Bruxelas, 6.9.2022

COM(2022) 662 final

2022/0274(COD)

Proposta de

DECISÃO DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO

relativa ao não reconhecimento dos documentos de viagem russos emitidos em regiões estrangeiras ocupadas


EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS

1.CONTEXTO DA PROPOSTA

Razões e objetivos da proposta

Em reação à anexação ilegal da República Autónoma da Crimeia e da cidade de Sebastopol pela Federação da Rússia em 2014 e à continuação das ações desestabilizadoras no leste da Ucrânia, a União Europeia já introduziu i) sanções económicas em resposta às ações da Rússia de desestabilização da situação na Ucrânia, associadas à aplicação incompleta dos acordos de Minsk; ii) sanções em resposta a ações que comprometem ou ameaçam a integridade territorial, a soberania e a independência da Ucrânia; iii) sanções em resposta à anexação ilegal da República Autónoma da Crimeia e da cidade de Sebastopol pela Federação da Rússia.

A decisão da Federação da Rússia de reconhecer como entidades independentes as zonas não controladas pelo Governo das províncias ucranianas de Donetsk e Luhansk e de enviar tropas russas para invadir a Ucrânia, uma agressão militar sem precedentes contra a sua integridade territorial, soberania e independência, constitui uma grave violação do direito internacional e dos acordos internacionais, nomeadamente a Carta das Nações Unidas, a Ata Final de Helsínquia, a Carta de Paris e o Memorando de Budapeste.

Enquanto signatária dos acordos de Minsk, a Rússia tem a responsabilidade clara e direta de trabalhar para encontrar uma solução pacífica. Ao tomar a decisão de reconhecer como entidades independentes as regiões não controladas pelo Governo do leste da Ucrânia, a Federação da Rússia violou claramente os acordos de Minsk, que estipulam a restituição integral do controlo dessas zonas ao Governo ucraniano.

Em 23 de fevereiro de 2022, a UE chegou a acordo por unanimidade sobre um primeiro pacote de sanções, que infligiu um custo adicional à Rússia em resposta às suas ações. Este pacote de sanções incluía sanções individuais, restrições financeiras e restrições às relações económicas entre a UE e as zonas não controladas pelo Governo das províncias de Donetsk e Luhansk.

Em 24 de fevereiro de 2022, o Conselho Europeu condenou com a maior veemência a agressão militar não provocada e injustificada da Rússia contra a Ucrânia e, juntamente com os seus parceiros internacionais, manifestou total solidariedade para com a Ucrânia e o seu povo. Através das suas ações militares ilegais, a Rússia tem desde então continuado a violar gravemente o direito internacional, cometendo atrocidades contra a população ucraniana e comprometendo a segurança e a estabilidade a nível europeu e mundial. Além disso, o Conselho Europeu instou a Rússia a cessar imediatamente as suas ações militares, a retirar incondicionalmente todas as forças e equipamento militares de todo o território da Ucrânia e a respeitar plenamente a integridade territorial, a soberania e a independência da Ucrânia dentro das suas fronteiras internacionalmente reconhecidas.  1

Subsequentemente, a União respondeu com novos pacotes de sanções, incluindo o congelamento de bens e a proibição de viajar para pessoas singulares. A União adotou igualmente medidas restritivas relativas aos setores financeiro, da energia, dos transportes e das tecnologias. Tomou também medidas adicionais, nomeadamente a suspensão parcial da aplicação do Acordo sobre a facilitação da emissão de vistos 2 . Esta suspensão parcial visava certas categorias de cidadãos russos, incluindo membros de delegações oficiais russas, membros dos governos e parlamentos nacionais e regionais e empresários.

Desde o início da agressão russa contra a Ucrânia, a situação agravou-se, com consequências humanitárias trágicas para a população civil e as infraestruturas, tendo a Rússia continuado a expandir ilegalmente a sua ocupação total ou parcial das regiões do leste e do sul da Ucrânia.

A evolução negativa da política interna da Rússia, caracterizada por uma crescente repressão política por parte do Governo para preservar a atual ordem política e económica, afetou cada vez mais as relações UE-Rússia. Em resposta, paralelamente à presente proposta, a Comissão propôs igualmente a suspensão total do Acordo UE-Rússia sobre a facilitação da emissão de vistos 3 .

Uma vez que os Estados-Membros não reconheceram a anexação ilegal da República Autónoma da Crimeia e da cidade de Sebastopol pela Federação da Rússia, nem de outras regiões da Ucrânia ocupadas pela Rússia, os documentos de viagem emitidos pelas autoridades russas nestes territórios não foram geralmente reconhecidos pelos Estados-Membros para efeitos de emissão de vistos e de passagem das fronteiras externas. O mesmo se aplica aos documentos de viagem emitidos nos territórios georgianos da Abcásia e da Ossétia do Sul ocupados pela Rússia. Estas posições estão refletidas no quadro dos documentos de viagem reconhecidos emitidos por países terceiros 4 , que a Comissão atualiza frequentemente com base nas notificações dos Estados-Membros.

A Comissão emitiu orientações destinadas aos consulados dos Estados-Membros na Ucrânia e na Federação da Rússia sobre a apresentação de pedidos de visto Schengen pelos residentes da Crimeia na sequência da anexação ilegal deste território pela Rússia em 2014. Em 2016, foram elaboradas novas orientações como uma abordagem comum para a questão do não reconhecimento de determinadas categorias de passaportes internacionais comuns russos emitidos pelas autoridades administrativas russas estabelecidas pela Rússia na Crimeia e em Sebastopol. Em 2019, os serviços da Comissão e o Serviço Europeu para a Ação Externa elaboraram orientações sobre como tratar os pedidos de visto apresentados por residentes das regiões ucranianas de Donetsk e Luhansk titulares de passaportes internacionais comuns russos. A Federação da Rússia está atualmente a alargar a prática que consiste em distribuir passaportes internacionais comuns russos a outras zonas da Ucrânia não controladas pelo Governo, em especial as regiões de Kherson e Zaporizhzhia. Em maio de 2022, a Rússia introduziu um procedimento simplificado de naturalização russa para as crianças órfãs da chamada República Popular de Donetsk e da chamada República Popular de Luhansk, bem como da Ucrânia. O decreto aplica-se igualmente às crianças sem cuidados parentais e às pessoas legalmente incapacitadas que sejam habitantes destas duas regiões ocupadas.

A presente proposta visa assegurar que os documentos de viagem russos emitidos nas regiões estrangeiras ocupadas ou a pessoas aí residentes, independentemente da localização geográfica, não sejam reconhecidos pelos Estados-Membros para efeitos de emissão de vistos e de passagem das fronteiras externas. A medida estabelece uma abordagem comum para o não reconhecimento desses documentos de viagem.

Coerência com as disposições existentes da mesma política setorial

Esta iniciativa está em consonância com as ações definidas nas conclusões do Conselho Europeu de 24 de fevereiro de 2022 e desenvolve as orientações destinadas aos consulados dos Estados-Membros e dos países associados a Schengen na Federação da Rússia e na Ucrânia sobre como tratar os pedidos de visto apresentados por residentes das regiões ucranianas de Donetsk e Luhansk titulares de passaportes internacionais comuns russos emitidos após 24 de abril de 2019. A presente proposta complementa a suspensão parcial do Acordo UE-Rússia sobre a facilitação da emissão de vistos e a proposta da Comissão de suspender totalmente o Acordo, que é apresentada em paralelo.

A presente decisão não afeta a aplicação da Decisão n.º 1105/2011/UE, nem as obrigações decorrentes dessa decisão para os Estados-Membros no que respeita aos documentos de viagem sobre os quais a União não tomou posição.

Coerência com outras políticas da União

A proposta constitui uma nova resposta da União à agressão militar russa contra a Ucrânia e à atribuição coerciva de passaportes russos nas regiões estrangeiras ocupadas. A proposta é plenamente coerente com a declaração do alto representante, em nome da UE, sobre as tentativas da Federação da Rússia para integrar pela força partes do território ucraniano 5 . Além disso, a inclusão dos documentos de viagem emitidos nos territórios georgianos da Ossétia do Sul e da Abcásia ocupados pela Rússia está em consonância com os apelos do Conselho Europeu 6 que condenam veementemente a decisão unilateral da Rússia de reconhecer a independência da Abcásia e da Ossétia do Sul e instam outros países a não reconhecerem a sua independência.

A presente proposta não prejudica o direito de livre circulação dos cidadãos da União, na aceção do artigo 20.º, n.º 1, do TFUE, e dos nacionais de países terceiros que beneficiam de direitos de livre circulação equivalentes aos dos cidadãos da União, bem como dos membros das suas famílias. A Diretiva 2004/38/CE 7 estabelece regras relativas à entrada de nacionais de países terceiros que beneficiam do direito de livre circulação.

2.BASE JURÍDICA, SUBSIDIARIEDADE E PROPORCIONALIDADE

Base jurídica

A proposta baseia-se no artigo 77.º, n.º 2, alíneas a) e b), do TFUE.

A proposta estabelece a obrigação de os Estados-Membros não reconhecerem os documentos de viagem emitidos pelas autoridades russas em regiões estrangeiras ocupadas ou a pessoas aí residentes para efeitos de emissão de vistos e de passagem das fronteiras externas.

Subsidiariedade (no caso de competência não exclusiva)

A ação no espaço de liberdade, segurança e justiça é um domínio de competência partilhada entre a União e os Estados-Membros, nos termos do artigo 4.º, n.º 2, do TFUE. Por conseguinte, o princípio da subsidiariedade é aplicável por força do artigo 5.º, n.º 3, do TUE segundo o qual a União intervém apenas se e na medida em que os objetivos da ação considerada não possam ser suficientemente alcançados pelos Estados-Membros, tanto ao nível central como ao nível regional e local, podendo contudo, devido às dimensões ou aos efeitos da ação considerada, ser mais bem alcançados ao nível da União.

O reconhecimento dos documentos de viagem tem sido, até à data, da competência dos Estados-Membros, uma vez que a União não exerceu anteriormente a sua competência partilhada nos termos do artigo 77.º, n.º 2, alíneas a) e b), do TFUE relativamente ao reconhecimento dos documentos de viagem no domínio da política comum de vistos e aos controlos a que são submetidas as pessoas que atravessam as fronteiras externas.

Os objetivos da presente proposta não podem ser suficientemente alcançados pelos Estados-Membros individualmente, podendo ser mais bem alcançados ao nível da União. Tal deve-se ao facto de os objetivos dizerem respeito à anulação dos documentos de viagem necessários para apresentar um pedido de visto ou para transpor as fronteiras externas dos Estados-Membros. A integridade do espaço Schengen e a necessidade de assegurar uma resposta uniforme à atribuição coerciva de passaportes russos nas regiões estrangeiras ocupadas exigem uma abordagem coerente em todo o espaço Schengen. Sem esta proposta, o reconhecimento ou o não reconhecimento desses documentos de viagem estariam sujeitos a decisões individuais dos Estados-Membros e poderiam conduzir a graves discrepâncias na emissão de vistos a pessoas que residem habitualmente em regiões ocupadas pela Rússia e na sua capacidade para atravessar as fronteiras externas. Esta medida garante a segurança jurídica nesta matéria e será diretamente aplicável nos Estados-Membros.

Por conseguinte, a União pode adotar a medida proposta em conformidade com o princípio da subsidiariedade.

Proporcionalidade

Em conformidade com o princípio da proporcionalidade consagrado no artigo 5.º, n.º 4, do TUE, é necessário adaptar a natureza e a intensidade de uma determinada medida ao problema identificado.

O objetivo da medida é assegurar o bom funcionamento da política comum em matéria de vistos e da política de controlos nas fronteiras externas, bem como salvaguardar a segurança da União e dos seus Estados-Membros. A medida proposta é uma resposta à agressão militar não provocada e injustificada da Rússia contra a Ucrânia. A presente proposta respeita plenamente o direito soberano dos Estados-Membros ao abrigo do direito internacional público em matéria de reconhecimento dos Estados. A proposta de não reconhecimento dos documentos de viagem não afeta o direito de os Estados adotarem qualquer decisão relativa ao reconhecimento de qualquer entidade territorial como personalidade internacional da comunidade internacional. Além disso, a medida proposta não afeta a eventual validade destes documentos de viagem no contexto da prova da identidade em processos ou interações a nível nacional. Por conseguinte, continuaria a caber a cada Estado-Membro decidir quais os tipos de documentos que podem ser apresentados como prova de identidade.

Uma vez que UE não reconheceu a anexação ilegal da península da Crimeia pela Federação da Rússia, bem como de outras regiões da Ucrânia ocupadas pela Rússia, os documentos de viagem emitidos pelas autoridades russas nesses territórios devem ser inequivocamente declarados inválidos pelo direito da União para efeitos de viagem. O mesmo se aplica aos documentos de viagem emitidos nos territórios georgianos da Abcásia e da Ossétia do Sul ocupados pela Rússia. Do mesmo modo, esta medida de não reconhecimento aplicar-se-ia a todos os documentos de viagem emitidos pelas autoridades russas em quaisquer regiões estrangeiras que a Rússia possa vir a invadir ou ocupar ilegalmente no futuro.

Escolha do instrumento

A proposta diz respeito ao não reconhecimento, em todo o espaço Schengen, dos documentos de viagem emitidos pelas autoridades russas em regiões estrangeiras ocupadas no contexto da política comum de vistos e dos controlos a que são submetidas as pessoas que atravessam as fronteiras externas. Tendo em conta o facto de ser aplicável o processo legislativo ordinário e de o âmbito de aplicação da medida proposta ser específico, é adequada uma decisão do Parlamento Europeu e do Conselho.

3.RESULTADOS DAS AVALIAÇÕES EX POST, DAS CONSULTAS DAS PARTES INTERESSADAS E DAS AVALIAÇÕES DE IMPACTO

A questão do não reconhecimento dos documentos de viagem russos emitidos nas regiões estrangeiras ocupadas foi debatida no Grupo dos Vistos do Conselho em 13 de julho de 2022. Na sequência da reunião informal dos ministros dos Negócios Estrangeiros (Gymnich) de 31 de agosto de 2022, o alto representante informou que os Estados-Membros tinham alcançado um acordo político sobre o não reconhecimento dos documentos de viagem russos emitidos nas regiões estrangeiras ocupadas.

Direitos fundamentais

A medida proposta respeita os direitos fundamentais e os princípios enunciados na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, em especial a liberdade de circulação e de residência, o direito de asilo, os direitos da criança e os princípios da não repulsão e da não discriminação.

Embora a medida proposta tenha essencialmente por efeito impedir as viagens de certas categorias de nacionais de países terceiros para a UE, não reconhecendo os seus documentos de viagem como válidos para efeitos de emissão de um visto e de passagem das fronteiras externas, não equivale a uma proibição de viajar contra essas pessoas. Os Estados-Membros conservam o direito de emitir um visto com validade territorial limitada e de apor a vinheta de visto numa folha separada, em conformidade com os artigos 25.º e 29.º do Regulamento (CE) n.º 810/2009 e/ou de derrogar as condições de entrada previstas no artigo 6.º do Regulamento (UE) 2016/399. Em especial, os Estados-Membros devem utilizar este direito, a fim de garantir que os direitos da criança e o princípio da não repulsão são respeitados.

O direito de asilo e o acervo da União em matéria de asilo não são afetados pela medida proposta.

Por último, embora os documentos de viagem emitidos pela Rússia nas regiões estrangeiras ocupadas não sejam reconhecidos para efeitos de entrada no espaço Schengen, a validade desses documentos como documentos de identidade num contexto nacional não é afetada.

4.INCIDÊNCIA ORÇAMENTAL

A proposta não tem incidência no orçamento da UE.

5.OUTROS ELEMENTOS

Planos de execução e acompanhamento, avaliação e prestação de informações

A Comissão acompanhará e avaliará a aplicação da medida proposta no contexto da cooperação Schengen local e no âmbito do Comité dos Documentos de Viagem, instituído nos termos do artigo 8.º da Decisão n.º 1105/2011/UE.

Explicação pormenorizada das disposições específicas da proposta

A proposta prevê o não reconhecimento dos documentos de viagem russos emitidos em regiões estrangeiras ocupadas ou a pessoas aí residentes para efeitos de emissão de vistos e de passagem das fronteiras externas. Por razões de segurança jurídica, clareza e transparência, a Comissão deverá elaborar uma lista dos documentos de viagem russos que não devem ser reconhecidos para efeitos de viagem para o espaço Schengen. Esta lista será disponibilizada ao público no sítio Web da Comissão como parte do quadro de reconhecimento dos documentos de viagem e da lista de documentos de viagem emitidos por países terceiros, como estabelecido pela Decisão n.º 1105/2011/UE.

2022/0274 (COD)

Proposta de

DECISÃO DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO

relativa ao não reconhecimento dos documentos de viagem russos emitidos em regiões estrangeiras ocupadas

O PARLAMENTO EUROPEU E O CONSELHO DA UNIÃO EUROPEIA,

Tendo em conta o Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, nomeadamente o artigo 77.º, n.º 2, alíneas a) e b),

Tendo em conta a proposta da Comissão Europeia,

Após transmissão do projeto de ato legislativo aos parlamentos nacionais,

Deliberando de acordo com o processo legislativo ordinário,

Considerando o seguinte:

(1)Em reação à anexação ilegal da República Autónoma da Crimeia e da cidade de Sebastopol pela Federação da Rússia em 2014 e à continuação das ações desestabilizadoras no leste da Ucrânia, a União Europeia já introduziu sanções económicas em resposta às ações da Rússia de desestabilização da situação na Ucrânia, associadas à aplicação incompleta dos acordos de Minsk; sanções em resposta a ações que comprometem ou ameaçam a integridade territorial, a soberania e a independência da Ucrânia; e sanções em resposta à anexação ilegal da República Autónoma da Crimeia e da cidade de Sebastopol pela Federação da Rússia.

(2)Enquanto signatária dos acordos de Minsk, a Federação da Rússia tem a responsabilidade clara e direta de trabalhar no sentido de encontrar uma solução pacífica para o conflito, em conformidade com estes princípios. Ao tomar a decisão de reconhecer como entidades independentes as zonas não controladas pelo Governo do leste da Ucrânia, a Federação da Rússia violou claramente os acordos de Minsk, que estipulam a restituição integral do controlo dessas zonas ao Governo ucraniano.

(3)A decisão da Federação da Rússia de reconhecer como entidades independentes as zonas das províncias ucranianas não controladas pelo Governo de Donetsk e de Luhansk e a decisão subsequente de enviar tropas russas para essas zonas comprometem ainda mais a soberania e a independência da Ucrânia e constituem uma grave violação do direito internacional e dos acordos internacionais, incluindo a Carta das Nações Unidas, a Ata Final de Helsínquia, a Carta de Paris e o Memorando de Budapeste.

(4)Uma agressão militar que ocorre num país limítrofe da União Europeia, como a que ocorreu na Ucrânia e que deu origem às medidas restritivas, justifica medidas destinadas a proteger os interesses essenciais de segurança da União Europeia e dos seus Estados-Membros.

(5)Desde a anexação ilegal da península da Crimeia, a Rússia emitiu passaportes internacionais russos aos residentes da Crimeia. Em maio de 2022, a Federação da Rússia introduziu um procedimento simplificado de naturalização russa para as crianças órfãs da chamada República Popular de Donetsk e da chamada República Popular de Luhansk, bem como da Ucrânia. O decreto aplica-se igualmente às crianças sem cuidados parentais e às pessoas legalmente incapacitadas que sejam habitantes destas duas regiões ocupadas. A emissão sistemática de passaportes russos nestas regiões ocupadas constitui uma nova violação do direito internacional e da integridade territorial, da soberania e da independência da Ucrânia.

(6)Por conseguinte, tendo em conta as violações do direito internacional e a agressão militar da Rússia contra a Ucrânia, e a fim de assegurar uma política comum de vistos e uma abordagem comum dos controlos a que são submetidas as pessoas que atravessam as fronteiras externas, nenhum documento de viagem russos emitido em regiões estrangeiras ocupadas ou a pessoas aí residentes deve ser reconhecido como documento de viagem válido para efeitos de emissão de vistos e de passagem das fronteiras externas.

(7)Os Estados-Membros são e devem continuar a ser competentes para o reconhecimento dos documentos de viagem para efeitos de emissão de vistos e de passagem das fronteiras externas dos seus titulares sempre que a União não tenha tomado uma posição sobre a matéria.

(8)O não reconhecimento dos documentos de viagem russos emitidos em regiões estrangeiras ocupadas ou a pessoas aí residentes para efeitos de emissão de vistos e de passagem das fronteiras externas deve abranger todas as regiões geográficas, incluindo os territórios georgianos da Abcásia e da Ossétia do Sul ocupados pela Rússia. O não reconhecimento não afeta a validade desses documentos para outros fins, incluindo como prova de identidade num contexto nacional.

(9)Por razões de segurança jurídica e de transparência, a Comissão deve disponibilizar ao público uma lista dos documentos de viagem russos que são emitidos em regiões estrangeiras ocupadas ou a pessoas aí residentes e que não devem ser reconhecidos. Esta lista deverá ser incorporada na lista de documentos de viagem elaborada ao abrigo da Decisão n.º 1105/2011/UE do Parlamento Europeu e do Conselho 8 e no quadro de reconhecimento que a acompanha, que inclui informações sobre documentos de viagem reconhecidos e não reconhecidos e que está disponível ao público em linha.

(10)A presente decisão não afeta o direito à livre circulação dos cidadãos da União e dos membros das suas famílias, incluindo a possibilidade de esses familiares entrarem no território dos Estados-Membros sem um documento de viagem válido, na aceção, nomeadamente, da Diretiva 2004/38/CE e dos acordos sobre a livre circulação de pessoas celebrados entre a União e os Estados-Membros, por um lado, e certos países terceiros, por outro. A Diretiva 2004/38/CE permite, nas condições nela especificadas, restrições à livre circulação por razões de ordem pública, segurança pública e saúde pública.

(11)A presente decisão respeita os direitos fundamentais e observa os princípios reconhecidos, nomeadamente, na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia. A presente decisão não deve prejudicar o direito de asilo.

(12)Os Estados-Membros conservam a possibilidade de permitir que os titulares de documentos de viagem visados pela presente decisão que não tenham exercido o seu direito de requerer proteção internacional entrem no território dos Estados-Membros em casos individuais, tal como previsto nos artigos 25.º e 29.º do Regulamento (CE) n.º 810/2009 e no artigo 6.º, n.º 5, do Regulamento (UE) 2016/399.

(13)O objetivo da presente decisão é reforçar o funcionamento da política comum de vistos e o espaço Schengen. Estes objetivos não podem ser alcançados pelos Estados-Membros isoladamente. É, portanto, necessário introduzir a obrigação, a nível da União, de não reconhecer determinados documentos de viagem para efeitos de emissão de vistos e de passagem das fronteiras externas. Por conseguinte, a União pode adotar medidas em conformidade com o princípio da subsidiariedade consagrado no artigo 5.º do Tratado da União Europeia. Em conformidade com o princípio da proporcionalidade consagrado no mesmo artigo, a presente decisão não excede o necessário para alcançar esses objetivos.

(14)Nos termos dos artigos 1.º e 2.º do Protocolo n.º 22 relativo à posição da Dinamarca, anexo ao Tratado da União Europeia e ao Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, a Dinamarca não participa na adoção da presente decisão, não ficando por ela vinculada nem sujeita à sua aplicação. Uma vez que a presente decisão desenvolve o acervo de Schengen, a Dinamarca decide, nos termos do artigo 4.º do referido Protocolo e no prazo de seis meses a contar da decisão do Conselho relativa à presente decisão, se procede à sua transposição para o seu direito interno.

(15)A presente decisão constitui um desenvolvimento das disposições do acervo de Schengen nas quais a Irlanda não participa 9 . Por conseguinte, a Irlanda não participa na sua adoção, não ficando por ela vinculada nem sujeita à sua aplicação.

(16)Em relação à Islândia e à Noruega, a presente decisão constitui um desenvolvimento das disposições do acervo de Schengen, na aceção do Acordo celebrado pelo Conselho da União Europeia e a República da Islândia e o Reino da Noruega relativo à associação destes Estados à execução, à aplicação e ao desenvolvimento do acervo de Schengen 10 , que se inserem no domínio a que se refere o artigo 1.º, pontos A e B, da Decisão 1999/437/CE do Conselho 11 .

(17)Em relação à Suíça, a presente decisão constitui um desenvolvimento das disposições do acervo de Schengen, na aceção do Acordo entre a União Europeia, a Comunidade Europeia e a Confederação Suíça relativo à associação da Confederação Suíça à execução, à aplicação e ao desenvolvimento do acervo de Schengen 12 , que se inserem no domínio a que se refere o artigo 1.º, pontos A e B, da Decisão 1999/437/CE, em conjugação com o artigo 3.º da Decisão 2008/146/CE do Conselho 13 .

(18)Em relação ao Listenstaine, a presente decisão constitui um desenvolvimento das disposições do acervo de Schengen, na aceção do Protocolo entre a União Europeia, a Comunidade Europeia, a Confederação Suíça e o Principado do Listenstaine relativo à adesão do Principado do Listenstaine ao Acordo entre a União Europeia, a Comunidade Europeia e a Confederação Suíça relativo à associação da Confederação Suíça à execução, à aplicação e ao desenvolvimento do acervo de Schengen 14 , que se inserem no domínio a que se refere o artigo 1.º, pontos A e B, da Decisão 1999/437/CE, em conjugação com o artigo 3.º da Decisão 2011/350/UE do Conselho 15 .

(19)O artigo 1.º, alínea a), da presente decisão constitui um ato baseado no acervo de Schengen ou de algum modo com ele relacionado, na aceção, respetivamente, do artigo 3.º, n.º 2, do Ato de Adesão de 2003, do artigo 4.º, n.º 2, do Ato de Adesão de 2005 e do artigo 4.º, n.º 2, do Ato de Adesão de 2011, enquanto o artigo 1.º, alínea b), constitui um ato baseado no acervo de Schengen ou de algum modo com ele relacionado, na aceção, respetivamente, do artigo 3.º, n.º 1, do Ato de Adesão de 2003, do artigo 4.º, n.º 1, do Ato de Adesão de 2005 e do artigo 4.º, n.º 1, do Ato de Adesão de 2011. 

(20)Devido à urgência da situação e à atual presença ilegal da Rússia em regiões estrangeiras, a presente decisão deve entrar em vigor no primeiro dia seguinte ao da sua publicação,

ADOTARAM A PRESENTE DECISÃO:

Artigo 1.º

Os documentos de viagem russos emitidos em regiões estrangeiras ocupadas ou a pessoas aí residentes não podem ser reconhecidos como documentos de viagem válidos para os seguintes efeitos:

(a)Emissão de um visto, em conformidade com o Regulamento (CE) n.º 810/2009;

(b)Passagem das fronteiras externas, em conformidade com o Regulamento (UE) 2016/399.

Artigo 2.º

A Comissão deve elaborar uma lista dos documentos de viagem russos a que se refere o artigo 1.º.

Essa lista deve ser disponibilizada ao público no âmbito da lista de documentos de viagem estabelecida pela Decisão n.º 1105/2011/UE.

Artigo 3.º

A presente decisão entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação no Jornal Oficial da União Europeia.

Feito em Bruxelas, em

Pelo Parlamento Europeu    Pelo Conselho

A Presidente    A Presidente

(1)    Conclusões do Conselho Europeu de 24 de fevereiro de 2022.
(2)    Decisão (UE) 2022/333 do Conselho.
(3)    Proposta de decisão do Conselho relativa à suspensão total da aplicação do Acordo entre a Comunidade Europeia e a Federação Russa sobre a facilitação da emissão de vistos aos cidadãos da União Europeia e da Federação Russa [COM(2022) 661].
(4)    Documentos de viagem emitidos por países terceiros e entidades territoriais (Parte I), disponível em <https://home-affairs.ec.europa.eu/travel-documents-issued-third-countries-and-territorial-entities-part-i_en>.
(5)    Comunicado de imprensa «Ucrânia: Declaração do alto representante, em nome da UE, sobre as tentativas da Federação da Rússia de integrar pela força partes do território ucraniano», de 3 de junho de 2022, disponível em < Ucrânia: Declaração do alto representante, em nome da UE, sobre as tentativas da Federação da Rússia de integrar pela força partes do território ucraniano - Consilium (europa.eu) >.
(6)    Conclusões da Presidência do Conselho Europeu Extraordinário de 1 de setembro de 2008 (12594/2/08 REV2).
(7)    Diretiva 2004/38/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril de 2004, relativa ao direito de livre circulação e residência dos cidadãos da União e dos membros das suas famílias no território dos Estados-Membros, que altera o Regulamento (CEE) n.º 1612/68 e que revoga as Diretivas 64/221/CEE, 68/360/CEE, 72/194/CEE, 73/148/CEE, 75/34/CEE, 75/35/CEE, 90/364/CEE, 90/365/CEE e 93/96/CEE (JO L 158 de 30.4.2004, p. 77).
(8)    Decisão n.º 1105/2011/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de outubro de 2011, relativa à lista dos documentos de viagem que autorizam o respetivo titular a atravessar as fronteiras externas e nos quais podem ser apostos vistos, e à criação de um mecanismo para elaborar essa lista (JO L 287 de 4.11.2011, p. 9).
(9)    A presente decisão não é abrangida pelo âmbito de aplicação das medidas previstas na Decisão 2002/192/CE do Conselho, de 28 de fevereiro de 2002, sobre o pedido da Irlanda para participar em algumas das disposições do acervo de Schengen (JO L 64 de 7.3.2002, p. 20).
(10)    JO L 176 de 10.7.1999, p. 36.
(11)    Decisão 1999/437/CE do Conselho, de 17 de maio de 1999, relativa a determinadas regras de aplicação do Acordo celebrado pelo Conselho da União Europeia com a República da Islândia e o Reino da Noruega relativo à associação dos dois Estados à execução, à aplicação e ao desenvolvimento do acervo de Schengen (JO L 176 de 10.7.1999, p. 31).
(12)    JO L 53 de 27.2.2008, p. 52.
(13)    Decisão 2008/146/CE do Conselho, de 28 de janeiro de 2008, respeitante à celebração, em nome da Comunidade Europeia, do Acordo entre a União Europeia, a Comunidade Europeia e a Confederação Suíça relativo à associação da Confederação Suíça à execução, à aplicação e ao desenvolvimento do acervo de Schengen (JO L 53 de 27.2.2008, p. 1).
(14)    JO L 160 de 18.6.2011, p. 21.
(15)    Decisão 2011/350/UE do Conselho, de 7 de março de 2011, respeitante à celebração, em nome da União Europeia, do Protocolo entre a União Europeia, a Comunidade Europeia, a Confederação Suíça e o Principado do Listenstaine relativo à adesão do Principado do Listenstaine ao Acordo entre a União Europeia, a Comunidade Europeia e a Confederação Suíça relativo à associação da Confederação Suíça à execução, à aplicação e ao desenvolvimento do acervo de Schengen, no que respeita à supressão dos controlos nas fronteiras internas e à circulação das pessoas (JO L 160 de 18.6.2011, p. 19).