidade imediata da regulamentação comunitária - Limitação do poder de investigação da Comissão aos comportamentos posteriores à adesão - Inexistência

(Acto de Adesão de Espanha, artigo 2.°, n.° 2; Regulamento n.° 17 do Conselho)

Sumário


1. O respeito dos direitos da defesa, enquanto princípio de carácter fundamental, deve ser assegurado não só nos processos administrativos susceptíveis de dar lugar a sanções, mas também em procedimentos de investigação prévia, como as diligências de instrução previstas no artigo 14.° do Regulamento n.° 17, que podem ser determinantes para a constituição de provas do carácter ilegal de comportamentos de empresas susceptíveis de implicar a responsabilidade destas.

2. Embora o reconhecimento de um direito fundamental à inviolabilidade do domicílio no que respeita ao domicílio privado das pessoas singulares se imponha na ordem jurídica comunitária como princípio comum aos direitos dos Estados-membros, o mesmo não acontece relativamente às empresas, pois os sistemas jurídicos dos Estados-membros apresentam divergências assinaláveis quanto à natureza e grau de protecção das instalações comerciais face às intervenções das autoridades públicas. Além disso, não se pode tirar uma conclusão diferente do artigo 8.° da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.

Não deixa de ser certo que, em todos os sistemas jurídicos dos Estados-membros, as intervenções do poder público na esfera da actividade privada de qualquer pessoa, singular ou colectiva, devem ter uma base legal e justificar-se pelas razões previstas na lei e esses sistemas prevêem, em consequência, embora com modalidades diferentes, uma protecção face a intervenções arbitrárias ou desproporcionadas. A exigência desta protecção deve, portanto, ser reconhecida como um princípio geral do direito comunitário.

3. Resulta tanto da finalidade do Regulamento n.° 17 como da enumeração, pelo seu artigo 14.°, dos poderes de que estão investidos os agentes da Comissão, que as diligências de instrução podem ter um alcance muito amplo.

A este respeito, o direito de acesso a todas as instalações, terrenos e meios de transporte das empresas tem especial importância, na medida em que deve permitir à Comissão recolher as provas das infracções às regras de concorrência nos locais onde elas se encontram normalmente, isto é, nas instalações comerciais das empresas.

Esse direito de acesso ficaria desprovido de utilidade se os agentes da Comissão tivessem de se limitar a pedir a apresentação de documentos ou de processos que eles estivessem em condições de identificar previamente de modo preciso. Implica, pelo contrário, a faculdade de procurar elementos de informação diversos que ainda não são conhecidos ou totalmente identificados. Sem essa faculdade, seria impossível à Comissão recolher os elementos de informação necessários à instrução caso se deparasse com uma recusa de colaboração ou ainda com uma atitude de obstrução por parte das empresas em causa.

O exercício de amplos poderes de investigação de que dispõe a Comissão aquando das diligências de instrução está, no entanto, sujeito a condições susceptíveis de garantir o respeito dos direitos das empresas. A este propósito, a obrigação da Comissão de indicar o objecto e a finalidade de uma diligência constitui uma exigência fundamental não apenas para evidenciar o carácter justificado da intervenção prevista no interior das empresas em causa, mas também para que estas fiquem em condições de compreender o alcance do seu dever de colaboração, preservando ao mesmo tempo os seus direitos de defesa.

4. Na hipótese de diligências de instrução realizadas com a colaboração das empresas em questão por força de uma obrigação decorrente de uma decisão de diligências de instrução, os agentes da Comissão têm, entre outras, a faculdade de exigir a apresentação dos documentos que pretendem, de entrar nos locais que designarem, e de que lhes seja mostrado o conteúdo dos móveis que indicarem. Em contrapartida, não podem forçar o acesso a instalações ou a móveis ou obrigar o pessoal da empresa a facultar-lhes esse acesso, nem efectuar buscas sem autorização dos responsáveis da empresa, autorização essa que, eventualmente, pode ser dada implicitamente, nomeadamente pela assistência prestada aos agentes da Comissão.

Pelo contrário, quando a Comissão encontra oposição das empresas em causa, os seus agentes podem, nos termos do n.° 6 do artigo 14.° do Regulamento n.° 17, procurar, sem a colaboração das empresas, todos os elementos de informação necessários para as diligências de instrução, com a colaboração das autoridades nacionais, que estão obrigadas a fornecer-lhes a assistência necessária ao cumprimento da sua missão. Embora essa assistência só seja exigida quando a empresa manifeste a sua oposição, deve acrescentar-se que ela pode igualmente ser solicitada a título preventivo, a fim de ultrapassar a eventual oposição da empresa.

5. Decorre do n.° 6 do artigo 14.° do Regulamento n.° 17 que cabe a cada Estado-membro regular as condições em que é prestada a assistência das autoridades nacionais aos agentes da Comissão. A este propósito, os Estados-membros estão obrigados a assegurar a eficácia da acção da Comissão respeitando simultaneamente os princípios gerais do direito comunitário. Dentro desses limites, é o direito nacional que define as modalidades processuais adequadas para garantir o respeito dos direitos das empresas.

Estas regras processuais nacionais devem ser respeitadas pela Comissão, que deve, além disso, velar para que a autoridade competente nos termos do direito nacional disponha de todos os elementos necessários para lhe permitir exercer a fiscalização que lhe compete.

Essa autoridade - seja ela judicial ou não - não pode, nessa ocasião, susbstituir pela sua própria apreciação a apreciação da Comissão quanto ao carácter necessário das diligências de instrução ordenadas, já que as apreciações de facto e de direito feitas pela Comissão estão apenas sujeitas à fiscalização de legalidade do Tribunal de Justiça. Em contrapartida, cabe nos poderes da autoridade nacional examinar, após ter comprovado a autenticidade da decisão de diligencias de instrução, se as medidas coercivas previstas não são arbitrárias ou excessivas em relação ao objecto da instrução e velar pelo respeito das normas do direito nacional na aplicação dessas medidas.

6. A validade de uma decisão não pode ser afectada por actos posteriores à sua adopção, de modo que eventuais irregularidades cometidas aquando da sua execução são irrelevantes quando se trata de apreciar a sua validade.

7. A validade dos actos adoptados pelas instituições só pode ser apreciada em função do direito comunitário; por isso, a alegação de violações dos direitos fundamentais, tais como estão formulados na Constituição de um Estado-membro, ou dos princípios de uma estrutura constitucional nacional não pode afectar a validade de um acto comunitário ou o seu efeito no território desse Estado.

8. O n.° 3 do artigo 14.° do Regulamento n.° 17 define os elementos essenciais da fundamentação da decisão que ordena uma diligência de instrução. A exigência de que a Comissão indique o objecto e a finalidade desta constitui uma garantia fundamental dos direitos de defesa das empresas em causa. Daqui decorre que o alcance do dever de fundamentar as decisões que ordenam diligências de instrução não pode ser restringido em função de considerações relativas à eficácia da investigação. A este respeito, embora sendo certo que a Comissão não está obrigada a comunicar ao destinatário de uma tal decisão todas as informações de que dispõe quanto a presumíveis infracções, como a delimitação precisa do mercado em questão ou o período durante o qual as infracções teriam sido cometidas, nem a proceder a uma qualificação jurídica rigorosa dessas infracções, ela deve, em contrapartida, indicar claramente as presunções que pretende comprovar.

9. Não viola o princípio da colegialidade inscrito no artigo 17.° do Tratado de Fusão a decisão pela qual a Comissão habilita o seu membro encarregado das questões de concorrência a tomar, em nome e sob a responsabilidade da Comissão, decisões nos termos do n.° 3 do artigo 14.° do Regulamento n.° 17.

10. Não tendo o Acto de Adesão do Reino de Espanha previsto qualquer derrogação no que respeita ao Regulamento n.° 17, este era aplicável no novo Estado-membro a partir da adesão, por força da regra geral consagrada no artigo 2.° do referido acto. Por conseguinte, as empresas estabelecidas em Espanha podiam estar sujeitas a diligências de instrução a partir de 1 de Janeiro de 1986.

O objecto das diligências de instrução efectuadas pela Comissão após esta data junto das empresas estabelecidas nos novos Estados-membros só pode ser limitado em função do âmbito de aplicação das regras comunitárias de concorrência. Nenhuma disposição limita a este respeito a competência de investigação da Comissão apenas aos comportamentos posteriores à adesão.

Partes


Nos processos apensos 97, 98 e 99/87,

Dow Chemical Ibérica, SA, sociedade de direito espanhol, com sede em Axpe-Erandio (Espanha),

Alcudia, Empresa para la Industria Química, SA, sociedade de direito espanhol com sede em Madrid, e

Empresa Nacional del Petróleo, SA, sociedade de direito espanhol, com sede em Madrid,

patrocinadas por José Pérez Santos, advogado em Madrid, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório do advogado Ernest Arendt, 4, avenue Marie-Thérèse,

recorrentes,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada pelo consultor jurídico Norbert Koch e por Luís Miguel Pais Antunes e Daniel Calleja y Crespo, membros do seu Serviço Jurídico, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de Georgios Kremlis, membro do seu Serviço Jurídico, Centro Wagner, Kirchberg,

recorrida,

que tem por objecto a anulação das decisões da Comissão tomadas nos processos IV/31.865 - PVC e IV/31.866 - polietileno, de 15 de Janeiro de 1987 (C(87) 19/1, 2 e 3), respeitantes a diligências de instrução efectuadas nos termos do n.° 3 do artigo 14.° do Regulamento n.° 17 do Conselho, de 6 de Fevereiro de 1962 (JO 13, p. 204; EE 08 F1 p. 22),

O TRIBUNAL,

constituído pelos Srs. O. Due, presidente, Sir Gordon Slynn, C. N. Kakouris, F. A. Schockweiler e M. Zuleeg, presidentes de secção, T. Koopmans, G. F. Mancini, R. Joliet, T. F. O' Higgins, J. C. Moitinho de Almeida, G. C. Rodríguez Iglesias, F. Grévisse e Diez de Velasco, juízes,

advogado-geral: J. Mischo

secretário: B. Pastor, administradora

visto o relatório para audiência e após a realização desta em 8 de Dezembro de 1988,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 21 de Fevereiro de 1989,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por petições que deram entrada na Secretaria do Tribunal em 2 de Abril de 1987, as sociedades Dow Chemical Ibérica, SA (a seguir, "Dow Ibérica"), Alcudia, Empresa para la Industria Química, SA (a seguir, "Alcudia"), e Empresa Nacional del Petróleo, SA (a seguir, "EMP"), interpuseram, nos termos do segundo parágrafo do artigo 173.° do Tratado CEE, recursos de anulação das decisões da Comissão tomadas nos processos IV/31.865 - PVC e IV 31.866 - polietileno, de 15 de Janeiro de 1987 (C(87) 19/1, 2 e 3), respeitantes a diligências de instrução efectuadas nos termos do n.° 3 do artigo 14.° do Regulamento n.° 17 do Conselho, de 6 de Fevereiro de 1962, primeiro regulamento de aplicação dos artigos 85.° e 86.° do Tratado (JO 13, p. 204; EE 08 F1 p. 22).

2 Dispondo de informações que lhe permitiam presumir a existência de acordos ou de práticas concertadas relativas à fixação de preços e quotas de fornecimento de PVC e de polietileno entre determinados produtores e fornecedores dessas substâncias na Comunidade, a Comissão decidiu proceder a diligências de instrução em várias empresas, entre as quais as recorrentes, e adoptou relativamente a elas as decisões impugnadas.

3 Em 20 e 21 de Janeiro seguintes, a Comissão procedeu às diligências em questão. Após terem tomado conhecimento das decisões impugnadas, e terem sido informados pelos funcionários da Comissão dos direitos e deveres das empresas em causa, os representantes das recorrentes consideraram-se obrigados a sujeitar-se à inspecção, pelo que não se opuseram a que os funcionários da Comissão tomassem, examinassem e fotocopiassem documentos e prestaram-lhes a colaboração necessária para esse efeito.

4 A Comissão teve assim acesso a todos os gabinetes, arquivos e documentos, bem como a uma maleta e à agenda pessoal de um representante da Dow Ibérica, e tirou todas as fotocópias que quis.

5 Para mais ampla exposição dos antecedentes do litígio, da tramitação processual e dos fundamentos e argumentos das partes, remete-se para o relatório para audiência. Estes elementos apenas serão adiante retomados na medida do necessário para a fundamentação da decisão do Tribunal.

6 Em apoio dos seus recursos, as recorrentes invocam oito fundamentos baseados em violação do direito fundamental à inviolabilidade do domicílio e ao respeito da vida privada, violação do princípio da proporcionalidade, violação do princípio da não discriminação, falta de fundamentação, inexistência ou indeterminação dos factos que estão na base das decisões, violação do direito fundamental à presunção de inocência, violação de formalidades essenciais e no facto de as decisões visarem comportamentos anteriores à adesão da Espanha à Comunidade.

Quanto ao fundamento baseado em violação do direito fundamental à inviolabilidade do domicílio e ao respeito da vida privada

7 Segundo as recorrentes, as decisões impugnadas, ou pelo menos a sua execução, implicaram uma violação do seu direito fundamental à inviolabilidade do domicílio e ao respeito da vida privada. O artigo 14.° do Regulamento n.° 17, que constitui, é certo, uma excepção a esse direito, não autoriza de modo algum os agentes da Comissão a actuações que as recorrentes qualificam de busca. Acrescentam que, se a referida disposição fosse interpretada no sentido de conferir à Comissão o poder de efectuar buscas, ela seria ilegal devido à sua incompatibilidade com os direitos fundamentais, cuja protecção exige que uma busca só possa ser efectuada por força de um mandado judicial prévio.

8 A Comissão salienta em primeiro lugar que não houve violação de domicílio e da vida privada dado que as recorrentes se sujeitaram à diligência sem manifestarem a mínima oposição. Sustenta em seguida que os poderes que detém nos termos do artigo 14.° do Regulamento n.° 17 incluem medidas que, segundo o direito de alguns Estados-membros, integram o conceito de busca. Considera que, não obstante, as exigências de tutela judicial resultantes dos direitos fundamentais, exigências que em princípio não contesta, estão satisfeitas desde que os destinatários das decisões de diligências de instrução tenham, por um lado, a possibilidade de as impugnar perante o Tribunal de Justiça e, por outro lado, a de solicitar a suspensão da execução em processo de medidas provisórias, que permite ao Tribunal verificar rapidamente o carácter não arbitrário das diligências ordenadas. Essa fiscalização equivale a um mandado judicial prévio.

9 Como o Tribunal salientou recentemente (acórdão de 21 de Setembro de 1989, Hoechst/Comissão, 46/87 e 227/88, Colect., p. ????), o artigo 14.° do Regulamento n.° 17 não pode ser interpretado de forma a conduzir a resultados incompatíveis com os princípios gerais do direito comunitário, e em particular com os direitos fundamentais.

10 De facto, segundo uma jurisprudência constante, os direitos fundamentais são parte integrante dos princípios gerais do direito cujo respeito o Tribunal garante, em conformidade com as tradições constitucionais comuns aos Estados-membros, bem como com os instrumentos internacionais em que os Estados-membros tenham cooperado ou a que tenham aderido (veja-se em especial o acórdão de 14 de Maio de 1974, Nold, 7/73, Recueil, p. 491). A Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, de 4 de Novembro de 1950 (a seguir "Convenção Europeia dos Direitos do Homem") apresenta, neste aspecto, particular significado (veja-se especialmente o acórdão de 15 de Maio de 1986, Johnston, 222/84, Recueil, p. 1651).

11 Para se interpretar o artigo 14.° do Regulamento n.° 17 há que ter em consideração, em especial, as exigências que resultam do respeito dos direitos da defesa, princípio cujo carácter fundamental foi destacado em numerosas ocasiões pela jurisprudência do Tribunal (veja-se especialmente o acórdão de 9 de Novembro de 1983, Michelin, 322/81, Recueil, p. 3461, n.° 7).

12 Há que esclarecer que, sendo certo que nesse acórdão o Tribunal salientou que os direitos da defesa devem ser respeitados nos processos administrativos susceptíveis de dar lugar a sanções, há que evitar que esses direitos fiquem irremediavelmente comprometidos em procedimentos de investigação prévia, entre os quais, designadamente, as diligências de instrução, que podem ser determinantes para a constituição de provas do carácter ilegal de comportamentos de empresas susceptíveis de implicar a responsabilidade destas.

13 Por conseguinte, se bem que alguns direitos de defesa só dizem respeito a processos contraditórios na sequência de uma comunicação de acusações, outros, como o direito de assistência jurídica e o direito à confidencialidade da correspondência entre advogado e cliente (reconhecido pelo Tribunal no acórdão de 18 de Maio de 1982, AM & S, 155/79, Recueil, p. 1575), devem ser respeitados desde a fase do inquérito preliminar.

14 No que se refere a exigências derivadas do direito fundamental à inviolabilidade do domicílio e ao respeito da vida privada, invocados pelas recorrentes, deve observar-se que, embora o reconhecimento desse direito no que concerne o domicílio particular das pessoas singulares se imponha na ordem jurídica comunitária como princípio comum aos direitos dos Estados-membros, o mesmo não acontece relativamente às empresas, pois os sistemas jurídicos dos Estados-membros apresentam divergências assinaláveis quanto à natureza e grau de protecção das instalações comerciais face às intervenções das autoridades públicas.

15 Não se pode tirar conclusão diferente do artigo 8.° da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, cujo n.° 1 prevê: "Qualquer pessoa tem direito ao respeito da sua vida privada e familiar, do seu domicílio e da sua correspondência". O objecto da protecção deste artigo diz respeito ao domínio da manifestação da liberdade pessoal do homem e não pode, portanto, ser alargado a instalações comerciais. Por outro lado, há que assinalar a inexistência de jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem quanto a esta questão.

16 Não deixa de ser certo que, em todos os sistemas jurídicos dos Estados-membros, as intervenções do poder público na esfera da actividade privada de qualquer pessoa, singular ou colectiva, devem ter uma base legal e justificar-se pelas razões previstas na lei, e esses sistemas prevêem, em consequência, embora com modalidades diferentes, uma protecção face a intervenções arbitrárias ou desproporcionadas. A exigência desta protecção deve, portanto, ser reconhecida como um princípio geral do direito comunitário. Há que recordar que o Tribunal afirmou a sua competência de fiscalização relativamente ao carácter eventualmente excessivo das diligências de instrução realizadas pela Comissão no âmbito do Tratado CECA (acórdão de 14 de Dezembro de 1962, San Michele e outros, 5 a 11 e 13 a 15/62, Recueil, p. 859).

17 É, portanto, à luz dos princípios gerais acima expostos que se devem apreciar a natureza e o alcance dos poderes de investigação que o artigo 14.° do Regulamento n.° 17 atribui à Comissão.

18 O n.° 1 deste artigo autoriza a Comissão a proceder a todas as diligências de instrução necessárias junto das empresas e associações de empresas e precisa que "para o efeito, compete aos agentes incumbidos pela Comissão:

a) Inspeccionar os livros e outros documentos profissionais;

b) Tirar cópias ou extractos dos livros e documentos profissionais;

c) Pedir in loco explicações orais;

d) Ter acesso às instalações, terrenos e meios de transporte das empresas".

19 Os n.os 2 e 3 do mesmo artigo prevêem que essas diligências se podem efectuar mediante apresentação de um mandado escrito ou com base numa decisão que obrigue as empresas a sujeitar-se a elas. Como o Tribunal já decidiu, a Comissão pode optar por uma destas duas possibilidades, consoante as particularidades de cada caso (acórdão de 26 de Junho de 1980, National Panasonic, 136/79, Recueil, p. 2033). Tanto os mandados escritos como as decisões devem indicar o objecto e a finalidade da diligência. Qualquer que seja o processo seguido, a Comissão é obrigada a informar previamente a autoridade competente do Estado-membro em cujo território a diligência deve ser efectuada, autoridade essa que, por força do n.° 4 do artigo 14.°, deve ser ouvida antes de se tomar uma decisão que ordene diligências de instrução.

20 Segundo o n.° 5 do mesmo artigo, os agentes da Comissão podem ser assistidos no cumprimento das suas tarefas por agentes da autoridade competente do Estado-membro em cujo território se deve efectuar a diligência. A assistência pode ser prestada a pedido dessa autoridade ou da Comissão.

21 Por fim, nos termos do n.° 6, a assistência das autoridades nacionais é necessária para a execução de uma diligência quando uma empresa se lhe opuser.

22 Como o Tribunal já assinalou no acórdão citado de 26 de Junho de 1980 (National Panasonic, n.° 20), resulta dos considerandos sétimo e oitavo do Regulamento n.° 17 que os poderes atribuídos à Comissão pelo artigo 14.° do referido regulamento têm como finalidade permitir-lhe desempenhar a missão, que lhe é confiada pelo Tratado CEE, de velar pelo respeito das regras de concorrência no mercado comum. Essas regras destinam-se a evitar que a concorrência seja falseada em detrimento do interesse geral, das empresas singulares e dos consumidores, conforme resulta do quarto parágrafo do preâmbulo do Tratado, da alínea f) do artigo 3.°, e dos artigos 85.° e 86.° O exercício dos poderes conferidos à Comissão pelo Regulamento n.° 17 contribui, assim, para a manutenção do regime de concorrência pretendido pelo Tratado e cujo respeito se impõe imperativamente às empresas. O oitavo considerando já citado precisa que, para esse efeito, a Comissão deve dispor, em todo o mercado comum, do poder de exigir as informações e proceder às averiguações "necessárias" para detectar as infracções aos artigos 85.° e 86.°

23 Tanto a finalidade do Regulamento n.° 17 como a enumeração, pelo seu artigo 14.°, dos poderes de que estão investidos os agentes da Comissão demonstram que as diligências de instrução podem ter um alcance muito amplo. A este respeito, o direito de acesso a todas as instalações, terrenos e meios de transporte tem especial importância, na medida em que deve permitir à Comissão recolher as provas das infracções às regras de concorrência nos locais onde elas se encontram normalmente, isto é, nas instalações comerciais das empresas.

24 Esse direito de acesso ficaria desprovido de utilidade se os agentes da Comissão tivessem de se limitar a pedir a apresentação de documentos ou de processos que eles estivessem em condições de identificar previamente de modo preciso. Tal direito implica, pelo contrário, a faculdade de procurar elementos de informação diversos que ainda não são conhecidos ou totalmente identificados. Sem essa faculdade, seria impossível à Comissão recolher os elementos de informação necessários à diligência de instrução caso se deparasse com uma recusa de colaboração ou ainda com uma atitude de obstrução por parte das empresas em causa.

25 Se é certo que o artigo 14.° do Regulamento n.° 17 confere deste modo à Comissão amplos poderes de investigação, o exercício desses poderes está sujeito a condições susceptíveis de garantir o respeito dos direitos das empresas em causa.

26 A este propósito cabe referir, antes de mais, a obrigação, imposta à Comissão, de indicar o objecto e finalidade da diligência. Essa obrigação constitui uma exigência fundamental não apenas para evidenciar o carácter justificado da intervenção prevista no interior das empresas em causa, mas também para que estas fiquem em condições de compreender o alcance do seu dever de colaboração, preservando ao mesmo tempo os seus direitos de defesa.

27 Há que observar em seguida que as condições de exercício dos poderes de investigação da Comissão variam em função do processo escolhido por esta, da atitude das empresas em causa e da intervenção das autoridades nacionais.

28 O artigo 14.° do Regulamento n.° 17 contempla em primeiro lugar as diligências de instrução efectuadas com a colaboração das empresas em causa, quer voluntariamente, na hipótese do mandado escrito de diligência de instrução, quer em virtude de uma obrigação decorrente de uma decisão de diligência de instrução. Nesta última hipótese, que é a do caso em apreço, os agentes da Comissão têm, entre outras, a faculdade de exigir a apresentação dos documentos que pretendem, de entrar nos locais que designaram e de que lhes seja mostrado o conteúdo dos móveis que indicarem. Em contrapartida, não podem forçar o acesso a instalações ou a móveis ou obrigar o pessoal da empresa a facultar-lhes esse acesso, nem efectuar buscas sem autorização dos responsáveis da empresa, autorização essa que, eventualmente, pode ser dada implicitamente, em particular prestando assistência aos agentes da Comissão.

29 A situação é totalmente distinta quando a Comissão encontra oposição das empresas em causa. Nesse caso, os agentes da Comissão podem, com base no n.° 6 do artigo 14.°, procurar, sem a colaboração das empresas, todos os elementos de informação necessários para as diligências de instrução, com a colaboração das autoridades nacionais, que estão obrigadas a fornecer-lhes a assistência necessária para o cumprimento da sua missão. Embora essa assistência só seja exigida quando a empresa manifeste a sua oposição, deve acrescentar-se que ela pode igualmente ser solicitada a título preventivo, a fim de ultrapassar a eventual oposição da empresa.

30 Do n.° 6 do artigo 14.° decorre que cabe a cada Estado-membro regular as condições em que é prestada a assistência das autoridades nacionais aos agentes da Comissão. A este propósito, os Estados-membros estão obrigados a assegurar a eficácia da acção da Comissão respeitando simultaneamente os princípios gerais acima enunciados. Daqui decorre que, dentro desses limites, é o direito nacional que define as modalidades processuais adequadas para garantir o respeito dos direitos das empresas.

31 Por conseguinte, quando a Comissão se propõe efectuar, com a colaboração das autoridades nacionais, diligências de instrução sem a colaboração das empresas em causa, está obrigada a respeitar as garantias processuais previstas para esse efeito pelo direito nacional.

32 A Comissão terá que velar para que a autoridade competente nos termos do direito nacional disponha de todos os elementos necessários para poder exercer a fiscalização que lhe compete. É importante sublinhar que essa autoridade - seja ela judicial ou não - não pode, nessa ocasião, substituir pela sua própria apreciação a apreciação da Comissão quanto ao carácter necessário das diligências de instrução ordenadas, já que as apreciações de facto e de direito feitas pela Comissão estão apenas sujeitas à fiscalização de legalidade do Tribunal. Em contrapartida, cabe nos poderes da autoridade nacional examinar, após ter comprovado a autenticidade da decisão de diligências de instrução, se as medidas coercivas previstas não são arbitrárias ou excessivas em relação ao objecto das diligências de instrução e velar pelo respeito das normas do direito nacional na aplicação dessas medidas.

33 A luz do que antecede, deve declarar-se que as medidas que as decisões impugnadas autorizavam os agentes da Comissão a aplicar não excediam os poderes de que dispõem nos termos do artigo 14.° do Regulamento n.° 17. De facto, o artigo 1.° das decisões impugnadas limitava-se a impor às recorrentes a obrigação de "permitir aos agentes mandatados pela Comissão o acesso às suas instalações no horário normal de trabalho e apresentar para exame e deixar copiar os documentos profissionais relativos ao objecto do inquérito solicitados pelos referidos agentes, assim como fornecer imediatamente todas as explicações que estes possam pedir".

34 É certo que, no decurso do processo no Tribunal, a Comissão sustentou que os seus agentes podem licitamente proceder, no âmbito das diligências de instrução, a buscas sem a colaboração das autoridades nacionais e sem respeitar as garantias processuais previstas pelo direito nacional. O carácter errado desta interpretação do artigo 14.° do Regulamento n.° 17 não pode, contudo, acarretar a ilegalidade das decisões adoptadas com base nessa disposição.

35 Quanto ao argumento relativo ao modo como as decisões impugnadas foram aplicadas, deve observar-se que, supondo que o comportamento dos agentes da Comissão não foi conforme com os poderes de que eles dispõem nos termos do artigo 14.° do Regulamento n.° 17 e das decisões impugnadas, isso afecta a legalidade das decisões. De facto, tal como o Tribunal decidiu no acórdão de 8 de Novembro de 1983 (IAZ, 96 a 102, 104, 105, 108 e 110/82, Recueil, p. 3369, n.° 16), actos posteriores à adopção de uma decisão não podem afectar a validade desta. Por conseguinte, não há que examinar, no âmbito do presente recurso, as acusações feitas quanto à forma como foram efectuadas as diligências de instrução.

36 O fundamento baseado na violação do direito fundamental à inviolabilidade do domicílio e ao respeito da vida privada deve, portanto, ser rejeitado.

Quanto ao fundamento baseado em violação do princípio da proporcionalidade

37 As recorrentes entendem que as decisões impugnadas violam o princípio comunitário da proporcionalidade por infringirem sem necessidade o direito fundamental, reconhecido às empresas pelo n.° 2 do artigo 18.° da Constituição espanhola, de se oporem a diligências de instrução e a buscas, salvo em caso de flagrante delito ou quando se efectuem em execução de um mandado judicial prévio. A Comissão deveria, por força do princípio comunitário da proporcionalidade, ter interpretado o artigo 14.° do Regulamento n.° 17 em conformidade com a disposição nacional citada para evitar uma perturbação grave da ordem constitucional espanhola, que é compatível, no caso em apreço, com a estrutura e objectivos da Comunidade.

38 A este propósito, deve observar-se que, ao mesmo tempo que invoca o princípio comunitário da proporcionalidade, o argumento das recorrentes redunda, na realidade, em fazer depender a validade das decisões impugnadas da interpretação do Regulamento n.° 17 em função de uma disposição do direito nacional. Ora, há que lembrar que, como o Tribunal já decidiu no acórdão de 17 de Dezembro de 1970 (Internationale Handelsgesellschaft, 11/70, Recueil, p. 1125, n.° 3) a validade dos actos comunitários só pode ser apreciada em função do direito comunitário e que, portanto, a alegação de uma violação dos direitos fundamentais, tais como estão formulados na Constituição de um Estado-membro, ou dos princípios de uma estrutura constitucional nacional não pode afectar a validade de um acto da Comunidade ou o seu efeito no território desse Estado.

39 O fundamento baseado na violação do princípio da proporcionalidade deve, portanto, ser rejeitado.

Quanto ao fundamento baseado em violação do princípio da não discriminação

40 As recorrentes invocam uma violação do princípio da não discriminação por a Comissão ter procedido às diligências de instrução impugnadas sem fiscalização judicial prévia enquanto, segundo afirmam, efectuou determinadas diligências de instrução junto de empresas estabelecidas noutros países da Comunidade somente após a referida fiscalização judicial.

41 A este propósito, basta verificar que a acusação das recorrentes se refere ao modo como as decisões em litígio foram aplicadas. Ora, tal como foi salientado acima, não há que examinar, no âmbito dos presentes recursos, as acusações feitas contra o desenrolar das diligências de instrução.

42 Por conseguinte, há que rejeitar o fundamento baseado em violação do princípio da não discriminação.

Quanto ao fundamento baseado em falta de fundamentação

43 Segundo as recorrentes, as decisões impugnadas não satisfazem as exigências de fundamentação decorrentes do artigo 190.° do Tratado e do n.° 3 do artigo 14.° do Regulamento n.° 17, por serem vagas, imprecisas e parcialmente erradas. Referem, em especial, que as referidas decisões contêm uma definição inexacta do mercado em causa, sem distinguir o mercado do PVC do do polietileno, omitem qualquer delimitação geográfica desse mercado, não caracterizam suficientemente as pretensas infracções, não contêm indicações quanto ao período durante o qual as infracções teriam sido cometidas, e que, por fim ignoram os factos não contestados de que a Dow Ibérica e a Alcudia não produzem nem comercializam o PVC e de que a EMP, ainda que accionista maioritária da Alcudia, não produz nem comercializa ela própria nenhuma das substâncias em questão.

44 Deve lembrar-se que, como o Tribunal já decidiu no acórdão citado de 26 de Junho de 1980 (National Panasonic, n.° 25), o n.° 3 do artigo 14.° do Regulamento n.° 17 define os elementos essenciais de fundamentação da decisão que ordena uma diligência de instrução, prevendo que ela "indicará o objecto e a finalidade da diligência, fixará a data em que esta se inicia e indicará as sanções previstas no n.° 1, alínea c), do artigo 15.° e no n.° 1, alínea d), do artigo 16.°, bem como a possibilidade de recurso da decisão para o Tribunal".

45 Tal como já foi referido, a exigência de que a Comissão indique o objecto e a finalidade da diligência constitui uma garantia fundamental dos direitos de defesa das empresas em causa. Daqui resulta que o alcance do dever de fundamentar as decisões que ordenam diligências de instrução não pode ser restringido em função de considerações relativas à eficácia da investigação. A este respeito, deve lembrar-se que, embora sendo certo que a Comissão não está obrigada a comunicar ao destinatário de uma decisão de uma diligência de instrução todas as informações de que dispõe quanto a presumíveis infracções nem a proceder a uma qualificação jurídica rigorosa dessas infracções, ela deve, em contrapartida, indicar claramente as presunções que pretende comprovar.

46 A luz das considerações que antecedem, as acusações das recorrentes relativamente à fundamentação das decisões impugnadas devem ser afastadas. De facto, a delimitação precisa do mercado em questão, a qualificação jurídica exacta das presumíveis infracções e a indicação do período durante o qual essas infracções teriam sido cometidas não são indispensáveis numa decisão que ordena diligências de instrução, desde que esta contenha os elementos essenciais já referidos.

47 A este propósito, há que declarar que, embora a fundamentação das decisões impugnadas esteja redigida em termos muito gerais que conviria terem sido especificados, e pode portanto ser criticada a esse respeito, ela contém os elementos essenciais exigidos pelo n.° 3 do artigo 14.° do Regulamento n.° 17. De facto, as decisões em causa mencionam, nomeadamente, informações que indicam a existência e aplicação de acordos ou práticas concertadas entre determinados produtores e fornecedores de PVC e de polietileno (incluindo mas não limitado à LdPE) na CEE, relativos aos preços, quantidades ou objectivos de venda dos referidos produtos. As decisões assinalam que esses acordos e práticas podem constituir uma infracção grave ao artigo 85.°, n.° 1, do Tratado. Segundo o artigo 1.° das decisões em questão, cada recorrente "está obrigado a sujeitar-se a uma diligência de instrução relativa à sua eventual participação" nesses acordos ou práticas concertadas e, por conseguinte, a permitir o acesso dos agentes da Comissão às suas instalações, apresentar ou deixar copiar para efeitos de inspecção documentos profissionais "relativos ao objecto do inquérito".

48 Quanto à crítica particular feita pela EMP à decisão que lhe diz respeito, basta observar que a participação desta empresa enquanto sociedade-mãe da Alcudia nos comportamentos anticoncorrenciais que são objecto da diligência de instrução, possibilidade mencionada na decisão impugnada, não pode ser afastada apenas pelo facto de a EMP não produzir nem comercializar ela própria as substâncias a que os comportamentos anticoncorrenciais dizem respeito.

49 Do que vem dito resulta que o fundamento baseado em insuficiência de fundamentação deve ser rejeitado.

Quanto ao fundamento baseado em inexistência ou indeterminação dos factos que estão na base das decisões

50 As recorrentes entendem que as decisões impugnadas violam o princípio da legalidade porque não assentam na existência de provas ou indícios susceptíveis de justificar as diligências de instrução ordenadas.

51 A este propósito, cabe salientar antes de mais que, na medida em que este fundamento se baseia no argumento de que a Comissão está obrigada a comunicar aos destinatários de uma decisão de diligências de instrução todas as informações de que dispõe a propósito de presumíveis infracções, este argumento foi já rejeitado no âmbito do exame do fundamento de falta de fundamentação.

52 Na medida em que o fundamento assenta na afirmação da inexistência de qualquer circunstância de facto susceptível de justificar as diligências de instrução ordenadas e, por conseguinte, no carácter arbitrário das decisões impugnadas, há que observar que, na falta de qualquer elemento fornecido pela recorrente em apoio desta afirmação, a acusação deve ser afastada.

53 O fundamento baseado em inexistência ou indeterminação dos factos em que se baseiam as decisões deve, portanto, ser rejeitado.

Quanto ao fundamento baseado em violação do direito fundamental à presunção de inocência

54 As recorrentes sustentam que as decisões impugnadas violam o seu direito fundamental à presunção de inocência por mencionarem "provas" da sua participação em acordos ou práticas concertadas.

55 A este propósito, basta verificar que o próprio texto da decisão evidencia que os acordos ou práticas concertadas em questão não são considerados provados, mas como "suspeitas".

56 Por conseguinte, há que rejeitar o fundamento baseado em violação do direito fundamental à presunção de inocência, sem haver necessidade de examinar se esse direito deve ser reconhecido às empresas na ordem jurídica comunitária.

Quanto ao fundamento baseado em violação de formalidades essenciais

57 Segundo as recorrentes, as decisões impugnadas estão viciadas por violação de formalidades essenciais porque, por um lado, não permitem nem precisar a identidade do órgão decisório nem saber se esse orgão estava ou não investido do poder de adoptar a decisão em causa e, por outro, não estão assinadas pelo orgão de decisão.

58 Quanto à primeira acusação, deve declarar-se que as decisões impugnadas foram adoptadas segundo o processo dito de habilitação, previsto na decisão da Comissão de 5 de Novembro de 1980, que habilita o membro da Comissão encarregado das questões de concorrência a tomar, em nome e sob a responsabilidade da Comissão, uma decisão nos termos do n.° 3 do artigo 14.° do Regulamento n.° 17, ordenando às empresas que se sujeitem a diligências de instrução. No acórdão de 23 de Setembro de 1986 (AKZO Chemie/Comissão, 5/85, Colect., p. 2585), o Tribunal já declarou que essa decisão não violava o princípio da colegialidade inscrito no artigo 17.° do Tratado de fusão. Não podia, portanto, haver qualquer dúvida quanto à identidade e poderes do orgão de decisão, a saber, a Comissão das Comunidades Europeias.

59 Quanto à segunda acusação, deve observar-se que nenhuma disposição prevê que o exemplar da decisão notificado à empresa deve ser assinado pelo membro da Comissão em quem esta delegou. Aliás, é pacífico que as decisões impugnadas estavam devidamente autenticadas com a assinatura do secretário-geral da Comissão.

60 O fundamento baseado em violação das formalidades essenciais deve, portanto, ser rejeitado.

Quanto ao fundamento baseado no facto de as decisões visarem comportamentos anteriores à adesão da Espanha à Comunidade

61 As recorrentes alegam que, embora os comportamentos anteriores à adesão da Espanha à Comunidade estejam submetidos ao "foro territorial comunitário", desde que produzam efeitos anticoncorrenciais no interior do território comunitário, não estão, todavia, sujeitos ao "foro pessoal comunitário" , isto é, não podem ser objecto de uma investigação coerciva, pois as empresas autoras desses comportamentos não relevavam da competência da Comissão. O poder de investigação desta instituição não pode ter carácter retroactivo.

62 A este propósito, deve declarar-se antes de mais que, não tendo sido prevista qualquer derrogação quanto ao Regulamento n.° 17, este acto é aplicável nos novos Estados-membros desde a adesão, por força da regra geral consagrada no artigo 2.° do Acto Relativo às Condições de Adesão do Reino de Espanha e da República Portuguesa. Por conseguinte, as empresas estabelecidas em Espanha podiam estar sujeitas a diligências de instrução a partir de 1 de Janeiro de 1986.

63 O objecto das diligências de instrução efectuadas pela Comissão após essa data junto das empresas estabelecidas nos novos Estados-membros só pode ser limitado em função do âmbito de aplicação das regras comunitárias de concorrência. Nenhuma disposição limita a este respeito a competência de investigação da Comissão apenas aos comportamentos posteriores à adesão.

64 De quanto antecede resulta que o fundamento baseado no facto de a decisão visar comportamentos anteriores à adesão da Espanha à Comunidade deve ser rejeitado.

65 De tudo o que vem dito resulta que nenhum dos fundamentos aduzidos contra as decisões impugnadas pode ser acolhido e os recursos devem ser julgados improcedentes.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

66 Nos termos do artigo 69.°, n.° 2 do Regulamento Porcessual, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o houver requerido. Tendo as recorrentes sido vencidas, devem ser condenadas solidariamente nas despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL

declara:

1) É negado provimento aos recursos.

2) As recorrentes são condenadas solidariamente nas despesas.