RELATÓRIO PARA AUDIÊNCIA

apresentado no processo 406/85 ( *1 )

I — Factos e tramitação processual

1. Regulamentação e prática nacional

Decorre da regulamentação francesa — tanto da que estava em vigor no momento em que se verificaram os factos do caso em apreço, como da regulamentação actual — que um veículo só pode ser matriculado em França se tiver sido previamente objecto de uma homologação que permita assegurar a sua conformidade com a regulamentação em vigor.

Podem distinguir-se duas categorias de homologações que abrangem a maior parte dos casos. A homologação dita «por tipo» é aplicável aos veículos novos de série. O Serviço de Minas emite um «auto de homologação» para certificar a conformidade de um tipo de veículo de série com as normas aplicáveis. É em seguida o fabricante ou o seu representante autorizado em França que entrega ao comprador de um veículo pertencente ao modelo em causa o auto de homologação e um «certificado de conformidade» com o tipo homologado.

A homologação dita a «título isolado» é exigida em relação a qualquer veículo para o qual se solicite a matrícula pela primeira vez em França sem que se possa apresentar um certificado de conformidade com um tipo homologado. Segundo a circular n.° 74-121, de 19 de Julho de 1974, relativa às homologações a título isolado constam entre os veículos sujeitos a este procedimento «os veículos usados, sem livrete, importados, cujo tipo foi objecto de uma homologação em França». A mesma circular prevê (ponto 3.3.3): «Se bem que a conformidade desses veículos não possa ser certificada, não será efectuado qualquer ensaio técnico a priori com excepção dos que visam o estado geral e o bom funcionamento dos dispositivos relativos à segurança; todavia, poderão ser exigidos testes de ruído e de poluição e poderão ser pedidas justificações se houver dúvidas, sobre um ponto específico, quanto à conformidade do veículo com o protótipo.»

No entanto, a prática administrativa relativa à homologação a título isolado vai para além dos textos legislativos e administrativos. Em regra geral, o Serviço de Minas exige um «certificado de conformidade», emitido pelo fabricante ou por um seu representante autorizado em França, especificando a identidade do veículo em causa, a sua conformidade com um tipo homologado ou as diferenças em relação a este tipo. Numa carta de 6 de Fevereiro de 1985, o Ministério dos Transportes, através do engenheiro chefe das minas, encarregado da subdirecção da regulamentação técnica dos veículos, lembra à chambre syndicale des importateurs d'automobiles (Câmara Sindical dos Importadores de Automóveis) que estes importadores têm «que passar a qualquer pessoa que o solicitar um documento, vulgarmente chamado certificado de conformidade, e destinado a referenciar um veículo individual, unicamente identificado pelo seu número internacional com 17 caracteres ou qualquer outra identificação equivalente, em relação a um tipo homologado em França e à regulamentação técnica à qual estava conforme à sua saída de fábrica. Este documento deve ser emitido sem convocação do veículo, sem pedido de informações não justificadas, sem demora, e a um preço compatível com a regulamentação francesa e com a jurisprudência comunitária aplicável neste domínio».

2. Disposições comunitárias

A Directiva 70/156/CEE do Conselho, de 6 de Fevereiro de 1970, relativa à aproximação das legislações dos Estados-membros respeitantes à recepção dos veículos a motor e seus reboques (JO L 42 de 23.2.1970, p. 1; EE 13 Fl p. 174) prevê a possibilidade de o fabricante ou o seu mandatário obterem, num Estado-membro, para um tipo de veículo, uma «recepção CEE» que será válida em toda a Comunidade. Todavia a recepção CEE só será operacional quando todos os elementos e características nela previstos tiverem sido objecto de uma harmonização por directivas especiais, o que não é ainda o caso. Entretanto, foram já adoptadas, sendo já aplicáveis, directivas especiais para facilitar a obtenção das diferentes homologações nacionais.

3. Os factos

Em 5 de Março de 1984, o Sr. Gilliard, domiciliado em França, adquiriu a um garagista na Bélgica um veículo em segunda mão de marca Lada, matriculado na Bélgica desde 25 de Abril de 1980.

Este tipo de veículo estava aprovado na Bélgica por auto de aprovação do Ministério das Comunicações, com data de 20 de Abril de 1979. O mandatário da Lada na Bélgica tinha emitido em 26 de Fevereiro de 1980 um certificado de conformidade, atestando a conformidade da viatura em questão com o tipo aprovado.

A administração das alfândegas francesas passou, em 6 de Março de 1984, um certificado a juntar ao pedido de matrícula, segundo o qual o veículo em questão preenchia as condições exigidas pelas regulamentações aduaneiras para poder ser matriculado numa série normal.

O Sr. Gilliard dirigiu, em 7 de Março de 1984, ao Serviço de Minas, um pedido de homologação a título isolado para obter a matrícula do seu veículo. Este serviço enviou-lhe documentação para que a completasse solicitando-lhe, nomeadamente, um «certificado passado pelo fabricante francês ou pelos representantes autorizados em França, habilitados a assinar os certificados de conformidade do tipo correspondente, especificando que o veículo apresentado é conforme a um tipo homologado».

A sociedade Lada (França) informou o Sr. Gilliard por carta de 27 de Março de 1984 de que não lhe era possível certificar a conformidade de uma viatura que não tinha sido importada por sua conta, pelo facto de a mesma lhe ser totalmente desconhecida, mas que para lhe «ser útil» podia controlar a viatura a fim de verificar todos os pontos sujeitos à homologação ou a uma regulamentação francesa; que, exigindo o exame mais de dez horas de trabalho, o montante total de uma tal prestação se elevava a 1874,58 FF, não incluindo, nem o preço das peças a substituir para efectuar os controlos, nem o preço das peças necessárias para que o veículo ficasse conforme à legislação francesa.

4. O processo principal

O Sr. Gilliard pôs o seu veículo em circulação a coberto de uma placa de matrícula falsa e sem ser titular das autorizações ou documentos administrativos necessários (livrete). O Sr. Gofette tinha-lhe arranjado a placa falsa. Em 6 de Maio de 1984, a polícia autuou o Sr. Gilliard pela prática de vários delitos puníveis pelo Código da Estrada. Foi notificado para comparecer perante o tribunal de grande instance de Charleville-Mézières por estes delitos, e o Sr. Gofette foi acusado por cumplicidade.

Os arguidos não contestaram os factos, mas o Sr. Gilliard invocou em sua defesa o Tratado CEE, nomeadamente o seu artigo 30.°

O tribunal de grande instance de Charle-ville-Mézières, considerando que o arguido levanta uma questão de interpretação do direito comunitário, por decisão de 30 de Setembro de 1985 seguida de uma decisão rectificativa de 6 de Março de 1986, submeteu ao Tribunal, nos termos do artigo 177.° do Tratado CEE, a seguinte questão prejudicial:

«O artigo 30.° do Tratado CEE, em conjugação com todas as outras disposições deste Tratado, deve ser interpretado no sentido de que proíbe a instituição num Estado-membro, por via legislativa, regulamentar ou prática administrativa, para os veículos importados de um outro Estado-membro onde já foram homologados ou aprovados, de um sistema que impõe uma nova homologação, dita a “título isolado”, pela qual o veículo será sujeito a testes de laboratório a não ser que seja apresentado um certificado passado pelo fabricante ou pelos representantes autorizados no território de importação, habilitados a assinar os certificados de conformidade do tipo correspondente especificando que o veículo importado é conforme a um tipo homologado?»

A decisão de reenvio foi registada na Secretaria em 9 de Dezembro de 1985 e a decisão rectificativa em 19 de Março de 1986.

Em conformidade com o artigo 20.° do Protocolo sobre o Estatuto do Tribunal de Justiça da Comunidade Económica Europeia foram apresentadas, em 16 de Junho de 1986, observações escritas (com um rectificativo em 17 de Junho de 1986) pelo Governo da República Francesa, representado por Régis de Gouttes, agente do Governo, e Ronny Abraham, agente suplente, e, em 9 de Junho de 1986, pela Comissão das Comunidades Europeias, representada por Maurice Guerrin, seu consultor jurídico.

De acordo com o proposto pelo juiz relator, ouvido o advogado-geral, o Tribunal decidiu dar início à fase oral sem medidas de instrução prévia e remeteu, em conformidade com o n.° 1 do artigo 95.° do Regulamento Processual, o processo para a Sexta Secção.

II — Observações escritas

O Governo francês e a Comissão estão de acordo em que a obrigação para o importador de sujeitar o seu veículo, já matriculado num outro Estado-membro, a controlos efectuados no Estado de importação e tendentes a verificar a conformidade do veículo com a regulamentação deste último Estado, constitui uma medida de efeito equivalente a uma restrição quantitativa à importação, em princípio proibida pelo artigo 30.° do Tratado CEE.

O Governo francês invoca, no entanto, o artigo 36.° do Tratado CEE, nomeadamente a segurança pública, para justificar a prática administrativa francesa. As especificações técnicas previstas pelo Código da Estrada visariam assegurar a segurança da circulação rodoviária. Não existindo harmonização completa das legislações nacionais nesta matéria, os Estados-membros continuariam a ser competentes para definir os procedimentos de controlo necessários. A exigência de um certificado de conformidade como o mencionado na questão não seria uma obrigação excessiva. O Governo francês recorda, a este propósito, o Regulamento (CEE) n.° 123/85, de 12 de Dezembro de 1984, pelo qual a Comissão teria reconhecido a compatibilidade, com o n.° 3 do artigo 85.° do Tratado CEE, dos acordos de distribuição exclusiva no sector dos veículos automóveis. Para efectuar os controlos de conformidade, o Estado de importação teria a escolha entre os seus próprios serviços e a delegação dos poderes de controlo no fabricante ou no seu representante. De qualquer modo, a regulamentação francesa nunca imporia ao proprietário do veículo recorrer a testes de laboratório, pois ser-lhe-ia sempre possível obter o certificado de conformidade se as condições estivessem preenchidas.

O Governo francês sugere que seja respondido pela forma seguinte:

«A instituição num Estado-membro de um sistema que impõe, para os veículos importados de um outro Estado-membro onde eles foram já homologados ou aprovados, uma nova homologação dita “a título isolado”, por ocasião da qual o importador deverá, a menos que apresente as fichas de homologação parcial previstas na Directiva 70/156/CEE, apresentar um certificado de conformidade emitido pelo fabricante ou por um seu representante autorizado, não é contrária às disposições conjugadas dos artigos 30.° e 36.° do Tratado CEE.»

Pelo contrário, a Comissão distingue entre os problemas das especificações técnicas do veículo no momento da sua construção e o problema do estado físico do veículo no momento do pedido de matrícula. Os controlos respeitantes ao estado físico, efectuados pelo Estado de importação, serão justificados pelos imperativos da segurança pública e da protecção do ambiente se forem verdadeiramente necessários e não constituírem uma repetição dos testes já efectuados no Estado-membro de exportação e cujos resultados estariam à disposição do Estado de importação (acórdão de 17 de Dezembro de 1981, Biologische Producten, 272/80, Recueil, p. 3277).

Os controlos respeitantes às especificações técnicas do Estado de importação seriam igualmente, em princípio, na ausência de harmonização comunitária completa, sempre justificáveis por razões de protecção da segurança e do ambiente. Os artigos 30.° e 36.° do Tratado CEE exigiriam, de qualquer modo, que o Estado de importação abrisse duas possibilidades ao importador para certificar a conformidade com as normas técnicas: ou pela apresentação de um certificado tal como o mencionado na questão, ou pela apresentação de documentos passados num outro Estado-membro, na medida em que estes incluam os elementos necessários para a matrícula no Estado-membro de importação. A este propósito, a Comissão refere o acórdão do Tribunal de 20 de Maio de 1976 (De Peijper, 104/75, Recueil p. 613). A Comissão considera, além disso, que quando um Estado-membro tiver delegado nos fabricantes ou nos seus mandatários uma função de autoridade pública, ou seja a emissão dos certificados de conformidade, resulta dos artigos 30.° e 36.° do Tratado CEE que o Estado deve velar por que essas funções sejam exercidas no respeito do princípio da livre circulação das mercadorias. A este respeito, a mera expediçao de uma carta como a de 6 de Fevereiro de 1985 não seria suficiente.

A Comissão propõe a seguinte resposta:

«Os artigos 30.° e 36.° do Tratado CEE não se opõem à instituição num Estado-membro, por via legislativa, regulamentar ou prática administrativa, para os veículos importados de um outro Estado-membro onde foram já homologados ou aprovados, de um sistema impondo uma nova homologação dita “a título isolado” e que inclui para o importador a alternativa:

ou de apresentar um certificado passado pelo fabricante ou pelos seus representantes autorizados no território de importação, habilitados a assinar os certificados de conformidade do tipo correspondente, especificando que o veículo importado é conforme a um tipo homologado, devendo tal certificado ser emitido em condições de custo e de prazos razoáveis,

ou de apresentar os documentos passados no Estado-membro de exportação, na medida em que os mesmos incluam os elementos necessários para a matrícula; as autoridades do Estado-membro de importação não devem exigir testes de laboratório sempre que os mesmos testes tenham já sido efectuados no Estado de exportação e que os seus resultados estejam à disposição destas autoridades ou possam, a seu pedido, ser postos à sua disposição».

G. C. Rodríguez Iglesias

Juiz relator


( *1 ) Língua do processo: francês.


ACÓRDÃO DO TRIBUNAL (Sexta Secção)

11 de Junho de 1987 ( *1 )

No processo 406/85,

que tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal, nos termos do artigo 177.° do Tratado CEE, pelo tribunal de grande instance de Charleville-Mézières no âmbito de uma acção penal deduzida perante este órgão jurisdicional pelo

Procurador da República

contra

Daniel Gofette

e

Alfred Gilliard,

e tendente a obter uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação dos artigos 30.° e 36.° do Tratado CEE no que diz respeito às condições de matrícula de veículos importados,

O TRIBUNAL (Sexta Secção),

constituído pelos Srs. C. Kakouris, presidente de secção, T. Koopmans, O. Due, K. Bahlmann e G. C. Rodríguez Iglesias, juízes,

advogado-geral : J. L. da Cruz Vilaça

secretário: P. Heim

vistas as observações apresentadas:

pelo Governo da República Francesa, na fase escrita, por Régis de Gouttes, agente do Governo, e Ronny Abraham, agente suplente e, na fase oral, por Ronny Abraham,

pela Comissão das Comunidades Europeias, pelo seu consultor jurídico, Maurice Guerrin, assistido na fase oral por Patrick Deboyser, perito,

visto o relatório para audiência e após a realização desta em 25 de Novembro de 1986,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 17 de Março de 1987,

profere o presente

Acórdão

1

Por decisão de 30 de Setembro de 1985, entrada neste Tribunal em 9 de Dezembro, seguida de uma decisão rectificativa de 6 de Março de 1986, chegada a este Tribunal em 19 de Março, o Tribunal de grande instance de Charleville-Mézières colocou, ao abrigo do artigo 177.° do Tratado CEE, uma questão prejudicial relativa à interpretação dos artigos 30.° e 36.° do Tratado.

2

Esta questão foi suscitada no âmbito de uma acção penal relativa a infracções ao Código da Estrada. Um dos acusados foi processado por ter posto o seu veículo usado, de marca Lada, comprado na Bélgica, em circulação com uma placa de matrícula falsa e sem ser titular das autorizações ou documentos administrativos exigidos (livrete), o outro acusado, por lhe ter arranjado a placa de matrícula falsa.

3

No decurso do processo perante o órgão jurisdicional nacional, o primeiro acusado notificado, Sr. Gilliard, invocou em sua defesa que as condições que tinham sido exigidas para a matrícula do seu veículo em França eram incompatíveis com o artigo 30.° do Tratado CEE.

4

Resulta do processo que o Sr. Gilliard, tendo dirigido ao Serviço de Minas um pedido de homologação para obter a matrícula do seu veículo, recebeu deste serviço um dossier a completar solicitando-lhe, nomeadamente, um «certificado passado pelo fabricante francês ou pelos representantes autorizados em França, habilitados a assinar os certificados de conformidade do tipo correspondente, especificando que o veículo apresentado é conforme a um tipo homologado», e que, tendo-se dirigido, para este efeito, à Sociedade Lada (França) esta informou-o de que só lhe podia passar o certificado solicitado após um controlo da viatura, ele-vando-se o montante dessa prestação a 1874,58 FF, não incluindo, nem o preço das peças a substituir para efectuar os controlos, nem o preço das peças necessárias para que o veículo ficasse conforme à legislação francesa.

5

O tribunal de grande instance de Charleville-Mézières, considerando necessária uma interpretação do Tratado com vista a dispor de todos os elementos úteis de apreciação, suspendeu a instância e solicitou ao Tribunal que se pronunciasse a título prejudicial sobre a seguinte questão:

«O artigo 30.° do Tratado CEE em conjugação com todas as outras disposições deste Tratado, deve ser interpretado no sentido de que proíbe a instituição num Estado-membro, por via legislativa, regulamentar ou prática administrativa, para os veículos importados de um outro Estado-membro onde já foram homologados ou aprovados, de um sistema que impõe uma nova homologação, dita “a título isolado”, pela qual o veículo será sujeito a testes de laboratório a não ser que seja apresentado um certificado passado pelo fabricante ou pelos representantes autorizados no território de importação, habilitados a assinar os certificados de conformidade do tipo correspondente especificando que o veículo importado é conforme a um tipo homologado?»

6

Para mais ampla exposição dos factos do processo principal, da regulamentação e da prática francesas, bem como das observações escritas apresentadas ao Tribunal, remete-se para o relatório para audiência. Estes elementos do processo só serão a seguir retomados na medida necessária à fundamentação da decisão do Tribunal.

7

Convém sublinhar, em primeiro lugar, que se é um facto que toda e qualquer medida de controlo imposta como condição prévia à matrícula de um veículo importado de um outro Estado-membro é susceptível de entravar as importações sendo, portanto, em princípio, incompatível com o artigo 30.° do Tratado, tais medidas podem ser justificadas com base no artigo 36.° na medida em que se revelem necessárias para garantir a segurança rodoviária.

8

No que respeita mais especialmente ao tipo de controlo visado pela questão do órgão jurisdicional nacional, convém verificar que a Directiva 70/156 do Conselho, de 6 de Fevereiro de 1970, relativa à aproximação das legislações dos Estados-membros respeitantes à recepção dos veículos a motor e seus reboques (JO L 42, p. 1; EE 13 F1 p. 174), não estabeleceu uma harmonização suficiente para que um processo de homologação comunitário para cada tipo de veículo possa excluir totalmente os processos nacionais de homologação.

9

Consequentemente, a existência de um processo de controlo que tem por objectivo verificar a conformidade dos veículos importados com um tipo homologado não é, em si mesma, incompatível com o Tratado.

10

Todavia, para que um tal processo nacional de controlo seja justificado face às exigências do artigo 36.° do Tratado, é necessário que o objectivo visado não possa ser atingido de modo igualmente eficaz por medidas menos restritivas do comércio intracomunitário (acórdão de 20 de Maio de 1976, De Peijper 104/75, Recueil, p. 613; acórdão de 12 de Junho de 1986, Schloh, 50/85, Colect., p. 1855). Este processo não deve ocasionar despesas ou prazos não razoáveis. Sempre que um particular, como o fabricante ou os seus representantes, tiver que efectuar os controlos necessários por delegação das autoridades públicas, cabe a estas assegurar que são plenamente respeitadas todas as condições anteriormente enunciadas.

11

Além disso, como o Tribunal já o declarou a propósito de ma questão comparável, as autoridades dos Estados-membros não podem exigir operações de controlo que já tenham sido efectuadas num outro Estado-membro e cujos resultados estejam ou possam ser postos à sua disposição a seu pedido (acórdão de 17 de Dezembro de 1981, Biologische Producten, 272/80, Recueil, p. 3277). O Estado-membro de importação deve pois admitir a possibilidade para o importador de substituir as operações de controlo para a homologação do veículo pela apresentação de documentos passados no Estado-membro de exportação na medida em que estes documentos contenham as informações necessárias.

12

E conveniente responder à questão colocada pelo órgão jurisdicional nacional que os artigos 30.° e 36.° do Tratado CEE devem ser interpretados no sentido de que, no estádio actual da evolução do direito comunitário, a instituição num Estado-membro de um sistema de homologação para os veículos importados de um outro Estado-membro onde já foram homologados ou aprovados só é compatível com o Tratado :

a)

se o processo de controlo não ocasionar despesas ou prazos não razoáveis e se as autoridades públicas assegurarem que estas condições são plenamente respeitadas quando o fabricante ou os seus representantes são encarregados de efectuar os controlos necessários,

b)

se o importador puder substituir as operações de controlo pela apresentação de documentos passados no Estado-membro de exportação na medida em que esses documentos contenham as informações necessárias com base nos controlos já efectuados.

Quanto às despesas

13

As despesas efectuadas pelo Governo francês e pela Comissão das Comunidades Europeias, que apresentaram observações ao Tribunal, não podem ser objecto de reembolso. Revestindo o processo, em relação às partes no processo principal, a natureza de um incidente deduzido perante o órgão jurisdicional nacional, cabe a este decidir quanto às despesas.

 

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL (Sexta Secção),

pronunciando-se sobre a questão que lhe foi submetida pelo tribunal de grande instance de Charleville-Mézières, por decisão de 30 de Setembro de 1985 e por decisão rectificativa de 6 de Março de 1986, declara:

Os artigos 30.° e 36.° do Tratado CEE devem ser interpretados no sentido de que, no estádio actual da evolução do direito comunitário, a instituição num Estado-membro de um sistema de homologação para os veículos importados de um outro Estado-membro onde já foram homologados ou aprovados só é compatível com o Tratado:

 

a)

se o processo de controlo não ocasionar despesas ou prazos não razoáveis e se as autoridades públicas assegurarem que estas condições são plenamente respeitadas quando o fabricante ou os seus representantes são encarregados de efectuar os controlos necessários,

 

b)

se o importador puder substituir as operações de controlo pela apresentação de documentos passados no Estado-membro de exportação na medida em que esses documentos contenham as informações necessárias com base nos controlos já efectuados.

 

Kakouris

Koopmans

Due

Bahlmann

Rodríguez Iglesias

Proferido em audiencia pública no Luxemburgo, a 11 de Junho de 1987.

O secretário

P. Heim

O presidente da Sexta Secção

C. Kakouris


( *1 ) Língua do processo: francês.