COMISSÃO EUROPEIA
Bruxelas, 3.3.2025
COM(2025) 65 final
RELATÓRIO DA COMISSÃO AO PARLAMENTO EUROPEU E AO CONSELHO
relativo à avaliação das possibilidades de racionalização e simplificação do processo de aplicação de mecanismos de capacidade ao abrigo do capítulo IV do Regulamento (UE) 2019/943, como previsto no artigo 69.º, n.º 3, do Regulamento (UE) 2019/943
1.INTRODUÇÃO
O Regulamento (UE) 2024/1747, de 13 de junho de 2024, alterou os Regulamentos (UE) 2019/942 e (UE) 2019/943 no que diz respeito à melhoria da configuração do mercado da eletricidade da União. Nos termos do artigo 69.º, n.º 3, do Regulamento (UE) 2019/943 alterado (a seguir designado por «Regulamento Eletricidade»), a Comissão Europeia (a seguir designada por «Comissão») deve publicar um relatório que avalie as possibilidades de racionalizar e simplificar o processo de aplicação dos mecanismos de capacidade e apresentar propostas com vista a simplificar o processo de avaliação dos mecanismos de capacidade, conforme adequado. O artigo 69.º, n.º 3, do Regulamento Eletricidade dispõe o seguinte:
«Até 17 de janeiro de 2025, a Comissão apresenta ao Parlamento Europeu e ao Conselho um relatório que avalie pormenorizadamente as possibilidades de racionalização e simplificação do processo de aplicação dos mecanismos de capacidade ao abrigo do capítulo IV, de modo a assegurar que os Estados-Membros possam resolver atempadamente os problemas de adequação. Nesse contexto, a Comissão solicita à ACER que altere a metodologia para a avaliação europeia da adequação dos recursos a que se refere o artigo 23.º, em conformidade com [o processo previsto n]os artigos 23.º e 27.º, conforme adequado.
Até 17 de abril de 2025, a Comissão, após consulta dos Estados-Membros, apresenta propostas com vista a simplificar o processo de avaliação dos mecanismos de capacidade, conforme adequado.»
O presente relatório avalia as possibilidades de racionalizar e simplificar o processo de aplicação dos mecanismos de capacidade ao abrigo do capítulo IV do Regulamento Eletricidade.
2.QUADRO DA UE RELATIVO AOS MECANISMOS DE CAPACIDADE
2.1Quadro da UE decorrente do Regulamento Eletricidade e das Orientações relativas a auxílios estatais à proteção do clima e do ambiente e à energia 2022
O capítulo IV do Regulamento Eletricidade introduziu requisitos para justificar os mecanismos de capacidade e regras para a aplicação de tais medidas, a fim de assegurar que os mecanismos de capacidade não distorçam indevidamente o mercado interno da eletricidade da União e que não sejam introduzidos em substituição das reformas do mercado necessárias nos Estados-Membros.
O quadro da UE relativo aos mecanismos de capacidade foi criado para permitir e coordenar, de forma mais adequada, a introdução de um instrumento adicional temporário que permita às redes de eletricidade fornecer capacidade suficiente (e flexível) para satisfazer a procura a médio e longo prazo, incluindo o apoio à descarbonização do sistema energético e à integração de um número crescente de fontes de energia renovável variáveis implantadas. Além disso, têm surgido preocupações adicionais no que diz respeito à segurança do aprovisionamento de eletricidade na sequência da crise energética sem precedentes com que a União se viu confrontada nos últimos anos. O mercado interno da eletricidade tem sido crucial para enfrentar os desafios colocados pela crise, possibilitando uma interdependência entre os Estados-Membros em matéria de aprovisionamento. No rescaldo da crise e à luz da ambição renovada no que diz respeito ao desenvolvimento de energias renováveis e aos objetivos de descarbonização da UE, a existência de mecanismos de capacidade bem concebidos pode desempenhar um papel importante para garantir a adequação dos recursos, assegurando simultaneamente o bom funcionamento do mercado interno, facilitando a implantação das tecnologias de menor intensidade carbónica e minimizando os custos para os consumidores. As regras do mercado interno da eletricidade são complementadas pelas disposições da UE em matéria de auxílios estatais, nomeadamente o enquadramento para os auxílios estatais estabelecido nas Orientações da Comissão relativas a auxílios estatais à proteção do clima e do ambiente e à energia 2022 (CEEAG), que se aplicam a medidas de segurança do aprovisionamento que envolvam auxílios estatais, incluindo mecanismos de capacidade.
Mais especificamente, o quadro da UE em matéria de adequação dos recursos e mecanismos de capacidade pode ser resumido do seguinte modo (capítulo IV do Regulamento Eletricidade e ponto 4.8 das CEEAG):
2.1.1Falhas de mercado e adequação
O artigo 20.º do Regulamento Eletricidade exige que os Estados-Membros com problemas de adequação identificados elaborem um plano de execução que defina como tencionam eliminar as causas profundas do problema de adequação por meio de reformas do mercado e o apresentem à Comissão para reexame. Os Estados-Membros são obrigados a acompanhar a aplicação dos seus planos de execução e a publicar os resultados em relatórios anuais.
2.1.2Necessidade e proporcionalidade
Os Estados-Membros devem estabelecer um objetivo de segurança do aprovisionamento, também designado por norma de fiabilidade, de acordo com as regras especificadas no artigo 25.º do Regulamento Eletricidade. A norma de fiabilidade é o resultado de uma análise económica e estabelece um limite para a subsidiação da sobrecapacidade à custa da concorrência e do dinheiro dos contribuintes europeus, que ocorre quando o custo da capacidade adicional excede o bem-estar social proporcionado por essa capacidade. Para o efeito, o Regulamento Eletricidade incumbe a REORT-E de desenvolver uma metodologia para calcular o valor da energia não distribuída (VEND), o custo de mais entrada (CME) e a norma de fiabilidade
. A ACER aprovou a metodologia em outubro de 2020.
A necessidade de um mecanismo de capacidade e o nível de capacidade a contratar devem ser determinados com base numa avaliação da adequação. Para o efeito, o Regulamento Eletricidade incumbiu a REORT-E de desenvolver uma metodologia para avaliar a adequação dos recursos na Europa (a seguir designada por «metodologia AEAR»), que a ACER aprovou em outubro de 2020. Todos os anos, a REORT-E deve apresentar, com base nessa metodologia, uma proposta de avaliação europeia da adequação dos recursos (AEAR) anual, a aprovar pela ACER. Em conformidade com o artigo 24.º do Regulamento Eletricidade, os Estados-Membros podem também basear os seus mecanismos de capacidade em avaliações nacionais da adequação dos recursos (ANAR), que devem, no entanto, basear-se na metodologia AEAR e ser objeto de uma revisão pela ACER caso as suas conclusões divirjam das da AEAR.
O volume adquirido em reação aos preços da capacidade deve ser estabelecido de modo que o volume adquirido não ultrapasse a norma de fiabilidade.
2.1.3Características de conceção
O atual quadro da UE relativo aos mecanismos de capacidade estabelece uma série de requisitos que têm de ser cumpridos. Mais concretamente:
—o apoio deve ser atribuído (e o nível de apoio determinado) por via de um processo de concurso concorrencial (artigo 22.º, n.º 1, do Regulamento Eletricidade),
—a conceção do mecanismo de capacidade deve assegurar a elegibilidade de todas as tecnologias que cumpram requisitos técnicos e ambientais objetivos. Todas essas tecnologias devem ser elegíveis para participar de forma não discriminatória (artigo 22.º, n.º 1, do Regulamento Eletricidade). Mais recentemente, foi introduzida uma disposição para incentivar os Estados-Membros a ponderar a adaptação da conceção dos mecanismos de capacidade de modo que promova recursos de flexibilidade não fóssil, como a resposta do lado da procura e o armazenamento (artigo 19.º-G do Regulamento Eletricidade),
—os requisitos de disponibilidade (e as sanções conexas) devem ser suficientes para proporcionar uma remuneração que incentive a disponibilidade em períodos de pressão prevista sobre o sistema (que pode conduzir a súbitas subidas de preços no caso de o sistema não ser suficientemente flexível) e seja proporcionada em relação ao serviço prestado à rede elétrica (artigo 22.º, n.º 1, do Regulamento Eletricidade),
—os mecanismos de capacidade devem permitir a participação de capacidades além‑fronteiras (artigo 26.º do Regulamento Eletricidade). Para o efeito, o Regulamento Eletricidade incumbiu a REORT-E de desenvolver uma metodologia que permita a participação transfronteiriça nos mecanismos de capacidade
, que a ACER aprovou em 2020,
—a participação de tecnologias de combustíveis fósseis é restringida por meio de um limite de emissões (artigo 22.º, n.º 4, do Regulamento Eletricidade). Mais recentemente, foi introduzida uma derrogação para tecnologias de combustíveis fósseis que emitam mais do que o limite (artigo 64.º do Regulamento Eletricidade). Caso seja concedida, a derrogação permite a recursos que excedem o limite de emissões participar nos mecanismos de capacidade até 31 de dezembro de 2028, sob determinadas condições,
—no caso de uma reserva estratégica, deve ficar claro que a capacidade contratada na reserva estratégica não participará nos mercados da eletricidade, mesmo em situações em que os preços sejam elevados (artigo 22.º, n.º 2, do Regulamento Eletricidade).
2.2Processo de aprovação em vigor
As etapas impostas pelo Regulamento Eletricidade e pelas regras em matéria de auxílios estatais são normalmente realizadas em paralelo para facilitar uma aprovação rápida:
1.O Estado-Membro apresenta à Comissão um plano de reforma do mercado (plano de execução), que explica de que forma tenciona resolver falhas de mercado ou distorções regulamentares. A Comissão emite o seu parecer no prazo de quatro meses a contar da apresentação formal do plano (artigo 20.º do Regulamento Eletricidade);
2.O Estado-Membro deve justificar a necessidade e a proporcionalidade do mecanismo de capacidade com base em dois elementos:
-uma avaliação da adequação, que pode ser conduzida utilizando a AEAR, tal como aprovada pela ACER. Caso um Estado-Membro pretenda basear-se numa ANAR, a Comissão tem de verificar os pressupostos, a metodologia e os resultados da mesma antes de adotar a decisão em matéria de auxílios estatais. Mais especificamente, se a ANAR identificar um problema que não tenha sido identificado na AEAR, o Estado-Membro apresenta a sua ANAR à ACER, que emite, no prazo de dois meses, um parecer indicando se as divergências entre a avaliação nacional e a avaliação europeia se justificam (artigo 24.º do Regulamento Eletricidade), e
-um objetivo de segurança do aprovisionamento (norma de fiabilidade), calculado com base no artigo 25.º do Regulamento Eletricidade e na metodologia da ACER para calcular o valor da energia não distribuída, o custo de mais entrada e a norma de fiabilidade (artigo 23.º, n.º 6, do Regulamento Eletricidade). A Comissão tem de verificar a norma de fiabilidade e a metodologia subjacente antes de adotar a decisão em matéria de auxílios estatais;
3.O Estado-Membro deve notificar o mecanismo de capacidade à Comissão para apreciação ao abrigo das regras da UE em matéria de auxílios estatais.
3.PONTO DA SITUAÇÃO DA APLICAÇÃO DO QUADRO DA UE E PRINCIPAIS ENSINAMENTOS
O quadro da UE relativo aos mecanismos de capacidade foi adotado em 2019 e tem exigido, desde então, uma série de medidas com vista à sua plena aplicação (ou seja, o desenvolvimento de metodologias da UE associadas aos mecanismos de capacidade). Podem ser retirados ensinamentos dos seminários da Comissão, da prática em matéria de auxílios estatais e dos relatórios de monitorização da segurança do aprovisionamento elaborados pela ACER, incluindo sobre a duração e a complexidade do processo de aplicação de um mecanismo de capacidade.
O presente relatório baseia-se nas práticas dos Estados-Membros ao ponderarem, adotarem e gerirem mecanismos de capacidade desde a adoção do Regulamento Eletricidade, bem como na prática decisória da Comissão. A Comissão adotou decisões em matéria de auxílios estatais relativas a dois regimes (Bélgica e Finlândia) desde a entrada em vigor do Regulamento Eletricidade e encontra-se em discussões prévias à notificação com vários Estados-Membros sobre os respetivos regimes.
O relatório baseia-se igualmente nas observações apresentadas pelas partes interessadas à Comissão no âmbito da consulta pública que esta lançou sobre a sua proposta de reforma da configuração do mercado da eletricidade, as quais foram resumidas no documento de trabalho dos serviços da Comissão que acompanhou a proposta.
Em 22 de maio e 7 de junho de 2023, a Comissão organizou dois seminários com os Estados‑Membros sobre a «Racionalização do quadro da UE relativo aos mecanismos de capacidade». Os seminários centraram-se em especial na atual metodologia AEAR e no processo de aprovação dos mecanismos de capacidade. A Comissão e a ACER apresentaram igualmente o conteúdo destes seminários ao Fórum Europeu de Regulação da Eletricidade em 8 de junho de 2023 e em 27 de maio de 2024. O Fórum congratulou-se com a iniciativa de acelerar o processo de aprovação dos mecanismos de capacidade e simplificar a metodologia AEAR.
Por último, o presente relatório discorre sobre determinadas questões levantadas pelos colegisladores no contexto das negociações da proposta de reforma da configuração do mercado da eletricidade, que levaram à obrigação de a Comissão elaborar este relatório.
3.1Falhas de mercado e adequação
A Comissão elaborou e publicou orientações
destinadas aos Estados-Membros sobre a forma de prepararem os seus planos de execução. Durante a avaliação dos planos, a Comissão procura obter o parecer das partes interessadas sobre as reformas propostas pelos Estados-Membros e realiza reuniões ou mantém intercâmbios escritos com os Estados-Membros para esclarecer eventuais questões ou problemas à medida que surgem.
As orientações da Comissão podem facilitar a análise de possíveis distorções regulamentares e falhas de mercado por parte dos Estados-Membros. A estrutura proposta nas orientações permitiu igualmente à Comissão compreender melhor o funcionamento e os problemas específicos do mercado da eletricidade nos Estados-Membros em causa, o que lhe permite adotar o seu parecer sobre o plano com maior celeridade. Até à data, muitos Estados-Membros (12 em 27
) já receberam pareceres da Comissão sobre os respetivos planos de execução.
3.2Necessidade e proporcionalidade
A ACER adotou a sua metodologia de análise da avaliação europeia da adequação dos recursos em 2020. A preparação de uma AEAR em conformidade com a metodologia AEAR exigiu uma implementação faseada por parte da REORT-E. Embora a REORT-E tenha realizado progressos consideráveis na condução da AEAR, a ACER não aprovou as AEAR de 2021 e 2022, principalmente devido à falta de coerência e solidez da avaliação. Em 2024, a ACER aprovou uma avaliação pela primeira vez — a «AEAR 2023» — tendo concluído que a mesma atingiu um nível de solidez que permite aos decisores confiar nos resultados apresentados.
Alguns Estados-Membros
têm formulado críticas à complexidade da metodologia AEAR e ao facto de, à luz da metodologia atual, ser forçoso usar o «cenário central de referência» da AEAR (com duas variantes: com e sem mecanismos de capacidade) para identificar problemas de adequação. No entanto, importa ter em conta que a metodologia AEAR se baseia numa avaliação dita «probabilística», que já pondera a existência de múltiplos cenários e a probabilidade da sua ocorrência. Não obstante, alguns Estados-Membros consideram que dispor de apenas um cenário central de referência para descrever a trajetória futura é demasiado restritivo, uma vez que pode dar a impressão de apresentar uma «verdade única» para o futuro e minimizar a importância de trajetórias alternativas. Atualmente, uma das principais críticas ao cenário central de referência é o facto de se basear no pressuposto de que os objetivos constantes dos planos nacionais em matéria de energia e de clima (PNEC) serão plenamente cumpridos, sem ter em conta eventuais atrasos na execução das medidas descritas nos planos e a possibilidade de esses atrasos afetarem a adequação do sistema. O Regulamento Eletricidade refere-se a «cenários centrais de referência», o que deixa margem para a introdução de um cenário central de referência adicional que descreva um ritmo diferente da transição energética. No entanto, este cenário deve apresentar um retrato provável do futuro para permitir a tomada de decisões em matéria de auxílios estatais, que se baseiam nestes cenários centrais para justificar a necessidade e a proporcionalidade dos mecanismos de capacidade.
Na ausência de resultados da AEAR antes de 2024, os Estados-Membros tiveram de recorrer a ANAR (que têm de assentar na mesma metodologia da ACER em que a AEAR se baseia) para justificar e dimensionar os seus mecanismos de capacidade durante esse período. De acordo com o relatório de monitorização da segurança do aprovisionamento de 2023 da ACER, alguns Estados-Membros foram objeto de avaliações da adequação exaustivas. Porém, a ACER assinalou igualmente que outros Estados-Membros poderão ter aplicado abordagens «excessivamente simplificadas» que divergiam substancialmente da metodologia da ACER. É interessante constatar que, de acordo com o relatório de monitorização da segurança do aprovisionamento de 2024 da ACER, muitos Estados-Membros já incluem nas suas ANAR cenários adicionais ao cenário central de referência, modelando um ritmo diferente da transição energética. Alguns Estados‑Membros incluem nas suas ANAR cenários de modelização de uma disponibilidade reduzida de recursos ou capacidades de rede que avaliam o impacto de condições pouco prováveis com elevado impacto na rede elétrica. Estes cenários têm em conta riscos determinísticos de revisão em baixa, por oposição à abordagem probabilística prevista no Regulamento Eletricidade, que associa as probabilidades a acontecimentos futuros incertos. Por último, o Regulamento Eletricidade prevê que as avaliações da adequação dos recursos possam integrar uma análise de sensibilidade sobre ocorrências meteorológicas extremas. Alguns Estados‑Membros incluem essa análise de sensibilidade nas suas ANAR.
A ACER adotou a sua metodologia de cálculo do valor da energia não distribuída, do custo de mais entrada e da norma de fiabilidade em 2020. De acordo com esta metodologia, os Estados‑Membros realizam estudos baseados em inquéritos a diferentes grupos de consumidores de eletricidade para estimar a sua disponibilidade para pagar pela capacidade, bem como a fornecedores de capacidade para estimar o custo de novas capacidades. A aplicação da metodologia da ACER a nível nacional difere significativamente entre os Estados-Membros. Um recente estudo de consultoria da ACER concluiu que, provavelmente, as divergências significativas em termos do valor da energia não distribuída (determinado com recurso a uma abordagem baseada em inquéritos) e do custo de mais entrada entre os Estados-Membros não podem ser explicadas na sua totalidade por especificidades nacionais que refletem diferenças estruturais nas economias. Aponta o referido estudo para eventuais dificuldades de aplicação e para a diversidade de resultados associados a uma abordagem baseada em inquéritos. Estes problemas de aplicação podem conduzir a desvios, o que, por sua vez, pode dar origem a um investimento excessivo ou insuficiente na segurança do aprovisionamento. A aplicação da metodologia e a realização do estudo sobre o valor da energia não distribuída, o custo de mais entrada e a norma de fiabilidade em cada Estado-Membro podem também ser complexas e onerosas, em especial para autoridades nacionais de pequena dimensão, que podem carecer de recursos e pessoal para conduzir este exercício.
3.3Características de conceção do mecanismo de capacidade
Com base na prática decisória, a Comissão identificou as seguintes deficiências principais na conceção dos mecanismos de capacidade.
Em primeiro lugar, alguns mecanismos de capacidade contêm requisitos de conceção dos produtos que podem dificultar a participação de novas tecnologias (como a resposta do lado da procura e o armazenamento), consolidando assim a matriz de produção existente. Estes requisitos incluem, por exemplo: requisitos de disponibilidade e fatores de redução restritivos (ou seja, a percentagem da capacidade instalada da unidade usada para caracterizar a sua capacidade efetiva), capacidades mínimas elegíveis, requisitos de entrega continuada a longo prazo e valores mínimos de licitação.
Em segundo lugar, em alguns mecanismos de capacidade é importante promover mais entrada (por exemplo, mediante a disponibilização de contratos a longo prazo), o que pode constituir, na prática, um processo moroso.De acordo com o relatório de monitorização da segurança do aprovisionamento de 2024 da ACER, as empresas históricas, enquanto fornecedores de capacidade «tradicionais», são os principais beneficiários do apoio. Concretamente, a partir de 2022, as centrais elétricas a gás natural têm sido os principais beneficiários dos mecanismos de capacidade, seguindo-se a capacidade nuclear e a capacidade hidroelétrica. Ao mesmo tempo, os fornecedores de capacidade não tradicionais, tais como as energias renováveis, o armazenamento e a resposta do lado da procura, representam uma pequena percentagem da capacidade remunerada pelos mecanismos de capacidade, apesar de registarem uma tendência de crescimento positiva. Todavia, é importante não esquecer que tal se deve, em parte, ao facto de os mecanismos de capacidade à escala do mercado refletirem a matriz elétrica e de a maior parte da remuneração se destinar a recursos existentes no mercado.
Em terceiro lugar, os mecanismos de capacidade não permitem, por vezes, uma participação efetiva dos recursos transfronteiriços em pé de igualdade com os fornecedores de capacidade nacionais, tal como exigido pelo Regulamento Eletricidade.Com exceção do mecanismo de capacidade polaco, a aplicação do quadro para a participação transfronteiriça direta está pendente (Bélgica, França e Irlanda) ou simplificada (Itália) nos restantes mecanismos de capacidade à escala do mercado. De acordo com alguns estudos, esta situação deve-se ao facto de o atual quadro para a participação transfronteiriça, incluindo as metodologias desenvolvidas pela ACER, ser complexo e difícil de aplicar. Além disso, o Regulamento Eletricidade estipula que a capacidade de entrada máxima (CEM) autorizada para participar nos mecanismos de capacidade deve ser calculada pelos centros de coordenação regionais (CCR) e basear-se nas avaliações anuais da AEAR. Até 2023, os Estados-Membros calcularam eles próprios as CEM (uma vez que o processo de cálculo nos CCR não tinha sido estabelecido e os resultados da AEAR não estavam disponíveis). Em 2024, os CCR elaboraram pela primeira vez recomendações sobre a CEM, com base nos resultados da AEAR de 2023 aprovada. No entanto, atualmente, a REORT-E apenas avalia plenamente a adequação dos recursos no que diz respeito a quatro dos dez anos a que se refere o Regulamento Eletricidade, o que cria uma lacuna de dados para o cálculo das CEM.
Em quarto lugar, os mecanismos de capacidade nos vários Estados-Membros aplicam sanções heterogéneas para incentivar os fornecedores de capacidade a honrar os seus compromissos. Os regimes de sanções existentes nos mecanismos de capacidade nem sempre proporcionam incentivos suficientemente adequados para garantir efetivamente a prestação do serviço contratado. Por exemplo, as sanções por atrasos no reforço da capacidade ou por falta de disponibilidade são geralmente muito inferiores ao valor da energia distribuída utilizado para identificar os custos da falta de capacidade e justificar os mecanismos de capacidade.
Por último, o Regulamento (UE) 2024/1747 (artigos 19.º-G e 19.º-H) permite que os Estados‑Membros introduzam regimes de apoio à flexibilidade não baseada em combustíveis fósseis. Uma vez que o objetivo desses regimes de flexibilidade pode sobrepor-se aos objetivos dos mecanismos de capacidade, deve ponderar-se a interação entre os mecanismos de capacidade e as medidas de flexibilidade, a fim de proporcionar a combinação de capacidade descarbonizada fiável e flexível necessária para o futuro sistema energético da forma mais eficaz em termos de custos.
3.4Consulta pública, transparência e avaliação
Desde 1 de julho de 2023, as regras em matéria de auxílios estatais exigem que os Estados‑Membros procedam a consultas públicas durante quatro a seis semanas (dependendo do orçamento do regime) sobre quaisquer medidas de segurança do aprovisionamento que exijam a aprovação de auxílios estatais. Este requisito foi introduzido (juntamente com um requisito semelhante aplicável aos regimes de descarbonização) para assegurar que as partes interessadas estejam cientes de eventuais medidas planeadas e tenham a oportunidade de examinar a conceção e os parâmetros fundamentais dos mecanismos de capacidade financiados pelo Estado previstos e apresentar observações. Deste modo, os participantes no mercado podem, por exemplo, apresentar pontos de vista sobre os requisitos de pré-qualificação e disponibilidade de capacidade, bem como sobre as sanções, que, tal como acima descrito, podem constituir obstáculos à participação de determinados recursos, reduzindo a concorrência e aumentando os custos. No entanto, estes requisitos também acrescentam uma etapa processual para as autoridades nacionais que pretendam introduzir mecanismos de capacidade.
3.5Duração do processo de aprovação
Os Estados-Membros consideraram moroso o processo de adoção de decisões em matéria de auxílios estatais relativas aos mecanismos de capacidade. O atual processo de aprovação de um mecanismo de capacidade tem geralmente uma duração mínima de seis meses. No entanto, a prática decisória revelou que as discussões com os Estados-Membros anteriores às notificações tenderam a ser mais prolongadas — até dois anos. Tal deveu-se não só ao caráter pioneiro dos primeiros procedimentos ao abrigo das novas disposições do Regulamento Eletricidade (artigos 20.º a 27.º), mas também ao facto de ser habitual que, durante a fase de pré-notificação, ainda esteja a decorrer o processo de conceção do regime: as ideias iniciais ainda são objeto de debate nos Estados-Membros, sendo normalmente necessárias várias rondas de intercâmbios internos com partes interessadas nacionais, bem como com os serviços da Comissão, para finalizar a conceção pormenorizada de uma medida e assegurar que esta cumpre os requisitos da legislação da UE.
4.PROPOSTAS DA COMISSÃO COM VISTA À RACIONALIZAÇÃO E SIMPLIFICAÇÃO
4.1. Reexame da metodologia da ACER para a AEAR
Nos termos do artigo 69.º, n.º 3, do Regulamento Eletricidade, a Comissão deve, com base no presente relatório, solicitar à ACER que altere a metodologia da AEAR, conforme adequado. Para dar resposta às preocupações relacionadas com a metodologia AEAR acima mencionadas, a ACER (em cooperação com a REORT-E) deve reexaminar a sua metodologia para avaliar a adequação na União e ponderar a revisão da metodologia de cálculo dos parâmetros de adequação, a fim de reduzir os encargos de execução para os Estados-Membros e facilitar a aplicação harmonizada do quadro da UE.
A metodologia deve ser atualizada e racionalizada em vários domínios, a fim de assegurar a solidez do quadro e a sua facilidade de aplicação pelas partes interessadas [REORT-E a nível da UE e operadores de redes de transporte (ORT) ou outras entidades a nível nacional], refletindo sobre os ensinamentos retirados da prática decisória.
O pedido da Comissão à ACER define apenas o âmbito dessa simplificação da metodologia AEAR. Cabe à REORT-E apresentar à ACER, para aprovação, os projetos pormenorizados de propostas de metodologia, em conformidade com o artigo 27.º do Regulamento Eletricidade.
4.1.1Quadro de cenários
De acordo com a metodologia AEAR (artigo 3.º), a identificação dos problemas de adequação deve basear-se num cenário central de referência (com variantes que incluam ou excluam mecanismos de capacidade aprovados), ao passo que as sensibilidades adicionais se destinam apenas a avaliar a solidez do problema de adequação identificado.
O atual cenário central de referência baseia-se na consecução das metas dos PNEC, que consistem em objetivos e metas políticas. Os PNEC descrevem as trajetórias da capacidade instalada (energias renováveis, armazenamento) e da procura (eletrificação, eficiência energética) futuras, de acordo com as metas ambiciosas da UE. Os PNEC dos Estados-Membros constituem o melhor plano disponível para retratar o futuro do sistema energético durante a transição energética. No entanto, este cenário não tem em conta a eventual ocorrência de atrasos na execução das medidas descritas nos planos nem a possibilidade de esses atrasos afetarem a adequação do sistema. Além disso, os PNEC são atualizados de cinco em cinco anos e as trajetórias iniciais podem desviar-se do plano anterior. Por exemplo, o desenvolvimento de novos ativos associados à produção de eletricidade (por exemplo, FER, energia nuclear), à procura de eletricidade (por exemplo, eletrólise para produção de hidrogénio) e a infraestruturas cruciais (rede nacional, ligação de ativos de produção, interligações) pode divergir do previsto em termos de composição ou de ritmo.
Como tal, poderia prever-se a revisão do quadro de cenários e a introdução de um «cenário de tendências e projeções» adicional na metodologia para a identificação de problemas de adequação, que os Estados-Membros poderiam utilizar para justificar a introdução de um mecanismo de capacidade. Este cenário adicional teria a vantagem de permitir considerar uma visão alternativa do futuro em que, por exemplo, as energias renováveis, a energia nuclear ou o armazenamento sejam instalados a um ritmo diferente e a eletrificação ocorra também a um ritmo diferente.
Este «cenário de tendências e projeções», igualmente determinado de forma probabilística, teria em conta os progressos efetivos no sentido da concretização dos PNEC dos Estados-Membros. Tal inclui a evolução observada da oferta e da procura (tendo em conta, por exemplo, o ritmo da eletrificação e a eficiência energética) e o desenvolvimento da rede, tendo em conta o risco, no caso de alguns países, de os objetivos e as metas não serem cumpridas a tempo. Por este motivo, a fim de evitar distorções da sua finalidade, ou seja, captar o ritmo real da transição energética, o segundo cenário não deve incluir outros riscos. Esta finalidade exige igualmente que as tendências utilizadas no segundo cenário não sejam mais conservadoras do que as projeções dos Estados‑Membros, incluindo as políticas e medidas já adotadas e aplicadas. Além disso, ao alargar o quadro de cenários, é essencial definir indicadores comparativos adequados para delinear as diferenças entre cenários centrais de referência, os quais permitirão igualmente às partes interessadas comparar efetivamente os principais pressupostos ao longo dos anos. O cenário adicional deve estabelecer um equilíbrio criterioso entre realismo e conservadorismo, a fim de evitar o risco de aumento dos custos para os consumidores sem que se proporcionem benefícios adicionais significativos.
Pelas razões acima expostas, o cenário adicional e os seus pressupostos, nomeadamente assentes em dados históricos e em projeções atuais, que divergem do objetivo e das metas apresentadas pelos Estados-Membros para assegurar o cumprimento das metas da União em matéria de energia e clima para 2030 e do objetivo da União de neutralidade climática até 2050, devem ser objeto de uma consulta pública exaustiva. A ACER deve fornecer orientações sobre a forma como esta consulta pública deve ser realizada. O Grupo de Referência das Partes Interessadas do PDDR é convidado a manifestar a sua opinião sobre a coerência dos cenários da AEAR com o quadro de cenários do PDDR.
É importante recordar que continuaria a caber às ANAR o papel de garantir que os desenvolvimentos específicos identificados pelos Estados-Membros possam ser tidos em conta na conceção de um mecanismo de capacidade.
4.1.2Seleção dos anos-alvo
A metodologia AEAR (artigo 4.º, n.º 1) exige a modelização de cada ano num horizonte de 10 anos (com base no requisito do Regulamento Eletricidade). É importante dispor de resultados para cada ano para a tomada de decisões sobre a necessidade de um mecanismo de capacidade, bem como para o cálculo da capacidade de entrada máxima para a participação transfronteiriça nos mecanismos de capacidade. No entanto, as partes interessadas (REORT-E) têm-se confrontado com dificuldades computacionais na modelização de cada um destes 10 anos. Num espírito de simplificação, o modelo poderia, no futuro, modelizar explicitamente um número limitado de anos‑alvo, que são cruciais para a tomada de decisões relativas aos mecanismos de capacidade (incluindo o cálculo da capacidade de entrada máxima), enquanto outros anos-alvo podem ser modelizados por extrapolação.
4.1.3Papel da avaliação da viabilidade económica
De acordo com a metodologia AEAR (artigo 6.º), a avaliação da viabilidade económica modeliza as decisões de entrada e saída do mercado. Atualmente, o modelo AEAR mede a viabilidade económica dos recursos utilizando a chamada abordagem do «custo do sistema», que minimiza os custos globais do sistema, ou seja, a soma dos custos fixos e dos custos totais de funcionamento. Esta abordagem, que otimiza os custos para todo o sistema europeu numa única etapa, deu origem a restrições computacionais significativas e a incoerências entre as decisões de entrada e saída de capacidade e os riscos de adequação estimados. Para dar resposta a estes problemas, a viabilidade económica dos recursos deve basear-se numa abordagem de «maximização das receitas» que meça a diferença entre as receitas e os custos esperados para cada recurso de capacidade. Esta abordagem já é aplicada por alguns ORT na Europa. Ao permitir desagregar a avaliação da viabilidade económica em iterações mais pequenas e menos exigentes do ponto de vista computacional, é mais simples (como uma «abordagem iterativa») e modeliza melhor as decisões de entrada e saída de capacidade. A metodologia AEAR deve incluir um pós-processo, a fim de permitir a identificação direta do volume a adquirir para cada zona de ofertas associada à lacuna de adequação identificada no modelo. Além disso, esta abordagem facilitará a aplicação de um cálculo da capacidade baseado nos fluxos, que reflita adequadamente as oportunidades de comércio transfronteiriço e os benefícios sociais subjacentes. Uma maior simplificação poderá dizer respeito à revisão do número de anos climáticos modelizados na avaliação probabilística, assegurando simultaneamente que esta represente com exatidão a necessidade de adequação dos recursos.
Atualmente, a AEAR modeliza o comportamento de investimento através do cálculo de um CME (custo de mais entrada) utilizando dois parâmetros fundamentais: o custo médio ponderado do capital (CMPC) e as taxas mínimas [ou seja, a taxa mínima de rendibilidade exigida pelos financiadores (acionistas e/ou credores) para financiar o investimento na tecnologia de referência na área geográfica considerada]. Algumas partes interessadas manifestaram preocupações com a possibilidade de a avaliação ser demasiado otimista em termos de comportamento do investimento, ou seja, sugeriram que os investidores avessos ao risco não seriam capazes de financiar um projeto com base em subidas extremas dos preços extremos que ocorrem durante algumas horas por ano. Por conseguinte, deve também ser dada especial atenção às condições do processo de tomada de decisões de investimento, através da modelização adequada da aversão ao risco de um investidor racional através de «taxas mínimas».
4.1.4Capacidades interzonais
A atual AEAR (artigo 4.º, n.º 7, da metodologia AEAR) modeliza os intercâmbios interzonais de países terceiros de duas formas distintas: i) no caso dos sistemas que não são de todo modelizados (Rússia, Bielorrússia), não se presume qualquer intercâmbio interzonal; ii) e, no caso dos sistemas que «não são explicitamente modelizados» (Marrocos, Moldávia, Tunísia e Ucrânia), os intercâmbios interzonais devem refletir as condições de mercado e as práticas operacionais previstas (incluindo acordos de ligação específicos). Os pressupostos relacionados com esses intercâmbios interzonais de países terceiros devem ser continuamente monitorizados pela REORT‑E (com supervisão da ACER), a fim de refletir o nível de risco associado a estes sistemas.
4.1.5Impacto das medidas constantes dos planos de execução dos Estados‑Membros
A metodologia AEAR (artigo 3.º, n.º 3, e artigo 5.º, n.º 14) contém um requisito segundo o qual a avaliação deve estar em consonância com as medidas e ações definidas pelos Estados-Membros nos planos de execução nos termos do artigo 20.º, n.º 3, do Regulamento Eletricidade. Num espírito de simplificação (e em conformidade com o artigo 23.º, n.º 5, do Regulamento Eletricidade), a avaliação poderá, no futuro, em vez de se alinhar com as medidas constantes dos planos de execução dos Estados-Membros, antecipar o impacto provável das medidas contidas nesses planos.
Além disso, caso seja identificada uma restrição indireta à formação dos preços grossistas nos termos do artigo 10.º, n.º 4, do Regulamento Eletricidade (e modelizada na AEAR), a metodologia AEAR (artigo 3.º, n.º 7) exige que a avaliação contenha uma sensibilidade obrigatória para identificar se as restrições indiretas à formação de preços podem constituir possíveis fontes de problemas de adequação dos recursos. Num espírito de simplificação, esta sensibilidade poderá deixar de ser obrigatória.
4.1.6Fatores de redução
A metodologia AEAR (artigo 4.º, n.º 4) contém requisitos em matéria de disponibilidade de fontes de aprovisionamento. Deve haver uma visão comum sobre a definição de fatores de redução para diferentes tecnologias. A REORT-E (sob a supervisão da ACER) deve disponibilizar ao público estes fatores de redução.
4.1.7Contributo da resposta do lado da procura e do armazenamento
A metodologia AEAR (artigo 4.º, n.os 3 e 5) contém requisitos sobre a forma de modelizar a resposta do lado da procura e o armazenamento. No entanto, as tecnologias de flexibilidade não fóssil ainda não foram objeto da aplicação da AEAR. À medida que a transição energética prossegue e o seu modelo de negócio se desenvolve, torna-se mais importante aperfeiçoar a aplicação da AEAR para que passe a considerar recursos de flexibilidade não fóssil e ter em conta quaisquer recursos apoiados ao abrigo de medidas de flexibilidade (por exemplo, uma melhor integração dos condicionalismos inerentes à variação de carga no modelo de despacho económico, uma melhor tomada em consideração das receitas dos serviços de sistema para a avaliação da viabilidade económica, uma melhor estimativa dos recursos locais, tais como bombas de calor, penetração dos veículos elétricos no mercado, etc.). A AEAR pode não só ter devidamente em conta o contributo da resposta do lado da procura e do armazenamento, mas deve também fornecer dados pertinentes para a avaliação das necessidades de flexibilidade, evitando assim a duplicação do trabalho dos Estados-Membros.
4.1.8Transparência e interação com as partes interessadas
A metodologia AEAR (artigos 9.º e 11.º) já contém requisitos em matéria de transparência e interação com as partes interessadas. Devem prosseguir os esforços para aumentar a transparência. Por exemplo, as partes interessadas e os reguladores solicitaram a publicação de resultados da AEAR que indiquem a distribuição da energia não servida por hora. Essas informações são fundamentais para que os Estados-Membros e as partes interessadas compreendam em que medida um evento de escassez constitui uma ameaça grave para a segurança do aprovisionamento e deve ser incluído na AEAR. A REORT-E (sob a supervisão da ACER) deve disponibilizar ao público os contributos (artigo 5.º da metodologia AEAR) que não sejam específicos dos Estados‑Membros, mas utilizados como valores predefinidos em todas as zonas de ofertas no modelo AEAR (por exemplo, indicadores de custos dos recursos, fatores de redução).
4.2. Racionalização do processo de aprovação de mecanismos de capacidade pela Comissão
Para que um auxílio estatal possa ser concedido legalmente através de um mecanismo de capacidade, tem de ser previamente aprovado por meio de uma decisão da Comissão. A adoção de uma decisão em matéria de auxílios estatais relativa a um mecanismo de capacidade nacional exige que se avalie a compatibilidade deste com os requisitos do Regulamento Eletricidade (artigos 20.º a 27.º) e da secção 4.8 das CEEAG.
A fim de responder às preocupações dos Estados-Membros e acelerar a aprovação de mecanismos de capacidade, a Comissão propõe o desenvolvimento de um procedimento simplificado em matéria de auxílios estatais para mecanismos de capacidade concebidos segundo modelos predefinidos e prontos a utilizar baseados em boas práticas e que, por conseguinte, possam expectavelmente limitar as distorções da concorrência. Este procedimento simplificado será proposto no âmbito do novo enquadramento para os auxílios estatais mencionado no pilar 2 da Comunicação «Bússola para a Competitividade».
A fim de permitir a necessária apreciação jurídica ao abrigo do Regulamento Eletricidade e das regras em matéria de auxílios estatais, bem como de fornecer as orientações necessárias em relação às conceções nacionais geralmente complexas, este procedimento simplificado abrangeria um conjunto necessário de características de conceção. Embora continue a ser necessária uma decisão em matéria de auxílios estatais para aprovar um mecanismo de capacidade, seria possível acelerar significativamente os debates com a Comissão no caso dos Estados-Membros que seguem o procedimento simplificado.
O procedimento simplificado proposto abrangeria as duas conceções mais comuns dos mecanismos de capacidade — uma para os mecanismos de capacidade dos compradores centrais à escala do mercado e outra para as reservas estratégicas — e resumiria os principais elementos que os Estados‑Membros são obrigados a apresentar na forma de uma lista de verificação.
Nos casos em que a conceção do mecanismo de capacidade prevista pelo Estado-Membro esteja em consonância com todos os elementos da lista de verificação, a Comissão procederia à rápida adoção de uma decisão em matéria de auxílios estatais, sem necessidade de novos debates sobre a conceção.
Os requisitos aplicáveis a este procedimento simplificado podem incluir os seguintes elementos:
·os Estados-Membros podem aplicar o procedimento simplificado se se basearem no relatório mais recente da AEAR (aprovado pela ACER) para demonstrar a necessidade do regime. Tal como referido no ponto 4.1, a metodologia AEAR será, no futuro, simplificada e os Estados-Membros disporão de flexibilidade adicional para justificar o seu regime com base na AEAR,
·como simplificação adicional para acelerar o processo de aprovação do mecanismo de capacidade, a Comissão solicitará à ACER que calcule um valor de referência da energia não distribuída para todos os Estados-Membros, tirando partido das experiências atuais para aumentar a eficiência e reforçar a coerência do cálculo. A ACER deve também disponibilizar indicadores de custos de referência a nível da UE, tendo em conta os estudos existentes sobre o custo de mais entrada e os melhores estudos económicos disponíveis. Estes valores de referência (que a ACER disponibilizará imediatamente) permitirão aos Estados-Membros estabelecer rapidamente as suas normas de fiabilidade se decidirem ter em conta os cálculos da ACER,
·no que diz respeito ao processo global de aprovação dos mecanismos de capacidade, os Estados-Membros que ainda não tenham adotado o seu plano de execução podem apresentar à Comissão o seu plano com bastante antecedência em relação ao regime proposto. Os Estados-Membros podem aplicar as reformas propostas no seu plano paralelamente à introdução do regime. Os Estados-Membros que já apresentaram o seu plano de execução e receberam o parecer da Comissão não são obrigados a emitir um novo plano de execução,
·por último, no que diz respeito à conceção do regime, este deve cumprir um conjunto necessário de características de conceção. A Comissão especificará estas boas práticas no âmbito da proposta relativa ao novo enquadramento para os auxílios estatais.
5.CONCLUSÃO E PRÓXIMAS ETAPAS
Com base no reexame do procedimento relacionado com os pedidos de introdução de mecanismos de capacidade ao abrigo do capítulo IV do Regulamento Eletricidade, a Comissão conclui que é possível racionalizar vários elementos, bem como, em certas condições, simplificar o procedimento.
Nos termos do artigo 69.º, n.º 3, do Regulamento Eletricidade, a Comissão deve apresentar, até 17 de abril de 2025, propostas com vista a simplificar o processo de avaliação dos mecanismos de capacidade, conforme adequado.
Essa proposta é apresentada em pormenor no anexo I do projeto de comunicação da Comissão sobre o quadro relativo a medidas de auxílio estatal em apoio do Pacto da Indústria Limpa (Enquadramento para os auxílios estatais no âmbito do Pacto da Indústria Limpa — CISAF). Os Estados-Membros serão consultados sobre a proposta antes da sua adoção.
A posição da Comissão sobre o presente relatório não prejudica qualquer posição que possa tomar sobre a compatibilidade de qualquer medida nacional de execução com o direito da UE.