Bruxelas, 26.10.2023

COM(2023) 670 final

RELATÓRIO DA COMISSÃO AO PARLAMENTO EUROPEU E AO CONSELHO

Circularidade da gestão dos lubrificantes minerais e sintéticos e dos óleos industriais usados na UE


1.Introdução

O presente relatório contém os resultados da análise dos dados e da avaliação realizada sobre a gestão dos lubrificantes minerais e sintéticos e dos óleos industriais usados na UE, com vista a ponderar a viabilidade da adoção de medidas para melhorar o tratamento de óleos usados, nomeadamente metas quantitativas sobre a recolha e a regeneração de óleos usados, que a Comissão levou a cabo em conformidade com o disposto no artigo 21.º, n.º 4, da Diretiva-Quadro Resíduos 1 (DQR). Baseia-se em três estudos aprofundados 2 3 4 da Comissão realizados entre 2019 e 2023.

2.Contexto

Os óleos usados são definidos na DQR como «quaisquer lubrificantes minerais ou sintéticos ou óleos industriais que se tenham tornado impróprios para o uso a que estavam inicialmente destinados, tais como os óleos usados dos motores de combustão e dos sistemas de transmissão, os óleos lubrificantes usados e os óleos usados de turbinas e sistemas hidráulicos» 5 .

Normalmente, os óleos lubrificantes e industriais são compostos por óleos de base e aditivos. Os óleos para motor, usados nos setores automóvel, marítimo e industrial, representam cerca de metade do total de óleos lubrificantes colocados no mercado. Os óleos hidráulicos ocupam a segunda posição, representando entre 15 % e 20 % do volume. Quando se transformam em resíduos, estes óleos são classificados como resíduos perigosos e representam o fluxo de resíduos perigosos líquidos mais importante na UE, tendo sido recolhidas em 2017 aproximadamente 1,6 milhões de toneladas de óleos usados 6 . Os óleos vegetais usados produzidos pelas cozinhas e atividades similares estão fora do âmbito do presente relatório e não são abrangidos pela definição de óleo usado.

Os óleos usados encontram-se regulamentados na UE há mais de 40 anos. A Diretiva 75/439/CE 7 relativa à eliminação dos óleos usados exigia que estes fossem recolhidos e eliminados sem provocar danos evitáveis para o homem e para o ambiente. No ano de 1987 8 foram introduzidas alterações importantes que levaram a que fosse privilegiada a regeneração dos óleos usados em vez da sua incineração para valorização energética. A DQR obriga os Estados-Membros a adotarem medidas rigorosas para garantir que os óleos usados são recolhidos separadamente, evitando a mistura com outros resíduos e, se exequível, com outros tipos de óleo, e que a sua gestão não ponha em perigo a saúde humana ou o ambiente, respeitando a hierarquia dos resíduos.

Conforme indicado na Comunicação sobre o Pacto Ecológico Europeu 9 , a União Europeia pugna por uma economia circular e com impacto neutro no clima, no contexto de um ambiente sem substâncias tóxicas que exige uma ação mais forte em termos de prevenção da poluição. A boa gestão ambiental dos óleos usados, de uma forma que minimize as emissões e as descargas e em que os óleos sejam em grande medida regenerados, pode contribuir de modo importante para a consecução destes objetivos, que são desenvolvidos mais aprofundadamente no Plano de Ação para a Economia Circular 10 e no Plano de Ação para a Poluição Zero 11 .

3.Panorâmica da gestão dos óleos usados na UE

Em 2017, foram colocados no mercado da UE cerca de 4,3 milhões de toneladas de óleos lubrificantes e industriais. Os 1,64 milhões de toneladas de óleos usados recolhidos na UE-28 em 2017 representam 38 % desta quantidade e correspondem a 82 % dos óleos usados teoricamente suscetíveis de recolha (~2 milhões de toneladas) 12 . As perdas inevitáveis, estimadas em 2,3 milhões de toneladas, ocorrem durante a utilização, sobretudo devido à queima em motores ou à eliminação juntamente com outros resíduos. Estima-se que cerca de 18 % dos óleos usados suscetíveis de recolha sejam perdidos nos queimadores de óleos usados de pequenas dimensões, devido à conversão ilegal em combustíveis e, em grau limitado, através de descargas diretas para o ambiente. Estas atividades têm um impacto direto e nefasto na água, nos solos e na qualidade do ar, são ilegais e contrárias à hierarquia dos resíduos e podem resultar em concorrência desleal com os operadores de resíduos legais, exigindo assim esforços intensificados em termos de recolha e de aplicação da lei para as evitar.

O caso específico dos óleos usados de navios é tratado na Diretiva 2000/59/CE 13 relativa aos meios portuários de receção, que visa reduzir substancialmente as descargas no mar de resíduos produzidos em navios e de resíduos da carga. A Agência Europeia da Segurança Marítima presta um serviço de prevenção da poluição, incluindo serviços de observação da Terra com recurso à imagiologia por satélite 14 .

A abordagem adotada para a gestão dos óleos usados difere substancialmente entre Estados-Membros. Em 11 Estados-Membros estão implementados regimes de responsabilidade alargada do produtor para óleos lubrificantes usados 15 .

Observa-se 16 que, aproximadamente, 61 % dos óleos usados são recolhidos e regenerados como óleos de base, ao passo que 24 % são tratados para produzir combustíveis e 11 % são utilizados para valorização energética direta em fábricas de cimento, cal, aço e em centrais elétricas, sendo o remanescente incinerado como resíduos perigosos. Em 2019, havia 27 instalações de regeneração de óleos usados na UE-28 17 , distribuídas por 11 Estados-Membros, com uma capacidade aproximada de 1,5 milhões de toneladas de óleos usados. No total, cerca de 0,95 milhões de toneladas de resíduos foram tratados em instalações de regeneração na UE, produzindo aproximadamente 0,68 milhões de toneladas de óleo de base regenerado. Estes valores revelam que os óleos de base regenerados representam cerca de 8 % 18 da quantidade anual de óleo de base produzido na UE e indica que mesmo que todos os óleos usados disponíveis para recolha fossem recolhidos e regenerados em óleo de base, a regeneração só é capaz de cobrir uma parte da procura.

Figura 1: Gestão dos óleos usados nos Estados-Membros da UE-27 19 .

Apesar das incertezas na estimativa das quantidades de óleos colocados no mercado que podem ser recolhidas, os dados mostram que ainda existe margem para melhoria, não só em termos da quantidade e qualidade dos óleos usados recolhidos, mas também da quantidade de óleos recolhidos que são regenerados. A secção abaixo apresenta abordagens para melhorar ambos os aspetos, reconhecendo que o ponto de partida e o contexto da gestão dos óleos usados diferem substancialmente de um Estado-Membro para outro.

4.Recolha de óleos usados

As taxas de recolha de óleos usados variam consideravelmente entre os Estados-Membros. Em 2018, variavam entre 38 % e 100 % dos óleos suscetíveis de recolha 20 . As informações limitadas sobre práticas ilegais com impacto nas taxas de recolha sugerem que a principal prática que afeta negativamente a recolha de óleos usados é a sua queima ilegal. A descarga direta no meio ambiente parece ser rara e não suficientemente expressiva para explicar as diferenças nas taxas de recolha.

Regimes de responsabilidade alargada do produtor e de recolha

Os Estados-Membros com elevadas taxas de recolha não aplicam necessariamente uma abordagem comum 21 . Alguns têm instituído um regime de responsabilidade alargada do produtor (por exemplo, Portugal, Itália), contrariamente a outros (por exemplo, Alemanha, Áustria). De igual modo, no que respeita aos Estados-Membros com uma taxa de recolha baixa, não foi possível definir um padrão comum. Alguns têm um regime de responsabilidade alargada do produtor (por exemplo, Bulgária), contrariamente a outros (por exemplo, Roménia). Em igualdade de circunstâncias, o desempenho em termos de recolha parecer ser superior em países com uma elevada densidade populacional, uma atividade industrial significativa e uma capacidade de regeneração ou de valorização energética em instalações próximas.

Figura 2: Taxas de recolha de óleo usado em 2018 (recolhido/suscetível de recolha) 22

De acordo com um estudo recente 23 , não existe uma conclusão clara quanto à necessidade de um regime de responsabilidade alargada do produtor ou de outros regimes de recolha formalizados (por exemplo, sistemas de consignação) para garantir taxas de recolha elevadas. Contudo, parece evidente que dois fatores principais impulsionam o desempenho em matéria de recolha de óleo usado:

·Custo/benefício para os detentores de resíduos: se se pagar ao detentor de resíduos pelo óleo usado, as taxas de recolha aumentam;

·Empenho dos detentores de resíduos em gerir os seus resíduos de forma legal: depende, em grande medida, da sensibilização dos detentores de resíduos e da aplicação da lei pelos Estados-Membros.

Por conseguinte, as taxas de recolha são elevadas quando esta é lucrativa, ou seja, quando os detentores de resíduos recebem dinheiro pelos mesmos, quando a recolha é gratuita ou quando estão dispostos a pagar o preço de mercado pela gestão dos seus resíduos. Nas áreas geográficas em que os custos superam a disponibilidade para pagar, estes serviços podem não ser assegurados, resultando numa gestão ilegal. Em última análise, as características do regime de incentivos parecem ter mais influência nas taxas de recolha do que o facto de estar ou não instituído um regime de responsabilidade alargada do produtor.

Veículos elétricos e impacto nos volumes de óleo usado

O estudo 24 também forneceu projeções para a produção de óleos usados na UE-27 até 2050 com base em duas abordagens de modelização, uma baseada nas previsões da procura de lubrificantes feitas pela McKinsey & Company 25 e outra baseada no mesmo aumento da procura, tendo em conta as metas regulamentares da UE para diminuir as emissões de gases com efeito de estufa provenientes dos veículos 26 e as informações sobre a utilização de lubrificantes em veículos elétricos 27 . Estas projeções assumem que a procura de lubrificantes na frota elétrica e a pilhas de combustível da UE corresponderá a 10 % da de uma frota convencional, prevendo-se um decréscimo da utilização de óleos para motor na UE. Presume-se que a produção de óleos usados provenientes do setor automóvel – que, atualmente, representa cerca de 40 % do mercado de óleos lubrificantes – diminuirá gradualmente do seu nível de 2035 para 32,5 % do mesmo em 2050. De acordo com o referido estudo, a produção total de óleos usados na UE-27 situar-se-á entre 1,7 e 2 milhões de toneladas neste último ano, valor similar à quantidade de óleos usados suscetíveis de recolha comunicados em relação a 2017. Estas projeções indicam uma baixa probabilidade de a quantidade global de óleos usados disponíveis para tratamento sofrer alterações significativas nas próximas décadas, o que pode ser explicado pela estimativa de que as referidas reduções na produção de óleos usados no transporte rodoviário sejam amplamente compensadas pelo aumento de outros modos de transporte e de utilizações industriais/não relacionadas com o transporte.

Medidas para aumentar a recolha e a qualidade dos óleos usados

Atualmente, a taxa média de recolha de óleos usados na UE é de cerca de 82 % 28 , mas com grandes disparidades entre os Estados-Membros devido a aspetos nacionais e específicos do contexto. Sete Estados-Membros têm, na sua legislação, metas de recolha de óleos usados juridicamente vinculativas 29 . Conforme ilustrado pela análise 30 composta por relatórios elaborados pelos Estados-Membros relativos a 2020, as informações estatísticas disponíveis sobre recolha e gestão de óleos usados não são suficientemente sólidas para se estabelecerem metas de recolha obrigatórias na UE. Todavia, os Estados-Membros poderiam equacionar uma abordagem assente em metas nacionais.

Essa abordagem poderia articular-se em torno de dois valores-alvo para 2030, fixados em 80 % e 95 % 31 no que diz respeito às quantidades de óleos usados 32 suscetíveis de recolha. Os Estados-Membros com melhor desempenho poderiam considerar a aplicação imediata da meta mais elevada 33 ou, se esta já tiver sido alcançada, garantir a sua manutenção. Aqueles com um desempenho inferior devem concentrar os seus esforços no cumprimento da meta de recolha de 80 % até 2030 e da meta de 95 % até 2035. Esta abordagem tem a vantagem de responder diretamente ao objetivo de recolher mais óleos usados, proporcionando simultaneamente alguma flexibilidade aos Estados-Membros.

A análise dos sistemas de gestão e dos regimes de recolha de óleos usados existentes na UE (e não só) e das boas práticas aplicadas, assim como das informações limitadas sobre a recolha e a regeneração de óleos usados nos Estados-Membros da UE, permitirá equacionar uma série de medidas destinadas a aumentar a quantidade e a qualidade dos óleos usados:

a.Possibilidade de os Estados-Membros estabelecerem metas de recolha obrigatórias

I.recolha de 80 % (peso seco) dos óleos usados produzidos até 2030.

II.recolha de 95 % (peso seco) dos óleos usados produzidos até 2030, para os Estados-Membros que já recolhem mais de 80 %.

b.Outras possíveis medidas para aumentar a recolha de óleos usados 34  

I.Introduzir uma subvenção para detentores de pequenas quantidades de resíduos aprovados, que, a pedido, poderiam receber uma subvenção anual de montante fixo para cobrir os custos de recolha.

II.Proibir a cobrança aos detentores de resíduos pela recolha (gratuita ou paga), eventualmente com condições – como um volume mínimo de recolha ou requisitos de qualidade.

III.Obrigatoriedade de os agentes de recolha de óleos usados prestarem um serviço de recolha inclusivo do ponto de vista espacial e abrangente, garantindo deste modo a recolha em casos menos rentáveis (zonas remotas, produtores de óleos usados de pequena dimensão, etc.).

IV.Conceder aos detentores de resíduos de pequena dimensão acesso a instalações de recolha municipais (por exemplo, pontos de recolha municipais). Seria, assim, prestado um serviço prático aos produtores de óleos usados de pequena dimensão, reduzindo o risco de eliminação ilegal.

V.Definir critérios específicos para a atribuição de licenças a agentes de recolha de óleos usados, definindo requisitos mínimos – por exemplo, em relação à cobertura geográfica do serviço, à capacidade de armazenamento e de controlo da qualidade, etc.

c.Possíveis medidas para aumentar a qualidade dos óleos usados recolhidos 35

I.Estabelecer o controlo da qualidade obrigatório pelos agentes de recolha de resíduos (incluindo pontos de controlo, frequência, parâmetros, etc.).

II.Garantir a recolha seletiva de fluxos de resíduos com potencial para contaminar óleos usados (por exemplo, óleo vegetal e alimentar, fluidos de travões).

III.Exigir que os detentores de resíduos que contaminem óleos usados (por exemplo, devido a separação inadequada e contaminação subsequente de lotes num camião ou reservatório de armazenagem) paguem pelo respetivo tratamento.

IV.Estabelecer orientações pormenorizadas e ministrar formação para esclarecer que tipos de óleos usados devem ser separados pelo detentor de resíduos, para evitar a mistura com óleos de bifenilos policlorados, fluidos de travões, etc.

Cumpre salientar que nem todas as medidas enumeradas (por exemplo, subvenções para detentores de resíduos de pequena dimensão + recolha gratuita/paga) podem ser combinadas e que a melhor forma de as aplicar pode ser muito específica do contexto nacional, nomeadamente o facto de as medidas serem adotadas no âmbito de um regime de responsabilidade alargada do produtor ou de disposições jurídicas específicas, orientações ou outros meios 36 . Estas medidas devem ser complementadas com a aplicação da lei pelos Estados-Membros e com ações de informação e sensibilização dirigidas aos produtores de óleos usados e ao público em geral.

5.Regeneração de óleos usados

O Plano de Ação para a Economia Circular visa promover e encorajar uma economia sustentável, eficiente na utilização dos recursos e competitiva, na qual o valor dos materiais e produtos é mantido em circulação durante o máximo de tempo possível. Uma vez que os óleos usados podem ser reciclados por processos tecnicamente bem estabelecidos, têm potencial para contribuir de forma significativa para os objetivos da economia circular.

A Diretiva-Quadro Resíduos define a regeneração de óleos usados como «qualquer operação de reciclagem que permita produzir óleos de base mediante a refinação de óleos usados, designadamente mediante a remoção dos contaminantes, produtos de oxidação e aditivos que os referidos óleos contenham» 37 . Fixa igualmente uma hierarquia dos resíduos que determina que a preparação para reutilização e a reciclagem devem ter prioridade em relação à valorização energética. No que diz respeito aos óleos usados, o artigo 21.º indica uma prioridade para a regeneração em relação a outras opções de tratamento.

Figura 3: Utilização de óleos usados por tratamento 38

Sete Estados-Membros 39 comunicam taxas de regeneração de 90 % ou mais 40 , enquanto dez registam taxas inferiores a 10 %. A utilização em fornos de cimento e centrais elétricas não é, de um modo geral, muito expressiva, mas em três Estados-Membros 41 representa mais de 50 % dos óleos recolhidos. Estima-se que 5 % a 15 % dos óleos usados recolhidos sejam de baixa qualidade e impróprios para regeneração, sendo, deste modo, habitualmente utilizados em fornos de cimento, caldeiras industriais e incineradores destinados a resíduos perigosos. Com base nos resultados e tecnologias de recolha atuais, tal implica, numa perspetiva conservadora, um máximo de 85 % dos óleos usados recolhidos que podem ser regenerados.

Conforme indicado em diversos estudos 42 , os óleos usados podem ser regenerados por diferentes processos: na UE, aproximadamente 32 % dos óleos usados recolhidos são regenerados por hidrotratamento, 46 % por extração com solventes e 22 % por destilação. A capacidade de regeneração disponível na UE não parece constituir um fator limitativo, porquanto excede o volume atualmente tratado por esse método, tendo sido apresentados novos projetos de instalações de regeneração (por exemplo, em Portugal). No entanto, se todos os óleos usados recolhidos fossem enviados para regeneração – e se as taxas de recolha aumentassem – seria necessário aumentar a capacidade.

Os principais fatores que parecem explicar o motivo pelo qual uma parte significativa de óleos usados recolhidos não entra na via da regeneração incluem: 1) a distribuição desigual das capacidades de regeneração entre Estados-Membros; 2) a escassez de incentivos para regeneração devido à ausência de instrumentos específicos para a apoiar (ajuda financeira, metas) em alguns Estados-Membros; 3) o aumento da procura de combustíveis com baixo teor de enxofre, sobretudo no mercado dos combustíveis navais; e 4) a variabilidade dos preços do óleo virgem, tornando a regeneração menos competitiva do que a valorização energética quando os preços do óleo virgem se situam no extremo inferior.

Comparação entre a regeneração de óleos usados e a valorização energética

A Comissão concluiu recentemente um novo estudo avançado que se baseia no ciclo de vida 43 para comparar o desempenho global das três principais tecnologias de regeneração de óleos usados 44 com diferentes opções para a valorização energética a partir de óleos usados 45 . A análise foi realizada com recurso a um instrumento específico de modelização da análise do ciclo de vida (ACV) 46 , que foi aplicado para simular as diferentes atividades e processos de gestão de resíduos incluídos em cada tecnologia, assim como para calcular os respetivos possíveis impactos ambientais 47 e custos do ciclo de vida (CCV). Esta análise foi posteriormente utilizada para obter informações sobre eventuais políticas que poderiam ser adotadas para aumentar os fluxos de óleos usados para as vias mais benéficas.

O estudo distingue dois tipos de CCV. Os CCV convencionais descrevem o custo financeiro como a soma dos custos e transferências orçamentais, ou seja, custos internos da gestão dos óleos usados. Os CCV societais somam os custos internos e externos, ambos expressos como preços-sombra, para quantificar o custo total suportado pela sociedade, refletindo assim uma avaliação dos custos e benefícios sociais e incluindo o preço-sombra específico do CO2, de outras emissões e do esgotamento dos recursos 48 . O estudo inclui também uma análise para verificar a sensibilidade dos resultados a vários fatores, assim como uma avaliação da incerteza nos resultados finais através de uma análise da cognoscibilidade 49 .

Resultado da avaliação da regeneração face à valorização energética

Para a maior parte das categorias de impacto, bem como em termos de custos do ciclo de vida societais, as três vias de regeneração 50 são as que registam melhor desempenho entre todas as opções de tratamento de óleos usados. A regeneração, nomeadamente, destaca-se como a via de gestão preferida quando se ponderam apenas os impactos no aquecimento global. Os resultados são mais matizados quando se ponderam os custos societais totais do ciclo de vida (ou seja, as emissões para o ambiente, quantificadas em termos monetários, de todos os tipos, bem como o esgotamento dos recursos), o que revela que a via de regeneração com o pior desempenho – baseada em solventes – apenas produz um pequeno benefício face ao tratamento para obter combustíveis, por destilação; em determinadas condições, pode até ficar atrás deste. A análise da cognoscibilidade também revela que, em termos dos custos do ciclo de vida societais, a regeneração com solventes e a regeneração por destilação não apresentam uma clara vantagem relativamente ao tratamento para obtenção de combustível, embora o contrário também seja verdade. As vias de incineração direta (por exemplo, combustão em fornos de cimento) são claramente opções menos vantajosas.

Em conclusão, numa perspetiva dos custos societais, e consoante a tecnologia e contexto específicos, a regeneração é preferível ou comparável ao tratamento para combustível e preferível à valorização energética direta. Esta análise demonstra que os Estados-Membros devem promover opções que produzam o melhor resultado ambiental global. No que respeita à gestão dos óleos usados, isso significa promover um maior recurso a instalações que utilizem as tecnologias de regeneração com melhor desempenho e mais avançadas, que não só apresentam o melhor desempenho ambiental como também produzem os óleos de base de valor mais elevado 51 .

Possíveis medidas para promover a regeneração de óleos usados

Existem diversas abordagens passíveis de serem aplicadas para aumentar a quantidade de óleos usados regenerados. As mais promissoras consistem em metas de regeneração ou instrumentos baseados no preço. As metas de regeneração podem assumir a forma do estabelecimento de percentagens mínimas obrigatórias, a nível nacional, de: 1) óleos usados recolhidos que têm de ser regenerados; 2) óleos lubrificantes ou de base colocados no mercado que têm de ser derivados de óleos usados regenerados; 3) teor de produto regenerado em cada lubrificante. A primeira abordagem regula a oferta de óleos usados regenerados e é adequada à fixação de metas a nível dos Estados-Membros, ao passo que as outras duas abrangem a procura e dizem respeito a requisitos dos produtos. No que respeita aos instrumentos baseados no preço, as opções analisadas incluíram uma subvenção à regeneração financiada pelo orçamento geral ou por uma taxa sobre os óleos de base virgens.

Foi realizada uma avaliação dos impactos socioeconómicos de políticas que estabeleceriam duas taxas de referência de regeneração de óleos usados a alcançar pelos Estados-Membros até 2030:

1)uma taxa de regeneração de 70 % de todos os óleos usados recolhidos, que representa um aumento face à média atual da UE de 61 %;

2)uma taxa de regeneração de 85 % de todos os óleos usados recolhidos, que corresponde a uma estimativa conservadora do volume que pode ser realisticamente regenerado.

Por definição, os efeitos ambientais 52 são idênticos para todas as políticas que alcancem a mesma meta. Embora o estabelecimento, como meta, de uma taxa mínima de regeneração obrigatória, definida como uma percentagem dos óleos usados recolhidos, resulte num encargo financeiro indefinido, que depende em grande medida da aplicação específica em cada Estado-Membro, o principal encargo das outras duas opções, baseadas na fixação de metas mínimas para a utilização de óleos usados regenerados em produtos lubrificantes, recai inicialmente sobre os produtores de lubrificantes e, em última instância, sobre os consumidores dos mesmos.

As subvenções para a regeneração financiadas pelo orçamento geral ou por uma taxa sobre o óleo de base virgem traduzem-se em custos relativamente elevados, que excedem amplamente as economias previstas nos custos do ciclo de vida societais. Tal deve-se ao facto de que teriam de ser pagas subvenções para todos os óleos de base regenerados, incluindo para a grande fração (61 %) que já é regenerada. A avaliação do resultado das três políticas baseadas em metas não é linear, uma vez que os benefícios esperados em termos de custos societais evitados são da mesma ordem de grandeza que os custos administrativos estimados 53 , conduzindo à conclusão de que os benefícios líquidos após a contabilização dos custos deverão ser bastante reduzidos (e nalguns casos negativos), podendo não ser suficientes para justificar uma intervenção política a nível da UE, sobretudo atendendo às incertezas envolvidas.

6.Conclusões

De um modo geral, a regeneração é a opção de tratamento que proporciona o melhor desempenho global dos pontos de vista ambiental e socioeconómico. Embora os Estados-Membros devam envidar mais esforços para aplicar as regras relativas aos óleos usados estabelecidas na DQA, não se justifica muito, na atualidade, propor requisitos adicionais a nível da UE. Por exemplo, a experiência dos Estados-Membros mostra que é possível alcançar elevadas taxas de recolha de óleos usados sem recurso a regimes obrigatórios de responsabilidade alargada do produtor, pelo que não se pode justificar, em termos gerais, a criação de um sistema obrigatório de responsabilidade alargada do produtor para os óleos usados. Além disso, é necessário dispor de dados mais sólidos sobre o desempenho dos diferentes Estados-Membros no domínio da produção, recolha e tratamento de óleos usados, tendo em vista a adoção de medidas legislativas.

A Comissão incentiva os Estados-Membros a tomarem nota das conclusões apresentadas no presente relatório e a analisá-las a fim de melhorar a aplicação das regras da UE em matéria de óleos usados a nível nacional, incentivar a recolha de óleos usados de maior qualidade e continuar a promover o seu tratamento, por recurso às tecnologias de regeneração com melhor desempenho.

A Comissão monitorizará de perto os dados sobre óleos usados comunicados pelos Estados-Membros e esforçar-se-á por apoiar a melhoria dos mesmos. Com base nesses dados e noutras informações sobre a aplicação da DQA no que respeita aos óleos usados, a Comissão poderá ponderar novas medidas da UE no futuro, como o estabelecimento de objetivos obrigatórios a nível da UE em matéria de recolha ou regeneração de óleos usados, em especial se as medidas tomadas pelos Estados-Membros criarem obstáculos ao mercado único.

(1)

 Diretiva 2008/98/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 19 de novembro de 2008, relativa aos resíduos e que revoga certas diretivas, JO L 312 de 22.11.2008, p. 3.

(2)

 Study to support the Commission in gathering structured information and defining of reporting obligations on waste oils and other hazardous waste (não traduzido para português), (2020). https://op.europa.eu/pt/publication-detail/-/publication/73a728bc-72f5-11ea-a07e-01aa75ed71a1/language-en/format-PDF/source-123020647 . 

(3)

 Environmental and economic sustainability of waste lubricant oil management in the EU (não traduzido para português). Comissão Europeia (2023). https://publications.jrc.ec.europa.eu/repository/handle/JRC133752    

(4)

 Study to analyse lubricant and industrial oil EPR systems and waste oil collection schemes in EU Member States to support measures to increase collection rates (não traduzido para português). Comissão Europeia (2023). https://data.europa.eu/doi/10.2779/948514  

(5)

 Artigo 3.º, ponto 3, da Diretiva 2008/98/CE.

(6)

 Números relativos à produção e recolha para a UE-28 (ver nota de rodapé 2). O Eurostat indica valores mais elevados de 4,0-4,5 Mt numa estatística altamente agregada que não é muito significativa ou comparável.

(7)

 Diretiva 75/439/CEE do Conselho, de 16 de junho de 1975, relativa à eliminação dos óleos usados, JO L 194 de 25.7.1975, p. 23, p. 31.

(8)

 Diretiva 87/101/CEE do Conselho de 22 de dezembro de 1986 que altera a Diretiva 75/439/CEE relativa à eliminação dos óleos usados, JO L 42 de 12.2.1987, p. 43.

(9)

 Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões intitulada «Pacto Ecológico Europeu», COM(2019) 640 final. 

(10)

 Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões intitulada «Um novo Plano de Ação para a Economia Circular – Para uma Europa mais limpa e competitiva», COM(2020) 98 final.

(11)

 Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões intitulada «Caminho para um planeta saudável para todos – Plano de ação da UE: “Rumo à poluição zero no ar, na água e no solo”», COM(2021) 400 final.

(12)

 Todos os números indicados neste parágrafo são apresentados no estudo a que se refere a nota de rodapé 2.

(13)

https://eur-lex.europa.eu/eli/dir/2000/59/2019-06-27?locale=pt.

(14)

https://www.emsa.europa.eu/csn-menu.html.

(15)

 BE, BG, HR, DK, EL, ES, FR, IT, LT, PL, PT.

(16)

 Ver nota de rodapé 2.

(17)

 UE-28, concretamente na BG, DK, FI, FR, DE, EL, IT, PL, PT, ES, UK (este último não figura no mapa).

(18)

  Entre 2013 e 2018, foram produzidas na UE-28 cerca de 8 Mt/ano de óleos de base virgens produzidos na UE-28.

(19)

 Ver nota de rodapé 4.

(20)

 GEIR (2019). https://www.geir-rerefining.org .

(21)

 Ver nota de rodapé 4.

(22)

 Ibid.

(23)

 Ver nota de rodapé 4.

(24)

 Ibid.

(25)

https://www.mckinsey.com/industries/oil-and-gas/our-insights/lubes-growth-opportunities-remain-despite-switch-to-electric-vehicles

(26)

O segundo modelo usa as estimativas de composição e evolução da frota desenvolvidas na proposta «Normas Euro7» [COM(2022) 586 final].

(27)

Shah, Raj, et al. «Recent trends in batteries and lubricants for electric vehicles». Advances in Mechanical Engineering 13.5 (2021).

(28)

 Ver nota de rodapé 4.

(29)

 BE, FR, EL, LT, PL, PT e ES.

(30)

 Ver nota de rodapé 4.

(31)

 Conforme descrito no estudo mencionado na nota de rodapé 4, que analisa os impactos económicos, sociais e ambientais de tal medida.

(32)

 A taxa de recolha é definida como o rácio entre os óleos usados recolhidos e os óleos usados produzidos (suscetíveis de recolha).

(33)

 Não se propõe um objetivo de 100% de recolha, dado que: a) no contexto de um cenário de produção de óleos usados disperso e de baixo volume, isso pode resultar em custos desproporcionais e em impactos ambientais devido à recolha separada de todos os óleos usados produzidos e b) as incertezas nos fatores de emissão de óleos usados utilizadas para estimar a quantidade de óleos usados suscetíveis de recolha recomendam precaução.

(34)

 Qualquer medida tem de ser aplicada em conformidade com as regras da UE em matéria de auxílios estatais, bem como com o princípio do poluidor-pagador.

(35)

 Uma maior qualidade dos óleos usados recolhidos pode também ter um impacto positivo na quantidade de óleos recolhidos que são regenerados. 

(36)

 O estudo a que se refere a nota de rodapé 4 proporciona uma análise exaustiva da forma como os regimes de responsabilidade alargada do produtor e outros regimes de recolha são aplicados em diferentes Estados-Membros.

(37)

 Artigo 3.º, ponto 18, da Diretiva 2008/98/CE.

(38)

 Conforme publicado no relatório a que se refere a nota de rodapé 3.

(39)

 DK, EL, LU, IT, NL, BE, FI e BG.

(40)

 Alguns países comunicam taxas de regeneração de 100 %. Contudo, os dados sugerem que essas taxas elevadas podem ser artefactos contabilísticos, dado que alguns países comunicam separadamente os sedimentos iniciais e a humidade dos óleos usados secos e outros comunicam apenas a regeneração de óleos usados com qualidade suficiente.

(41)

 HR, EE e SI.

(42)

 Ver notas de rodapé 2 e 4.

(43)

Ver referência ao estudo do JRC na nota de rodapé 3.

(44)

 Hidrotratamento, extração com solventes e destilação.

(45)

 Combustível derivado de óleo usado que substitui o combustível naval primário (WODFa); combustível derivado de óleo usado que substitui o fuelóleo leve primário (WODFb); combustão em forno de cimento; combustão em incinerador destinado a resíduos perigosos e combustão numa caldeira industrial.

(46)

 Programa informático de análise do ciclo de vida: EASETECH v3.4.0.

(47)

 Foram analisadas 14 categorias de impacto.

(48)

 Foi utilizado o valor por defeito de 100 EUR/tonelada de CO2 sugerido pela CE Delft e a DG MOVE para 2030.

(49)

 Aplicando simulações de Monte Carlo a dois cenários em simultâneo, por exemplo, hidrotratamento face a extração com solventes.

(50)

 Hidrotratamento, extração com solventes e destilação.

(51)

Normalmente, óleos pertencentes aos Grupos API II e III.

(52)

 Permitindo evitar 0,6 Mt de emissões de equivalente de CO2 até 2045 para a meta de 70 % e 1,7 Mt para a meta de 85 % (cumulativo ao longo do período de tempo considerado).

(53)

 Resultando num benefício cumulativo calculado de 124 milhões de EUR entre 2024 e 2045 em termos de custos societais evitados para a meta de 70 % e de 330 milhões de EUR para a meta de 85 %. Estimam-se, cumulativamente, custos administrativos de 11-213 milhões de EUR para o mesmo período.