RELATÓRIO PARA AUDIÊNCIA

apresentado nos processos apensos 80 e 159/85 ( *1 )

I — Factos e tramitação processual

1.

A legislação neerlandesa proíbe, desde 1969, a venda de pão ao consumidor abaixo de um determinado preço mínimo. Esta regulamentação está, presentemente, contida na Verordening broodprijzen, aprovada em 2 de Setembro de 1976 pelo Produktschap voor Granen, Zaden en Peulvruchten (Instituto Interprofissional de Produtores de Cereais, Sementes e Legumes Secos) através de um decreto real de 26 de Junho de 1974, sendo a sua validade prorrogada todos os anos.

Relativamente ao pão produzido nos Países Baixos, os n.os 1 e 2 do artigo 2.° da Verordening broodprijzen estabelecem que:

«1.

É proibida a venda aos consumidores, pelas empresas dependentes do Produktschap, de pão de fabrico neerlandês a um preço inferior ao preço de venda estabelecido por “besluit” (decisão) do presidente da Produktschap; o preço fixado pode variar de acordo com os diferentes tipos de pão.

2.

O preço mínimo exigível nos termos do número anterior é fixado através de um método de cálculo do preço julgado razoável pelo presidente do Produktschap, após concertação com os ministérios implicados; o método aplicado atende tanto aos custos globais de produção das padarias bem organizadas e que operam de forma rentável como aos custos globais de comercialização das empresas distribuidoras bem organizadas e que operam de forma rentável.»

Relativamente ao pão importado, a Verordening broodprijzen não continha inicialmente qualquer disposição.

O regulamento de 22 de Novembro de 1982 acrescentou à Verordening broodprijzen um artigo 2.° A, respeitante ao pão importado, o qual tem o seguinte conteúdo:

«1.

E proibida a venda aos consumidores de pão que não seja o referido no n.° 1 do artigo 2.°, a um preço inferior ao preço de compra definido no n.° 2, acrescido, por um lado, de uma margem igual aos custos globais de comercialização, calculados de acordo com as disposições do artigo 2.°, das empresas distribuidoras bem organizadas e que operam de forma rentável e, por outro, do imposto sobre o valor acrescentado.

2.

Por ‘preço de compra’ da acepção do n.° 1, deve entender-se o preço, com transporte pago, constituído pelo montante do preço de compra realmente pago ou devido, deduzido o imposto sobre o valor acrescentado; se o preço de compra for pago ou devido a outro título, que não o de uma entrega com transporte pago, será aumentado do montante dos custos suplementares, com excepção do imposto sobre o valor acrescentado, verificados até ao momento da entrega na loja, como os custos de armazenagem e de saída de armazém bem como os custos de transporte, na medida em que estes não estejam compreendidos no preço de compra realmente pago ou devido.»

Através de um regulamento de 7 de Março de 1985, entrado em vigor em 23 de Março de 1985, foi acrescentado ao artigo 2.° A um n.° 3, com o seguinte conteúdo:

«3.

A proibição referida no n.° 1 não se aplica ao pão vendido a um preço igual ou superior ao preço mínimo indicado no artigo 2.° aplicável ao pão produzido nos Países Baixos.»

Por decisão de 23 de Julho de 1984, o presidente do Produktschap voor Granen, Zaden en Peulvruchten fixou o preço mínimo para o pão de 800 gramas, incluindo a margem para os custos globais de comercialização, fixada em 0,17 HFL por esta decisão, em 1,86 HFL, para o pão branco e para o pão escuro cortado e embalado e em 1,79 HFL, para as outras espécies de pão branco ou escuro, com excepção do pão pequeno.

2.

A sociedade Edah BV, que explora supermercados de grande superfície, iniciou, a partir de Janeiro de 1985, uma «acção de promoção» da venda de pão cortado de origem neerlandesa. Colocou assim à venda, em diferentes estabelecimentos, pão produzido nos Países Baixos ao preço de 1,59 HFL em vez do preço mínimo de 1,86 HFL, previsto para este tipo de pão pela referida decisão de 23 de Julho de 1984.

a)

A Nederlandse Bakkerij Stichting, que defende os interesses dos industriais de padaria neerlandeses, bem como diversas padarias situadas na proximidade de filiais da Edah BV, solicitaram ao presidente do Arrondissementsrechtbank de Almelo uma medida provisória com vista a proibir a Edah BV de vender pão de fabrico neerlandês a um preço inferior ao preço mínimo, alegando que a acção de promoção da Edah BV é ilícita e lhes causou um prejuízo considerável.

A Edah BV defendeu-se alegando, nomeadamente, que a regulamentação neerlandesa sobre o preço do pão não é vinculativa, dada a sua incompatibilidade com o direito comunitário.

Por decisão de 13 de Março de 1985, o presidente do Arrondissementsrechtbank de Almelo atendeu o pedido de medida provisória proibindo temporariamente a Edah BV, até ulterior decisão baseada na solução de questões de direito comunitário por este Tribunal, de vender pão a um preço inferior ao fixado nos termos da regulamentação em questão. Por outro lado, decidiu submeter ao Tribunal, nos termos do artigo 177.° do Tratado CEE, as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Será contrária à proibição das medidas de efeito equivalente a restrições quantitativas à importação, estabelecida no artigo 30.° do Tratado CEE, a disposição legal de um Estado-membro que estabelece uma margem de comercialização que representa apenas uma parcela relativamente reduzida do preço definitivo de venda a retalho, quando e na medida em que essa disposição se aplica à venda ao consumidor final, por um retalhista estabelecido no Estado-membro em causa, de um produto importado por um preço inferior ao preço mínimo fixado para esse produto pelo referido Estado-membro, enquanto a venda do produto nacional nas mesmas condições é proibida em quaisquer circunstâncias?»

2)

A regulamentação de um Estado-membro que proíbe a venda ao consumidor final, por um retalhista estabelecido neste Estado-membro, de um certo produto a um preço inferior a determinado preço mínimo é ou não contrária à proibição de toda e qualquer discriminação em razão da nacionalidade, consagrada no artigo 7.° do Tratado CEE, no caso de a proibição de venda a preço inferior se aplicar (sempre) ao produto nacional mas não ao produto importado?»

b)

O Officier van Justitie instaurou no Arrondissementsrechtbank de s'Hertogenbosch procedimentos criminais contra a Edah BV por diversas infracções ao artigo 2° da Verordening broodprijzen cometidas em 29 de Janeiro e em 1 de Março de 1985.

A Edah BV não contestou os factos que lhe foram imputados, mas defendeu-se alegando que a regulamentação neerlandesa sobre o preço do pão era incompatível com os artigos 7.° e 30.° do Tratado CEE.

Por decisão de 20 de Maio de 1985, o Arrondissementsrechtbank de s'Hertogenbosch, embora salientando que os factos que lhe foram submetidos são anteriores à data da entrada em vigor do n.° 3 do artigo 2.° A, 23 de Março de 1985, deliberou submeter ao Tribunal, nos termos do artigo 177.° do Tratado CEE, as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Será incompatível com a proibição de medidas de efeito equivalente a restrições quantitativas à importação, estabelecida no artigo 30.° do Tratado CEE, a regulamentação dos preços que, por força da legislação de um Estado-membro, se aplica às vendas ao consumidor final efectuadas por retalhistas estabelecidos nesse Estado-membro quando essa regulamentação impõe aos produtos importados uma margem fixa, expressa em numerário, a acrescentar ao preço de compra, não representando essa margem mais do que uma parcela relativamente reduzida do preço definitivo de venda a retalho e tendo os produtos nacionais de ser vendidos a um preço mínimo nominal fixado por esse Estado-membro?

2)

A regulamentação de um Estado-membro que proíbe a venda ao consumidor final, por um retalhista estabelecido nesse Estado-membro, de um certo produto a um preço inferior a determinado preço mínimo é ou não contrária à proibição de toda e qualquer discriminação em razão da nacionalidade consagrada no artigo 7.° do Tratado CEE, no caso de a proibição de venda a preço inferior se aplicar (sempre) ao produto nacional mas não ao produto importado?»

3.

A decisão do presidente do Arrondissementsrechtbank de Almelo deu entrada na Secretaria do Tribunal em 1 de Abril de 1975; a decisão do Arrondissementsrechtbank de s'Hertogenbosch foi registada em 28 de Maio de 1985.

Nos termos do artigo 20.° do protocolo sobre o estatuto do Tribunal de Justiça da CEE, foram apresentadas observações escritas, no processo 80/85, pela Nederlandse Bakkerij Stichting, representada por R. A. A. Duk, advogado em Haia, bem como, nos processos 80/85 e 159/85, pela Edah BV, representada por T. R. Ottervanger, advogado do escritório Loeff & van der Ploeg de Roterdão, pelo Governo neerlandês, representado por I. Verkade, secretário-geral do Ministério dos Negócios Estrangeiros, e pela Comissão das Comunidades Europeias, representada por Th. van Rijn, membro do Serviço Jurídico.

Com base no relatório do juiz relator e ouvido o advogado-geral, o Tribunal ordenou que os processos fossem apensados para efeitos da audiência e do acórdão e decidiu abrir a fase oral sem medidas de instrução prévias; o processo foi deferido à Terceira Secção, nos termos do n.° 1 do artigo 95.° do Regulamento Processual.

II — Observações escritas

1. Observações da Edah BV

Relativamente à compatibilidade do regime legal de preços do pão, nas suas duas versões sucessivas, com o artigo 30.o do Tratado CEE, a Edah BV observa que qualquer regulamentação que opere uma distinção entre produtos nacionais e produtos importados deve ser considerada como medida de efeito equivalente a uma restrição quantitativa, a partir do momento em que é susceptível de desfavorecer, por qualquer forma que seja, o escoamento dos produtos importados (acórdão do Tribunal de 29 de Novembro de 1983, Roussel Laboratoria, 181/82, Recueil, p. 3849).

O regime aplicável até 23 de Março de 1985 (primeira questão no processo 159/85) continha uma regra de cálculo para o pão importado, ao passo que ao pão neerlandês se aplicava um preço mínimo fixo. Contanto que o preço mínimo fosse respeitado, o pão neerlandês podia, assim, ser vendido ainda que com prejuízo. Ao invés, quando o preço de compra do pão estrangeiro é superior ao preço mínimo do pão neerlandês, diminuído da margem prescrita para o pão estrangeiro, este último tinha de ser vendido a uma preço superior ao preço mínimo aplicável ao pão neerlandês. Em relação ao pão neerlandês, era lícito ao retalhista contentar-se com uma margem inferior desde que fosse respeitado o preço mínimo. Tratar-se-ia, portanto, de um potencial entrave ao comércio. Os exemplos numéricos que se poderiam dar para esta situação não seriam de forma alguma hipotéticos. O cálculo do preço de custo, sobre o qual a margem incide, ba-sear-se-ia em «empresas bem organizadas que operam de forma rentável». Contudo, algumas empresas, como a Edah BV, estariam melhor organizadas e seriam mais rentáveis graças a uma gama de produtos limitada e a uma grande rotação da mercadoria. Para retalhistas como estes, a importação de pão já não faria qualquer sentido.

O regime aplicável até 23 de Março de 1985 seria, assim, incompatível com o artigo 30.°

O regime em vigor desde 23 de Março de 1985 (primeira questão no processo 80/85), igualmente relativo ao pão importado, impediria o escoamento do produto nas melhores condições possíveis na medida em que, nomeadamente, não permitiria que o preço de compra menos elevado do pão importado se reflectisse no preço de venda ao público: o retalhista seria obrigado a aplicar ao pão importado a margem imposta, excepto se o preço final daí resultante viesse a exceder o preço mínimo fixado para o pão neerlandês; para o pão neerlandês pode, pelo contrário, contentar-se com uma margem inferior. Assim, quando o preço de compra do pão importado é de 1,69 HFL e o do pão neerlandês é de 1,72 HFL, o pão importado, vendido com uma margem obrigatória de 0,17 HFL, deveria ser vendido ao mesmo preço mínimo de 1,86 HFL que o pão neerlandês, ao qual apenas teria sido aplicada, neste exemplo, uma margem de 0,14 HFL. O consumidor não poderia, assim, beneficiar de um preço de custo menos elevado do pão importado.

O regime em vigor desde 23 de Março de 1985 seria, assim, igualmente incompatível com o artigo 30.°

A regulamentação em questão seria, além disso, incompatível com o artigo 30.° por uma razão totalmente diversa, já que se aplicaria a todas as espécies de pão importado, mas apenas a determinadas espécies de pão neerlandês; para os outros tipos de pão neerlandês, o preço seria, assim, inteiramente livre, enquanto que espécies idênticas de pão importado estariam sujeitas ao regime relativo às margens.

O artigo 7. ° do Tratado CEE deveria ser interpretado extensivamente, como abrangendo qualquer discriminação exercida em razão do lugar de estabelecimento das empresas ou da origem dos produtos. O regime de preços em litígio poderia conduzir a que um produto nacional se encontrasse numa posição menos favorável que um produto importado. Os fabricantes neerlandeses seriam, então, desfavorecidos em relação aos seus concorrentes estrangeiros: com preços de compra iguais, os produtos neerlandeses estariam vinculados ao preço mínimo, enquanto os produtos importados poderiam, desde que respeitassem a margem imposta, ser vendidos mais barato.

Tal tendência ter-se-ia manifestado na prática quando, no início do ano de 1985, supermercados concorrentes da Edah começaram a vender grandes quantidades de pão importado a preços inferiores ao preço mínimo em vigor para o pão neerlandês. A Edah viu-se obrigada a reagir comprando pão neerlandês a preços iguais ou quase iguais aos cobrados pelas padarias estrangeiras aos seus bons clientes. O regime de preços teria então impedido os industriais de padaria neerlandeses de competir com os seus concorrentes estrangeiros.

Tratar-se-ia de uma discriminação de sentido contrário, em detrimento dos fabricantes neerlandeses. Esta discriminação estaria incluída no domínio de aplicação do Tratado porque o sistema em questão falseava a concorrência e visava influenciar as correntes comerciais. O legislador neerlandês podia atingir o mesmo fim através de uma regulamentação menos gravosa e conforme com o Tratado, prescrevendo, indistintamente para os produtos nacionais e importados, uma margem do lucro mínima fixa, que apenas constituísse uma parte relativamente pequena do preço de venda ao público.

Concluindo, a Edah considera que o regime de preços é incompatível com o artigo 7.° do Tratado CEE.

2. Observações da Nederlandse Bakkerij Stichting

Relativamente ao artigo 30. ° do Tratado CEE, o regime de preços em vigor desde 23 de Março de 1985 não proíbe ao retalhista a venda abaixo do preço mínimo do pão neerlandês de pão importado a preços relativamente baixos, contanto que seja respeitada a margem fixa; em compensação, quando o preço de compra do pão importado é relativamente alto, o retalhista não seria obrigado a aplicar a margem. Não haveria, assim, qualquer entrave à comercialização dos produtos importados, dado que o montante da margem imposta seria igualmente um factor de cálculo do preço mínimo do pão neerlandês e que esta margem apenas deveria ser aplicada ao pão importado quando o seu preço de venda fosse inferior ao preço mínimo do pão neerlandês.

Resulta dos acórdãos do Tribunal de 24 de Janeiro de 1978 (van Tiggele, 82/77, Recueil 1978, p. 25), de 29 de Novembro de 1983 (Roussel, 181/82, Recueil 1983, p. 3849), de 10 de Janeiro de 1985 (Le-clerc/Au blé vert, 229/83, Recueil 1985, p. 1) e de 29 de Janeiro de 1985 (Cullet//Leclerc, 231/83, Recueil 1985, p. 305), que o Tribunal deixa aos Estados-membros a competência para regulamentar os preços. Esta competência seria desprovida de conteúdo real se apenas pudesse ser exercida relativamente aos produtos nacionais. O simples facto de uma regulamentação fazer distinção entre produtos nacionais e produtos importados não a torna incompatível com o artigo 30.°, se ela não favorecer, por qualquer forma que seja, os produtos importados. Tratando-se de um preço mínimo, esse efeito verificar-se-ia se a vantagem adquirida na compra dos produtos importados fosse anulada.

A regulamentação em questão não teria qualquer efeito semelhante, mas teria apenas em vista impedir que o pão importado fosse vendido sem margem razoável a um preço inferior ao preço mínimo em vigor para o produto nacional, e manter uma situação económica sã, impedindo os supermercados de grande superfície de atrair clientes por meio de campanhas baseadas no preço do pão. A margem imposta constituiria uma pequena parcela do preço de venda ao público. Qualquer importador poderia explorar integralmente uma vantagem adquirida na compra, já que nenhum preço mínimo lhe seria aplicável.

Deveria, portanto, responder-se à primeira questão colocada no processo 80/85 da seguinte forma:

«A disposição legal de um Estado-membro aplicável unicamente aos artigos importados e que institui uma margem que apenas representa uma parte relativamente pequena do preço de venda ao público não constitui uma medida proibida de efeito equivalente a uma restrição quantitativa à importação, na acepção do artigo 30.° do Tratado CEE, quando e na medida em que esta disposição seja aplicável à venda ao público, por qualquer retalhista estabelecido nesse Estado, de um produto importado a um preço inferior ao preço mínimo fixado pelo Estado em causa para um produto semelhante nele fabricado. O facto de a venda do produto nacional nas mesmas condições ser, em qualquer circunstância, proibida é irrelevante.»

O artigo 7. ° do Tratado CEE diria exclusivamente respeito à discriminação de pessoas em razão da nacionalidade e não a uma distinção entre mercadorias de acordo com o lugar em que foram produzidas. Este entendimento seria confirmado pelos acórdãos do Tribunal de 30 de Novembro de 1978 (Bussone, 31/78, Recueil 1978, p. 2429) e de 14 de Julho de 1981 (Oebel, 155/80, Recueil 1981, p. 1993).

As discriminações de sentido contrário apenas seriam proibidas em matéria de livre circulação de pessoas. Noutros domínios, essa proibição apenas existiria quando se pudesse basear em disposições específicas do Tratado. Pelo contrário, o artigo 7.° não se lhes oporia, conforme resulta dos acórdãos de 14 de Julho de 1981 (já referido) e de 25 de Janeiro de 1983 (Smit, 126/82, Recueil 1983, p. 73).

Cada Estado-membro teria o direito de sujeitar os produtos nacionais a um regime de preços mais severo do que o que vigora para os produtos importados. Se o preço mínimo absoluto se aplicasse ao pão importado, poderia, pelo contrário, tratar-se de uma medida de efeito equivalente a uma restrição quantitativa à importação.

Deveria, pois, responder-se à segunda questão da seguinte forma:

«A regulamentação de um estado-membro que proíba a venda ao público, por qualquer retalhista estabelecido nesse Estado, de um certo produto a um preço inferior ao preço mínimo determinado não é incompatível com a proibição de discriminação exercida em razão da nacionalidade, consagrada no artigo 7.° do Tratado CEE, quando a proibição de venda a um preço inferior não se aplica ao produto importado mas (sempre) ao produto nacional».

3. Observações do Governo neerlandês

A regulamentação sobre o preço do pão teria por finalidade prevenir uma concorrência excessiva através de preços de promoção entre os vendedores de pão tradicionais e outros circuitos de venda ou os supermercados de grande superfície e garantir assim um bom abastecimento de pão. Dado que não havia praticamente importações de pão, a regulamentação apenas teria sido aplicada, de início, ao pão neerlandês. Em 1982, teria surgido a necessidade de a alargar ao pão importado, não pela importância das importações, mas em resultado da perturbação que teriam provocado algumas vendas de pão importado a preços muito baixos nos supermercados de grande superfície. Foi, contudo, de forma abusiva que a Produktschap negligenciou ligar o preço mínimo do pão importado, calculado por meio da margem fixada, ao preço mínimo do pão neerlandês. Esta omissão teria sido suprida pelo regulamento de 7 de Março de 1985.

Relativamente ao artigo 30. ° do Tratado CEE, deveriam distinguir-se três situações diversas.

A primeira seria aquela, criada pelo regime aplicável até 23 de Março de 1985, mas não desejada, em que a margem imposta obrigaria à venda de pão importado a um preço superior ao preço mínimo para o pão neerlandês. Tal situação poderia colocar o pão importado numa situação concorrencial desfavorável, suscitando assim dúvidas quanto à sua compatibilidade com o artigo 30.° A partir de 23 de Março de 1985, esta situação deixou de se verificar.

Uma segunda situação, que surge ao abrigo do regime aplicável a partir de 23 de Março de 1985, seria aquela em que o pão importado pode ser vendido, através da margem imposta, a um preço inferior ao preço mínimo para o pão neerlandês. Esta não seria abrangida pelo artigo 30.° porque não haveria aí qualquer entrave ao comércio intracomunitário: a vantagem de preço do pão importado poderia tornar-se efectiva. Esta situação seria mesmo conforme ao acórdão do Tribunal de 24 de Janeiro de 1978 (van Tiggele, 82/77, Recueil 1978, p. 21) na medida em que era evitada uma neutralização da vantagem concorrencial dos produtos importados. Seria irrelevante o facto de se tratar, no caso, de uma disposição específica para os produtos importados.

A terceira situação a individualizar seria a de o pão neerlandês ser desfavorecido em resultado de um preço mínimo absoluto, inaplicável ao pão importado. Tratar-se-ia, pois, de saber se o artigo 30.° contém uma proibição de discriminação em sentido contrário. A proibição de medidas nacionais que tenham por efeito penalizar os produtos nacionais não seria exigida pela unificação do mercado e pela liberalização das trocas com o exterior. Diversamente do que se passa no domínio da livre circulação das pessoas, a discriminação em sentido contrário não seria incompatível com as disposições do Tratado em matéria de livre circulação de mercadorias (ver acórdãos de 13 de Março de 1979, Peureux, 86/78, Recueil 1979, p. 897; e de 7 de Fevereiro de 1984, Jongeneel Kaas, 237/83, Recueil 1984, p. 483). Os Estados-membros seriam livres de adoptar as medidas relativas ao comércio nacional ou aos produtos nacionais.

Deveria, pois, responder-se negativamente às primeiras questões, relativas ao artigo 30.°

O artigo 7. ° do Tratado CEE apenas poderia ser invocado se tivesse efeito directo na ordem jurídica interna. Ora, o Tribunal apenas teria admitido isso relativamente a outras disposições mais específicas, como os artigos 48.° e 52.° Tendo em conta a expressão «no domínio de aplicação» do presente Tratado, o artigo 7.o não teria um âmbito autônomo. Não poderia assim ter um efeito directo independentemente do conteúdo de disposições específicas. Por outro lado, o artigo 30.° deveria considerar-se, a este respeito, como lex specialis. Em todo o caso, pelas mesmas razões que foram invocadas a propósito do artigo 30.°, o artigo 7.° não proibiria a discriminação em sentido contrário no domínio da livre circulação das mercadorias.

As questões relativas ao artigo 7.° deveriam, assim, ser respondidas igualmente de forma negativa.

4. Observações da Comissão

No que respeita ao artigo 30. ° do Tratado CEE, como no caso do acórdão do Tribunal de 29 de Novembro de 1983 (Roussel Laboratoria, 181/82, Recueil 1983, p. 3849), tratar-se-ia, no caso concreto, de um regime de preços distinto para os produtos nacionais e para os produtos importados: para os produtos nacionais havia um preço mínimo fixo, ao passo que, para o pão importado, a base do sistema era constituída por uma margem de comercialização imposta. Esse regime de preços deveria considerar-se uma medida de efeito equivalente quando fosse, por qualquer forma, susceptível de entravar o escoamento dos produtos importados.

Se o regime aplicável até 23 de Março de 1985 concede um tratamento em parte mais favorável ao pão importado, na medida em que, contrariamente ao pão produzido nos Países Baixos, o pão importado poderia, contanto que respeitasse a margem, ser vendido a um preço inferior ao preço mínimo, quando os custos de produção fossem mais baixos, este sistema implicaria, não obstante, uma discriminação, na medida em que, para um mesmo preço de custo, o pão produzido nos Países Baixos apenas devia observar o preço mínimo, mesmo quando a margem de comercialização fosse inferior a 0,17 HFL, enquanto o pão importado deveria, em qualquer circunstância, respeitar essa margem, mesmo que o preço total ultrapassasse o preço mínimo. Esta discriminação poderia dificultar o escoamento do pão importado.

Em compensação, na versão da regulamentação em vigor desde 23 de Março de 1985, a margem imposta apenas se aplica quando o preço de venda do pão importado for inferior ao preço mínimo. Poder-se-á perguntar se esta margem não tem uma certa finalidade proteccionista, ao evitar que a diferença entre o preço do pão importado e o do pão neerlandês se torne demasiado grande. Mas o escoamento do pão importado não se tornará mais difícil se os custos de produção, eventualmente menos elevados, desse pão puderem ser repercutidos sobre o preço facturado ao consumidor.

Por outro lado, nas duas versões do regime legal, o preço do pão importado seria aplicável a qualquer tipo de pão, enquanto o preço mínimo apenas se aplica aos tipos de pão mencionados. Devendo determinados tipos de pão importado respeitar a margem de comercialização, enquanto para os tipos correspondentes de pão neerlandês os preços são livres, o escoamento daqueles pode, portanto, ser dificultado pela regulamentação em questão.

A segunda questão colocada nos dois processos, relativa ao artigo 7. ° do Tratado CEE, suscita o problema da discriminação em sentido contrário, na medida em que a regulamentação em questão proíbe, em relação aos produtos nacionais, a venda abaixo do preço mínimo fixado, autorizando-a contudo para os produtos importados. Em numerosos casos, o artigo 30.° determinaria a não aplicação aos produtos importados de determinadas disposições de uma regulamentação nacional. O Tribunal ainda não se teria pronunciado sobre a questão de saber se, nos termos do artigo 7°, os produtos nacionais devem, em tal situação, continuar a satisfazer as exigências da regulamentação nacional. O artigo 7° apenas proibiria as discriminações em razão da nacionalidade «no domínio de aplicação do presente Tratado» (ver acórdão de 13 de Fevereiro de 1985, Gravier, 293/83, Recueil 1985, p. 593). A situação de um regime que apenas se aplica à venda de produtos nacionais no território do Estado-membro em causa não apresentaria nenhuma ligação a qualquer das situações reguladas pelo direito comunitário (ver acórdão de 27 de Outubro de 1982, Morson e Jhanjan, processos apensos 35 e 36/82, Recueil 1982, p. 3723). Não haveria, neste caso, qualquer transporte de mercadorias entre dois Estados-membros. Tratar-se-ia, assim, de uma situação puramente interna, regulada apenas pelo direito nacional.

Em conclusão, a Comissão propõe que se responda às questões suscitadas da seguinte forma:

«1.

a)

A regulamentação de um Estado que estabelece para a venda de produtos importados uma margem que apenas representa uma percentagem relativamente pequena do preço de venda ao público, enquanto para os produtos nacionais existe um preço nominal mínimo, é incompatível com a proibição enunciada no artigo 30.° do Tratado CEE.

b)

Tal regulamentação não é incompatível com esta proibição quando e na medida em que se aplique à venda a um preço inferior ao preço mínimo fixado pelo Estado-membro para os produtos nacionais e quando e na medida em que entre as espécies de produtos a que se aplica a margem imposta não se encontrem outras para além das que estão sujeitas ao regime de preço mínimo.

2.

A regulamentação de um Estado-membro que proíbe a venda ao público de um determinado produto nacional a um preço inferior a um dado preço mínimo, mas que não é aplicável aos produtos importados, não é incompatível com a proibição de qualquer discriminação exercida em razão da nacionalidade, prevista no artigo 7.° do Tratado CEE.»

U. Everling

Juiz relator


( *1 ) Língua de processo: neerlandes.


ACÓRDÃO DO TRIBUNAL (Terceira Secção)

13 de Novembro de 1986 ( *1 )

Nos processos apensos 80 e 159/85,

que têm por objecto pedidos dirigidos ao Tribunal, nos termos do artigo 177.° do Tratado CEE,

no processo 80/85, pelo Arrondissementsrechtbank de Almelo, no âmbito do litígio pendente neste Tribunal entre

Nederlandse Bakkerij Stichting, Haia, bem como Theodoms Cornells Dam, Firma Bos, Johannes Bernardus Busch e Jacobus Bos, Enschede,

e

Edah BV, Helmond,

assim como

no processo 159/85, pelo Arrondissementsrechtbank de s'Hertogenbosch, no àmbito do processo penai pendente neste Tribunal entre

Officier van Justitie, s'Hertogenbosch,

e

Edah BV, Helmond,

com vista a obter uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação dos artigos 7.° e 30.° do Tratado CEE,

O TRIBUNAL (Terceira Secção),

constituído pelos Srs. Y. Galmot, presidente de secção, U. Everling e J. C. Moitinho de Almeida, juízes,

advogado-geral: J. Mischo

secretário: D. Louterman, administradora

considerando as observações apresentadas:

em representação da Nederlandse Bakkerij Stichting, por R. A. A. Duk, advogado em Haia, oralmente e por escrito,

em prepresentação de Edah BV, por T. R. Ottervanger, advogado em Roterdão, oralmente e por escrito,

em representação do Governo neerlandês, por I. Verkade, secretário-geral do Ministério dos Negócios Estrangeiros, por escrito, e por G. M. Borchardt, oralmente,

em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por Th. van Rijn, membro do serviço Jurídico, oralmente e por escrito,

visto o relatório para audiência e após a realização desta em 29 de Maio de 1986,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 24 de Setembro de 1986,

profere o presente

ACÓRDÃO

1

Por decisão de 13 de Março de 1985, entrada na Secretaria do Tribunal em 1 de Abril do mesmo ano, o presidente do Arrondissementsrechtbank de Almelo e, através de decisão de 20 de Maio de 1985, entrada no Tribunal a 28 do mesmo mês, o Arrondissementsrechtbank de s'Hertogenbosch submeteram, nos termos do artigo 177.° do Tratado CEE, cada um duas questões prejudiciais relativas à interpretação dos artigos 7.° e 30.° do Tratado CEE e do princípio geral da não discriminação. Dado que estas questões têm um objecto idêntico ou conexo, o Tribunal decidiu apensar os processos para os fins do processo e da prolação do acórdão.

2

Estas questões foram suscitadas no quadro de dois processos dirigidos contra a sociedade Edah BV, que explora grandes supermercados nos Países Baixos. Os dois processos dizem respeito à venda de pão pela Edah BV a um preço inferior ao preço mínimo de venda, fixado de acordo com a regulamentação neerlandesa sobre o preço de venda do pão (Verordening broodprijzen). O processo em apreciação pelo presidente do Arrondissementsrechtbank de Almelo tem-por objecto um pedido de providências cautelares apresentado pela Nederlandse Bakkerij Stichting, que defende os interesses dos industriais de padaria neerlandeses, bem como por vários donos das padarias cujos estabelecimentos estão situados nas proximidades de um outro explorado pela Edah BV, com vista a obter a proibição da prática por esta de preços inferiores ao mínimo estabelecido. No Arrondissementsrechtbank de s'Hertogenbosch a Edah BV é acusada pelo Officier van Justitie, no quadro de um processo penal, de infracção à regulamentação já referida.

3

A Verordening broodprijzen, aprovada em 2 de Setembro de 1976 pelo Produktschap voor Granen, Zaden en Peulvruchten (Instituto interprofissional de Produtores de Cereais Sementes e Legumes Secos) proíbe, no seu artigo 2.°, a venda de pão de fabrico neerlandês a um preço inferior ao preço mínimo de venda. Para fixar este preço mínimo, o presidente do Produktschap deve, nomeadamente, ter em conta os custos globais de produção e de distribuição das empresas de panificação bem organizadas e que operam de forma rentável.

4

Em 1982, foi acrescentado à Verordening broodprijzen um artigo 2.° A, a fim de proibir a venda aos consumidores de pão de fabrico não neerlandês a um preço inferior ao preço de compra acrescido de uma margem igual ao conjunto dos custos de distribuição das empresas bem estruturadas e rentáveis e ainda do imposto sobre o valor acrescentado. Desde 23 de Março de 1985, devido a um regulamento de 7 de Março de 1985, a proibição relativa ao pão de fabrico não neerlandês deixou de aplicar-se ao pão vendido a um preço igual ou superior ao preço mínimo aplicável ao pão produzido nos Países Baixos.

5

De Janeiro a Março de 1985, a Edah BV vendeu, no âmbito de uma acção de promoção dos seus hipermercados, pão cortado de fabricação neerlandesa ao preço de 1,59 HFL, em vez do preço mínimo de 1,86 HFL, aplicável na altura a esse tipo de pão nos termos de uma decisão do presidente do Produktschap de 23 de Julho de 1984. Nos processos que deram origem ao reenvio, a Edah BV justificou a não observância do preço mínimo alegando que a regulamentação neerlandesa sobre o preço mínimo do pão era incompatível com os artigos 7.° e 30.° do Tratado CEE.

6

Os dois tribunais nacionais encarregados de dirimir o litígio decidiram então submeter ao Tribunal duas questões sobre a interpretação destes artigos. O Arrondissementsrechtbank de s'Hertogenbosch, referindo-se à regulamentação neerlandesa anterior a 23 de Março de 1985, colocou uma primeira questão assim formulada:

«Será incompatível com a proibição de medidas de efeito equivalente a restrições quantitativas à importação, estabelecida no artigo 30.° do Tratado CEE, a regulamentação dos preços que, por força da legislação de um Estado-membro, se aplica às vendas ao consumidor final efectuadas por retalhistas estabelecidos nesse Estado-membro quando essa regulamentação impõe aos produtos importados uma margem fixa, expressa em numerário, a acrescentar ao preço de compra, não representando essa margem mais do que uma parcela relativamente reduzida do preço definitivo de venda a retalho e tendo os produtos nacionais de ser vendidos a um preço mínimo nominal fixado por esse Estado-membro?»

7

A primeira questão colocada pelo presidente do Arrondissementsrechtbank de Almelo, relativa à regulamentação do preço do pão em vigor desde 23 de Março de 1985, é do seguinte teor:

«Será contrária à proibição das medidas de efeito equivalente a restrições quantitativas à importação, estabelecida no artigo 30.° do Tratado CEE, a disposição legal de um Estado-membro que estabelece uma margem de comercialização que representa apenas uma parcela relativamente reduzida do preço definitivo de venda a retalho, quando e na medida em que essa disposição se aplica à venda ao consumidor final, por um retalhista estabelecido no Estado-membro em causa, de um produto importado por um preço inferior ao peço mínimo fixado para esse produto pelo referido Estado-membro, enquanto a venda do produto nacional nas mesmas condições é proibida em quaisquer circunstâncias?»

8

Além disso, os Tribunais autores do reenvio colocaram ainda uma segunda questão formulada, em termos semelhantes, da seguinte maneira:

«A regulamentação de um Estado-membro que proíbe a venda ao consumidor final, por um retalhista estabelecido neste Estado-membro, de um certo produto a um preço inferior a determinado preço mínimo é ou não contrária à proibição de toda e qualquer discriminação em razão da nacionalidade consagrada no artigo 7.° do Tratado CEE, no caso de a proibição de venda a preço inferior se aplicar (sempre) ao produto nacional mas não ao produto importado?»

9

Deve recordar-se, antes de mais, que, ao estatuir no âmbito do artigo 177.° do Tratado CEE, este Tribunal não pode pronunciar-se sobre a compatabilidade com o direito comunitário de uma disposição legislativa ou regulamentar nacional. Pode, contudo, fornecer ao Tribunal nacional elementos de interpretação do direito comunitário que permitirão àquela resolver o problema jurídico submetido à sua apreciação.

Sobre o artigo 30.°

10

Assim entendidas, as primeiras questões submetidas pelos tribunais de reenvio visam o esclarecimento da interpretação do artigo 30.° do Tratado CEE face a uma regulamentação nacional que fixa um preço de venda a retalho, como a que vigora para o pão nos Países Baixos, nas suas versões anterior e posterior a 23 de Março de 1985, a qual estabelece a obrigação de praticar um preço mínimo de montante fixo na venda de pão de fabrico nacional e de observar uma determinada margem de comercialização na de pão importado.

11

No domínio da aplicação da proibição de medidas de efeito equivalente a restrições quantitativas à importação estabelecida pelo artigo 30.° aos regimes estaduais de regulamentação de preços, o Tribunal já declarou (ver acórdãos de 26 de Novembro de 1976, Tasca, 65/75, Recueil 1976, p. 291, de 24 de Janeiro de 1978, Van Tiggele, 82/77, Recueil 1978, p. 25 e de 29 de Janeiro de 1985, Cullet, 231/83, Recueil 1985, p. 305) que esses regimes, aplicáveis indistintamente a produtos nacionais e importados, não constituem uma restrição quantitativa, mas podem produzir esse efeito quando os preços se situem a um nível tal que os produtos importados fiquem desfavorecidos em relação aos produtos nacionais análogos, quer porque eles não poderiam ser comercializados lucrativamente nas condições estabelecidas, quer porque a vantagem concorrencial resultante dos preços de custo inferiores seria neutralizada.

12

No entanto, as questões suscitadas não se referem a uma regulamentação aplicável indistintamente aos produtos nacionais e aos produtos importados, mas a regras diversas para os dois grupos de produtos, contidas em disposições diferentes adoptadas em momentos distintos, e que se distinguem igualmente quanto ao fundo. Como o Tribunal entendeu no acórdão de 29 de Novembro de 1983 (Roussel Laboratoria, 181/82, Recueil 1983, p. 3849), essa regulamentação diferenciada para os dois grupos de produtos deve ser considerada como uma medida de efeito equivalente a uma restrição quantitativa, já que é susceptível de prejudicar, por qualquer forma que seja, o escoamento dos produtos importados.

13

Quando, por força de tal regulamentação de preços, como era o caso da versão da Verordening broodprijzen em vigor até 23 de Março de 1985, a margem de distribuição obrigatória vem juntar-se ao preço de compra do pão importado, qualquer que seja o valor deste, isso equivale, em certos casos, a impor à venda de pão importado um preço superior ao preço mínimo aplicável ao pão de fabrico nacional. Pode, assim, criar-se ao pão importado uma desvantagem concorrencial relativamente ao preço de venda ao público e desfavorecer o seu escoamento. Uma regulamentação que pode ter tal efeito é susceptível de afectar o comércio entre os Estados-membros, sendo assim incompatível com o artigo 30.° do Tratado CEE.

14

Em compensação, quando, como acontece na versão da Verordening broodprijzen em vigor depois de 23 de Março de 1985, a norma que impõe a observância da margem de comercialização não se aplica ao pão importado vendido a um preço igual ou superior ao preço mínimo aplicável ao pão de fabrico nacional, a referida desvantagem concorrencial é evitada. Não se verificando esta desvantagem, o escoamento do pão importado não é prejudicado nem as trocas entre os Estados-membros são afectadas por essa regulamentação.

15

Não se pode considerar, como queria a Edah BV, que tal regulamentação é, não obstante, susceptível de afectar o comércio, na medida em que impede os retalhistas particularmente bem organizados e que operam de forma rentável de repercutir nos preços a vantagem concorrencial de que dispõem quando vendem pão importado. Na verdade, quando a mesma margem, correspondente aos custos de comercialização de empresas distribuidoras bem organizadas e que operam de forma rentável, é imposta à venda de pão importado e é tomada em conta na fixação do preço mínimo do pão de fabrico nacional, os produtos nacionais e os importados são colocados em pé de igualdade relativamente à repercussão da vantagem concorrencial que um retalhista tira eventualmente da organização e da rentabilidade da sua actividade, na medida em que a vantagem concorrencial eventualmente resultante de um preço de custo inferior do produto importado pode ser repercutido e não é neutralizado. O escoamento dos produtos importados não é assim, de qualquer forma, prejudicado.

16

Com vista a demonstrar que, mesmo na versão em vigor desde 23 de Março de 1985, a regulamentação em causa é susceptível de afectar o comércio, a Edah BV referiu-se ainda ao seguinte cálculo: quando o preço de compra do pão importado é de 1,69 HFL e o do pão neerlandês de 1,72 HFL, o primeiro tem de ser vendido com a margem obrigatória de 0,17 HFL, ao preço de 1,86 HFL, ao passo que para o pão neerlandês, também vendido ao preço mínimo de 1,86 HFL, o retalhista pode contentar-se com uma margem de distribuição de 0,14 HFL. Para a Edah BV, cuja opinião foi partilhada, neste ponto, pela Comissão durante a audiência, este exemplo numérico revela que o pão importado, em alguns casos, é objecto de discriminação.

17

E certo que na hipótese invocada pela Edah BV o retalhista não pode fazer beneficiar o consumidor do preço de custo mais baixo do pão importado. Deve, no entanto, salientar-se que a margem de comercialização do pão importado é, então, superior à do pão nacional, e que esta circunstância pode levar o retalhista a favorecer a venda do primeiro em detrimento do segundo. Sendo assim, não se pode concluir que a importação de pão seja afectada.

18

Também não pode aceitar-se a tese da Edah BV segundo a qual tal regulamentação é incompatível com o artigo 30.° do Tratado CEE porque permite, eventualmente, vender pão importado a preços baixos a um preço de venda inferior ao peço mínimo aplicável ao pão de fabrico nacional. De facto, este artigo visa eliminar os obstáculos à importação de mercadorias e não garantir, em qualquer caso, um tratamento igual às mercadorias de origem nacional e importadas. Uma desigualdade de tratamento que não é susceptível de criar obstáculos à importação ou de desfavorecer a comercilização de mercadorias importadas, antes a favorecendo, não é abrangida pela proibição imposta por este artigo.

19

Finalmente, não se revela necessário analisar a tese da Edah BV e da Comissão segundo a qual aquela regulamentação é incompatível com o artigo 30.° do Tratado CEE, na medida em que o preço mínimo é fixado para algumas espécies determinadas de pão de fabrico nacional, enquanto a margem de comercilização se aplica a qualquer pão importado. De facto, uma vez que nada, nas decisões de reenvio, indica que esta diferença, partindo do princípio de que ela não é puramente formal, possa ter qualquer papel de relevo no quadro dos processos em curso nos tribunais nacionais, o Tribunal entende que a questão de saber se o artigo 30.° se opõe a tal diferença de tatamento não lhe foi submetida pelos tribunais autores do reenvio.

20

Face ao que precede, deve responder-se às primeiras questões submetidas pelo presidente do Arrondissementsrechtbank de Almelo e pelo Arrondissementsrechtbank de s'Hertogenbosch que o artigo 30.° do Tratado CEE deve ser interpretado o sentido de que:

constitui uma medida equivalente a uma restrição quantitativa à importação a regulamentação nacional que estabelece um montante fixo como preço mínimo de venda ao público do pão de fabrico nacional e que impõe para a venda de pão importado uma margem de comercialização correspondente aos custos de comercialização de empresas distribuidoras bem organizadas e que operam de forma rentável, pela qual é aumentado o preço de compra, desde que tal margem de comercialização seja obrigatória, mesmo quando o preço de venda que dela resulte for superior ao preço mínimo aplicável ao pão de fabrico nacional;

tal regulamentação não constitui uma restrição quantitativa à importação quando a margem de comercialização na venda de pão importado, que é a mesma que se tem em conta para a determinação do preço mínimo fixado para o pão de fabrico nacional, não é obrigatória para o pão importado vendido a um preço igual ou superior a esse preço mínimo;

este artigo não constitui obstáculo a que, no quadro de tal regulamentação, o preço de venda do pão importado resultante da aplicação da margem de comercialização possa, eventualmente, ser inferior ao preço mínimo fixado para o pão de fabrico nacional.

Sobre o artigo 7.° e a proibição de discriminação

21

As segundas questões submetidas pelos tribunais reenviantes têm em vista apurar se o artigo 7.° do Tratado CEE ou o princípio geral da não discriminação se opõem a que, no âmbito de uma regulamentação como a que está em causa no presente caso, o preço de venda para o pão importado possa, eventualmente, ser inferior ao preço mínimo fixado para o pão de fabrico nacional, e, assim, desfavorecer este último em relação aos produtos importados.

22

A desigualdade de tratamento assinalada diz respeito a uma distinção estabelecida por uma regulamentação nacional entre mercadorias em razão da sua origem e entre comerciantes em razão da mercadoria por estes vendida. Ao invés, no caso presente não há qualquer distinção entre operadores económicos em razão da sua nacionalidade ou lugar de estabelecimento. Não pode, pois, falar-se de «uma discriminação exercida em razão da nacionalidade», mesmo disfarçada ou indirecta, na acepção do artigo 7.° do Tratado CEE.

23

Tratando-se do princípio geral da não discriminação, deve observar-se que o tratamento desfavorável de produtos de fabrico nacional em relação aos produtos importados, ou de comerciantes que vendem os produtos de fabrico nacional em relação aos que vendem produtos importados, dado por um Estado-membro num sector não sujeito a regulamentação comunitária ou a harmonização das legislações nacionais, não releva do âmbito de aplicação do direito comunitário.

24

Deve assim responder-se à segunda das questões colocadas pelo Arrondissementsrechtbank de Almelo e pelo Arrondissementsrechtbank de s'Hertogenbosch que nem o artigo 7° do Tratado CEE nem o princípio geral da não discriminação do direito comunitário se aplicam a uma desigualdade de tratamento que se traduza em, no quadro de tal regulamentação, o preço de venda do pão importado poder, eventualmente, ser inferior ao preço fixado para o pão de fabrico nacional.

Quanto às despesas

25

As despesas em que incorreram o Governo neerlandês e a Comissão das Comunidades Europeias, que apresentaram observações ao Tribunal, não podem ser reembolsadas. Revestindo este processo, relativamente às partes do processo principal, a natureza de um incidente suscitado perante os tribunais nacionais, cabe a estes decidir quanto às despesas.

 

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL (Terceira Secção),

pronunciando-se sobre as questões que lhe foram submetidas pelo presidente do Arrondissementsrechtbank de Almelo, através da decisão de 13 de Março de 1985, e pelo Arrondissementsrechtbank de s'Hertogenbosch, através decisão de 20 de Maio de 1985, decide:

 

1)

O artigo 30.° do Tratado CEE deve ser interpretado no sentido de que

constitui uma medida equivalente a uma restrição quantitativa à importação a regulamentação nacional que estabelece um montante fixo como preço mínimo de venda ao público do pão de fabrico nacional e que impõe para a venda de pão importado uma margem de comercialização correspondente aos custos de comercialização de empresas distribuidoras bem organizadas e que operam de forma rentável, pela qual é aumentado o preço de compra, desde que tal margem de comercialização seja obrigatória, mesmo quando o preço de venda que dela resulte for superior ao preço mínimo aplicável ao pão de fabrico nacional;

tal regulamentação não constitui uma restrição quantitativa à importação quando a margem de comercilização na venda de pão importado, que é a mesma que se tem em conta para a determinação do preço mínimo fixado para o pão de fabrico nacional, não é obrigatória para o pão importado vendido a um preço igual ou superior a esse preço mínimo;

este artigo não constitui obstáculo a que, no quadro de tal regulamentação, o preço de venda do pão importado, resultante da aplicação da margem de comercialização, possa, eventualmente, ser inferior ao preço mínimo fixado para o pão de fabrico nacional.

 

2)

Nem o artigo 7° do Tratado CEE nem o princípio geral da não discriminação do direito comunitário se aplicam a uma desigualdade de tratamento que se traduza em, no quadro de tal regulamentação, o preço de venda do pão importado poder, eventualmente, ser inferior ao preço fixado para o pão de fabrico nacional.

 

Galmot

Everling

Moitinho de Almeida

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, a 13 de Novembro de 1986.

O secretário

P. Heim

O presidente da Terceira Secção

Y. Galmot


( *1 ) Língua do processo: neerlandês.