ACÓRDÃO DO TRIBUNAL (Quinta Secção)

22 de Janeiro de 1986 ( *1 )

No processo 250/84,

que tem por objecto um pedido submetido ao Tribunal, ao abrigo do artigo 177.o do Tratado CEE, pelo tribunale di Roma, visando obter, no litígio pendente perante este órgão jurisdicional entre

Eridania zuccherifici nazionali SpA e outros

e

Cassa conguaglio zucchero e ministérios italianos das Finanças e do Tesouro,

uma decisão a título prejudicial sobre a validade dos artigos 24.o e 28.o do Regulamento n.o 1785/81 do Conselho, de 30 de Junho de 1981, que estabelece a organização comum de mercado no sector do açúcar (JO 1981, L 177, p. 4; EE 03, fase. 22, p. 80),

O TRIBUNAL (Quinta Secção),

constituído pelos Srs. U. Everling, presidente de secção, R. Joliét, O. Due, Y. Galmot e C. Kakouris, juízes,

advogado-geral: P. Ver Loren van Themaat

secretano: H. A. Rühi, administrador principal

considerando as observações apresentadas:

dos autores no processo principal, patrocinados pelos advogados Mauro de André, Giuseppe Marchesini e Federico Sorrentino,

do Governo italiano, representado por Ivo M. Braguglia, avvocato dello Stato,

do Conselho das Comunidades Europeias, representado por Antonio Sacchettini e Arthur Bräutigam,

da Comissão das Comunidades Europeias, representada por Alberto Prozzillo,

ouvidas as conclusões do advogado-geral na audiência de 22 de Outubro de 1985,

profere o presente

ACÓRDÃO

(A parte relativa aos factos não é reproduzida)

Fundamentos da decisão

1

Por despacho de 11 de Novembro de 1983, que deu entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 23 de Outubro de 1984, o tribunale di Roma submeteu a este Tribunal, ao abrigo do artigo 177.o do Tratado CEE, duas questões referentes à validade dos artigos 24.o e 28.o do Regulamento n.o 1785/81 do Conselho, de 30 de Junho de 1981, que estabelece a organização comum de mercado no sector do açúcar (JO 1981, L 177, p. 4; EE 03, fase. 22, p. 80).

2

As referidas questões foram suscitadas no âmbito de uma acção intentada pela Eridania zuccherifici nazionali SpA, quinze outras empresas italianas produtoras de açúcar, o Consorzio nazionale bieticultori e a Associazione nazionale bieticultori contra a Cassa conguaglio zucchero e os ministérios italianos das Finanças e do Tesouro. Aos autores no processo principal foi exigido, em 1982, o pagamento das cotizações sobre a produção de açúcar, nos termos dos artigos 24.o e 28.o do Regulamento n.o 1785/81. Os autores pediram ao tribunale di Roma que declarasse que estas cotizações não eram devidas, dada a ilegalidade do referido regulamento, e condenasse as rés, entidades administrativas, a restituir as cotizações já pagas, acrescidas de juros.

3

O tribunale di Roma, considerando que a decisão da causa depende de saber se as mencionadas disposições do Regulamento n.o 1785/81 são ou não válidas, suspendeu a instância e pediu a este Tribunal que se pronunciasse, a título prejudicial, sobre as seguintes questões:

«a)

O artigo 28.o do Regulamento (CEE) n.o 1785/81 do Conselho, ao impor aos produtores italianos uma cotização para a comercialização do açúcar a preço garantido, calculada com base nas quotas de produção fixadas pelo artigo 24.o, é ilegal por violar a proibição de discriminações prevista nos artigos 7.o e 40.o, n.o 3, do Tratado, bem como o princípio da proporcionalidade, no que respeita ao objectivo enunciado no artigo 39.o, n.o 1, alínea b), do mesmo Tratado?

b)

O artigo 24.o do Regulamento n.o 1785/81, ao fixar as quotas de produção A italianas e a relação entre as quotas A e B, é ilegal por carecer de fundamentação, face ao disposto no artigo 190.o do Tratado?»

4

Na fundamentação da decisão de reenvio, o órgão jurisdicional nacional observa que a Itália é o Estado-membro com a relação mais baixa entre o consumo interno e a quota A (85 %, contra uma média comunitária de 101 % e um máximo de 194 % para a Bélgica). Daqui resultaria que a Itália só pode exportar açúcar retirado da quota B, com uma cotização de 39,5 % do preço de intervenção, enquanto os outros Estados-membros podem exportar igualmente açúcar da quota A, com uma cotização inferior de 2 %. Esta situação infringiria o artigo 7o do Tratado.

5

Segundo o órgão jurisdicional nacional, existe igualmente uma discriminação entre produtores, na acepção do artigo 40.o, n.o 3, segundo parágrafo, do Tratado. Por um lado, a relação entre as cotizações sobre as quantidades retiradas da quota B e o volume desta quota para a Itália seria a mais alta da Comunidade (138 LIT/kg, face à média comunitária de 113 LIT/kg). Em segundo lugar, os custos fixos de produção para as quantidades da quota A atribuídas à Itália seriam os maiores da Comunidade, dado que a produção média italiana por estabelecimento seria a mais baixa (293333 quintais, face à média comunitária de 466471 quintais). Além disso, as cotizações impostas aos produtores italianos, referentes à quota B, seriam desproporcionadas, atendendo ao objectivo definido no artigo 39.o, n.o 1, alínea b), do Tratado, que visa assegurar um nível de vida equitativo à população agrícola.

6

Finalmente, ainda segundo a decisão de reenvio, o Regulamento n.o 1785/81 não está devidamente fundamentado, porquanto se limita a afirmar, no respeitante às quotas de produção, que as razões que levaram à sua criação permanecem válidas, sem explicar por que motivo não foram tomadas em consideração as alterações entretanto verificadas na situação do mercado.

Sobre o sistema das quotas e das cotizações na produção de açúcar

7

A organização comum de mercado no sector do açúcar foi criada pelo Regulamento n.o 1009/67 do Conselho, de 18 de Dezembro de 1967 (JO 1967 308, p. 1). Este diploma instituiu um sistema, inicialmente para vigorar até Julho de 1975, que previa a atribuição a cada empresa de uma «quota de base», bem como de uma «quota máxima» por cada campanha. A quantidade de açúcar que excedesse a quota máxima não podia ser vendida na Comunidade. Previa-se igualmente um sistema comunitário de financiamento dos custos de escoamento dos excedentes, que até determinados limites eram suportados por todos os produtores, mediante uma cotização sobre a produção, e no restante estavam a cargo do orçamento comunitário. Este sistema foi mantido em vigor, com algumas modificações, pelos regulamentos n.os 3330/74 do Conselho, de 19 de Dezembro de 1974QO 1974, L 359, p. 1), e 1592/80 do Conselho, de 24 de Junho de 1980 (JO 1980, L 160, p. 12). O Regulamento n.o 3330/74 aumentou as quotas de base apenas para os Estados-membros principais produtores de açúcar, excluindo portanto a Itália. O aumento tinha por objectivo contrabalançar os efeitos negativos das importações de açúcar preferencial proveniente dos países ACP, em resultado dos compromissos assumidos pela Comunidade.

8

As disposições citadas foram substituídas, com efeitos a partir de 1 de Julho de 1981, pelo Regulamento n.o 1785/81 do Conselho, de 30 de Junho de 1981, ora em causa. Este regulamento prevê três tipos de quotas. A quota A, que corresponde ao consumo de açúcar na Comunidade, pode ser livremente comercializada na Comunidade e o seu escoamento está garantido pelo preço de intervenção. A quota B constitui a parte da produção de açúcar que excede a quota de base (quota A) mas não supera a «quota máxima», que é igual ao produto da multiplicação da quota A por um determinado coeficiente. A quota B pode ser também livremente comercializada no mercado comum, embora sem a garantia do preço de intervenção, ou exportada para países terceiros, com uma subvenção à exportação. Esta subvenção, de valor igual à diferença entre o preço de intervenção e o preço mundial do açúcar, é paga sob a forma de restituições à exportação. Finalmente, a quota C — ou seja, a parte da produção que excede a «quota máxima» (quotas A e B) — só pode ser comercializada em países terceiros, sem direito à atribuição de subvenções à exportação.

9

O Regulamento n.o 1785/81 modificou igualmente o sistema de financiamento dos encargos decorrentes da exportação de açúcar. Por um lado, instituiu o princípio da responsabilidade integral dos produtores, que têm de suportar por inteiro as despesas relativas ao escoamento, nos mercados de exportação, das quantidades de açúcar que beneficiam das restituições. Por outro, sujeitou à cotização sobre a produção não apenas o açúcar produzido no âmbito da quota B, mas também o da quota A.

10

Segundo os artigos 24.o e 28.o do Regulamento n.o 1785/81, o sistema assim instituído ficou estabelecido da seguinte forma:

os quantitativos de referência («quantidades de base») para a fixação das quotas de base («quotas A») não sofrem alterações em relação às disposições anteriores, com excepção da quantidade de base atribuída à Itália, que passa de 1230000 toneladas para 1320000 toneladas (artigo 24.o do Regulamento n.o 1785/81);

as quotas que excedem a quota de base mas permanecem dentro dos limites da quota máxima («quotas B») são fixadas em função da produção efectiva, mas não podem ser inferiores a 10 % das quotas de base. Para tomar em conta a evolução regional da produção de beterraba e de cana-de-açúcar, as quotas B são fixadas num volume igual à média das produções mais elevadas obtidas em três das últimas cinco campanhas (ibidem);

os encargos de escoamento dos excedentes resultantes da diferença entre a produção e o consumo comunitários são integralmente suportados pelos produtores; a totalidade da produção compreendida nas quotas A e B fica sujeita a uma cotização, a liquidar de acordo com as seguintes regras (artigo 28.o do Regulamento n.o 1785/81):

a perda global, resultante do escoamento dos excedentes em questão, começa por ser dividida pelo conjunto da produção no âmbito das quotas A e B, com uma cotização sobre a produção que não pode exceder 2 % do preço de intervenção do açúcar branco;

a parte desta perda que não for coberta pelo produto da referida cotização será financiada mediante uma cotização adicional sobre a produção compreendida na quota B, não superior a 30 % do mesmo preço de intervenção. Contudo, quando este último sistema de financiamento for ainda insuficiente, o limite máximo poderá ser aumentado até 37,5 %, de forma que a cotização total sobre a produção, no que respeita à quota B, poderá atingir 39,5 %.

Quanto à primeira questão

Sobre a alegada discriminação

11

Na primeira parte da questão inicial, o órgão jurisdicional nacional pergunta, essencialmente, se a cotização imposta aos produtores italianos, por força dos artigos 24.o e 28.o do Regulamento n.o 1785/81, infringe a proibição de discriminações estabelecida pelos artigos 7.o e 40.o, n.o 3, do Tratado.

12

Os autores no processo principal e o Governo italiano pronunciam-se no sentido de ser dada uma resposta afirmativa. Em sua opinião, a discriminação deriva do facto de a totalidade dos encargos relacionados com o financiamento do sistema das quotas ser calculada com base no consumo da Comunidade, ao passo que os encargos a suportar por cada empresa são calculados com base na sua produção efectiva durante o período de referência. A aplicação de parâmetros diversos em relação ao total dos encargos e à repartição dos mesmos entre cada um dos agentes económicos teria tido como consequência que a quota A atribuída à Itália, sujeita a uma cotização de apenas 2 %, fosse fixada a um nível manifestamente inferior ao consumo interno italiano.

13

Os autores no processo principal aduzem, em apoio da sua tese, vários elementos factuais. Por um lado, a quota de base atribuída à Itália não teria sido aumentada entre 1968 e 1981, ao contrário do que teria sucedido com a de todos os outros Estados-membros. Além disso, embora o Regulamento n.o 1785/81 tenha atribuído à Itália uma quota A superior à anterior em 7,3 %, nem por isso a percentagem global do aumento da quota de base/quota A italiana teria deixado de ser inferior à percentagem do aumento médio da mesma quota na Comunidade desde 1968 (7,3 % contra 18 %). Em contrapartida, o consumo de açúcar na Itália teria aumentado 9,1 % desde 1968, enquanto no conjunto da Comunidade teria diminuído 2,1 %. Em consequência destas evoluções, a Itália seria, a par da República Federal da Alemanha, o Estado-membro com a mais baixa relação entre a quota A e o consumo interno (85 %, contra a média comunitária de 101 %).

14

Daqui resulta, segundo os autores no processo principal, que os produtores italianos só possam exportar açúcar da quota B, sujeito a uma cotização mais elevada, suportando sobre essa quota B os encargos gerados pelas exportações dos produtores dos outros Estados-membros, que dispõem de uma quota A superior ao consumo interno. Deste modo, os produtores italianos, que nunca teriam conseguido constituir excedentes, seriam obrigados a financiar o escoamento a preço garantido da produção dos seus parceiros comunitários.

15

O Governo italiano salienta, a este propósito, que a situação acima descrita ameaça perturbar progressivamente o equilíbrio da produção na Comunidade, dado que o produtor excedentário, que só em parte sofre os efeitos dos seus próprios excedentes, tenderá a aumentar a produção, adquirindo assim o direito a um aumento da sua própria quota, enquanto o produtor com custos mais elevados, que em geral não cria excedentes, é forçado a contribuir para os encargos decorrentes da exportação da referida produção excedentária.

16

O Conselho e a Comissão contestam a existência de discriminações em razão da nacionalidade ou entre produtores da Comunidade. As quotas seriam fixadas com base em critérios objectivos, tendo em atenção a finalidade do sistema, que consistiria em assegurar um determinado controlo da produção açucareira, permitindo, ao mesmo tempo, o seu reordenamento.

17

A Comissão especifica que a fixação das quotas nacionais em função da produção efectiva das empresas está em conformidade com os princípios da solidariedade entre os produtores, da especialização da produção e da liberdade do comércio intracomunitário. Se deste sistema derivam, para os produtores italianos, encargos eventualmente diferentes daqueles que suportam os restantes produtores da Comunidade, tal diferença será apenas o resultado da diversidade de níveis de produção nos Estados-membros. Pelo mesmo motivo, a relação entre as cotizações cobradas e a quota B, no que respeita à Itália, seria desprovida de significado, dado que as empresas dos diferentes Estados-membros utilizariam sempre em medida variável a sua quota B no decorrer das diferentes campanhas. No que respeita à alegada impossibilidade, para os produtores italianos, de exportar açúcar que não tenha sido produzido no âmbito da quota B, a Comissão observa que, efectivamente, os referidos produtores não exportam para países terceiros o açúcar produzido no âmbito das quotas e que, além disso, não existe qualquer relação entre as cotizações cobradas e o destino do produto. Finalmente, as restituições seriam pagas indistintamente à exportação, tanto do açúcar produzido no âmbito da quota A como do açúcar produzido no âmbito da quota B.

18

O Conselho e a Comissão salientam ainda que, devido à falta de competitividade da produção italiana de beterraba, os produtores italianos beneficiam, sob vários aspectos, de um regime mais favorável do que os produtores de outros Estados-- membros. Assim, as quantidades de base para a Itália teriam sido fixadas desde o início, pelo Regulamento n.o 1009/67, a um nível superior ao das quantidades de base atribuídas aos outros Estados-membros; para mais, só à Itália teria sido atribuída, pelo Regulamento n.o 1785/81, uma quota A superior à quantidade de base anterior. Além diiso, no que respeita aos produtores italianos, a cotização sobre a produção seria calculada em função do preço de intervenção e não do preço de intervenção derivado, mais elevado, que vigora em relação à Itália, enquanto zona deficitária; consequentemente, os produtores italianos estariam na realidade sujeitos a uma cotização menos elevada do que os outros produtores da Comunidade. Finalmente, o sistema em vigor autorizaria a Itália a conceder ajudas nacionais aos seus produtores de beterraba e de açúcar, além da garantia dos preços estabelecidos em função das regiões, e também concederia a este Estado-membro a faculdade de modificar sem limites as quotas das suas empresas, na medida do necessário para a efectivação de planos de reestruturação.

19

Em primeiro lugar, deve notar-se que, como explicaram a Comissão e o Conselho, o sistema das quotas para a produção de açúcar é um elemento essencial da organização comum de mercado neste sector. Face a uma situação excedentária, tanto no mercado comunitário como no mercado mundial, esse sistema visa conter a produção, aproximando-a o mais possível do consumo interno, e promover simultaneamente a especialização regional. Com esta finalidade, assegura o escoamento a preço garantido das quantidades estabelecidas, mediante um esquema de cobertura das despesas relativas ao escoamento, suportadas solidariamente por todos os produtores. Nos termos em que este esquema está organizado, sobre a quota A, que representa o consumo interno, incide apenas uma cotização mínima, enquanto a quota B, essencialmente destinada à exportação, está sujeita a uma cotização muito mais elevada, de forma a permitir o financiamento das restituições necessárias e, simultaneamente, criar um efeito dissuasivo sobre os produtores.

20

Nestas circunstâncias, razão teve o Conselho ao distribuir as quotas fixadas a cada uma das empresas em função da sua produção efectiva. Tal critério, com efeito, está em conformidade com o princípio da especialização regional, princípio-base do mercado comum, o qual exige que a produção possa realizar-se ho local mais adequado, do ponto de vista econômico. Além disso, a referida distribuição está em conformidade com o princípio da solidariedade dos produtores, dado que a produção constitui um critério legítimo para avaliar, simultaneamente, a importância econômica dos produtores e os benefícios que extraem do sistema.

21

O facto de a repartição dos encargos entre as empresas em função da produção implicar, para a Itália, uma quota A inferior ao seu consumo interno e uma relação particularmente elevada entre as cotizações cobradas e a sua quota B, não permite extrair uma conclusão diferente. Na verdade, estas consequências resultam necessariamente do facto de, num mercado comum caracterizado pela especialização regional, a produção nos Esţados-membros, individualmente considerados, poder desenvolver-se independentemente do nível do consumo nesses mesmos Estados. Tal não pode, portanto, constituir uma discriminação.

22

A acusação de discriminação resulta ainda mais injustificada se se considerarem as disposições em causa no contexto do regulamento de que fazem parte. Precisamente para atenuar as disparidades causadas pelas dificuldades estruturais características da Itália, o Conselho previu, enquadradas no sistema das quotas, várias medidas específicas com a natureza de auxílios aos produtores italianos, tais como uma quantidade de base mais elevada desde o início, um preço de intervenção mais alto e a permissão de concessão de ajudas nacionais.

23

Os autores no processo principal e o Governo italiano sustentam, em seguida, que as disposições em causa são discriminatórias, na medida em que as quotas atribuídas aos estabelecimentos italianos, em média, são inferiores às quotas médias atribuídas aos estabelecimentos da Comunidade (29233 toneladas contra 51873 toneladas). Daqui resultaria que os custos fixos a suportar pelos produtores italianos seriam superiores aos que suportam os produtores dos outros Estados-membros, o que já teria causado a falência de várias empresas italianas.

24

O Conselho e a Comissão contrapõem que as quotas de produção não são atribuídas aos estabelecimentos, mas às empresas, e que as empresas italianas dispõem, em média, da quantidade mais elevada da Comunidade, no que respeita à quota A. Não contestam, porém, que os custos da produção de açúcar em Itália sejam superiores à média comunitária.

25

A este respeito, deve lembrar-se que o sistema das quotas não tem por objectivo favorecer as empresas menos rentáveis, mas garantir um determinado controlo da produção, permitindo ao mesmo tempo o seu reordenamento, em função das exigências do mercado. Justifica-se, portanto, que não sejam tomadas em conta as diferenças do custo de produção quando se procede à distribuição das quotas entre os produtores. Este critério é tanto mais válido quanto é certo que, no caso vertente, o sistema das quotas vem acompanhado de um conjunto de medidas destinadas a compensar, pelo menos parcialmente, as dificuldades de natureza estrutural das regiões menos favorecidas.

26

Das considerações antecedentes resulta que os produtores italianos, efectivamente, não são discriminados em relação aos outros produtores da Comunidade. Logo, o argumento relativo à alegada violação dos artigos 7.o e 40.o, n.o 3, do Tratado, deve ser rejeitado.

Sobre a alegada violação do artigo 39.o, n.o 1, alínea b), do Tratado

27

Na segunda parte da primeira questão, o tribunal nacional pergunta, essencialmente, se o nível da cotização imposta aos produtores italianos, por força dos artigos 24.o e 28.o do Regulamento n.o 1785/81, está em contradição com o objectivo definido no artigo 39.o, n.o 1, alínea b), do Tratado. Nos termos desta disposição, a política agrícola comum visa «assegurar ... um nível de vida equitativo à população agrícola, designadamente pelo aumento do rendimento individual dos que trabalham na agricultura».

28

Segundo os autores no processo principal, esta pergunta deve ser respondida em sentido afirmativo, dado que os produtores italianos não são responsáveis pelos excedentes de açúcar cuja existência determinou a criação do regime em causa. A este propósito, observam em particular que a cotização referente à quota B impõe aos produtores italianos um sacrifício desproporcionado e repercute-se em 60 % sobre os produtores de beterraba italianos. Estes factores provocariam uma diminuição dos rendimentos dos produtores italianos, contrária ao objectivo definido no artigo 39.o, n.o 1, alínea b), do Tratado.

29

O Conselho e a Comissão sustentam, pelo contrário, que as disposições em apreço estão estruturadas de forma a tomar suficientemente em conta as necessidades específicas das zonas deficitárias, de que.a Itália faz parte. Em primeiro lugar, nestas zonas, o preço mínimo, quer da beterraba A, quer da beterraba B, seria mais elevado. Além disso, dado que a cotização sobre a produção do açúcar é calculada com base no preço de intervenção e não no preço de intervenção derivado, os produtores de beterraba italianos pagariam pelo açúcar B, em percentagem, uma cotização inferior à devida pelos produtores dos outros Estados-membros (28,8 % do preço de intervenção contra 30 %, na campanha de 1981/1982). Além disso, os produtores italianos de beterraba e de açúcar beneficiariam das ajudas nacionais permitidas pelo artigo 46.o do Regulamento n.o 1785/81. Finalmente, sendo hoje a produção italiana de açúcar B quase inexistente, os produtores italianos não pagariam, na prática, qualquer cotização referente a este açúcar. A Comissão observa, de resto, que é precisamente o sistema das quotas que permite a subsistência da cultura da beterraba na Itália, dado que as beterrabas italianas, pelas suas características, são bastante menos aproveitáveis do que as cultivadas noutros Estados-membros.

30

Na medida em que estes argumentos são idênticos aos invocados a respeito da primeira parte da questão inicial do tribunale di Roma, será suficiente remeter para as considerações acima desenvolvidas.

31

No que toca à afirmação dos autores no processo principal, segundo a qual o sistema instituido pelo Regulamento n.o 1785/81 não é de molde a assegurar um nível de vida equitativo aos produtores italianos, e nomeadamente aos produtores italianos de beterrabas, deve recordar-se que o mercado do açúcar se caracteriza, no seu conjunto, por uma produção excedentária. Consequentemente, o mecanismo de intervenção e de co-financiamento instituído com vista a assegurar o escoamento dos excedentes a preço garantido corresponde ao interesse de todos os produtores de açúcar da Comunidade, incluindo os produtores italianos. Como justamente salientou a Comissão, o preço mínimo assim garantido tem precisamente o objectivo de proteger os rendimentos do conjunto destes produtores.

32

Nestas circunstâncias, não é lícito afirmar que a medida dos encargos que derivam do sistema para os produtores italianos esteja em contradição com o objectivo definido no artigo 39.o, n.o 1, alínea b), do Tratado. Em especial, deve rejeitar-se o argumento segundo o qual os referidos produtores são obrigados a participar no financiamento do escoamento de excedentes pelos quais não são responsáveis. Esta concepção é incompatível com o próprio princípio de um mercado comum, no qual é impossível individualizar as empresas ou o Estado-membro responsáveis por uma eventual sobreprodução. Decorre do sistema instituído pelo Regulamento n.o 1785/81 que todas as empresas que superam a sua quota A produzem, por definição, excedentes destinados à exportação.

33

Por consequência, o argumento referente à alegada violação do artigo 39.o, n.o 1, alínea b), do Tratado, deve igualmente ser rejeitado.

Quanto à segunda questão

34

Na segunda questão, o órgão jurisdicional nacional pergunta, no essencial, se o artigo 24.o do Regulamento n.o 1785/81 é válido, face à exigência de fundamentação estabelecida pelo artigo 190.o do Tratado.

35

Os autores no processo principal e o Governo italiano sustentam que o Regulamento n.o 1785/81 não contém fundamentação suficiente, no que respeita à fixação das quotas para a Itália. O preâmbulo do regulamento limitar-se-ia a afirmar que permanecem válidas as razões que, até agora, levaram a Comunidade a aplicar um sistema de quotas de produção — faltando-lhe, porém, qualquer indicação relativa ao montante das quotas e ao facto de terem mudado, entretanto, a estrutura das cotizações e a situação no plano da produção e do consumo nos vários Estados-membros.

36

O Conselho e a Comissão, pelo seu lado, afirmam que foi dado cumprimento à exigência formulada pelo artigo 190.o dp Tratado, dado que do preâmbulo dos anteriores regulamentos n.os 1009/67 e 3330/74 consta uma fundamentação mais ampla, para a qual se remete no preâmbulo do Regulamento n.o 1785/81.

37

Segundo a jurisprudencia constante do Tribunal, a fundamentação exigida pelo artigo 190.o do Tratado deve ser adequada à natureza do acto considerado. Deve revelar, de forma clara e inequívoca, o percurso lógico seguido pela autoridade comunitária de que emana o acto, de forma a permitir aos interessados conhecer as razões que determinaram a medida adoptada e possibilitar ao Tribunal o exercício da sua própria fiscalização.

38

Decorre igualmente da mencionada jurisprudência, mais recentemente confirmada pelo acórdão de 28 de Outubro de 1982 (nos processos apensos 292 e 293/81, Lion e Haentjens, Recueil, p. 3887), que não se pode exigir que a fundamentação dos regulamentos especifique os vários elementos de facto ou de direito, por vezes muito numerosos e complexos, que constituem o objecto dos regulamentos, desde que estes se insiram no quadro sistemático do conjunto de que fazem parte. Consequentemente, se o acto impugnado evidencia, no essencial, o objectivo prosseguido pela instituição, é excessivo pretender a motivação específica de cada uma das opções de natureza técnica efectuadas.

39

É este o caso do Regulamento n.o 1785/81, no que respeita à justificação do sistema das quotas de produção. Com efeito, da fundamentação exposta a este propósito no preâmbulo do citado regulamento, designadamente no seu 11.o considerando, conjugada com os preâmbulos dos anteriores regulamentos n.os 1009/67 e 3330/74, resultam de forma clara e inequívoca os motivos que levaram o Conselho a conservar, em linhas gerais, o sistema já existente, embora modificando-o num ou noutro ponto, em especial no que respeita às bases de cálculo das quotas e ao financiamento do sistema. Esta fundamentação é suficiente para permitir aos agentes económicos interessados o conhecimento da razão de ser das disposições em causa e para possibilitar ao'Tribunal o exercício da sua própria fiscalização.

40

Consequentemente, o argumento relativo à alegada insuficiência de fundamentação, em violação do artigo 190.o do Tratado, deverá também ser rejeitado.

41

Por todos os motivos atrás expostos, deve responder-se ao tribunale di Roma que o exame das questões suscitadas não revelou elementos susceptíveis de afectar a validade dos artigos 24.o e 28.o do Regulamento n.o 1785 do Conselho, de 30 de Junho de 1981.

Quanto às despesas

42

As despesas reclamadas pelo Governo italiano, pelo Conselho e pela Comissão, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. No que respeita às partes no processo principal, revestindo o presente processo a natureza de um incidente suscitado perante um órgão jurisdicional nacional, é a este que compete decidir quanto às despesas.

 

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL (Quinta Secção),

pronunciando-se sobre as questões que lhe foram submetidas pelo tribunale di Roma, por despacho de 11 de Novembro de 1983, declara:

 

O exame das questões suscitadas não revelou elementos susceptíveis de afectar a validade dos artigos 24.o e 28.o do Regulamento n.o 1785/81 do Conselho, de 30 de Junho de 1981.

 

Everling

Joliét

Due

Galmot

Kakouris

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, a 22 de Janeiro de 1986.

O secretário

P. Heim

O presidente da Quinta Secção

U. Everling


( *1 ) Língua do processo: italiano.