ACORDAO DO TRIBUNAL (QUINTA SECCAO) DE 31 DE MARCO DE 1993. - A. AHLSTROEM OSAKEYHTIOE E OUTROS CONTRA COMISSAO DAS COMUNIDADES EUROPEIAS. - PRATICAS CONCERTADAS ENTRE EMPRESAS ESTABELECIDAS EM PAISES TERCEIROS RELATIVAS AOS PRECOS DE VENDA A COMPRADORES ESTABELECIDOS NA COMUNIDADE. - PROCESSOS APENSOS C-89/85, C-104/85, C-114/85, C-116/85, C-117/85 E C-125/85 A C-129/85.
Colectânea da Jurisprudência 1993 página I-01307
Edição especial sueca página I-00111
Edição especial finlandesa página I-00123
Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória
++++
1. Concorrência ° Procedimento administrativo ° Comunicação das acusações ° Conteúdo necessário
(Regulamento n. 17 do Conselho, artigo 19. , n. 1; Regulamento n. 99/63 da Comissão, artigo 4. )
2. Concorrência ° Acordos entre empresas ° Prática concertada ° Conceito ° Coordenação e cooperação incompatíveis com a obrigação para cada empresa de determinar de maneira autónoma o seu comportamento no mercado
(Tratado CEE, artigo 85. , n. 1)
3. Concorrência ° Acordos entre empresas ° Prática concertada ° Paralelismo de comportamento ° Presunção de existência de uma concertação ° Limites
(Tratado CEE, artigo 85. , n. 1)
4. Concorrência ° Procedimento administrativo ° Respeito dos direitos da defesa ° Direito para as partes implicadas de manifestarem o seu ponto de vista sobre as acusações feitas e sobre os documentos em que se apoiam antes da tomada da decisão
5. Concorrência ° Acordos entre empresas ° Afectação do comércio entre Estados-membros ° Acordo que fixa o preço de um produto semiacabado
(Tratado CEE, artigo 85. , n. 1)
6. Concorrência ° Acordos entre empresas ° Afectação do comércio entre Estados-membros ° Critérios
(Tratado CEE, artigo 85. , n. 1)
7. Concorrência ° Acordos entre empresas ° Afectação da concorrência ° Critérios de apreciação ° Objecto anticoncorrencial ° Determinação suficiente
(Tratado CEE, artigo 85. , n. 1)
8. Concorrência ° Acordos entre empresas ° Afectação do comércio entre Estados-membros ° Proibição de revenda e de exportação
(Tratado CEE, artigo 85. , n. 1)
9. Recurso de anulação ° Actos susceptíveis de recurso ° Compromisso subscrito por empresas perante a Comissão no âmbito de um processo de aplicação das regras de concorrência ° Equiparação a uma injunção de cessação de infracção ° Admissibilidade
(Tratado CEE, artigo 173. , Regulamento n. 17 do Conselho, artigo 3. )
10. Concorrência ° Multas ° Apreciação em função do comportamento individual da empresa ° Relevância da não aplicação de sanção a um outro operador económico ° Inexistência
(Regulamento n. 17 do Conselho, artigo 15. )
1. A comunicação das acusações, que tem por função fornecer às empresas acusadas de violação das regras de concorrência todos os elementos necessários para que possam apresentar de forma útil a sua defesa antes de a Comissão adoptar uma decisão definitiva, deve ser formulada em termos suficientemente claros, ainda que sumários, para permitir aos interessados tomar efectivamente conhecimento dos comportamentos que lhe são imputados pela Comissão.
Não corresponde a esta exigência a comunicação das acusações que, contrariamente à decisão final da Comissão, não apresenta de forma distinta duas infracções, apresentando cada uma características próprias no que respeita a elementos tão essenciais como os participantes na concertação ou o período da infracção.
2. A prática concertada visa uma forma de coordenação entre empresas que, sem ter sido levada até à realização de um acordo propriamente dito, substitui cientemente os riscos da concorrência por uma cooperação prática entre elas. Os critérios de coordenação e de cooperação permitindo definir esta noção devem ser compreendidos à luz da concepção inerente às disposições do Tratado relativas à concorrência e segundo a qual qualquer operador económico deve determinar de maneira autónoma a política que entende seguir no mercado comum.
Não correspondem a esses critérios os anúncios de preços que são feitos por produtores aos utilizadores e que, em si mesmos, constituem um comportamento no mercado que não é de molde a reduzir as incertezas de cada empresa sobre as atitudes que adoptarão os seus concorrentes, porque, no momento em que uma empresa os efectua, não tem nenhuma garantia quanto ao comportamento que será seguido pelas outras.
3. Um paralelismo de comportamento só pode ser considerado como fornecendo a prova de uma concertação se a concertação constitui a única explicação plausível para ele. É necessário ter presente no espírito que, embora o artigo 85. do Tratado proíba todas as formas de conluio que sejam de molde a falsear a concorrência, não priva os operadores económicos do direito de eles próprios se adaptarem de maneira inteligente ao comportamento verificado ou previsto dos seus concorrentes.
4. O respeito dos direitos da defesa no processo de aplicação das regras de concorrência exige que as empresas tenham podido, antes de a Comissão adoptar a sua decisão, apresentar o seu ponto de vista sobre as acusações formuladas contra elas, bem como sobre os documentos em que as mesmas se fundamentam.
Este respeito não foi assegurado quando, para concluir pela existência da infracção na sua decisão final, a Comissão teve de se basear em documentos recolhidos posteriormente à comunicação das acusações e sobre os quais as empresas em causa não tiveram ocasião de se pronunciar.
5. Qualquer acordo que tem por objecto ou por efeito restringir a concorrência através da fixação dos preços de um produto semiacabado é susceptível de afectar o comércio intracomunitário, mesmo se o produto semiacabado não é objecto, em si mesmo, de um comércio entre Estados-membros, quando esse produto constitui a matéria-prima de outro produto comercializado algures na Comunidade.
6. Um acordo, para ser susceptível de afectar o comércio entre os Estados-membros, deve, com base num conjunto de elementos objectivos de direito e de facto, permitir considerar, com um grau de probabilidade suficiente, que poderá exercer uma influência directa ou indirecta, efectiva ou potencial, sobre as correntes de trocas comerciais entre Estados-membros, num sentido que possa prejudicar a realização dos objectivos de um mercado único entre Estados.
7. O facto de uma cláusula de um acordo entre empresas, que tem por objecto restringir a concorrência, não ter sido posta em execução pelos contratantes, não basta para a subtrair à proibição do artigo 85. , n. 1, do Tratado.
8. Pela sua natureza, uma cláusula de um acordo entre empresas, que tem por objecto proibir a um comprador revender ou exportar a mercadoria adquirida, é susceptível de compartimentar os mercados e, portanto, de afectar o comércio entre Estados-membros.
9. Um compromisso subscrito por empresas perante a Comissão no âmbito de um processo de aplicação das regras de concorrência deve ser considerado como um acto susceptível de recurso de anulação nos termos do artigo 173. do Tratado. Com efeito, as obrigações criadas por esse compromisso devem ser equiparadas a injunções de cessação de infracções, previstas pelo artigo 3. do Regulamento n. 17, que habilita a Comissão a tomar todas as medidas, tanto positivas como negativas, que se revelem necessárias para pôr fim à infracção verificada. Ao assumir este compromisso, as empresas limitam-se, por razões que lhes são próprias, a dar a sua anuência a uma decisão que a Comissão tinha competência para tomar unilateralmente.
10. Quando uma empresa, com o seu comportamento, violou o artigo 85. , n. 1, do Tratado, não pode escapar à sanção aplicável, com o fundamento de que a outro operador económico não foi aplicada qualquer multa, quando o Tribunal de Justiça nem sequer foi chamado a pronunciar-se sobre a situação de este último.
Nos processos apensos "pasta de papel",
C-89/85,
1) A. Ahlstroem Osakeyhtioe, Helsínquia,
2) United Paper Mills Ltd, Valkeakoski, que sucedeu nos direitos da Joutseno-Pulp Osakeyhtioe, Joutseno,
3) Kaukas Oy, Lappeenranta, que sucedeu nos direitos da Oy Kaukas AB, Lappeenranta,
4) Oy Metsae-Botnia AB, Espoo, que sucedeu nos direitos da Kemi Oy, Kemi,
5) Oy Metsae-Botnia AB, Espoo,
6) Metsae-Serla Oy, Helsínquia, que sucedeu nos direitos da Metsaeliiton Teollisuus Oy, Espoo,
7) Veitsiluoto Oy, Kemi, que sucedeu nos direitos da Oulu Oy, Oulu,
8) Wisaforest Oy AB, Pietarsaari, que sucedeu nos direitos da Oy Wilh. Schauman AB, Helsínquia,
9) Sunilà Osakeyhtioe, Sunila,
10) Veitsiluoto Oy, Kemi,
11) Finncell, Helsínquia,
12) Enso-Gutzeit Oy, Helsínquia,
todas empresas de direito finlandês, representadas por A. von Winterfeld, advogado no foro de Colónia, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório do advogado E. Arendt, 8-10, rue Mathias Hardt,
recorrentes,
contra
Comissão das Comunidades Europeias, representada por A. McClellan e G. zur Hausen, consultores jurídicos, e P. J. Kuyper, membro do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes, assistidos por S. Boese, do Belmont European Community Law Office em Bruxelas, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de Roberto Hayder, representante do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,
recorrida,
C-104/85,
Bowater Incorporated, Darien, Connecticut, EUA, representada por D. Vaughan, QC, e D. F. Hall, solicitor, da sociedade Linklaters & Paines, de Londres, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório dos advogados Elvinger & Hoss, 15, Côte d' Eich,
recorrente,
contra
Comissão das Comunidades Europeias, representada por A. McClellan, consultor jurídico, B. Clarke-Smith e P. J. Kuyper, membros do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes, e por N. Forwood, QC, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de Roberto Hayder, representante do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,
recorrida,
C-114/85,
The Pulp, Paper and Paperboard Export Association, Bethlehem, Pensilvânia, EUA, que agrupa as empresas americanas
1) The Chesapeake Corporation, West Point, Virgínia,
2) Crown Zellerbach Corporation, São Francisco, Califórnia,
3) Federal Paperboard Company Inc., Montvale, Nova Jérsia,
4) Georgia-Pacific Corporation, Atlanta, Geórgia,
5) Scott Paper Company, Delaware County, Pensilvânia,
6) Weyerhaeuser Co., Tacoma, Washington,
representadas por M. Waelbroeck e A. Vandencasteele, advogados no foro de Bruxelas, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório do advogado E. Arendt, 8-10, rue Mathias Hardt,
recorrentes,
contra
Comissão das Comunidades Europeias, representada por A. McClellan, consultor jurídico, B. Clarke-Smith e P. J. Kuyper, membros do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes, e por N. Forwood, QC, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de Roberto Hayder, representante do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,
recorrida,
apoiada por
Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, representado por Timothy Pratt, Principal Assistant Treasury Solicitor, e por Lucinda Hudson, do Treasury Solicitor' s Department, na qualidade de agentes, assistidos pela professora Rosalyn Higgins, QC, com domicílio escolhido no Luxemburgo na Embaixada do Reino Unido, 14, boulevard Roosevelt,
interveniente,
C-116/85,
St Anne-Nackawic Pulp and Paper Company Ltd, Nackawic, NB Canadá, representada por D. Voillemot, advogado no foro de Paris, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório do advogado J. Loesch, 8, rue Zithe,
recorrente,
contra
Comissão das Comunidades Europeias, representada por A. McClellan, consultor jurídico, B. Clarke-Smith e P. J. Kuyper, membros do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes, e por N. Forwood, QC, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de Roberto Hayder, representante do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,
recorrida,
C-117/85,
International Pulp Sales Company, Nova Iorque, representada por I. Van Bael e J. F. Bellis, advogados no foro de Bruxelas, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório dos advogados Elvinger & Hoss, 15, Côte d' Eich,
recorrente,
contra
Comissão das Comunidades Europeias, representada por A. McClellan, consultor jurídico, B. Clarke-Smith e P. J. Kuyper, membros do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes, e por N. Forwood, QC, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de Roberto Hayder, representante do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,
recorrida,
C-125/85,
Westar Timber Ltd, Canadá, representada por C. Stanbrook, QC, e M. Siragusa, advogado no foro de Roma, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório dos advogados Elvinger & Hoss, 15, Côte d' Eich,
recorrente,
contra
Comissão das Comunidades Europeias, representada por A. McClellan, consultor jurídico, K. Banks e P. J. Kuyper, membros do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes, e por N. Forwood, QC, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de Roberto Hayder, representante do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,
recorrida,
apoiada por
Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, representado por Timothy Pratt, Principal Assistant Treasury Solicitor, e por Lucinda Hudson, do Treasury Solicitor' s Department, na qualidade de agentes, assistidos pela professora Rosalyn Higgins, QC, com domicílio escolhido no Luxemburgo na Embaixada do Reino Unido, 14, boulevard Roosevelt,
interveniente,
C-126/85,
Weldwood of Canada Ltd, Canadá, representada por Christopher Prout e Alice Robinson, barristers, e J. M. Cochran da sociedade Wilkie Farr e Gallagher, de Paris, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório dos advogados Elvinger & Hoss, 15, Côte d' Eich,
recorrente,
contra
Comissão das Comunidades Europeias, representada por A. McClellan, consultor jurídico, K. Banks e P. J. Kuyper, membros do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes, e por N. Forwood, QC, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de Roberto Hayder, representante do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,
recorrida,
apoiada por
Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, representado por Timothy Pratt, Principal Assistant Treasury Solicitor, e por Lucinda Hudson, do Treasury Solicitor' s Department, na qualidade de agentes, assistidos pela professora Rosalyn Higgins, QC, com domicílio escolhido no Luxemburgo na Embaixada do Reino Unido, 14, boulevard Roosevelt,
interveniente,
C-127/85,
MacMillan Bloedel Ltd, Canadá, representada por C. Stanbrook, QC, P. Sambuc e Dr. D. Schroeder, Rechtsanwaelte no foro de Colónia, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório dos advogados Elvinger & Hoss, 15, Côte d' Eich,
recorrente,
contra
Comissão das Comunidades Europeias, representada por A. McClellan, consultor jurídico, K. Banks e P. J. Kuyper, membros do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes, e por N. Forwood, QC, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de Roberto Hayder, representante do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,
recorrida,
apoiada por
Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, representado por Timothy Pratt, Principal Assistant Treasury Solicitor, e por Lucinda Hudson, do Treasury Solicitor' s Department, na qualidade de agentes, assistidos pela professora Rosalyn Higgins, QC, com domicílio escolhido no Luxemburgo na Embaixada do Reino Unido, 14, boulevard Roosevelt,
interveniente,
C-128/85,
Canadian Forest Products Ltd, Canadá, representada por C. Stanbrook, QC, e M. Siragusa, advogado no foro de Roma, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório dos advogados Elvinger & Hoss, 15, Côte d' Eich,
recorrente,
contra
Comissão das Comunidades Europeias, representada por A. McClellan, consultor jurídico, K. Banks e P. J. Kuyper, membros do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes, e por N. Forwood, QC, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de Roberto Hayder, representante do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,
recorrida,
apoiada por
Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, representado por Timothy Pratt, Principal Assistant Treasury Solicitor, e por Lucinda Hudson, do Treasury Solicitor' s Department, na qualidade de agentes, assistidos pela professora Rosalyn Higgins, QC, com domicílio escolhido no Luxemburgo na Embaixada do Reino Unido, 14, boulevard Roosevelt,
interveniente,
C-129/85,
Fletcher Challenge Canada Ltd, Canadá, representada por C. Stanbrook, QC, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório dos advogados Elvinger & Hoss, 15, Côte d' Eich,
recorrente,
contra
Comissão das Comunidades Europeias, representada por A. McClellan, consultor jurídico, K. Banks e P. J. Kuyper, membros do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes, e por N. Forwood, QC, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de Roberto Hayder, representante do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,
recorrida,
apoiada por
Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, representado por Timothy Pratt, Principal Assistant Treasury Solicitor, e por Lucinda Hudson, do Treasury Solicitor' s Department, na qualidade de agentes, assistidos pela professora Rosalyn Higgins, QC, com domicílio escolhido no Luxemburgo na Embaixada do Reino Unido, 14, boulevard Roosevelt,
interveniente,
que têm por objecto a anulação da decisão da Comissão de 19 de Dezembro de 1984 relativa a um processo de aplicação do artigo 85. do Tratado CEE (IV/29.725 ° Pasta de papel) (JO 1985, L 85, p. 1),
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção),
composto por: G. C. Rodríguez Iglesias, presidente de secção, M. Zuleeg, R. Joliet, J. C. Moitinho de Almeida e F. Grévisse, juízes,
advogado-geral: M. Darmon
secretário: H. A. Ruehl, administrador principal
visto o relatório para audiência e após a audiência de 12 e 13 de Novembro de 1991,
ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 7 de Julho de 1992,
profere o presente
Acórdão
I ° Introdução
1 Através de diferentes petições que deram entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça entre 4 e 30 de Abril de 1985, as empresas finlandesas A. Ahlstroem Osakeyhtioe, United Paper Mills Ltd, sucessora de Joutseno-Pulp Osakeyhtioe, Kaukas Oy, sucessora de Oy Kaukas AB, Oy Metsae-Botnia AB, sucessora de Kemi Oy, Oy Metsae-Botnia AB, Metsae-Serla Oy, sucessora de Metsaeliiton Teollisuus Oy, Veitsiluoto Oy, sucessora de Oulu Oy, Wisaforest Oy AB, sucessora de Oy Wilh. Schauman AB, Sunilà Osakeyhtioe, Veitsiluoto Oy, Finncell e Enso-Gutzeit Oy (a seguir "recorrentes finlandesas"), o produtor americano Bowater Incorporated (a seguir "Bowater"), as empresas americanas The Chesapeake Corporation, Crown Zellerbach Corporation, Federal Paperboard Company Inc., Georgia-Pacific Corporation, Scott Paper Company e Weyerhaeuser Company (a seguir "membros da KEA"), a empresa canadiana St Anne-Nackawic Pulp and Paper Company Ltd (a seguir "St Anne"), a empresa americana International Pulp Sales Company (a seguir "IPS"), a empresa canadiana Westar Timber Ltd (a seguir "Westar"), a empresa canadiana Welwood of Canada Ltd (a seguir "Welwood"), a empresa canadiana MacMillan Bloedel Ltd (a seguir "MacMillan"), a empresa canadiana Canadian Forest Products Ltd (a seguir "Canfor") e a empresa British Columbia Forest Products Ltd, actualmente Fletcher Challenge Canada Limited (a seguir "British Columbia"), pediram, ao abrigo do artigo 173. , segundo parágrafo, do Tratado CEE, a anulação da Decisão 85/202/CEE da Comissão, de 19 de Dezembro de 1984, relativa a um processo de aplicação do artigo 85. do Tratado CEE (JO 1985, L 85, p. 1).
2 Por despacho de 16 de Dezembro de 1987, o Tribunal de Justiça decidiu apensar estes dez processos para efeitos de tramitação processual e do acórdão.
3 Na decisão impugnada (a seguir "decisão"), a Comissão deu como provado que 40 produtores de pasta de papel, bem como três das suas associações profissionais, tinham infringido o disposto no artigo 85. , n. 1, do Tratado, ao concertarem-se sobre os seus preços. Foram aplicadas multas a 36 dos 43 destinatários da decisão, cujos montantes variam entre 50 000 ecus e 500 000 ecus.
A ° O produto
4 O produto que deu origem à pretensa concertação é a pasta de papel branqueada a sulfato, obtida através de um tratamento químico da celulose e utilizada no fabrico de produtos de papel de alta qualidade.
5 A pasta de papel branqueada a sulfato é fabricada a partir de madeira proveniente de dois tipos de árvores: as resinosas e as folhosas. Como as fibras das resinosas são mais compridas e mais sólidas, a pasta daí resultante é de melhor qualidade. Dentro dessas duas categorias, as pastas subdividem-se ainda em dois subgrupos: as pastas produzidas a partir de madeiras originárias dos países do Norte, de crescimento relativamente lento, e as pastas produzidas a partir de madeiras originárias dos países do Sul. Esta classificação determinou quatro níveis de preços, correspondentes, por ordem decrescente, à pasta proveniente de madeira de resinosas do Norte, de resinosas do Sul, de folhosas do Norte e de folhosas do Sul.
6 O papel é fabricado a partir de uma mistura de pastas cuja composição é determinada em função das qualidades e das características que o fabricante pretende conferir ao papel, bem como das potencialidades do seu equipamento. Dentro de uma categoria de produtos, as pastas são, a maior parte das vezes, perfeitamente substituíveis, mas, uma vez determinada a mistura, o fabricante tem relutância em alterá-la, com receio de ter de proceder a adaptações do seu equipamento e a experiências demoradas e dispendiosas.
7 Para o fabricante, o preço da pasta representa 50% a 75 % do custo do papel.
B ° Os produtores
8 Na altura dos factos, havia mais de 50 empresas que vendiam pasta na Comunidade. A maior parte delas tinham os seus estabelecimentos no Canadá, nos Estados Unidos, na Suécia e na Finlândia. As suas vendas efectuavam-se por intermédio de filiais, de agentes e de sucursais estabelecidos na Comunidade. Frequentemente, o mesmo agente trabalhava para vários produtores.
9 Todas as recorrentes finlandesas eram membros da Finncell, excepto a Enso-Gutzeit, que a abandonou em 31 de Dezembro de 1979. O objectivo da Finncell, fundada em 1918, é vender, tanto no mercado interno como no estrangeiro, em seu próprio nome e por conta própria, a pasta fabricada pelos seus membros. Para este efeito, fixa os preços e reparte pelos seus membros as encomendas que recebe.
10 As recorrentes americanas, com excepção de Bowater, eram membros da Pulp, Paper and Paperboard Export Association of the United States, antigamente denominada Kraft Export Association (a seguir "KEA"). A KEA foi constituída ao abrigo do Webb Pomerene Act, de 10 de Abril de 1918, nos termos do qual as empresas americanas podem, sem violar o direito da concorrência dos Estados Unidos, criar associações para a promoção conjunta das suas exportações. Esta lei permite, inter alia, que os produtores troquem informações sobre a comercialização dos seus produtos no estrangeiro e estabeleçam acordos sobre os preços de exportação. O produtor IPS deixou a KEA em 13 de Março de 1979.
11 A maioria dos produtores de pasta fabricam papel ou fazem parte de grupos que o fabricam e, sendo assim, transformam eles próprios uma parte substancial da pasta que produzem. No entanto, a decisão controvertida diz exclusivamente respeito à pasta comercializável, isto é, à pasta que é oferecida para venda no mercado europeu pelos produtores supracitados.
C ° Os clientes e as práticas comerciais
12 Durante o período em questão, um produtor tinha, em geral, cerca de 50 clientes na Comunidade, com excepção da Finncell, que tinha 290.
13 Os produtores de pasta de papel tinham por hábito concluir com os respectivos clientes contratos de fornecimento a longo prazo, cuja duração podia atingir cinco anos. Nos termos desses contratos, o produtor garantia aos seus clientes a possibilidade de comprar em cada trimestre uma quantidade mínima de pasta a um preço que não excedia o que tinha sido anunciado no princípio do trimestre. O cliente, por sua vez, tinha a liberdade de comprar mais ou menos do que a quantidade que lhe tinha sido reservada e podia negociar reduções de preços relativamente ao preço anunciado.
14 Os "anúncios trimestrais" constituíam uma prática comercial bem enraizada no mercado europeu da pasta de papel. Nos termos desse sistema, os produtores, algumas semanas ou, às vezes, alguns dias antes do início de cada trimestre, comunicavam aos seus clientes e agentes os preços, geralmente fixados em dólares, que pretendiam obter durante o trimestre em causa para cada tipo de pasta de papel. Os preços variavam conforme a pasta se destinasse aos portos da Europa do noroeste (zona 1) ou aos portos mediterrânicos (zona 2). Os preços eram, em geral, publicados na imprensa especializada.
15 Os preços definitivos facturados aos clientes (a seguir "preços de transacção") podiam ser idênticos aos anunciados, ou inferiores, quando certos descontos ou facilidades de pagamento, sob diversas formas, eram concedidos aos compradores.
D ° O procedimento administrativo
16 Em 1977, após diligências efectuadas ao abrigo do artigo 14. do Regulamento n. 17 do Conselho, de 6 de Fevereiro de 1962, Primeiro Regulamento de execução dos artigos 85. e 86. do Tratado (JO 1962, 13, p. 204; EE 08 F1 p. 22, a seguir "Regulamento n. 17"), a Comissão afirmou ter descoberto na indústria da pasta de papel a existência de um certo número de acordos e práticas restritivas que não haviam sido notificados nos termos dos artigos 4. e 5. desse regulamento.
17 No fim dessas investigações, a Comissão decidiu dar oficiosamente início ao procedimento previsto no artigo 3. , n. 1, do Regulamento n. 17 contra 57 produtores de pasta de papel ou associações estabelecidos nos Estados Unidos, no Canadá, na Finlândia, na Noruega, na Suécia, no Reino Unido, em Espanha e em Portugal. Por conseguinte, a Comissão enviou, em 4 de Setembro de 1981, a esses produtores, uma comunicação das acusações. Nos termos da carta que acompanhava esse documento, era-lhes imputada a participação na fixação de preços por meio de práticas concertadas, bem como a participação em decisões de associações, em organizações comuns, em acordos relativos às condições de venda e em trocas de informações.
18 Nos meses de Março e de Abril de 1982, a Comissão procedeu à audição das partes.
19 Como as respostas à comunicação das acusações davam a entender que os preços de transacção eram diferentes dos anunciados, a Comissão, em Setembro de 1982, pediu aos interessados que lhe fornecessem a respectiva prova, como lhe é permitido pelo artigo 11. do Regulamento n. 17. Mais de 100 000 facturas e notas de crédito foram então comunicadas à Comissão.
E ° A decisão
20 Em 19 de Dezembro de 1984, a Comissão adoptou a decisão controvertida. Como já foi dito antes, esta decisão abrange 43 destinatários da comunicação das acusações. Seis deles têm o seu estabelecimento no Canadá, onze nos Estados Unidos, doze na Finlândia, onze na Suécia, um na Noruega, um em Portugal e um em Espanha. Só a 36 deles foram aplicadas multas entre 50 000 ecus e 500 000 ecus. Os destinatários norueguês, português, espanhol, bem como um dos produtores suecos, dois finlandeses e um americano não foram multados.
21 O artigo 1. da decisão que enuncia as diferentes infracções ao disposto no artigo 85. , n. 1, do Tratado, contém cinco números.
22 Nos termos do artigo 1. , n. 1, todas as recorrentes finlandesas, excepto a Finncell, as recorrentes americanas, com excepção da Chesapeake e da Scott Paper, e as recorrentes canadianas concertaram-se, tal como uma das suas concorrentes americanas e algumas das suas concorrentes suecas e norueguesas, "sobre os preços da pasta de papel branqueada a sulfato com destino à Comunidade Económica Europeia", durante todo ou parte do período de 1975-1981.
23 Nos termos do artigo 1. , n. 2, todas as recorrentes finlandesas, excepto a Finncell, americanas e canadianas, menos St Anne, participaram, com algumas das suas concorrentes americanas e suecas, numa concertação sobre os preços de transacção efectivos exigidos na Comunidade, pelo menos, aos clientes na Bélgica, em França, na República Federal da Alemanha, nos Países Baixos e no Reino Unido, durante todo ou parte do período de 1975, 1976 e de 1979 a 1981.
24 Nos termos do artigo 1. , n. 3, todas as recorrentes americanas que eram membros da KEA concertaram-se sobre os preços anunciados e sobre os preços de transacção efectivos aplicáveis às vendas de pasta de papel e trocaram dados individualizados sobre os preços de venda assim praticados. À própria KEA é, em especial, imputado o facto de ter recomendado os preços aplicáveis a essas vendas. No entanto, não foi aplicada qualquer multa por essas infracções.
25 Nos termos do artigo 1. , n. 4, a Finncell e o produtor canadiano St Anne trocaram, no âmbito da Fides, com uma série de outros produtores suecos, noruegueses, espanhóis e portugueses, dados individualizados sobre os preços de venda da pasta de folhosas, na Comunidade Económica Europeia, de 1973 a 1977. Resulta da fundamentação da decisão que a Fides é uma sociedade fiduciária suíça que gere o Centro de Pesquisa e de Informação da Indústria Europeia da Pasta e do Papel. Dentro da Fides, há um grupo mais restrito, denominado inicialmente o "Club Mini-Fides" e, depois, o "Bristol Club". As trocas de informações em causa realizaram-se quer no âmbito da própria Fides, quer no do "Bristol Club".
26 No artigo 1. , n. 5, a Comissão acusou as recorrentes canadianas Canfor, MacMillan, St Anne e Westar, bem como um produtor americano, um produtor norueguês e vários produtores suecos, de terem aplicado, em contratos de venda de pasta de papel a clientes na Comunidade Económica Europeia, cláusulas proibitivas de exportação ou de revenda da pasta de papel, adquirida por estes últimos.
27 De um anexo a esta decisão consta um compromisso que todas as recorrentes ° com excepção de St Anne, de Bowater e de IPS ° subscreveram para com a Comissão. Nos termos desse compromisso, os interessados obrigaram-se a anunciar e a facturar pelo menos 50% das suas vendas com destino à Comunidade, na moeda do comprador, a não voltar a anunciar os seus preços numa base trimestral, mas a mantê-los em vigor "até nova ordem", a só comunicar os seus preços às pessoas indicadas no compromisso, a cessar a concertação no âmbito da KEA e da Fides e a não voltar a impor proibições de exportação ou de revenda aos compradores.
28 Na sua petição, as recorrentes pedem ao Tribunal de Justiça que anule a decisão da Comissão total ou parcialmente ou, subsidiariamente, que reduza o montante da multa que lhes foi aplicada. Além disso, algumas recorrentes solicitam ao Tribunal de Justiça que anule o compromisso acima descrito, total ou parcialmente, ou que as desvincule dele.
29 Finalmente, ao mesmo tempo que interpuseram este recurso, as recorrentes canadianas British Columbia, Canfor, MacMillan, Weldwood e Westar, e as recorrentes americanas membros da KEA, requereram, nos termos do artigo 91. do Regulamento de Processo, um incidente processual, tendo por objecto que o Tribunal de Justiça ordenasse à Comissão que não utilize, no presente processo, nem os documentos que lhe foram transmitidos pelas empresas após a respectiva audição nem qualquer análise desses documentos a que a Comissão possa ter procedido relativamente aos preços de transacção. Por despacho de 10 de Julho de 1985, o Tribunal de Justiça decidiu reservar para final a decisão sobre o pedido incidental bem como a decisão quanto às despesas.
F ° A tramitação processual no Tribunal de Justiça
30 Num primeiro acórdão de 27 de Setembro de 1988 (89/85, 104/85, 114/85, 116/85, 117/85 e 125/85 a 129/85, Colect., p. 5193), o Tribunal de Justiça rejeitou o fundamento baseado na errada apreciação do âmbito de aplicação territorial do artigo 85. do Tratado e na incompatibilidade da decisão da Comissão com o direito internacional público, bem como o fundamento de aplicação exclusiva das regras de concorrência contidas no acordo de comércio livre entre a Comunidade e a Finlândia. O Tribunal de Justiça também anulou a decisão da Comissão, na parte respeitante à Pulp, Paper and Paperboard Export Association of the United States.
31 Por despacho de 25 de Novembro de 1988, o Tribunal de Justiça decidiu obter um relatório pericial sobre o paralelismo dos preços. Os peritos foram designados por despacho de 16 de Março de 1989. Foi-lhes perguntado se os documentos utilizados pela Comissão para elaborar os quadros 6 e 7 anexos à decisão justificavam a conclusão sobre o paralelismo entre os preços anunciados e os preços de transacção. No que respeita aos preços de transacção, o Tribunal de Justiça pediu aos peritos que estabelecessem uma distinção entre os documentos recolhidos durante as investigações e aqueles que o haviam sido após a comunicação das acusações. O relatório pericial contendo as respostas a essas questões foi apresentado ao Tribunal de Justiça em 10 de Abril de 1990.
32 Por despacho de 25 de Outubro de 1990, o Tribunal de Justiça decidiu mandar elaborar um segundo relatório pericial. Aos peritos, que foram designados no mesmo despacho, confirmado, neste particular, pelo despacho de 14 de Março de 1991, foi pedido que descrevessem e analisassem as características do mercado durante o período abrangido pela decisão e que dissessem se, à luz dessas características, o normal funcionamento do mercado devia conduzir a uma estrutura de preços diferenciados ou a uma estrutura de preços uniformes. Finalmente, foi perguntado aos peritos se as características e o funcionamento do mercado durante o período abrangido pela decisão tinham sido diferentes das características e do funcionamento anteriores a esse período e posteriores à decisão, e se os anos de 1977 e de 1978 se distinguiam do resto do período de 1975-1981. Os peritos apresentaram o relatório em 11 de Abril de 1991.
33 Para mais ampla exposição dos factos da causa, da tramitação processual, bem como dos fundamentos e argumentos das partes, remete-se para o relatório para audiência. Estes elementos apenas serão adiante retomados na medida do necessário para a fundamentação da decisão do Tribunal de Justiça.
34 Como a parte da decisão relativa à concertação geral sobre os preços de transacção, que é referida no artigo 1. , n. 2, do dispositivo, é contestada por razões processuais, é necessário começar por examinar essa infracção. O Tribunal de Justiça examinará, sucessivamente, a infracção relativa à concertação sobre os preços anunciados, a infracção relativa à concertação no âmbito da KEA, a infracção relativa às trocas de informações no âmbito da Fides e, finalmente, a infracção resultante da inserção, em contratos ou em cláusulas contratuais gerais, de cláusulas proibitivas de exportação ou de revenda.
II ° A infracção relativa à concertação geral sobre os preços de transacção
A ° A disposição impugnada
35 Como já foi anteriormente mencionado, o artigo 1. , n. 2, da decisão impugnada acusou alguns produtores canadianos, americanos, finlandeses e suecos de se terem concertado sobre os preços de transacção da pasta de papel branqueada a sulfato.
36 Esta disposição não indica entre quem esta concertação se realizou, nem relativamente a que trimestres. Em resposta ao pedido do Tribunal de Justiça, que solicitava informações adicionais sobre este ponto, a Comissão declarou que todos os pormenores constavam do quadro 7, em anexo à decisão, o qual se refere aos preços praticados por cada produtor, para cada tipo de pasta e para cada trimestre.
37 Segundo a Comissão, sempre que um produtor tiver facturado o mesmo preço que outro produtor, relativamente a um dado produto, numa dada região e durante um dado trimestre, deve, em princípio, ser considerado como se se tivesse concertado com o outro produtor. Daqui resulta que o quadro 7 torna possível identificar vários tipos de concertação que se realizaram quer entre todos os destinatários da decisão, quer entre destinatários situados no mesmo país ou continente, quer entre outros destinatários (v. o n. 81 da decisão). Esse quadro foi comunicado aos interessados com a indicação apenas do seu nome.
B ° Os fundamentos apresentados pelas recorrentes
38 As recorrentes canadianas, com a excepção do produtor St Anne, as americanas e as finlandesas pediram a anulação do artigo 1. , n. 2. Os vários fundamentos que invocam cabem em três categorias principais. Em primeiro lugar, os direitos da defesa foram violados. Em segundo lugar, o paralelismo dos preços de transacção, em que a Comissão se baseia para demonstrar a existência da concertação, não existe. Finalmente, mesmo que houvesse tal paralelismo, não devia ser imputado à concertação, mas sim ao normal funcionamento do mercado.
39 Segundo as recorrentes, os direitos da defesa foram violados essencialmente por três formas. Em primeiro lugar, a acusação de concertação sobre os preços de transacção não constava da comunicação das acusações transmitida às recorrentes. Em segundo lugar, esta parte da decisão baseou-se em documentos recolhidos pela Comissão em data posterior à comunicação das acusações e sobre os quais as recorrentes não tiveram, por conseguinte, a oportunidade de se pronunciar. Em terceiro lugar, a Comissão devia ter organizado uma audição comum dos produtores em causa, como lhe é permitido nos termos do artigo 9. , n. 3, do Regulamento n. 99/63/CEE da Comissão, de 25 de Julho de 1963, relativo às audições referidas nos n.os 1 e 2 do artigo 19. do Regulamento n. 17 do Conselho (JO 1963, 127, p. 2268; EE 08 F1 p. 62, a seguir "Regulamento n. 99").
C ° A infracção relativa à concertação sobre os preços de transacção não consta da comunicação das acusações
40 As recorrentes argumentam em primeiro lugar que a comunicação das acusações só se referia à concertação sobre os preços anunciados. Ao acolher na sua decisão uma segunda infracção relativa a uma concertação sobre os preços de transacção, a Comissão ignorou o disposto no artigo 19. , n. 1, do Regulamento n. 17 e no artigo 4. do Regulamento n. 99, que a obrigam a ter apenas em conta, na decisão final, acusações sobre as quais as empresas interessadas tenham tido oportunidade de se pronunciar.
41 A Comissão considera, porém, que a comunicação das acusações se referia tanto à concertação sobre os preços de transacção como à concertação sobre os preços anunciados. A este propósito, invoca vários passos desse documento e as respostas dadas pelos produtores, por escrito ou durante as audições. A Comissão afirma que resulta claramente dessas respostas que os interessados tinham compreendido que a comunicação das acusações se reportava a ambos os tipos de concertação.
42 À luz destes argumentos, é necessário verificar se, neste caso, a comunicação das acusações foi redigida em termos que, embora sucintos, eram suficientemente claros para permitir que os interessados tomassem efectivamente conhecimento do comportamento que lhes é censurado pela Comissão. É só com esta condição que a comunicação das acusações podia ter desempenhado a sua função, nos termos dos regulamentos comunitários, que é fornecer às empresas todos os elementos de informação necessários para lhes permitir que se defendam efectivamente antes de a Comissão tomar uma decisão definitiva (v., sobre este ponto, os acórdãos de 15 de Julho de 1970, Boehringer Mannheim/Comissão, 45/69, Recueil, p. 769; de 14 de Julho de 1972, Geigy/Comissão, 52/69, Recueil, p. 787; de 16 de Dezembro de 1975, Suiker Unie e o./Comissão, 40/73 a 48/73, 50/73, 54/73 a 56/73, 111/73, 113/73 e 114/73, Recueil, p. 1663; de 14 de Fevereiro de 1978, United Brands/Comissão, 27/76, Recueil, p. 207; de 13 de Fevereiro de 1979, Hoffmann-La Roche/Comissão, 85/76, Recueil, p. 461).
43 Neste caso, a comunicação das acusações divide-se em duas partes principais, uma intitulada "Os factos" e a outra "Aplicabilidade do artigo 85. , n. 1, do Tratado CEE", e não contém qualquer dispositivo. Tendo em conta a falta de dispositivo, é à segunda parte da comunicação das acusações que deve fazer-se referência para saber qual o comportamento dos produtores objecto de acusação.
44 A leitura da parte intitulada "Aplicabilidade do artigo 85. , n. 1, do Tratado CEE" revela que só um passo poderia ser interpretado no sentido de conter uma referência específica aos preços de transacção. Trata-se do n. 66, que refere que "os produtores norte-americanos, até 1978, portanto durante três anos e meio, praticaram o mesmo preço que os produtores escandinavos, excepto durante a primeira metade de 1977, em que concederam descontos e aumentaram a respectiva parte do mercado". Os outros passos indicados pela Comissão referem-se, num caso, à "fixação de preços... realizada, designadamente, através do sistema dos anúncios de preços" e, nos outros, aos "preços" de um modo geral e sem qualquer outra indicação.
45 Redigida desta forma, não pode considerar-se que a comunicação das acusações satisfaça o requisito de clareza anteriormente mencionado.
46 Contra esta conclusão, a Comissão não pode argumentar que, na comunicação das acusações, não havia qualquer referência distinta à infracção relativa aos preços de transacção, porque, durante as investigações que a precederam, solicitou às empresas que apresentassem facturas representativas e essas tinham demonstrado que havia coincidência entre os preços anunciados e os preços de transacção.
47 Deve notar-se que, na decisão, as duas infracções não coincidem.
48 Antes de mais, alguns produtores ° como Chesapeake Corporation ° foram punidos por terem participado na concertação sobre os preços de transacção e não sobre os preços anunciados, ao passo que outros ° como St Anne ° se encontram na situação inversa.
49 Em segundo lugar, há diferenças no que toca aos períodos das infracções: a infracção de concertação sobre os preços de transacção não diz respeito ao período de 1977-1978, que, em compensação, está abrangido pela acusação relativa aos preços anunciados. A este respeito, é extremamente significativo que, enquanto a comunicação das acusações vem acompanhada de um único quadro intitulado "Price trends based on prices announced and confirmed by producers", que abrange todo o período que vai de 1974 a 1980, a decisão vem acompanhada de três quadros separados, um deles sobre os preços anunciados (quadro 6), que reproduz o conteúdo do quadro que consta do anexo à comunicação das acusações, e os outros dois sobre os preços de transacção, com os títulos "Regular transaction prices" (quadro 7) e "Deviations from regular transaction prices in Table 7" (quadro 8). O quadro 7 não abrange os anos de 1977 e 1978.
50 Como, na decisão, as duas infracções têm as suas características próprias, que dizem respeito a elementos tão essenciais como os participantes na concertação ou o período da infracção, deviam ter sido apresentadas de maneira distinta logo desde o momento da comunicação das acusações. Isso era tanto mais necessário, no caso em apreço, quanto é certo que os dois tipos de infracções deram origem à aplicação de multas diferentes.
51 Contrariamente ao que afirma a Comissão, as respostas à comunicação das acusações não são de molde a demonstrar que as recorrentes a tinham entendido no sentido de abranger a infracção relativa aos preços de transacção. Os vários passos mencionados na tréplica em apoio desta afirmação são susceptíveis de uma dupla interpretação. Na medida em que, na audição administrativa ou nas suas observações escritas, os produtores fizeram várias referências aos preços de transacção, isso pode ter por finalidade demonstrar que, como esses preços eram diferentes, a concertação sobre os preços anunciados não tinha tido qualquer efeito sobre o mercado e que, assim sendo, as condições fixadas pelo artigo 85. , n. 1, não estavam preenchidas, e não demonstrar que eles não se tinham concertado sobre os preços de transacção, contrariamente ao que resultara da comunicação das acusações.
52 Resulta de quanto antecede que a acusação relativa à concertação sobre os preços de transacção não foi claramente posta em relevo na comunicação das acusações e que, por conseguinte, não foi dado às recorrentes o ensejo de se defenderem cabalmente durante a fase do procedimento administrativo.
53 Por conseguinte, e sem que haja necessidade de examinar os outros fundamentos, deve anular-se o artigo 1. , n. 2, da decisão impugnada, relativo à concertação sobre os preços de transacção.
54 Nestes termos, deve declarar-se que o pedido incidental no sentido de o Tribunal de Justiça retirar do processo certos documentos relativos a essa infracção é destituído de objecto.
III ° A infracção relativa à concertação geral sobre os preços anunciados
55 As recorrentes finlandesas, americanas e canadianas pediram a anulação do artigo 1. , n. 1, da decisão, segundo o qual se concertaram, tal como outros produtores suecos, americanos e noruegueses, sobre os preços da pasta de papel branqueada a sulfato com destino à Comunidade Económica Europeia, durante todo ou parte do período de 1975-1981.
56 Por cartas de 6 de Março e de 2 de Maio de 1990, o Tribunal de Justiça solicitou à Comissão que prestasse alguns esclarecimentos sobre esse artigo 1. , n. 1.
57 Na sua primeira questão, o Tribunal de Justiça perguntou se o sistema de anúncios trimestrais de preços posto em causa pela Comissão devia ser considerado como constituindo em si mesmo uma infracção ao Tratado ou se esse sistema era uma simples prova da concertação sobre os preços anunciados que se realizou numa fase anterior. As respostas da Comissão não possibilitaram uma escolha entre essas duas interpretações e, portanto, ambas devem ser tomadas em consideração.
58 Como o artigo 1. , n. 1, não indica nem quem praticou a infracção nem quais os trimestres em que ocorreu, o Tribunal de Justiça, na sua segunda questão, pediu à Comissão que fornecesse essas indicações. Na sua resposta, a Comissão afirmou que todos os dados de que dispunha constavam do quadro 6, em anexo à decisão. Esse quadro, intitulado "Announced prices", indica, para cada trimestre do período em causa, os preços anunciados por vários produtores e a data dos anúncios. Como foi explicado pela Comissão, deve considerar-se que todos os produtores que, segundo os dados desse quadro, anunciaram o mesmo preço para um dado trimestre, se concertaram durante esse período.
A ° O sistema de anúncios trimestrais de preços constitui em si mesmo a infracção ao disposto no artigo 85. do Tratado
59 De acordo com a primeira hipótese considerada pela Comissão, o que constitui a infracção ao disposto no artigo 85. do Tratado é o sistema de anúncios trimestrais de preços em si mesmo.
60 Em primeiro lugar, a Comissão considera que este sistema foi instaurado deliberadamente pelos produtores de pasta de papel para lhes permitir conhecer os preços que iriam ser praticados pelos seus concorrentes durante os trimestres seguintes. A divulgação dos preços a terceiros, especialmente à imprensa e a agentes que trabalhavam para vários produtores, muito antes da sua aplicação no início de um novo trimestre, deu aos outros produtores tempo suficiente para anunciarem os seus novos preços correspondentes antes desse trimestre e para os aplicarem a partir do seu início.
61 Em segundo lugar, a Comissão considera que a instauração deste mecanismo teve como efeito tornar o mercado artificialmente transparente ao permitir que os produtores obtivessem uma imagem rápida e fiel dos preços cotados pelos seus concorrentes.
62 Para decidir sobre este ponto, deve ter-se presente que, nos termos do artigo 85. , n. 1, do Tratado, são proibidos todos os acordos entre empresas, todas as decisões de associações de empresas e todas as práticas concertadas, susceptíveis de afectar o comércio entre os Estados-membros e que tenham por objectivo ou efeito impedir, restringir ou falsear a concorrência no mercado comum.
63 Segundo o acórdão do Tribunal de Justiça, Suiker Unie/Comissão, já referido (n.os 26 e 173), a prática concertada refere-se a uma forma de coordenação entre empresas que, sem ter sido levada até ao ponto da realização de um acordo propriamente dito, substitui cientemente os riscos da concorrência por uma cooperação prática entre elas. No mesmo acórdão, o Tribunal de Justiça acrescentou que os critérios de coordenação e de cooperação devem ser entendidos à luz da concepção inerente às disposições do Tratado relativas à concorrência, segundo a qual cada operador económico deve determinar de modo autónomo a política que pretende adoptar no mercado comum.
64 No caso em apreço, as comunicações resultam dos anúncios de preços feitos aos utilizadores. Elas constituem em si mesmas um comportamento no mercado que não reduz a incerteza de cada empresa quanto à atitude futura das suas concorrentes. Na altura em que cada empresa adopta tal comportamento, ela não pode ter qualquer certeza quanto à conduta futura das outras.
65 Por conseguinte, não deve considerar-se que o sistema dos anúncios trimestrais de preços no mercado da pasta de papel constitui em si mesmo uma infracção ao disposto no artigo 85. , n. 1, do Tratado.
B ° A infracção resulta de uma concertação sobre os preços anunciados
66 Na segunda hipótese, a Comissão considera que o sistema de anúncios dos preços constitui prova de uma concertação que se realizou numa fase anterior. No n. 82 da decisão, a Comissão afirma que, para provar esta concertação, se baseou no comportamento paralelo dos produtores de pasta de papel no período de 1975-1981, bem como em diferentes tipos de trocas directas ou indirectas de informações.
67 Resulta dos n.os 82 e 107 a 110 da decisão que o paralelismo de comportamento consiste essencialmente no sistema de anúncios trimestrais dos preços, na simultaneidade ou quase-simultaneidade dos anúncios e no facto de os preços anunciados serem idênticos. Decorre também dos diversos telex e documentos mencionados nos n.os 61 e seguintes da decisão que se realizaram reuniões e contactos entre certos produtores tendo em vista a troca de informações sobre os respectivos preços.
1. Quanto aos telex e documentos mencionados nos n.os 61 e seguintes da decisão
68 Nas perguntas de 6 de Março e de 2 de Maio de 1990, o Tribunal de Justiça solicitou à Comissão que indicasse exactamente quais as conclusões que tirava dos telex e documentos mencionados nos n.os 61 e seguintes da decisão, ou seja, que indicasse entre quem se realizou a concertação comprovada por cada telex ou documento e em que período. Em resposta a esta questão, a Comissão afirmou que esses documentos só vinham corroborar a prova baseada no paralelismo de comportamento e que, por conseguinte, eram relevantes não só no que diz respeito às empresas e ao período que aí eram especificamente mencionados mas também no que diz respeito a todas as empresas e à duração total do paralelismo do comportamento.
69 À luz desta resposta, estes documentos não devem ser tomados em consideração. Como a identidade das pessoas que participam na concertação é um elemento constitutivo da infracção, é impossível basear a prova dessa infracção em documentos cujo valor probatório, a este respeito, a Comissão foi incapaz de esclarecer.
2. Quanto às outras provas aduzidas pela Comissão
70 Como a Comissão não tem documentos que demonstrem directamente a existência de concertação entre os produtores em causa, é necessário verificar se o sistema de anúncios trimestrais dos preços, a sua simultaneidade ou quase-simultaneidade e o seu paralelismo comprovado durante o período de 1975-1981 constituem um conjunto de provas sérias, precisas e concordantes de uma concertação prévia.
71 Para determinar o valor probatório destes diversos elementos, deve notar-se que um paralelismo de comportamento não pode ser considerado como fazendo prova de uma concertação, a menos que a concertação constitua a única explicação plausível para esse comportamento. É necessário ter presente que, embora o artigo 85. proíba todas as formas de conluio que sejam de molde a falsear a concorrência, não priva os operadores económicos do direito de se adaptarem de maneira inteligente ao comportamento verificado ou previsto dos seus concorrentes (v. o acórdão Suiker Unie/Comissão, já referido, n. 174).
72 Por conseguinte, é necessário, no caso em apreço, verificar se o paralelismo de comportamento alegado pela Comissão não pode, tendo em conta a natureza dos produtos, a dimensão e o número das empresas e o volume do mercado em causa, ser explicado de outro modo que não a concertação.
a) Quanto ao sistema de anúncios de preços
73 Como já foi exposto acima, a Comissão vê no sistema de anúncios trimestrais de preços a prova de uma concertação numa fase anterior.
74 Nas suas alegações, as recorrentes defendem, pelo contrário, que este sistema se explica pelas necessidades comerciais específicas do mercado da pasta de papel.
75 Por despachos de 25 de Outubro de 1990 e de 14 de Março de 1991, o Tribunal de Justiça incumbiu dois peritos de examinar as características do mercado da pasta de papel branqueada a sulfato no período abrangido pela decisão controvertida. O respectivo relatório apresenta as considerações seguintes.
76 Em primeiro lugar, os peritos notaram que o sistema de anúncios em questão tem de ser encarado no contexto das relações a longo prazo que existiam entre os produtores e os seus clientes e que resultavam não só do método de fabrico da pasta de papel mas também da natureza cíclica do mercado. Tendo em conta o facto de cada tipo de papel ser o resultado de uma mistura específica de pastas de papel com as suas características próprias e de ser difícil alterar essa mistura, estabeleceram-se relações baseadas numa cooperação estreita entre os produtores de pasta de papel e os fabricantes de papel. Estas relações eram tanto mais estreitas quanto é certo que também tinham a vantagem de proteger ambas as partes contra as incertezas inerentes à natureza cíclica do mercado: ao mesmo tempo que garantiam a segurança da oferta aos compradores, garantiam a segurança da procura aos produtores.
77 Os peritos salientaram que foi no contexto dessas relações a longo prazo que, após a segunda guerra mundial, os compradores pediram a instauração deste sistema de anúncios. Como a pasta representa 50% a 75% do custo do papel, esses compradores pretendiam conhecer o mais cedo possível os preços que poderiam ser-lhes exigidos, de modo a calcularem os seus custos e a fixarem os preços dos seus próprios produtos. No entanto, como esses compradores não pretendiam ficar vinculados a um preço fixo elevado no caso de o mercado vir a afrouxar, o preço anunciado era encarado como um preço-limite, abaixo do qual o preço de transacção poderia sempre ser renegociado.
78 A explicação dada para a utilização de um ciclo trimestral é que é o resultado de um compromisso entre o desejo dos fabricantes de papel de terem um certo grau de previsibilidade no que toca ao preço da pasta de papel e o dos produtores de não perderem quaisquer oportunidades de obter lucros no caso de fortalecimento do mercado.
79 O dólar dos Estados Unidos foi, segundo os peritos, introduzido no mercado pelos produtores norte-americanos durante os anos 60. Essa evolução foi, de um modo geral, bem aceite pelos compradores, que a consideraram como um meio de garantir que não pagavam um preço mais alto do que os seus concorrentes.
b) Quanto à simultaneidade ou quase-simultaneidade dos anúncios
80 No n. 107 da sua decisão, a Comissão alega que a rápida sucessão ou mesmo a simultaneidade dos anúncios de preços não teriam sido possíveis sem um constante fluxo de informações entre as empresas em causa.
81 Segundo as recorrentes, a simultaneidade ou quase-simultaneidade dos anúncios ° ainda que viessem a ser demonstradas ° devem, pelo contrário, ser encaradas como um resultado directo do altíssimo grau de transparência do mercado. Esta transparência, longe de ser artificial, pode ser explicada pela rede de relações extremamente bem montada que, tendo em conta a natureza e a estrutura do mercado, se tinha estabelecido entre os vários operadores.
82 Os peritos confirmaram essa análise no seu relatório e na audição que se lhe seguiu.
83 Em primeiro lugar, como acentuaram, os compradores estavam sempre em contacto com vários produtores de pasta de papel. Uma razão para isto prendia-se com o processo de fabrico do papel, mas havia outra, que consistia no facto de, para evitar tornar-se demasiado dependentes de um produtor, os compradores de pasta de papel tomarem a precaução de diversificar as suas fontes de abastecimento. Tendo em vista obter os preços mais baixos possíveis, tinham o hábito, especialmente em alturas de baixa de preços, de revelar aos seus fornecedores os preços anunciados pelos seus concorrentes.
84 Em segundo lugar, deve notar-se que a maior parte da pasta de papel era vendida a um número relativamente reduzido de grandes fabricantes de papel. Esses poucos compradores mantinham relações muito estreitas uns com os outros e trocavam informações sobre as alterações de preços de que tinham conhecimento.
85 Em terceiro lugar, vários produtores, que fabricavam eles próprios papel, compravam pasta de papel a outros produtores, estando assim informados, tanto em épocas de alta como de baixa de preços, dos preços praticados pelos seus concorrentes. Estas informações também eram acessíveis aos produtores que, embora não fabricassem eles próprios papel, estavam, porém, ligados a grupos que o faziam.
86 Em quarto lugar, este alto grau de transparência do mercado da pasta de papel, resultante das ligações entre operadores ou grupos de operadores, foi ainda reforçado pela existência de agentes estabelecidos na Comunidade que trabalhavam para vários produtores e pela existência de uma imprensa especializada muito dinâmica.
87 Relativamente a este último ponto, deve salientar-se que a maior parte das recorrentes negam ter comunicado à imprensa especializada qualquer informação sobre os seus preços e que os poucos produtores que reconheceram ter feito isso fazem notar que tais comunicações foram esporádicas e a pedido da própria imprensa.
88 Finalmente, é preciso acrescentar que a utilização de meios de comunicação rápidos, tais como o telefone e o telex, bem como o recurso muito frequente dos fabricantes de papel a compradores profissionais muito bem informados significavam que, não obstante o número de fases em causa ° produtor, agente, comprador, agente, produtor °, as informações sobre o nível dos preços anunciados se espalham em alguns dias, se não mesmo em algumas horas, no mercado da pasta de papel.
c) Quanto ao paralelismo dos preços anunciados
89 O paralelismo dos preços anunciados em que a Comissão se baseia para provar a concertação vem descrito no n. 22 da decisão. Nele, a Comissão, apoiando-se no quadro 6 em anexo à decisão, declara que os preços anunciados pelos produtores canadianos e americanos foram idênticos desde o primeiro trimestre de 1975 até ao terceiro trimestre de 1977 e desde o primeiro trimestre de 1978 até ao terceiro trimestre de 1981, que os preços anunciados pelos produtores suecos e finlandeses foram idênticos desde o primeiro trimestre de 1975 até ao segundo trimestre de 1977 e desde o terceiro trimestre de 1978 até ao terceiro trimestre de 1981 e, finalmente, que os preços de todos os produtores foram idênticos desde o primeiro trimestre de 1976 até ao segundo trimestre de 1977 e desde o terceiro trimestre de 1979 até ao terceiro trimestre de 1981.
90 Segundo a Comissão, a única explanação que pode dar-se para este paralelismo dos preços é a concertação entre os produtores. Esta afirmação baseia-se, no essencial, nas considerações seguintes.
91 Em primeiro lugar, o preço único praticado pelos produtores durante o período em causa não pode ser considerado como um preço de equilíbrio, ou seja, como o resultante do funcionamento normal da lei da oferta e da procura. A Comissão põe em relevo que não houve qualquer sondagem do mercado "por tentativas", como é demonstrado pela estabilidade de preços verificada entre o primeiro trimestre de 1975 e o quarto trimestre de 1976, bem como pelo facto de, em geral, no caso da pasta de resinosas, desde o terceiro trimestre de 1979 até ao segundo trimestre de 1980, o primeiro preço aumentado ter sido sempre seguido pelos outros produtores.
92 Também não pode aceitar-se o argumento relativo ao "price leadership": a semelhança dos preços anunciados e, além disso, a dos preços de transacção não podem explicar-se pela existência de um chefe de mercado cujos preços fossem adoptados pelos seus concorrentes. A ordem por que os anúncios foram feitos continuou a variar de trimestre para trimestre e nenhum produtor deteve uma posição suficientemente forte para actuar como chefe.
93 Em segundo lugar, a Comissão considera que, como as condições económicas variavam de um produtor para outro ou de um grupo de produtores para outro, deviam ter aplicado preços diferentes. Os fabricantes de pasta de papel com custos baixos deviam ter baixado os seus preços, de modo a aumentarem as suas partes de mercado em detrimento dos seus concorrentes menos eficientes. Segundo a Comissão, as divergências em questão diziam respeito aos custos de produção e de transporte, às relações entre esses custos (calculados nas moedas nacionais: dólar canadiano, coroa sueca ou markka finlandesa) e os preços de venda (fixados em dólares dos Estados Unidos), ao volume das encomendas, às variações na procura de pasta de papel nos vários países importadores, à importância relativa do mercado europeu, que era maior para os produtores escandinavos do que para os americanos e canadianos, e às taxas de utilização das capacidades de produção, que, de um modo geral, eram mais elevadas nos Estados Unidos e no Canadá do que na Suécia e na Finlândia.
94 No que toca ao volume das encomendas, a Comissão considera que, como a venda de grandes quantidades permitia que os produtores reduzissem substancialmente os seus custos, os registos de preços deviam ter mostrado diferenças significativas de preços entre compradores de grandes quantidades e compradores de pequenas quantidades. Na prática, essas diferenças raramente ascenderam a mais de 3%.
95 Em terceiro lugar, a Comissão alega que, em todo o caso, durante algum tempo, em 1976, 1977 e 1981, os preços anunciados da pasta de papel se situaram a um nível artificialmente elevado, que diferia grandemente daquele que se podia ter esperado em condições normais de concorrência. Por exemplo, é inconcebível, sem concertação, que o preço único de 415 USD, anunciado para a pasta de resinosas do Norte, se tenha mantido imutável desde o primeiro trimestre de 1975 até ao terceiro trimestre de 1977 e que, especialmente durante o segundo e o terceiro trimestre de 1977, o preço anunciado se tenha situado 100 USD acima do preço de venda efectivamente realizável no mercado. A afirmação de que os preços se situaram a um nível anormalmente elevado é confirmada pelo facto de, em 1977 e em 1982, a queda dos preços ter sido particularmente brusca.
96 Finalmente, a Comissão baseia-se na concessão de descontos secretos e nas alterações das partes do mercado.
97 No que diz respeito à concessão de descontos secretos, deve salientar-se que existe uma contradição entre a decisão e o que foi dito posteriormente. No n. 112 da sua decisão, a Comissão refere-se à exclusão da concorrência secreta, mas, a seguir, afirma, nas suas alegações, que, se os descontos eram secretos, isso era porque infringiam a concertação e tinham, por conseguinte, que se manter ignorados dos outros produtores.
98 No que respeita às alterações das partes de mercado comprovadas entre 1975 e 1981, a Comissão considera que elas não justificam a conclusão de que não houve concertação. Essas alterações foram muito menos acentuadas entre 1975 e 1976 e entre 1980 e 1981 do que as ocorridas entre 1978 e 1979 e entre 1979 e 1980.
99 As recorrentes contestaram a tese de que o paralelismo dos preços era explicável pela concertação.
100 Ao pedir segundo relatório pericial, o Tribunal de Justiça pediu aos peritos que especificassem se, em sua opinião, o normal funcionamento do mercado da pasta de papel devia conduzir a uma estrutura de preços diferenciados ou a uma estrutura de preços uniformes.
101 Resulta do relatório dos peritos, bem como na discussão que se lhe seguiu, que os peritos consideram que o normal funcionamento do mercado é uma explicação mais plausível para a uniformidade dos preços do que a concertação. As linhas fundamentais da sua análise podem ser resumidas da maneira seguinte:
i) A descrição do mercado
102 Os peritos descrevem o mercado como um conjunto de oligopólios-oligopsónios compostos de alguns produtores e de alguns compradores e correspondendo, cada um deles, a uma dada espécie de pasta de papel. Essa estrutura do mercado resulta, em grande parte, do método de fabrico da pasta de papel: como o papel é o resultado de uma mistura característica de pastas, cada fabricante de papel só pode tratar com um número limitado de produtores de pasta e, inversamente, cada produtor de pasta só pode abastecer um número limitado de clientes. Dentro dos grupos assim constituídos, a cooperação foi ainda consolidada pelo facto de se ter verificado que oferecia tanto aos compradores como aos vendedores de pasta segurança contra as incertezas do mercado.
103 Essa organização do mercado, conjugada com o seu altíssimo grau de transparência, leva, a curto prazo, a uma situação em que os preços são lentos a reagir. Os produtores sabem que, se aumentassem os preços, os seus concorrentes sem dúvida não os seguiriam para não afastarem desse modo os seus clientes. Do mesmo modo, teriam relutância em reduzir os seus preços, pois sabem que, se o fizessem, os outros produtores os seguiriam, admitindo que eles dispõem de capacidades de produção não utilizadas. Tal baixa de preços seria tanto menos desejável quanto é certo que prejudicaria todo o sector no seu conjunto: como a procura global de pasta de papel é inelástica, a perda de receitas resultante da redução dos preços não podia ser compensada pelos lucros obtidos em resultado do aumento das vendas e haveria um declínio nos lucros globais dos produtores.
104 A longo prazo, a possibilidade de os compradores se voltarem, mediante algum investimento, para outros tipos de pasta, e a existência de produtos de substituição, tais como a pasta proveniente do Brasil ou a obtida a partir de papel reciclado, têm por efeito atenuar as tendências oligopolísticas do mercado. Isso explica por que é que, durante um período de vários anos, as flutuações de preços foram relativamente contidas.
105 Finalmente, a transparência do mercado podia ser responsável por certos aumentos globais de preços registados a curto prazo: quando a procura é maior do que a oferta, os produtores que sabem ° como acontecia no mercado da pasta de papel ° que o nível das existências dos seus concorrentes é baixo e que a sua taxa de utilização das capacidades de produção é elevada não teriam receio de aumentar os preços. Haveria então assim uma forte probabilidade de virem a ser seguidos pelos seus concorrentes.
ii) As tendências do mercado de 1975 a 1981
106 Os diferentes mecanismos acima descritos permitem explicar algumas fases da sequência de alterações de preços consideradas "anormais" pela Comissão, em especial, a estabilidade dos preços observada no período de 1975-1976, o colapso do mercado em 1977 e a nova queda dos preços nos finais de 1981.
° O período de 1975-1976
107 Em 1974, a procura de pasta de papel era muito forte. Como as taxas de utilização das capacidades de produção eram muito elevadas e os níveis das existências extremamente baixos, o excesso de procura provocou um aumento dos preços.
108 Em 1975 e em 1976, as circunstâncias modificaram-se: houve um aumento dos níveis de existências e uma diminuição geral da taxa de utilização das capacidades de produção. Não obstante estas alterações, nenhum produtor tomou a iniciativa de reduzir os seus preços, pois sabia que, se o fizesse, os seus concorrentes o teriam seguido. Inversamente, se tivesse decidido aumentar os preços, teria ficado isolado no mercado e teria perdido alguns dos seus clientes, se não mesmo todos.
109 Segundo os peritos, as características oligopolísticas do mercado e o seu altíssimo grau de transparência não são os únicos factores responsáveis pela estabilidade dos preços observada durante o período de 1975-1977. Há outra explicação, que reside nas circunstâncias especiais que existiam na altura. OS FUNDAMENTOS CONTINUAN NO NUM.DOC : 685J0089(01).1
110 Em primeiro lugar, a nível geral, deve salientar-se que, em 1976, a procura mundial de papel tinha voltado a aumentar, o que dera azo a previsões optimistas. Além disso, a taxa de inflação era elevada, os preços tinham diminuído em termos reais e as taxas de juro eram baixas. Ademais, os produtores suecos beneficiaram de uma redução fiscal sobre a constituição de existências, que era função do respectivo valor. Finalmente, os produtores norte-americanos tinham uma saída para o mercado dos Estados Unidos, que, nessa altura, era muito activo e, quanto a eles, exploravam quase todas as suas capacidades de produção.
° O ano de 1977
111 O colapso dos preços em 1977 foi o resultado do aumento maciço da oferta e da estagnação da procura que caracterizaram este período. O Governo sueco tinha extinto o regime de subsídios à armazenagem, originando assim um aumento maciço da oferta numa altura em que os níveis das existências nos outros países produtores eram relativamente elevados. Os produtores verificaram então que o crescimento esperado da procura não tinha acontecido e que, por conseguinte, um aumento dos preços era menos provável. Nestas circunstâncias, se uma empresa decidisse baixar os seus preços, podia ter a certeza de que os seus concorrentes a seguiriam, desde que, no entanto, dispusessem de capacidades de produção não utilizadas.
° O período de 1978-1981
112 A partir do quarto trimestre de 1978, a procura voltou a subir e ultrapassou a oferta. Assim sendo, a transparência do mercado provocou um rápido ajustamento dos preços no sentido da alta. As empresas que tinham conhecimento de que os seus concorrentes não dispunham de qualquer capacidade de produção inutilizada puderam então aumentar os seus preços, sem receio de ficarem isoladas e de perderem assim a sua parte de mercado.
113 A este período de subida de preços, seguiu-se um período de estabilidade desde meados do ano de 1980 até finais de 1981. Essa estabilidade poderia ser atribuída ao facto de os níveis das existências serem baixos, as taxas de utilização das capacidades de produção elevadas e de a procura, influenciada pelo aparecimento de novos tipos de pasta no mercado, ser estacionária.
114 No quarto trimestre de 1981, o mercado voltou a entrar em recessão, como resultado do aumento das existências, da diminuição das taxas de utilização das capacidades de produção e da baixa da procura mundial de papel. A ausência dos factores especiais que existiam em 1975-1977, ou seja, de uma taxa mais elevada de inflação e da existência, na Suécia, de um regime de subsídios à armazenagem, explica a queda mais rápida dos preços.
iii) Vários factores cuja existência foi comprovada no mercado são incompatíveis com a explicação de que houve concertação
115 Os peritos analisam as estruturas do mercado e as tendências de preços no período em causa e defendem que vários factores ou mecanismos específicos deste mercado são incompatíveis com uma explicação baseada na concertação. Esses factores são a existência efectiva e potencial de "outsiders", que não pertencem ao grupo de empresas que pretensamente se conluiaram, as alterações das partes de mercado e a ausência de quotas de produção, bem como a comprovação de que os produtores não tiraram partido das diferenças existentes entre os vários Estados importadores, no que toca à elasticidade da procura.
116 No que diz respeito ao primeiro ponto, deve salientar-se que, no n. 137 da sua decisão, a Comissão avalia a produção dos "outsiders" em 40% do consumo total de pasta de papel na Comunidade. Tendo em conta a dimensão dessa parte de mercado, teria sido difícil a um cartel funcionar apenas entre as empresas às quais é imputada a prática de uma infracção, por se haverem concertado.
117 A isto, a Comissão responde com o argumento de que não instaurou um processo contra esses outros produtores, porque, a seu ver, tinham actuado como seguidores durante o período em causa.
118 Este argumento não pode ser aceite. É inteiramente incompatível com o raciocínio adoptado pela Comissão, no que diz respeito ao quadro 6, quanto à identificação dos produtores que participam na concertação. Se, a este propósito, como já foi salientado no n. 58, supra, o mero facto de anunciar um preço idêntico ao de outro produtor, para o mesmo período, constitui realmente uma prova suficiente de concertação, é evidente que o processo de infracção nos termos do artigo 85. devia ter sido estendido a esses "outsiders", que, como a Comissão reconhece ao utilizar o termo "seguidores", anunciaram o mesmo preço que os produtores punidos no âmbito do artigo 1. , n. 1, do dispositivo da decisão.
119 Quanto ao segundo factor, os peritos declaram que, tendo em conta o quadro 2 anexo à decisão, tinha havido alterações nas partes de mercado, entre 1975 e 1981. Essas alterações revelam a existência de concorrência entre os produtores e a ausência de quotas.
120 Finalmente, no que diz respeito à ausência de diferenças de preços entre os vários Estados-membros, os peritos consideram que é errado afirmar, como faz a Comissão nos n.os 136 a 140 da decisão, que os produtores de pasta de papel deviam ter explorado as diferenças de elasticidade-preço existentes nos diferentes Estados-membros. Segundo os peritos, para assim fazerem, as empresas deveriam ter estado em condições de segmentar o mercado, o que só teria sido possível se tivesse havido um cartel efectivo que abrangesse todos os fornecedores existentes e potenciais e que fosse capaz de manter o respeito dos obstáculos à revenda e à transferência entre Estados-membros. Nestas circunstâncias, a uniformidade dos preços constitui, pelo contrário, um argumento que milita a favor da explicação baseada no normal funcionamento do mercado.
iv) Críticas específicas dos peritos à explicação da Comissão
121 Os peritos dirigem uma série de críticas específicas à explicação da Comissão. Tais críticas dizem respeito ao impacto dos custos de transporte nos preços, ao volume das encomendas e, em geral, às diferenças de custos e à concessão de descontos secretos.
122 Em primeiro lugar, em resposta à afirmação da Comissão de que os preços deviam ter variado de acordo com o lugar de destino, os peritos afirmam que o lugar de destino da pasta de papel ° quer sejam os portos do Atlântico quer os do Báltico ° só tinha uma influência reduzida nos custos de transporte. Quando muito, poderia ter provocado uma diferença de custo de dez dólares por tonelada. Contrariamente ao que a Comissão afirma, essa diferença é demasiado pequena para afectar os preços em cada uma das duas zonas.
123 Em segundo lugar, os peritos explicam por que é que, a seu ver, encomendas muito grandes de pasta de papel não provocaram fortes reduções de preços. Tais encomendas não permitem realizar economias de custo significativas, por várias razões: primeiro, a pasta de papel é normalmente um produto estandardizado, fornecido a partir de existências anónimas; depois, os produtores têm o hábito de instalar capacidade de armazenagem nos grandes portos de destino; finalmente, como utilizam uma larga gama de pastas de papel, os fabricantes de papel preferem, quando efectuam encomendas de grandes quantidades, que a pasta de papel lhes seja entregue por várias vezes. No fim de contas, as economias de escala ligadas às encomendas muito grandes limitam-se a despesas gerais e a encargos administrativos.
124 Em terceiro lugar, os peritos consideram que, mesmo que houvesse verdadeiras economias de escala, as diferenças de custos que elas provocaram entre os produtores não afectaram os preços, mas sim os lucros das empresas.
125 Finalmente, se os descontos concedidos eram secretos, tal devia-se a várias razões fora do alcance dos produtores de pasta: para começar, em alguns países, como a França, os descontos que não são justificados por economias de custo são ilegais; em seguida, como os descontos se referem, em geral, à tonelagem anual, só podem ser calculados no fim do ano financeiro. Por último, são os compradores que pedem que os descontos se mantenham confidenciais, em parte, para conseguirem uma vantagem sobre os seus concorrentes através da obtenção de melhores preços, e, em parte, para evitarem que os compradores de papel procurem obter eles próprios uma redução de preço.
3. Conclusões
126 Segundo esta análise, deve afirmar-se que, no caso em apreço, a concertação não é a única explicação plausível para o paralelismo de comportamento. Antes de mais, pode considerar-se que o sistema de anúncios de preços constitui uma resposta racional ao facto de o mercado da pasta de papel ser um mercado a longo prazo e à necessidade sentida tanto pelos compradores como pelos vendedores de limitar os riscos comerciais. Em seguida, a semelhança nas datas dos anúncios de preços pode ser considerada como uma consequência directa do alto grau de transparência do mercado, que não deve ser qualificada de artificial. Finalmente, o paralelismo de preços e a evolução dos preços podem ser explicados satisfatoriamente pelas tendências oligopolísticas do mercado e pelas circunstâncias específicas existentes em certos períodos. Por conseguinte, o paralelismo de comportamento detectado pela Comissão não constitui prova de concertação.
127 Na falta de um conjunto de provas sérias, precisas e concordantes, deve declarar-se que a concertação relativa aos preços anunciados não foi demonstrada pela Comissão. Por conseguinte, o artigo 1. , n. 1, da decisão impugnada deve ser anulado.
IV ° A concertação no âmbito da KEA
128 As recorrentes americanas, com excepção de Bowater, pediram a anulação do artigo 1. , n. 3, do dispositivo da decisão, no qual é imputado aos membros da KEA terem-se concertado sobre os preços anunciados e sobre os preços de transacção da pasta de papel com destino à Comunidade e terem trocado dados individualizados sobre esses preços, e à KEA é imputado ter recomendado preços para as vendas em questão.
129 No acórdão de 27 de Setembro de 1988, já referido, essa disposição foi anulada na parte respeitante à KEA.
A ° Quanto à concertação sobre os preços anunciados e à troca de informações sobre os preços de transacção
130 Relativamente à concertação sobre os preços anunciados e à troca de informações sobre os preços de transacção, deve referir-se, antes de mais, o artigo II A do "Policy Statement of the Pulp Group" (declaração de princípio do grupo das pastas). Nos termos dessa disposição, os membros do grupo devem reunir-se, de tempos a tempos, para fixar, por unanimidade, os preços de venda de pasta de papel, conhecidos por "preços KEA recomendados", e comprometem-se a anunciar esses preços aos seus clientes. Se, posteriormente, os membros da associação se desviarem desses preços ° como continuam a ter liberdade para fazer °, são obrigados a notificá-lo previamente ao director do grupo, que pode decidir, em caso de necessidade, marcar uma nova reunião do grupo, para estudar as medidas a tomar.
131 Como os produtores se reuniam de tempos a tempos para fixar o "preço KEA recomendado", é evidente que os que pertenciam à KEA se concertavam, no âmbito dessa associação, sobre os preços anunciados da pasta de papel. De igual modo, deve salientar-se que, ao comprometerem-se a notificar antecipadamente qualquer preço que se desviasse do fixado de comum acordo, criaram um sistema de troca de informações sobre o seu comportamento futuro susceptível de restringir a concorrência.
132 Tudo isso é evidente em si mesmo e a objecção das recorrentes de que, na prática, o "preço KEA recomendado" fixado pelo grupo nem sempre foi respeitado pelos seus membros não tem qualquer efeito. Este argumento aceita implicitamente que, pelo menos durante algum tempo, as recorrentes anunciaram os preços KEA recomendados e, por conseguinte, se concertaram sobre eles.
B ° Quanto à concertação sobre os preços de transacção
133 No artigo 1. , n. 3, da decisão, a Comissão também acusa as recorrentes que eram membros da KEA de se terem concertado sobre os preços de transacção no âmbito dessa associação.
134 Muito embora o artigo 1. , n. 3, não dê qualquer indicação a este respeito, deve considerar-se que essa infracção foi cometida nos anos de 1975 e 1976. Nos n.os 120 e 121 da decisão, a Comissão afirma que os preços KEA recomendados foram acatados "pelo menos durante os anos de 1975 e 1976", ao passo que, "em 1977 e 1978, pode ter existido uma discrepância entre o preço recomendado e o preço pago". Em resposta à dedução feita por algumas recorrentes, a partir dessas alegações, de que a opinião da Comissão era que os preços recomendados pela KEA não tinham sido acatados durante os anos de 1979, 1980 e 1981, a Comissão afirmou que, "se teve de restringir a sua investigação aos anos de 1975 e 1976", isso deveu-se ao facto de "não dispor das informações necessárias sobre os preços KEA recomendados durante os anos de 1979 a 1981". Dessas alegações, decorre claramente que o período da infracção deve ser limitado aos anos de 1975 e 1976.
135 Para decidir sobre esta infracção, deve ter-se presente que, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça (v. o acórdão Hoffmann-La Roche, já referido), para respeitar os direitos da defesa, deve ter sido dada às empresas interessadas a oportunidade de se pronunciarem sobre as acusações formuladas contra elas e sobre os documentos em que essas acusações se baseiam, antes de a Comissão adoptar a sua decisão.
136 Por despachos de 25 de Novembro de 1988 e de 16 de Março de 1989, o Tribunal de Justiça designou dois peritos para verificarem, em especial, que os documentos recolhidos pela Comissão durante a investigação e, por conseguinte, antes da comunicação das acusações, justificam a conclusão a que aquela chegou de que os preços praticados pelos produtores eram idênticos aos que haviam anunciado.
137 Resulta claramente do relatório pericial que foi apresentado ao Tribunal de Justiça em 10 de Abril de 1990 que, no momento em que foi elaborada a comunicação das acusações, a Comissão não tinha facturas suficientes para fundamentar a acusação de que os membros da KEA tinham praticado uma infracção, concertando-se sobre os preços de transacção. O anexo 15-1 a esse relatório revelou claramente que, no caso de três membros da associação ° Chesapeake Corporation, Mead Corporation e Scott Paper °, a Comissão não dispunha de qualquer factura, ao passo que, no caso de Crown Zellerbach e de IPS, tinha apenas três e quatro facturas, respectivamente. Além disso, no caso de IPS, esses documentos referiam-se aos anos de 1977 e de 1978, não abrangidos pela infracção.
138 Daqui resulta que, para demonstrar a infracção relativa aos preços de transacção, a Comissão teve de se basear, no essencial, em documentos recolhidos posteriormente à elaboração da comunicação das acusações. Como não foi dada aos membros da KEA a oportunidade de se pronunciarem sobre esses documentos, o artigo 1. , n. 3, da decisão impugnada deve ser anulado, por violação dos direitos da defesa, na parte respeitante a esta infracção.
C ° Quanto à afectação do comércio entre os Estados-membros
139 Nos termos do artigo 85. do Tratado, os comportamentos atentatórios da concorrência poderão não ser objecto de sanções pela Comissão, a menos que sejam também susceptíveis de afectar o comércio entre os Estados-membros.
140 Nos n.os 136 e seguintes da sua decisão, a Comissão considera que é o que acontece no caso em apreço. O nível uniforme de preços resultante das práticas em causa impediu determinadas trocas comerciais, que, de outro modo, teriam ocorrido entre os Estados-membros, em virtude das diferenças da procura, das taxas de câmbio e dos custos de transporte. Estas trocas comerciais teriam sido realizadas por intermediários independentes e por produtores de papel, que revenderiam os seus excedentes de pasta de papel no mercado mais activo de outro Estado-membro.
141 As recorrentes que são membros da KEA contestaram essa afirmação, por três razões fundamentais. Antes de mais, as suas actividades limitam-se à exportação para a Comunidade e não afectam o comércio entre os Estados-membros. Em seguida, não há praticamente qualquer comércio deste produto entre os Estados-membros: as poucas fábricas de pasta de papel existentes na Comunidade utilizam a quase totalidade da sua produção nas suas próprias fábricas de papel. Além disso, tendo em conta os custos de armazenagem, os fabricantes de papel, em geral, só compram pasta de papel para o seu próprio consumo. Finalmente, as recorrentes consideram que a sua parte de mercado era demasiado reduzida para ter um impacto sensível no comércio entre os Estados-membros.
142 A primeira objecção aos dois primeiros argumentos é que, como foi decidido pelo Tribunal de Justiça (v. o acórdão de 30 de Janeiro de 1985, BNIC, 123/83, Recueil, p. 391), qualquer acordo que tenha por objectivo ou por efeito restringir a concorrência pela fixação dos preços de um produto semiacabado é susceptível de afectar o comércio intracomunitário, mesmo que o produto semiacabado não seja ele próprio objecto de comércio entre os Estados-membros, quando tal produto constituir a matéria-prima de outro produto comercializado algures na Comunidade. No caso em apreço, deve salientar-se que a pasta de papel representa 50% a 75% do custo do papel e, por conseguinte, não há dúvida de que a concertação que se realizou sobre os preços da pasta de papel afectou o comércio do papel entre os Estados-membros.
143 Da mesma maneira, o terceiro argumento apresentado pelos membros da KEA, baseado na estreiteza da sua parte de mercado, deve ser rejeitado. A este respeito, deve ter-se presente que, como o Tribunal de Justiça julgou em várias ocasiões (v., por exemplo, o acórdão de 7 de Junho de 1983, Musique Diffusion française, 100/80 a 103/80, Recueil, p. 1825), um acordo, para ser susceptível de afectar o comércio entre os Estados-membros, deve, com base numa série de elementos objectivos de direito ou de facto, permitir encarar, com um grau de probabilidade suficiente, que possa exercer uma influência directa ou indirecta, actual ou potencial, sobre as correntes de trocas comerciais entre os Estados-membros, num sentido susceptível de prejudicar a realização dos objectivos de um mercado único entre os Estados.
144 No caso em apreço, resulta claramente do quadro 2 anexo à decisão que as exportações dos produtores americanos variaram entre 14,10% e 17,67% do consumo total da pasta de papel na Comunidade, durante o período em questão. Como as partes de mercado desta dimensão não são insignificantes, deve admitir-se que a concertação sobre os preços anunciados e as trocas de informações que se realizaram no âmbito da KEA eram susceptíveis de afectar o comércio entre os Estados-membros.
D ° Quanto à aplicação do princípio da não discriminação
145 Finalmente, os membros da KEA criticam o artigo 1. , n. 3, da decisão, com o fundamento de terem sido vítimas de discriminação em relação à Finncell. No n. 135 da decisão, a Comissão exprime a intenção de se ocupar da compatibilidade da Finncell com o artigo 85. do Tratado, numa decisão distinta. Os membros da KEA alegam que a Finncell tem mais clientes na Comunidade do que a KEA e que as regras da Finncell, que exigem que a pasta de papel seja comercializada através dessa organização, têm um carácter mais vinculativo.
146 Esse argumento é irrelevante para a apreciação da presente infracção. O facto de um operador que estava numa situação semelhante à de um recorrente não ter sido objecto de qualquer declaração de infracção pela Comissão não pode em caso algum constituir motivo para afastar a declaração de uma infracção desse recorrente, desde que tenha sido devidamente comprovada.
147 À luz de todas as considerações precedentes, o artigo 1. , n. 3, da decisão deve ser anulado, por violação dos direitos da defesa, na parte em que dá como provado que houve concertação entre os membros da KEA sobre os preços de transacção.
V ° A concertação no âmbito da Fides
148 O artigo 1. , n. 4, acusa St Anne e Finncell, bem como vários produtores suecos, noruegueses, espanhóis e portugueses, de terem trocado, no âmbito da Fides, dados individualizados sobre os preços aplicáveis às vendas de pasta de folhosas, durante o período de 1973-1977.
149 Segundo a decisão, foram os produtores finlandeses, juntamente com os produtores suecos, que tomaram a iniciativa de convocar as reuniões em questão e pretenderam que fosse imposta uma certa disciplina, ou seja, que os produtores se pusessem de acordo sobre um preço de venda, obrigando-se cada um, em relação aos outros, a justificar quaisquer diferenças existentes entre os seus preços e os preços fixados de comum acordo. O produtor canadiano St Anne, pela sua parte, limitou-se a participar na troca de informações sobre os preços de venda, sem ter aceitado qualquer espécie de disciplina.
150 A Comissão fundamenta a sua comprovação desta infracção nos vários documentos e telex mencionados nos n.os 44 a 60 da decisão. Os documentos em questão são relatórios de certas reuniões, cartas em que os produtores informavam as suas filiais ou os seus agentes de vendas dos resultados das reuniões em causa e notas internas de certos produtores relativas a essas reuniões.
151 O produtor canadiano St Anne e a associação finlandesa Finncell pediram a anulação desta parte da decisão.
A ° Quanto à participação de St Anne nas reuniões da Fides
152 St Anne afirma que, na parte que lhe diz respeito, a infracção que consiste na participação nas reuniões no âmbito da Fides não constava da comunicação das acusações.
153 Antes de mais, deve salientar-se, a este respeito, que, quando a comunicação das acusações se refere às reuniões no âmbito da Fides, só menciona os produtores escandinavos e europeus. É o que se passa, em especial, nos n.os 61 e 80, na parte intitulada "Aplicabilidade do artigo 85. , n. 1, do Tratado CEE". A única excepção a esta comprovação consta do n. 32 da comunicação das acusações, que se refere a um telex de 28 de Março de 1977, no qual o produtor espanhol ENCE informava o seu agente Becelco dos preços praticados pelos produtores escandinavos, por um lado, e pelos produtores St Anne, Portucel e Celbi, por outro. No entanto, este documento não pode ser tomado em consideração. Dado que consta da parte relativa à matéria de facto da comunicação das acusações e dele não foi extraída qualquer conclusão na parte respeitante aos fundamentos de direito, não pode servir para determinar o comportamento de que as recorrentes são acusadas. Em seguida, deve notar-se que o anexo VII da comunicação das acusações, que, segundo o seu título, dá uma lista dos "principais membros da secção de pasta de folhosas da Fides", não faz qualquer menção de St Anne.
154 Nestas circunstâncias, deve declarar-se que, na fase da comunicação das acusações, a recorrente St Anne não podia ter tomado conhecimento da acusação relativa à sua participação nas reuniões da Fides nem, por conseguinte, se podia ter defendido quanto a este ponto. Assim sendo, como as regras constantes do artigo 2. , n. 1, e do artigo 4. do Regulamento n. 99 foram ignoradas, o artigo 1. , n. 4, da decisão deve ser anulado, na parte respeitante a St Anne.
B ° Quanto à participação da Finncell nas reuniões da Fides
155 No que diz respeito à sua participação nas reuniões da Fides, a Finncell alega, antes de mais, que as informações e os documentos mencionados nos n.os 57 a 60 da decisão foram recolhidos posteriormente à comunicação das acusações, não lhe tendo sido dada a oportunidade de se pronunciar sobre esses documentos antes da decisão.
156 Como resulta claramente da própria letra da decisão, as informações em causa provêm das respostas dadas por outras empresas à comunicação das acusações. Como a recorrente não pôde apresentar as suas observações quanto a esses documentos antes da decisão, têm de ser excluídos do processo, para não se violar os direitos da defesa.
157 A Finncell também formula uma série de críticas sobre as outras afirmações constantes dos n.os 44 a 56 da decisão. Em primeiro lugar, servem para fundamentar uma concertação da Finncell com produtores canadianos, suecos, noruegueses, espanhóis e portugueses, ao passo que, na comunicação das acusações, só lhe era imputada uma troca de informações com o GEC, um agrupamento de interesse económico francês. Em segundo lugar, alguns desses documentos só se referem aos produtores escandinavos, o que não abrange os produtores finlandeses. Em terceiro lugar, as discussões mencionadas em alguns desses documentos não se referiam ao preço da pasta de papel, mas sim a outros assuntos, tais como a situação do mercado ou a utilização das capacidades de produção. Em quarto lugar, a Finncell sublinha que tinha fixado os seus preços antes dessas reuniões, que, por conseguinte, não tiveram qualquer efeito sobre os seus preços.
158 Estes argumentos não podem ser acolhidos.
159 Antes de mais, a concertação comprovada nos números supracitados da decisão não é diferente, no que toca aos respectivos participantes, da descrita na comunicação das acusações. O n. 80 dos fundamentos de direito da comunicação das acusações, que tem por título "Troca de informações no âmbito da Fides", só se refere, na verdade, à concertação entre o GEC e a Finncell. No entanto, o n. 61 da comunicação das acusações, que também se situa nos fundamentos de direito, refere-se igualmente a uma cooperação em matéria de preços no âmbito da Fides, sob o título "Cooperação entre os produtores escandinavos e outros produtores europeus" e refere-se ao n. 30 do mesmo documento. O n. 30 indica que a Fides tinha "uma secção de 'pasta de folhosas' na qual os principais produtores escandinavos e outras empresas europeias trocam informações sobre o mercado" e remete para a lista de participantes que consta do anexo 7.
160 Em seguida, é evidente que o termo "escandinavo" utilizado nos documentos mencionados nos n.os 48, 49, 51, 52 e 53 da decisão abrange tanto os produtores finlandeses como os produtores suecos. Ainda que assim não fosse, deve salientar-se, além disso, que os documentos referidos nos n.os 45 e 54 mencionam os produtores finlandeses pelo seu nome, enquanto o n. 53 se refere a uma viagem do director do GEC, a Helsínquia, para "estudar a possibilidade de aumentar os preços a partir da segunda metade de 1977". Contrariamente à afirmação da Finncell, esta diligência não pode ser qualificada de unilateral. Os documentos que constam dos n.os 51, 53 e 54 demonstram que a finalidade da viagem era justificar o comportamento do GEC em matéria de preços, perante as críticas formuladas, em especial, pelos produtores escandinavos.
161 Em resposta ao terceiro argumento, deve salientar-se que a maior parte dos documentos considerados faz claramente referência a discussões sobre os preços. É o que acontece, em especial, com os documentos referidos nos n.os 48, 49, 52 e 53.
162 Finalmente, o argumento de que os preços da Finncell eram fixados antes das reuniões da Fides não é relevante, pois o comportamento que a Comissão denuncia no artigo 1. , n. 4, do dispositivo da decisão não é só a participação dos produtores nas reuniões em que esses preços eram fixados, mas também o facto de um produtor impor aos seus concorrentes preços que tinha antecipadamente fixado.
163 Resulta das considerações precedentes que, globalmente considerados, os documentos referidos nos n.os 44 a 56 da decisão comprovam a participação da Finncell nas reuniões da Fides.
C ° Quanto à afectação do comércio entre os Estados-membros
164 As recorrentes finlandesas consideram que, de uma maneira geral, as infracções pretensamente comprovadas pela Comissão não podem ter afectado de modo algum o comércio da pasta de papel entre os Estados-membros.
165 Alegam que a decisão se refere exclusivamente às correntes de trocas comerciais entre os Estados terceiros e os Estados-membros e que não podem tirar-se daí quaisquer conclusões no que diz respeito ao comércio intracomunitário. Além disso, não há praticamente comércio de pasta de papel entre os Estados-membros. Finalmente, tendo em conta o método de fabrico da pasta de papel e os seus vínculos estreitos com os fornecedores, os fabricantes de papel não tinham qualquer interesse no incremento das importações paralelas.
166 Esses argumentos são semelhantes aos apresentados pelos membros da KEA e reclamam a mesma resposta que foi dada no n. 143. Por conseguinte, devem ser rejeitados.
167 À luz das considerações precedentes, o artigo 1. , n. 4, é anulado, por violação dos direitos da defesa, na parte respeitante ao produtor St Anne.
VI ° As cláusulas de proibição de exportação e de revenda
168 As recorrentes canadianas St Anne, Westar, MacMillan e Canfor pedem a anulação do artigo 1. , n. 5, da decisão, em que são acusadas, bem como outros produtores americanos, suecos e noruegueses, de terem incluído, em contratos de venda de pasta de papel, cláusulas que proibiam os compradores de exportarem e de revenderem a pasta de papel.
169 Sem contestarem a existência dessas cláusulas, as recorrentes apresentam três tipos de argumentos.
170 Em primeiro lugar, segundo dizem, essas cláusulas foram copiadas, por inadvertência, de contratos mais antigos e, por negligência, não foram tiradas dos contratos.
171 Em segundo lugar, não tiveram qualquer efeito sobre os co-contratantes: os compradores nunca se consideraram vinculados pelas obrigações aí estipuladas e os vendedores nunca pretenderam impor a aplicação dessas cláusulas. Além disso, elas foram, de um modo geral, tiradas dos contratos logo que foi recebida a comunicação das acusações.
172 Finalmente, as cláusulas controvertidas não tiveram qualquer efeito no comércio entre os Estados-membros. Tendo em conta os vínculos estreitos com os produtores de pasta de papel, os fabricantes de papel tiveram relutância em negociar com os seus concorrentes noutros Estados-membros. E isto tanto mais que os preços eram uniformes em toda a Comunidade e que tais transacções, se se tivessem realizado, teriam acarretado custos de transporte, de carga e de descarga adicionais. Quanto a este mesmo aspecto, alguns produtores também sublinham o facto de só alguns contratos conterem tais cláusulas; pela sua parte, St Anne salienta, em especial, que o volume anual de pasta de papel que vendeu na Comunidade durante o período em questão não representava senão 3% da quantidade total utilizada na Comunidade.
173 Estes argumentos não são de molde a suprimir a infracção comprovada pela Comissão.
174 Antes de mais, deve salientar-se que o artigo 15. , n. 2, do Regulamento n. 17 autoriza a Comissão a aplicar multas às empresas, sempre que, "deliberada ou negligentemente", cometam uma infracção ao disposto no n. 1 do artigo 85. do Tratado. Por conseguinte, o facto de as cláusulas terem sido inseridas nos contratos por negligência não pode ser tomado em consideração.
175 Em segundo lugar, deve ter-se presente que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça (v., por exemplo, acórdãos de 21 de Fevereiro de 1984, Hasselblad, 86/82, Recueil, p. 883, e de 11 de Janeiro de 1990, Sandoz prodotti Farmaceutici/Comissão, C-277/87, Recueil, p. I-883), o facto de uma cláusula, que tem por objectivo restringir a concorrência, não ter sido aplicada pelos co-contratantes, não basta para subtrair essa cláusula à proibição do artigo 85. , n. 1, do Tratado.
176 Finalmente, em resposta ao terceiro argumento apresentado pelas recorrentes, deve declarar-se que, pela sua própria natureza, uma cláusula que tem por objectivo proibir um comprador de revender ou de exportar mercadorias que comprou é susceptível de compartimentar os mercados e, por conseguinte, de afectar o comércio entre os Estados-membros, exigência que ° deve recordar-se (v. acórdão de 13 de Julho de 1966, Consten e Grundig/Comissão, 56/64 e 58/64, Recueil, p. 429) ° apenas se destina a determinar os acordos que são abrangidos pelo direito comunitário.
177 Por conseguinte, deve declarar-se que, ao inserirem cláusulas de proibição de exportação e de revenda nos seus contratos ou nas suas cláusulas contratuais gerais, as recorrentes St Anne, Westar, MacMillan e Canfor infringiram o artigo 85. , n. 1, do Tratado.
VII ° O compromisso
178 As recorrentes americanas ° incluindo Bowater, mas excluindo IPS ° e as recorrentes canadianas Westar, Weldwood, MacMillan, Canfor e British Columbia pediram a anulação total ou parcial do compromisso anexo à decisão.
179 Ao subscrever este compromisso, essas recorrentes ° com a excepção de Bowater ° obrigaram-se a anunciar e a facturar, pelo menos, 50% das suas vendas com destino à Comunidade, na moeda do comprador, a anunciar os seus preços que se manteriam em vigor "até nova ordem", a comunicá-los apenas aos operadores indicados nesse documento, a cessar a concertação e as trocas de informações realizadas no âmbito da KEA e da Fides e a não voltar a impor proibições de exportação ou de revenda aos compradores. Quem assinou esse compromisso obteve uma redução substancial da multa.
180 A Comissão pediu ao Tribunal de Justiça que rejeitasse este pedido por inadmissível. A seu ver, o compromisso constitui um acto unilateral das recorrentes supracitadas ° com a excepção de Bowater, que não o assinou ° e não pode, por conseguinte, ser objecto de recurso, ao abrigo do artigo 173. do Tratado.
181 Este ponto de vista não pode ser acolhido. As obrigações impostas às recorrentes pelo compromisso devem ser equiparadas a injunções para pôr termo a infracções, previstas no artigo 3. do Regulamento n. 17. Resulta do acórdão do Tribunal de Justiça de 6 de Março de 1974, Istituto Chemioterapico Italiano e Commercial Solvents/Comissão (6/73 e 7/73, Recueil, p. 223), que essa disposição autoriza a Comissão a tomar todas as medidas que se revelarem necessárias para pôr termo à infracção verificada e que estas podem consistir tanto em medidas positivas como em medidas negativas. Ao assumir este compromisso, as recorrentes apenas se limitaram, assim, por razões que lhes são próprias, a dar a sua anuência a uma decisão que a Comissão tinha poderes para adoptar unilateralmente.
182 As disposições do compromisso devem ser divididas em duas categorias separadas: a primeira abrange as regras, tais como os compromissos de cessar a concertação e as trocas de informações realizadas no âmbito da KEA e da Fides ou o compromisso de suprimir as cláusulas de proibição de exportação ou de revenda, que obrigam as recorrentes a pôr termo aos comportamentos ilícitos denunciados no artigo 1. , n.os 3, 4 e 5, da decisão; a segunda categoria inclui as regras que têm em vista desmantelar o sistema de anúncios de preços e reduzir a transparência do mercado. A obrigação de anunciar os preços da pasta de papel, que se manteriam em vigor até nova ordem, a de anunciar e de facturar os preços, relativamente a 50% das vendas, na moeda do comprador, bem como a delimitação dos operadores a quem os preços poderão doravante ser comunicados pertencem ao segundo grupo.
183 As razões para anular as regras que fazem parte do segundo grupo derivam logicamente daquilo que o Tribunal de Justiça já decidiu anteriormente. Como não foi demonstrado que o sistema de anúncios de preços não correspondia às necessidades do mercado nem que a transparência que ele tinha criado devia ser considerada artificial, é evidente que as disposições que têm em vista alterar este sistema são desprovidas de objecto.
184 As regras que obrigam as recorrentes a pôr termo a certos comportamentos que se comprovou terem sido adoptados no âmbito da KEA, ou a não trocar informações no âmbito da Fides nem inserir cláusulas de proibição de exportação e de revenda em contratos ou em cláusulas contratuais gerais limitam-se a enunciar as consequências que, de futuro, as destinatárias devem tirar do artigo 1. , n.os 3, 4 e 5, da decisão. Essas injunções continuam a aplicar-se, na medida em que digam respeito à verificação de infracções que não foram anuladas pelo Tribunal de Justiça.
185 Por conseguinte, devem anular-se as disposições do compromisso, na medida em que impõem outras obrigações que não as que resultam de declarações de verificação de infracções feitas pela Comissão que não tenham sido anuladas pelo Tribunal de Justiça.
VIII ° As multas
186 Resulta das considerações precedentes que só devem ser consideradas provadas as infracções ou parte das infracções enunciadas no artigo 1. , n.os 3, 4 e 5, do dispositivo da decisão. Essas infracções são, como se recordará, em primeiro lugar, no caso dos membros da KEA, a concertação sobre os preços anunciados e a troca de dados individualizados sobre os preços no âmbito dessa associação; em segundo lugar, no que toca à Finncell, a troca de dados individualizados sobre os preços com outros produtores no âmbito da Fides; e, em terceiro lugar, no que diz respeito às recorrentes canadianas St Anne, Westar, MacMillan e Canfor, a inserção de cláusulas proibitivas de exportação ou de revenda em contratos ou em cláusulas contratuais gerais.
A ° As infracções relativas à KEA
187 Resulta do n. 146 da decisão que não foi aplicada qualquer multa aos produtores americanos pela sua participação nas actividades da KEA. Como esta acção é a primeira em que o Webb Pomerene Act está em causa, a recorrida admitiu que os produtores interessados não sabiam que o seu comportamento era contrário ao Tratado CEE.
B ° A infracção relativa à Fides
188 Nos termos do artigo 3. da decisão, a recorrente Finncell foi condenada a pagar uma multa de 100 000 ecus por ter trocado informações sobre os preços com outros produtores, no âmbito da Fides.
189 A este respeito, deve ter-se presente que a Finncell desempenhou um papel predominante no âmbito da associação e que a infracção durou de 1973 a 1977. Tendo em conta a gravidade e a duração da infracção, a multa aplicada pela Comissão deve ser mantida.
C ° A infracção relativa às cláusulas proibitivas de exportação e de revenda
190 Nos termos do artigo 3. da decisão, foram aplicadas multas de 125 000 ecus, 150 000 ecus, 200 000 ecus e 150 000 ecus às recorrentes Canfor, MacMillan, St Anne e Westar, respectivamente.
191 Essas multas punem a inclusão de proibições de exportação e de revenda e, no caso das empresas Canfor, MacMillan e Westar, as infracções resultantes da participação na concertação geral sobre os preços anunciados e sobre os preços de transacção, e, quanto à St Anne, as infracções resultantes da participação na concertação geral sobre os preços anunciados e nas reuniões da Fides.
192 Como só foi considerada provada, contra essas recorrentes, a infracção relativa às cláusulas proibitivas de exportação e de revenda, é necessário rever o montante das multas aplicadas.
193 É certo que as cláusulas proibitivas de exportação e de revenda comprometem directamente a liberdade das trocas comerciais entre os Estados-membros e, por conseguinte, constituem infracções graves ao Tratado.
194 No entanto, deve salientar-se que as interessadas cessaram rapidamente esta infracção. O único contrato celebrado pela Westar que continha a cláusula controvertida deixou de produzir efeitos em 31 de Dezembro de 1978, ou seja, muito antes da comunicação das acusações, que data de 4 de Setembro de 1981. As recorrentes Canfor e St Anne suprimiram as cláusulas controvertidas dos seus contratos ou cláusulas contratuais gerais logo após a recepção da comunicação das acusações. Quanto à MacMillan, afirma, sem ser contestada pela Comissão, ter eliminado a cláusula de todos os seus contratos em finais de 1981.
195 Além disso, deve salientar-se que, na sua defesa, todas as recorrentes afirmam, sem serem contestadas pela Comissão, que a inserção da cláusula controvertida em contratos ou cláusulas contratuais gerais foi unicamente resultado da sua negligência.
196 Finalmente, deve notar-se que, no que toca a esta sanção, as recorrentes Canfor e Westar alegam ter sido discriminadas em relação ao produtor ITT Rayonier. Embora este produtor também tivesse inserido cláusulas proibitivas de exportação e de revenda nas suas cláusulas contratuais gerais, não lhe foi aplicada qualquer sanção pela Comissão. A Westar, relativamente à qual a Comissão só indicou um contrato que continha a cláusula controvertida, afirma que a discriminação de que foi vítima foi particularmente flagrante.
197 Este argumento não pode ser acolhido. Quando uma empresa, pelo seu comportamento, tiver violado o artigo 85. , n. 1, do Tratado, não pode furtar-se a toda e qualquer sanção com o fundamento de que outro operador económico não foi multado, quando a situação desse operador nem sequer é objecto de qualquer processo que tenha sido submetido à apreciação do Tribunal de Justiça.
198 À luz das considerações precedentes, a multa aplicada a cada uma das interessadas deve ser fixada em 20 000 ecus.
Quanto às despesas
199 Por despacho de 20 de Março de 1990, o recurso interposto pela Mead Corporation, membro da KEA, foi cancelado do registo e a decisão quanto às despesas foi reservada para final.
200 Nos termos do artigo 69. , n. 5, primeiro parágrafo, do Regulamento de Processo, a parte que desistir deve ser condenada nas despesas, se a outra parte o houver requerido. Como a Comissão requereu que a Mead Corporation suporte as suas próprias despesas, deve decidir-se nesse sentido.
201 Quanto ao resto, nos termos do artigo 69. , n. 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida deve ser condenada nas despesas e, se forem várias as partes vencidas, o Tribunal de Justiça decide sobre a repartição das despesas.
202 No caso em apreço, para efectuar esta repartição, deve fazer-se uma distinção entre as despesas resultantes dos dois relatórios periciais e as outras.
203 As despesas resultantes dos relatórios periciais devem ser suportadas pela Comissão, já que esses relatórios se referem às infracções verificadas pela Comissão nos n.os 1 e 2 do artigo 1. da decisão, que foram anulados pelo Tribunal de Justiça.
204 No que diz respeito às outras despesas, dois terços devem ser suportados pela Comissão, um nono pelas recorrentes membros da KEA, um nono pela Finncell e um nono pelas recorrentes canadianas St Anne, Westar, MacMillan e Canfor.
205 Esta repartição tem em conta o facto de a Comissão ter sido vencida no que respeita à infracção relativa à concertação geral sobre os preços anunciados, à infracção relativa à concertação geral sobre os preços de transacção, à infracção relativa à concertação sobre os preços de transacção no âmbito da KEA e à infracção relativa às trocas de informações no âmbito da Fides, na parte respeitante a St Anne, ao passo que as recorrentes membros da KEA foram vencidas no que respeita às infracções relativas à concertação sobre os preços anunciados e às trocas de informações no âmbito dessa associação, a Finncell no que respeita à infracção relativa à troca de dados individualizados sobre os preços no âmbito da Fides e as recorrentes canadianas supracitadas no que respeita à infracção relativa às cláusulas proibitivas de exportação e de revenda.
206 Finalmente, nos termos do artigo 69. , n. 4, do Regulamento de Processo, o Governo do Reino Unido, que interveio em apoio da Comissão, em vários processos, suportará as suas próprias despesas.
Pelos fundamentos expostos,
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção)
decide:
1) É anulado o artigo 1. , n. 1, da Decisão 85/202/CEE da Comissão, de 19 de Dezembro de 1984, relativa a um processo de aplicação do artigo 85. do Tratado CEE.
2) É anulado o artigo 1. , n. 2, da mesma decisão.
3) É anulado o artigo 1. , n. 3, da mesma decisão, na parte em que dá como provada uma concertação sobre os preços de transacção.
4) É anulado o artigo 1. , n. 4, da mesma decisão, na parte respeitante à recorrente St Anne.
5) É negado provimento aos recursos no que respeita ao artigo 1. , n. 5, da mesma decisão.
6) São anuladas as disposições do compromisso anexo à decisão, na medida em que impõem outras obrigações além das que resultam das infracções verificadas pela Comissão, que não foram anuladas pelo Tribunal de Justiça.
7) São anuladas as multas aplicadas às recorrentes, com excepção da aplicada à Finncell e das aplicadas às recorrentes Canfor, MacMillan, St Anne e Westar, que são reduzidas para 20 000 ecus.
8) A Mead Corporation suportará as suas despesas.
9) As despesas resultantes dos dois relatórios periciais solicitados pelo Tribunal de Justiça serão suportadas pela Comissão.
10) As outras despesas serão suportadas na proporção de dois terços pela Comissão, de um nono pelas recorrentes membros da KEA, de um nono pela Finncell e de um nono pelas recorrentes canadianas St Anne, Westar, MacMillan e Canfor.
11) O Governo do Reino Unido, interveniente, suportará as suas despesas.