61986C0158

Conclusões do advogado-geral Mancini apresentadas em 26 de Janeiro de 1988. - WARNER BROTHERS INC. METRONOME VIDEO APS CONTRA ERIK VIUFF CHRISTIANSEN. - PEDIDO DE DECISAO PREJUDICIAL APRESENTADO PELO OESTRE LANDSRET DE COPENHAGA. - DIREITOS DE AUTOR - OPOSICAO AO ALUGUER DE VIDEOCASSETES. - PROCESSO 158/86.

Colectânea da Jurisprudência 1988 página 02605
Edição especial sueca página 00465
Edição especial finlandesa página 00471


Conclusões do Advogado-Geral


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Senhor Presidente,

Senhores Juízes,

1. O OEstre Landsret de Copenhaga interrogou o Tribunal sobre a compatibilidade com a ordem jurídica comunitária das normas dinamarquesas que reconhecem ao titular do direito de autor sobre um filme a faculdade de proibir o aluguer das cassettes desse filme após ter autorizado a sua venda.

O Tribunal é, assim, chamado pela segunda vez a decidir quais são os limites que, no quadro do mercado comum, podem ser postos à livre circulação de videocassettes. No primeiro litígio (processos apensos 60 e 61/84, Cinéthèque/Fédération Nationale des Cinémas Français), estava em causa a proibição feita aos produtores e aos distribuidores franceses de venderem ou alugarem as cassettes - mesmo as de origem interna - durante o período de tempo em que o filme fosse exibido nos cinemas nacionais. Como vos recordais, (acórdão de 11 de Julho de 1985, Recueil, p. 2605, n.° 22), o Tribunal considerou que "a aplicação desse regime pode provocar entraves às trocas intracomunitárias de videocassettes devido às disparidades entre

os regimes aplicáveis nos diferentes Estados-membros e entre as condições em que as obras cinematográficas aí são exibidas" (tradução provisória).

No entanto, o Tribunal considerou a proibição compatível com as regras comunitárias porque era ditada unicamente pela necessidade de proteger os interesses económicos de uma indústria, a cinematográfica, que é também um produtor de cultura muito importante. Além disso, retomando uma distinção já feita no primeiro acórdão Coditel (de 18 de Março de 1980, processo 62/79, Recueil 1980, p. 881), o Tribunal esclareceu que o filme "pertence à categoria das obras artísticas que podem ser comunicadas ao público quer directamente, como no caso da (sua) difusão... na televisão ou da sua exibição em sala, quer indirectamente sob a forma de suportes materiais como as videocassettes. No segundo caso, a comunicação ao público confunde-se com a colocação em circulação do suporte..." (tradução provisória) (n.° 9).

O problema suscitado pelo presente processo é diferente. O obstáculo colocado pela lei nacional à livre circulação das cassettes situa-se, com efeito, não no princípio mas sim no fim do processo de exibição do filme, já que, como veremos melhor a seguir, a proibição de aluguer tem por objecto os suportes de filmes já exibidos há algum tempo nos cinemas. Por conseguinte, no caso em apreço não se trata de conciliar o princípio consignado no artigo 30.° do Tratado - e, por consequência, os direitos do importador das cassettes - com a protecção de um interesse geral, como a salvaguarda da indústria cinematográfica; o Tribunal é chamado, pelo contrário, a determinar em que medida a pretensão do

importador de utilizar sem restrições a cassette que comprou no mercado comum deve ceder o passo à pretensão em contrário do titular do direito de autor, de fazer depender do seu consentimento o aluguer desse suporte.

2. É sabido que, graças aos progressos técnicos no domínio do registo e da reprodução de imagens e de sons em fita, o mercado das videocassettes conhece desde há anos um desenvolvimento contínuo. Deve igualmente dizer-se que, por razões evidentes de conveniência, o consumidor médio apenas compra cassettes em casos especiais (filmes educativos, filmes infantis, filmes pornográficos, comédias musicais, óperas, grandes clássicos do cinema), enquanto que, habitualmente, prefere alugá-las. De qualquer forma, são as empresas cinematográficas que decidem em cada caso onde e de que forma - venda ou aluguer - comercializar o filme, terminado o seu ciclo de exibição nas salas de cinema.

A luz destes dados, é natural que o proprietário de um filme e os seus representantes tenham interesse em definir a venda e o aluguer de cassettes desse filme como formas de exploração distintas e independentes, no sentido de que a primeira pode excluir o direito de utilizar a segunda. Ora, é precisamente neste terreno que surge a questão submetida ao Tribunal. Com efeito, admitindo que a preferência dos consumidores pelo aluguer resista aos progressos da técnica e atendendo ao previsível menor custo dos produtos nos próximos anos, é necessário verificar se a independência a que aludi pode ter uma repercussão sobre o princípio

comunitário do esgotamento do direito de autor. Em caso de resposta afirmativa, o titular que tenha vendido a cassette de um filme seu num Estado-membro sem renunciar ao direito sobre o aluguer poderá proibir ao importador do suporte para outro Estado-membro a exploração da obra através do aluguer.

3. Antes de expor os factos do processo, é oportuno examinar como os Estados-membros regulam o direito de autor no domínio da cinematografia, o aluguer de videocassettes, e o esgotamento do direito com ele relacionado. Na Grã-Bretanha, o Copyright Act 1956 atribui ao autor de um filme o direito de proibir a sua reprodução, exibição pública e difusão televisiva. No que diz respeito às cassettes, é sempre ao autor que compete decidir se deve primeiro proceder à venda e seguidamente ao aluguer ou vice-versa. No entanto, em caso de venda, o seu direito deve considerar-se esgotado: ou seja, ele não poderá opor-se ao aluguer ulterior da obra por terceiros nem exigir por isso qualquer compensação. No entanto, poderá proteger os seus interesses incluindo no contrato uma cláusula que obrigue o comprador a não alugar o suporte ou fixando o preço em função da possibilidade de a cassette ser alugada.

As legislações irlandesa, neerlandesa e alemã inspiram-se em princípios análogos. Na República Federal, em particular, dois acórdãos do Bundesgerichtshof (6 de Março e 15 de Março de 1986, GRUR 1986, p. 736 e 743) declararam que o titular do direito de comercializar cassettes contendo obras musicais ou cinematográficas e vendidas com o seu

consentimento não pode proibir que terceiros as aluguem. O artigo 27.° da Urheberrechtsgesetz (9 de Setembro de 1965) reconhece-lhe, no entanto, o direito a uma compensação equitativa.

Na Dinamarca e França adopta-se a regra inversa. No primeiro desses Estados, a possibilidade de alugar a terceiros cassettes que podem ser legalmente compradas no mercado está sempre dependente da autorização prévia do proprietário da obra, cujo direito, por conseguinte, não se esgota com a sua venda (ver a Lei n.° 158, de 31 de Maio de 1961, artigos 2.° e 23.°, este último modificado pela Lei n.° 274, de 6 de Junho de 1985). Em França, o artigo 26.° da lei de 3 de Julho de 1985 atribuiu directamente ao fabricante de videogramas o direito de autorizar o seu aluguer, e, segundo a doutrina, esta faculdade não está sujeita a esgotamento em caso de anterior venda do suporte.

Finalmente, no que diz respeito à Grécia, à Itália, ao Luxemburgo, a Portugal e à Espanha, o problema não foi até agora resolvido por regras específicas. Todavia, em princípio, a jurisprudência e a doutrina reconhecem ao autor um direito sobre o aluguer, por analogia com o que a lei prevê no caso dos fonogramas.

4. Em 4 de Julho de 1984, Erik Viuff Christiansen publicou num jornal diário de Copenhaga um anúncio no qual referia a possibilidade de alugar no seu estabelecimento a cassette em versão original, ou seja, sem legendas em dinamarquês, do filme "Never say never again". Os "fans" locais de James Bond exultaram porque, até esse momento, a cassette não

estava disponível no mercado nacional. Com efeito, E. Christiansen tinha-a comprado alguns dias antes em Londres, onde acabara de ser posta à venda pelo produtor do filme, a Warner Brothers Inc.

Informadas da oferta de E. Christiansen, esta sociedade e a empresa que gere na Dinamarca os direitos sobre as cassettes por ela produzidas (a Metronome Video ApS) requereram ao tribunal cível de Copenhaga que proibisse o retalhista de alugar o suporte, afirmando que não tinham concedido qualquer autorização, expressa ou tácita, para esse efeito. O pedido foi acolhido e, no decurso do posterior processo de confirmação, o Tribunal Regional do Leste (OEstre Landsret) submeteu ao Tribunal, por despacho de 11 de Junho de 1986, a seguinte questão prejudicial:

Nos termos dos artigos 30.° e 36.° do Tratado CEE, o titular do direito exclusivo sobre uma videocassette, legalmente comercializada com o seu consentimento num Estado-membro cuja ordem jurídica não permite ao vendedor proibir a revenda ou o aluguer, perde o direito de se opor ao aluguer desse suporte noutro Estado-membro, para o qual ele tenha sido legalmente importado, quando a legislação do segundo Estado sobre o direito de autor autoriza essa proibição sem distinguir entre as videocassettes de produção nacional e as videocassettes importadas, e sem criar entraves à importação de videocassettes?

5. No processo perante o Tribunal, apresentaram observações escritas as partes no processo principal, a Comissão das Comunidades Europeias

e os governos da Dinamarca, do Reino Unido e da França. Com excepção dos dois últimos, todos intervieram também na audiência.

A Comissão observa em primeiro lugar que, em grande parte da Comunidade, o consumo de videocassettes se faz em 90% através do aluguer. Por conseguinte, atribuir ao titular da obra gravada a faculdade de se opor a esta forma de exploração, mesmo após a venda do produto, equivale a entravar as trocas intracomunitárias de videogramas. Para mais, se o proprietário recusasse sistematicamente a autorização ou a fizesse depender de condições demasiado onerosas, as importações poderiam cessar por completo. Neste ponto, E. Christiansen está de acordo. Apesar de - afirma - a proibição obtida pelas sociedades autoras dizer respeito apenas ao aluguer e não à entrada da cassette na Dinamarca, é certo que, não estando os consumidores dinamarqueses interessados na compra do suporte, esta medida acaba por retirar todo o interesse à sua importação do Reino Unido. Portanto, não existem dúvidas de que há violação do artigo 30.°

Assim sendo, o retalhista afirma que, do ponto de vista comunitário, não é possível ao titular do direito de autor protegido pelas normas de um Estado-membro invocar estas últimas para impedir a importação e posterior comercialização de um produto legalmente comercializado noutro Estado-membro por ele próprio ou com o seu consentimento. Com efeito, só é possível permitir-lhe invocar essas disposições postulando um isolamento dos mercados nacionais que a jurisprudência do Tribunal considera incompatível com os objectivos do Tratado (ver acórdão de 14 de Julho de 1981, processo 187/80, Merck/Stephar BV, Recueil 1981, p. 2063, n.os 12 e 13).

Mas, continua E. Christiansen, isto não é tudo. O acórdão de 20 de Janeiro de 1981 (processos apensos 55 e 57/80, Musik-Vertrieb Membran/Gema, Recueil 1981, p. 147, n.° 25) afirma que "no quadro de um mercado comum caracterizado pela livre circulação de mercadorias... o autor, agindo directamente ou por intermédio do seu... (representante), pode escolher livremente o local, em qualquer um dos Estados-membros, onde coloca a sua obra em circulação. Pode fazer esta escolha em função do seu interesse, ou seja, tendo em conta... o nível de remuneração assegurado no

Estado-membro em questão..." (tradução provisória). Ora, no caso em apreço, é pacífico que a Warner Brothers decidiu em toda a liberdade vender a cassette de "Never say never again", e não existem dúvidas de que, ao fixar-lhe o preço, tomou em consideração os direitos relativos à sua exploração sob a forma de aluguer. Portanto, também sob este ponto de vista, permitir-lhe que se oponha a que E. Christiansen alugue na Dinamarca o suporte que comprou legalmente no Reino Unido é contrário aos artigos 30.° e 36.° do Tratado.

6. Todos os outros intervenientes defenderam a tese contrária. Limitar-me-ei aqui a expô-la referindo os argumentos apresentados pela Comissão.

Após ter admitido, como já vimos, que reconhecer ao autor o direito de proibir o aluguer pode entravar as importações, a Comissão corrige o tiro, pondo a tónica sobre os graves problemas provocados

pelo livre aluguer de cassettes. É cada vez mais frequente - observa a Comissão - que a cassette seja alugada por algumas horas apenas para gravar a obra noutro suporte; este último será depois utilizado para fins pessoais ou, pior ainda, reproduzido em outros exemplares que, por sua vez, serão vendidos ou alugados, evidentemente sem que o autor seja remunerado. Todavia, é pacífico que no caso em apreço não se verificam fenómenos desse género. E. Christiansen não é um "pirata dos audiovisuais", mas um comerciante normal que comprou licitamente o videograma de um filme de James Bond ao titular do direito e, longe de o reproduzir, pretende utilizá-lo alugando-o a terceiros.

Feita esta observação preliminar, a Comissão, seguindo a fundamentação do Tribunal no acórdão Cinéthèque, nota que a proibição feita pelo legislador dinamarquês também se aplica às cassettes produzidas no território nacional e, portanto, não visa regular os fluxos de trocas entre os Estados-membros. Todavia, essas trocas podem ser afectadas. A norma controvertida apenas será compatível com o princípio da livre circulação se: a) os obstáculos que coloca ao comércio no âmbito da Comunidade não exceder o que é estritamente necessário para atingir o objectivo prosseguido; b) esse objectivo possa justificar-se face ao Tratado. E é esse precisamente o nosso caso.

Como todos sabem, o conteúdo patrimonial do direito de autor compõe-se de dois elementos: o direito de representar a obra e o de a reproduzir. O aluguer de cassettes, constituindo uma actividade de exploração comercial de natureza repetitiva, aparenta-se mais à primeira.

Ora, o citado acórdão Coditel I prevê que, na medida em que a faculdade de controlar a exibição de um filme é um aspecto essencial do direito de autor, a ordem jurídica comunitária não pode deixar de a ter em conta.

Este princípio deve aplicar-se também à exibição através de cassettes: com efeito, o proprietário da obra cinematográfica apenas pode tirar um rendimento dessa forma de comunicação na medida em que lhe seja reconhecido o direito de alugar o suporte, da mesma forma que o filme apenas lhe proporciona uma vantagem económica porque ele está habilitado a projectá-lo. Dito de outra forma, o objectivo prosseguido pela lei dinamarquesa ao proteger o autor contra o livre aluguer das cassettes obedece à mesma lógica segundo a qual ele pode opor-se a uma exibição pública do seu filme. Em conclusão, o aluguer de cassettes configura-se como um elemento central do direito de exclusividade que pertence ao titular da obra e, por conseguinte, o facto de fazer depender da autorização deste último o seu exercício é compatível com o Tratado.

7. A tese assim resumida não pode ser acolhida. Com efeito, parece-me que os dois postulados em que assenta - o autor tem o direito exclusivo de autorizar o aluguer das cassettes e essa forma de exploração é uma manifestação do seu direito mais amplo de representar a obra - são, um deles alheio, ao problema que nos ocupa, e o outro insustentável.

Em especial, é destituída de fundamento a equiparação do aluguer à exibição pública do filme. Para melhor nos apercebermos disso, é útil

lembrar que, segundo uma boa parte dos ordenamentos jurídicos nacionais, o exercício dessa actividade se torna livre a partir do momento em que a cassette é posta à venda ou, como acontece na Alemanha, comporta no máximo a obrigação de pagar ao autor uma remuneração equitativa. Todavia, o elemento decisivo é que, mesmo nos Estados onde o autor conserva, após a venda do suporte, a faculdade de controlar qualquer outra forma de exploração da obra, o aluguer da cassette é uma operação puramente comercial: o risco inerente - ou seja, o facto de o filme ser visto várias vezes, uma só vez, ou nunca ser visto por quem levou a cassete alugada - não recai sobre o titular do direito de representação, mas sim sobre aquele que alugou a cassete.

Seguidamente, quanto ao primeiro postulado, não me parece que o Tribunal tenha sido chamado a decidir se, do ponto de vista comunitário, o autor de um filme que circula em cassette ainda tem o direito de exercer de forma exclusiva a actividade de aluguer da sua obra. O que o OEstre Landsret pergunta é se o comprador de uma cassette vendida num Estado-membro pelo proprietário do filme (ou com o seu consentimento) pode, contra a vontade deste último, alugá-la a terceiros noutro Estado; numa palavra, pretende saber se o princípio do esgotamento do direito de autor também se aplica no caso em apreço.

8. Lembro em primeiro lugar que, segundo a jurisprudência constante do Tribunal, "qualquer regulamentação comercial dos Estados-membros (susceptível) de entravar directa ou indirectamente, actual ou potencialmente, o comércio intracomunitário deve ser considerada como

medida de efeito equivalente a restrições quantitativas" (tradução provisória) (acórdão de 11 de Julho de 1974, processo 8/74, Dassonville, Recueil, p. 837, n.° 5).

Quanto ao caso que nos ocupa, disse já várias vezes que a disposição em litígio não visa a importação de cassettes, mas pode entravar a sua entrada na Dinamarca. Além disso, se é verdade que o artigo 36.° do Tratado mantém as proibições justificadas por exigências de protecção da propriedade industrial ou comercial e, portanto, do direito de autor, sabemos também que, com base no princípio de esgotamento do direito, o titular da obra ou o seu representante "não podem invocar (o seu) direito exclusivo de exploração... para impedir ou restringir a importação de suportes... licitamente colocados no mercado de outro Estado-membro (pelo próprio titular ou com o seu consentimento)" (acórdão GEMA, n.° 15) (tradução provisória).

Este último princípio é decisivo; e creio que a tese da Warner Brothers e da Metronome, segundo a qual o aluguer é uma forma de exploração económica diferente e independente da venda (ver acima, n.° 2), está em plena contradição com ele. A razão é evidente. O autor de um filme, depois de ter vendido a cassette a um terceiro, transferindo assim de forma definitiva o seu direito de propriedade sobre essa mercadoria e permitindo a sua livre circulação, não pode vir depois invocar as normas de outro Estado-membro para fazer valer o seu direito exclusivo sobre a obra gravada na cassette e impedir na prática a sua entrada nesse Estado. Com efeito, essa pretensão é motivada pelo mesmo interesse económico que esteve na base do primeiro acto de disposição sobre a obra; e, se é assim, tem de inclinar-se perante a regra do

artigo 30.°. Citarei ainda o acórdão GEMA: "o objectivo essencial do Tratado... não pode ser atingido se, (por força) dos vários regimes jurídicos... dos Estados-membros, os cidadãos tivessem a possibilidade de compartimentar os mercados e conduzir a restrições dissimuladas ao comércio entre os Estados-membros" (n.° 14). (Tradução provisória).

Pode, portanto, dizer-se de forma definitiva que a venda e o aluguer têm, é certo, natureza diferente (através da primeira, transfere-se a propriedade de um bem; através da segunda, assegura-se a sua posse durante um certo tempo), mas também a característica comum de comportarem necessariamente a comercialização do produto em favor do consumidor. Por conseguinte, a faculdade eventual de exercer de forma exclusiva o aluguer de uma cassette não poderá nunca anular o efeito - a livre circulação do bem em toda a Comunidade - provocado pela sua venda noutro Estado-membro. Sustentar o contrário significa privar os consumidores, no caso os cidadãos dinamarqueses, do que podem obter como propriedade ao abrigo do Tratado.

Tudo isto, bem entendido, não implica que, no caso do aluguer de uma cassette já legalmente vendida noutro Estado-membro, o titular do direito sobre a obra cinematográfica fique totalmente desprovido de protecção patrimonial. Falou-se, por exemplo, no direito a uma compensação ou na possibilidade que o autor tem de se proteger introduzindo cláusulas especiais no contrato de venda. Todavia, uma coisa

é certa: quaisquer que sejam as suas formas ou o seu conteúdo, a protecção concedida ao autor não poderá entravar a livre circulação das cassettes já colocadas no mercado.

Neste aspecto, o Tribunal convidou a Governo britânico a esclarecer se, no Reino Unido, o preço de compra de uma videocassette inclui uma fracção dos direitos de autor e, em caso de resposta afirmativa, qual a sua consequência sobre o aluguer do produto nos outros Estados-membros. As respostas fornecidas são vagas e contêm números que não são comparáveis. Mas - sublinha a Comissão - estes dados não poderiam ser mais rigorosos. Com efeito, a comercialização de cassettes varia consideravelmente de país para país. Na Grã-Bretanha, por exemplo, nos quatro últimos anos as vendas tiverem um forte aumento, enquanto na Dinamarca os mesmos suportes continuam a ser difundidos sobretudo através do aluguer.

Quid juris? Apenas há que repetir o que o Tribunal já declarou: que o autor pode escolher livremente e segundo parâmetros diferentes o local da Comunidade em que põe em circulação a sua obra, mas não pode servir-se de "divergências que subsistem na ausência de harmonização das normas nacionais (sobre a) exploração comercial dos direitos de autor (para) criar entraves à livre circulação de mercadorias no mercado comum" (acórdão GEMA, atrás citado, n.° 26).

9. Com base nas considerações que antecedem, sugiro ao Tribunal que responda da forma seguinte à questão que lhe foi submetida pelo OEstre

Landsret de Copenhaga, por despacho de 11 de Junho de 1986 no litígio pendente nesse órgão jurisdicional entre Warner Brothers Inc. e Metronome Video ApS e Erik Viuff Christiansen:

"Os artigos 30.° e 36.° do Tratado CEE devem ser interpretados no sentido de que é com eles incompatível a legislação de um Estado-membro nos termos da qual o titular dos direitos de autor sobre uma videocassette se pode opor a que essa mercadoria seja posta em circulação através de aluguer nesse Estado, embora ele a tenha legalmente vendido ou autorizado a sua venda noutro Estado-membro."

(*) Tradução do italiano.