61986J0113

ACORDAO DO TRIBUNAL DE JUSTICA DE 4 DE FEVEREIRO DE 1988. - COMISSAO DAS COMUNIDADES EUROPEIAS CONTRA REPUBLICA ITALIANA. - COMUNICACAO DE DADOS ESTATISTICOS NO SECTOR DOS OVOS E DAS AVES DE CAPOEIRA. - PROCESSO 113/86.

Colectânea da Jurisprudência 1988 página 00607


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


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1. Acção de incumprimento - Objecto do litígio - Determinação durante o processo pré-contencioso - Tomada em consideração de factos posteriores ao parecer fundamentado - Requisitos - Factos da mesma natureza e constitutivos de comportamento idêntico aos inicialmente visados - Respeito dos direitos da defesa

(Tratado CEE, artigo 169.°)

2. Agricultura - Organização comum de mercados - Ovos - Recolha e transmissão dos dados relativos à estrutura e à actividade das unidades de incubação - Obrigações dos Estados-membros

(Regulamento n.° 2782/75 do Conselho, artigo 10.°; Regulamento n.° 1868/77 da Comissão, artigo 4.°, n.° 1 e artigo 6.°)

Sumário


1. O objecto de uma acção em aplicação do artigo 169.° do Tratado é circunscrito pelo processo administrativo pré-contencioso previsto nesta disposição bem como pelos pedidos da acção, devendo o parecer fundamentado da Comissão e a acção ter como base os mesmos fundamentos e argumentos.

No entanto, quando o incumprimento alegado consista no atraso sistemático referente à comunicação por um Estado-membro de informações que tem a obrigação de transmitir periodicamente à Comissão, os atrasos ocorridos posteriormente ao parecer fundamentado traduzem-se em factos da mesma natureza que os visados por este parecer e são constitutivos de um comportamento idêntico, de modo que o objecto do litígio os pode abarcar, em especial quando o Estado-membro em questão se tenha colocado, ao apresentar a sua defesa, no plano do procedimento de comunicação em geral, não sendo, deste modo, postos em causa os direitos da defesa.

2. Os prazos fixados para a comunicação pelos Estados-membros à Comissão dos mapas estatísticos relativos à estrutura e à actividade das unidades de incubação, previstos no artigo 10.° do Regulamento n.° 2782/75, bem como no n.° 1 do artigo 4.° e no artigo 6.° do Regulamento n.° 1868/77, têm um carácter imperativo, que não exclui, todavia, uma certa flexibilidade em presença de circunstâncias excepcionais.

As autoridades nacionais têm a obrigação de zelar, mediante um sistema de controlo adequado, para que as unidades de incubação lhes transmitam os dados em tempo útil a fim de que, por seu turno, os possam comunicar à Comissão nos prazos prescritos e, por conseguinte, não podem invocar os atrasos imputáveis às unidades de incubação para justificar a inobservância dos prazos impostos pelas disposições acima referidas.

Partes


No processo 113/86,

Comissão das Comunidades Europeias, representada pelo seu consultor jurídico, Gianluigi Campogrande, com domicílio escolhido no gabinete de Georges Kremlis, membro do seu Serviço Jurídico, edifício Jean Monnet Luxemburgo,

demandante,

contra

República Italiana, representada por Luigi Ferrari Bravo, chefe do Serviço do Contencioso Diplomático do Ministério dos Negócios Estrangeiros, na qualidade de agente, assistido por Pier Giorgio Ferri, avvocato dello Stato, com domicílio escolhido na embaixada de Itália no Luxemburgo, 5, rue Marie Adélaïde,

demandada,

que tem por objecto obter a declaração de que a República Italiana não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 10.° do Regulamento n.° 2782/75 do Conselho, de 29 de Outubro de 1975, relativo à produção e comercialização de ovos para incubação e de pintos de aves de capoeira (JO L 282, p. 100; EE 03 F9 p. 170) e dos artigos 4.°, n.° 1 e 6.° do Regulamento n.° 1868/77 da Comissão, de 29 de Julho de 1977, que estabelece as regras de aplicação daquele regulamento (JO L 209, p. 1; EE 03 F13 p. 28),

O TRIBUNAL,

constituído pelos Srs. G. Bosco, presidente de secção, f. f. de presidente, O. Due, presidente de secção, U. Everling, K. Bahlmann, R. Joliet, T. F. O' Higgins e F. Schockweiler, juízes,

advogado-geral: J. L. da Cruz Vilaça

secretário: B. Pastor, administradora

visto o relatório para audiência e após a realização desta em 16 de Junho de 1987,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 10 de Novembro de 1987,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por petição entrada na Secretaria do Tribunal em 16 de Maio de 1986, a Comissão das Comunidades Europeias intentou, nos termos do segundo parágrafo do artigo 169.° do Tratado CEE, uma acção com o fim de obter a declaração de que a República Italiana, ao não comunicar nos prazos fixados os dados estatísticos previstos

- no artigo 10.° do Regulamento n.° 2782/75 do Conselho, de 29 de Outubro de 1975, relativo à produção e comercialização de ovos para incubação e de pintos de aves de capoeira (JO L 282, p. 100)

- bem como nos artigos 4.°, n.° 1 do Regulamento n.° 1868/77 da Comissão, de 29 de Julho de 1977, que estabelece as regras de aplicação do supracitado Regulamento n.° 2782/75 (JO L 209, p. 1),

não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do mencionado regulamento.

2 A fim de facilitar a adaptação da oferta às exigências do mercado, o Regulamento n.° 2782/75 do Conselho, acima referido, prevê medidas que permitem o estabelecimento de previsões a curto e a longo prazo baseadas no conhecimento dos meios de produção utilizados. Para este efeito, o artigo 9.° deste regulamento dispõe, especialmente, que cada unidade de incubação deve comunicar mensalmente ao organismo competente do Estado-membro o número de ovos postos em incubação, o número de pintos nascidos e o número de pintos destinados a ser efectivamente utilizados. Nos termos do artigo 10.° do regulamento em questão, os Estados-membros comunicam todos os meses à Comissão a recepção e contagem dos dados referidos no artigo 9.°, num mapa recapitulativo feito com base nos dados do mês precedente.

3 O já citado Regulamento n.° 1868/77 da comissão prevê, além disso, no n.° 1 do artigo 4.°, que o recapitulativo mencionado acima será transmitido pelos Estados-membros à Comissão, em relação a cada mês do ano civil, o mais tardar quatro semanas após o mês considerado. Finalmente, o seu artigo 6.° dispõe que antes de 30 de Janeiro de cada ano, os Estados-membros enviarão à Comissão um mapa estatístico sobre a estrutura e a actividade das incubadoras.

4 Para mais ampla exposição dos factos, tramitação processual, fundamentos e argumentos das partes, remete-se para o relatório para audiência. Estes elementos apenas serão adiante retomados na medida do necessário para a fundamentação do Tribunal.

Quanto ao objecto do litígio

5 Quanto ao objecto do presente litígio, é preciso lembrar que o objecto de uma acção em aplicação do artigo 169.° do Tratado é circunscrito pelo processo administrativo pré-contencioso previsto nesta disposição bem como pelos pedidos da acção, devendo o parecer fundamentado da Comissão e a acção ter como base os mesmos fundamentos e argumentos (ver acórdão de 7 de Fevereiro de 1984, Comissão/República Italiana, 166/82, Recueil, p. 459). Depreende-se dos autos que alguns dos atrasos incriminados na petição ocorreram posteriormente ao parecer fundamentado de 24 de Abril de 1975, relativamente à comunicação dos devidos dados depois desta data.

6 Deve observar-se, não obstante, que a Comissão, na parte dispositiva do seu parecer fundamentado, acusara, de modo geral, a República Italiana de não ter cumprido as suas obrigações "ao não comunicar nos prazos previstos os dados estatísticos" referidos no artigo 10.° do Regulamento n.° 2782/75 do Conselho, bem como no n.° 1 do artigo 4.° e no artigo 6.° do Regulamento n.° 1868/77 da Comissão. Na fundamentação do referido parecer, a Comissão indicou ter recebido até à altura, após troca de cartas com o Governo italiano em 1983, unicamente os dados mensais completos de Janeiro e Fevereiro de 1983, além de alguns dados relativos aos meses de Fevereiro, Março e Abril de 1984, e que o último mapa estatístico anual devidamente preenchido por ela recebido dizia respeito ao ano de 1982.

7 No mesmo sentido, a Comissão, na sua petição, conclui pedindo que seja declarado que a República Italiana, "ao não comunicar nos prazos fixados os dados estatísticos...", não cumpriu as suas obrigações.

8 Para fundamentar este pedido, a Comissão invoca o facto de a República Italiana ainda não ter comunicado os mapas estatísticos relativos à estrutura e à actividade das unidades de incubação para os anos de 1984 e 1985, que deveriam ter sido comunicados respectivamente até 30 de Janeiro de 1985 e 30 de Janeiro de 1986. Por outro lado, os dados mensais continuaram a ser comunicados sistematicamente com um atraso de cerca de dois meses em relação ao prazo previsto no n.° 1 do artigo 4.° do Regulamento n.° 1868/77.

9 Sendo assim, a Comissão, na sua acção, não visa actos específicos, mas um incumprimento continuado do Governo italiano da sua obrigação de comunicar, em tempo útil, os dados em questão.

10 Embora seja verdade que, no momento da propositura da presente acção, os mapas estatísticos para os anos de 1984 e 1985 já tinham sido comunicados à Comissão, como ela o admite na sua réplica, o Governo italiano, no entanto, reconheceu que estes mapas estatísticos, da mesma forma que os outros dados mencionados no requerimento introdutório, só foram comunicados após a expiração dos prazos acima referidos. Além do mais, o Governo italiano não contestou a acusação que lhe tinha sido feita pela Comissão no requerimento introdutório de continuar a comunicar com atraso os dados mensais.

11 Por conseguinte, há que considerar que os atrasos continuados de comunicação ocorridos depois do parecer fundamentado se traduzem em factos da mesma natureza que os visados por este parecer e são constitutivos de um comportamento idêntico. Tal como foi julgado pelo Tribunal no acórdão de 22 de Março de 1983 (Comissão/República Francesa, 42/82, Recueil, p. 1013), o objecto do litígio, em semelhantes circunstâncias, pode abarcar os factos ocorridos posteriormente ao parecer fundamentado.

12 Os argumentos desenvolvidos em sua defesa pelo Governo italiano no decurso do processo perante o Tribunal também não se referem a comunicações determinadas, mas dizem respeito igualmente ao procedimento de comunicação em geral. Deste modo, os direitos da defesa do Governo italiano não são postos em causa pela argumentação da Comissão consistente em criticar, de maneira geral, a comunicação tardia dos dados.

13 Assim, deve ser considerado objecto do litígio, no caso sub judice, a inobservância dos prazos acima referidos pelas autoridades da República Italiana, caracterizada pelos atrasos continuados, sem que haja necessidade de verificar em separado cada comunicação intempestiva e de excluir os factos ocorridos posteriormente ao parecer fundamentado.

Quanto ao alegado incumprimento

14 Contestando a acção de incumprimento assim definida, no que respeita à obrigação de comunicar os dados e estatísticas em causa nos prazos previstos no n.° 1 do artigo 4.° e no artigo 6.° do Regulamento n.° 1868/77, o Governo italiano sustenta que estes prazos não são imperativos e rígidos, mas constituem uma simples indicação do lapso de tempo que podia ser considerado suficiente desde que as próprias unidades de incubação comunicassem a tempo os dados em questão às autoridades nacionais. Além disso, a Comissão estaria a confundir a obrigação de comunicação sem demora dos dados fornecidos pelas unidades de incubação, que é o único objecto do recurso, com a obrigação dos Estados-membros de assegurar a observância por parte das unidades de incubação dos seus próprios deveres decorrentes do regulamento, de comunicar, em tempo útil, os dados ao organismo competente.

15 Esta argumentação não pode ser admitida. Quanto à natureza coerciva dos prazos em questão, deve observar-se que o Conselho, por intermédio do artigo 17.° do Regulamento n.° 2782/75, autorizou a Comissão a estabelecer as regras de aplicação deste regulamento, e que esta fez uso desta autorização através dos artigos 4.°, n.° 1 e 6.° do seu Regulamento n.° 1868/77. Estas disposições estão redigidas de maneira clara e inequívoca. Dado que o sistema de previsões da evolução do mercado dos produtos em questão, tal como foi instituído pelo Regulamento n.° 2782/75, só pode funcionar se os dados pertinentes para toda a Comunidade forem completos e regularmente actualizados, os prazos devem ser compreendidos como possuindo um carácter imperativo.

16 Todavia, uma certa flexibilidade na aplicação dos prazos pode ser imposta por circunstâncias excepcionais. A Comissão, atendendo a tais circunstâncias, tolerou no passado, conforme declarou na audiência, que fossem excedidos os prazos prescritos, de modo ocasional e limitado. Atrasos continuados e prolongados, como os discutidos no presente processo, susceptíveis de pôr em causa o sistema de previsões da evolução do mercado, não podem, no entanto, ser justificados dessa forma.

17 É verdade que os dados em causa emanam das unidades de incubação e só podem ser comunicados à Comissão nos prazos prescritos se as unidades de incubação os comunicarem a tempo às autoridades nacionais, por força do artigo 9.° do Regulamento n.° 2782/75 do Conselho. No entanto, compete às autoridades nacionais zelar, mediante um sistema de controlo adequado, para que as unidades de incubação lhes transmitam os dados em tempo útil a fim de que, por seu turno, os possam comunicar à Comissão nos prazos prescritos. Com efeito, o artigo 16.° do mencionado regulamento, que entrou em vigor em 1 de Novembro de 1975, prevê expressamente que o controlo do cumprimento das disposições em causa deve ser efectuado pelos organismos designados por cada Estado-membro.

18 Cumpre, portanto, declarar que ao não comunicar nos prazos fixados os dados estatísticos previstos no artigo 10.° do Regulamento n.° 2782/75 do Conselho, bem como no n.° 1 do artigo 4.° e no artigo 6.° do Regulamento n.° 1868/77 da Comissão, a República Italiana não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do Tratado CEE.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

19 Nos termos do n.° 2 do artigo 69.° do Regulamento Processual, a parte vencida deve ser condenada nas despesas. Tendo a República Italiana sido vencida, há que condená-la nas despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL

decide:

1) Ao não comunicar nos prazos fixados os dados estatísticos previstos no artigo 10.° do Regulamento n.° 2782/75 do Conselho, bem como no n.° 1 do artigo 4.° e no artigo 6.° do Regulamento n.° 1868/77 da Comissão, a República Italiana não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do Tratado CEE.

2) A República Italiana é condenada nas despesas.