COMISSÃO EUROPEIA
Bruxelas, 14.4.2021
COM(2021) 170 final
COMUNICAÇÃO DA COMISSÃO AO PARLAMENTO EUROPEU, AO CONSELHO, AO COMITÉ ECONÓMICO E SOCIAL EUROPEU E AO COMITÉ DAS REGIÕES
sobre a estratégia da UE para lutar contra a criminalidade organizada (2021-2025)
{SWD(2021) 74 final}
Introdução
Longe do olhar do público devido à opacidade das suas atividades, a criminalidade organizada constitui uma ameaça significativa para os cidadãos europeus, as empresas e as instituições estatais, bem como para a economia no seu conjunto. Tal como salientado na avaliação da ameaça da criminalidade grave e organizada da União Europeia (SOCTA UE 2021) mais recente, existem grupos de criminalidade organizada em todos os Estados-Membros. O panorama da criminalidade organizada caracteriza-se por um ambiente em rede onde a cooperação entre criminosos é fluida, sistemática e motivada pelo lucro. Os grupos de criminalidade organizada utilizam os seus substanciais lucros ilegais para se infiltrarem na economia lícita e nas instituições públicas, nomeadamente através da corrupção, corroendo o Estado de direito e os direitos fundamentais, comprometendo o direito das pessoas à segurança e minando a sua confiança nas autoridades públicas. As receitas provenientes de atividades criminosas nos nove principais mercados criminosos da União Europeia ascenderam a 139 mil milhões de EUR em 2019, o que corresponde a 1 % do produto interno bruto da União. Tal como sublinhado na Estratégia para a União da Segurança, as medidas tomadas a nível da UE para apoiar os Estados-Membros na luta contra a criminalidade organizada devem ser prosseguidas e reforçadas.
A complexidade do modelo de negócio dos grupos de criminalidade organizada foi exposta, em particular, em 2020, no quadro da investigação conjunta liderada pelas autoridades francesas e neerlandesas com o apoio da Europol e da Eurojust, para desmantelar a EncroChat, uma rede telefónica cifrada amplamente utilizada pelas redes criminosas. Até à data, o processo EncroChat conduziu a mais de 1 800 detenções e a mais de 1 500 novas investigações. Além disso, mostrou até que ponto os grupos de criminalidade organizada operam a nível transnacional e em linha em todos os mercados criminosos num ambiente em rede, utilizando modi operandi cada vez mais sofisticados e novas tecnologias. Em março de 2021, outra operação conjunta realizada na sequência da decifração da Sky ECC, uma rede cifrada para a qual muitos antigos utilizadores da rede EncroChat tinham migrado, permitiu prevenir mais de 70 incidentes violentos, apreender mais de 28 toneladas de substâncias psicotrópicas e deter mais de 80 suspeitos implicados na criminalidade organizada e no tráfico de droga na Bélgica e nos Países Baixos. Foram iniciadas mais de 400 novas investigações contra grupos de criminalidade organizada de alto risco.
O recurso à violência pelos criminosos envolvidos em atividades de criminalidade organizada está a aumentar na UE, tal como a ameaça de incidentes violentos devido à utilização frequente de armas de fogo ou de explosivos em espaços públicos. A agilidade dos grupos de criminalidade organizada para se adaptarem e tirarem partido das mudanças no ambiente no qual operam foi confirmada durante a pandemia de COVID-19. Os grupos criminosos aproveitaram a pandemia para expandir as atividades criminosas em linha e para cometer fraudes, nomeadamente no domínio da contrafação de produtos médicos. A grande procura contínua de vacinas contra a COVID-19 tornou-se um filão atrativo para os criminosos que procuram produzir e fornecer vacinas contrafeitas ou participar em esquemas fraudulentos contra particulares ou autoridades públicas. Até à data, os governos da UE detetaram tentativas de burlas e falsas ofertas por parte de autores de fraudes que tentavam vender mais de 1,1 mil milhões de doses de vacinas por um preço total superior a 15,4 mil milhões de euros. A crise económica resultante da pandemia aumenta os riscos ligados às atividades da criminalidade organizada e de estas se infiltrarem ainda mais na sociedade e na economia.
As ameaças transnacionais e a evolução dos modi operandi dos grupos de criminalidade organizada que operam fora de linha e em linha exigem uma resposta coordenada, mais direcionada e adaptada. Embora as autoridades nacionais que operam no terreno estejam na linha da frente da luta contra a criminalidade organizada, a ação a nível da União e as parcerias mundiais são fundamentais para assegurar uma cooperação eficaz, bem como o intercâmbio de informações e de conhecimentos entre as autoridades nacionais, com o apoio de um quadro penal comum e de meios financeiros eficazes. Além disso, a criminalidade organizada é emblemática da ligação entre a segurança interna e a segurança externa. Para enfrentar este desafio transnacional, é necessário assegurar o empenhamento internacional na luta contra a criminalidade organizada, nomeadamente através da adoção de novas medidas para estabelecer parcerias e desenvolver a cooperação com os países da vizinhança imediata e no resto do mundo.
Tanto o Parlamento Europeu como o Conselho sublinharam que a criminalidade organizada causa danos enormes e salientaram a importância de uma ação enérgica da UE para combater todas as formas de criminalidade organizada.
A presente estratégia tem por base realizações anteriores, identifica vertentes de trabalho prioritárias para proteger melhor os cidadãos e a economia dos grupos de criminalidade organizada e apresenta ações concretas a médio e longo prazo, que serão desenvolvidas no pleno respeito dos direitos fundamentais. Constitui a primeira estratégia dedicada especificamente à criminalidade organizada desde a entrada em vigor do Tratado de Lisboa.
1.Promover a aplicação da lei e a cooperação judiciária
Atualmente, a criminalidade organizada é uma atividade internacional. 65 % dos grupos criminosos ativos nos Estados-Membros da UE são compostos por membros de múltiplas nacionalidades. As rotas de transporte de drogas, armas de fogo ou produtos de contrafação atravessam todos os continentes através de uma cadeia de abastecimento mundial. Os grupos de criminalidade organizada móveis envolvidos no crime organizado contra a propriedade deslocam-se rapidamente através de múltiplas jurisdições para cometer os seus crimes. Ao operarem em diferentes jurisdições, os grupos criminosos evitam ser detetados e exploram as diferenças entre os direitos nacionais aplicáveis.
1.1.Intercâmbio fluido de informações e acesso atempado às mesmas
Num espaço de liberdade, segurança e justiça, onde não existem controlos nas fronteiras internas, é possível assegurar um elevado nível de segurança graças a uma sólida cooperação policial e judiciária entre os Estados-Membros. O acesso atempado às informações, no pleno respeito dos direitos fundamentais e, em especial, da proteção de dados, é essencial para lutar contra todas as formas de criminalidade organizada. A União Europeia disponibilizou às autoridades responsáveis pela aplicação da lei um vasto leque de instrumentos destinados a facilitar o intercâmbio de informações que se revelaram cruciais para pôr a nu as atividades e as redes criminosas.
O Sistema de Informação de Schengen (SIS) permitiu aos agentes de primeira linha detetar e localizar rapidamente pessoas e objetos envolvidos em atividades de criminalidade organizada e tomar medidas em conformidade. As informações contidas nesta base de dados partilhada podem ajudar os agentes a deter uma pessoa, apreender um objeto ou determinar as deslocações de pessoas envolvidas numa investigação. Só em 2020, o Sistema de Informação de Schengen foi consultado quase 4 mil milhões de vezes, o que resultou em mais de 200 000 respostas positivas. A revisão do quadro do SIS em 2018 reforçou consideravelmente as funcionalidades do sistema e introduziu uma série de novos instrumentos, permitindo às autoridades nacionais introduzir indicações sobre pessoas que corram o risco de serem raptadas ou de serem vítimas de tráfico de seres humanos, ou solicitar controlos de verificação de um suspeito. A reforma permite igualmente à Europol aceder às indicações do SIS e ao intercâmbio de informações suplementares e torna mais eficaz a utilização de dados biométricos, introduzindo a possibilidade de utilizar imagens faciais para efeitos de identificação e de incluir perfis de ADN para facilitar a identificação de pessoas desaparecidas. A aplicação destas novidades está a avançar a toda a velocidade para que o novo sistema esteja plenamente operacional até ao final de 2021, com os atos de execução e a documentação técnica concluídos, os trabalhos de desenvolvimento técnico do SIS bem encaminhados e as primeiras medidas tomadas para elaborar um manual do SIS e organizar atividades de formação para os utilizadores do sistema.
O potencial do SIS na luta contra a criminalidade organizada será ainda reforçado pelo novo quadro para a interoperabilidade entre os sistemas de informação da UE no domínio da justiça e assuntos internos. É crucial envidar todos os esforços necessários para alcançar a plena interoperabilidade até ao final de 2023. Tal facilitará o acesso das autoridades responsáveis pela aplicação da lei às informações pertinentes constantes dos sistemas de informação centralizados da UE e permitirá a deteção de identidades múltiplas, essencial para combater a fraude de identidade a que os criminosos recorrem frequentemente para cometer crimes ou fugir à justiça. No âmbito do quadro para a interoperabilidade, está a ser desenvolvida uma funcionalidade denominada detetor de identidades múltiplas que, mediante a verificação dos dados constantes destes sistemas, ajudará a lutar eficazmente contra a utilização fraudulenta de identidades.
Frequentemente, os investigadores que trabalham de forma isolada num Estado-Membro não conseguem estabelecer a participação de um grupo de criminalidade organizada num crime específico. O quadro jurídico de Prüm de 2008 permite às autoridades responsáveis pela aplicação da lei, no decurso das suas investigações, procurar ADN e impressões digitais nas bases de dados de outros Estados-Membros com base num sistema de respostas positivas/negativas através de ligações bilaterais e procurar dados de registo de veículos. Embora o quadro jurídico de Prüm se tenha revelado fundamental na resolução de muitos crimes na Europa, a sua natureza descentralizada resultou no não estabelecimento de muitas ligações bilaterais entre as bases de dados nacionais dos Estados-Membros devido à complexidade técnica e aos consideráveis recursos financeiros e humanos exigidos. Além disso, as autoridades podem demorar semanas ou mesmo meses a partilhar os dados pessoais ligados a uma resposta positiva. Para aumentar a eficiência das investigações criminais e reforçar o intercâmbio automático de informações sobre os criminosos, a Comissão proporá a modernização do quadro jurídico de Prüm para satisfazer as necessidades operacionais das autoridades responsáveis pela aplicação da lei, respeitando os direitos fundamentais e os requisitos de necessidade e proporcionalidade, e o alinhamento das disposições em matéria de proteção de dados com a Diretiva sobre a Proteção de Dados na Aplicação da Lei. A Comissão está a estudar as opções para assegurar a ligação das bases de dados pertinentes entre todos os Estados-Membros e para acelerar o intercâmbio de informações na sequência de uma resposta positiva. Está igualmente a avaliar a necessidade de trocar categorias de dados adicionais relevantes para as investigações criminais, como imagens faciais, cartas de condução, registos criminais e dados balísticos, ao abrigo do quadro jurídico de Prüm, e de adicionar a Europol a esse quadro, enquanto novo parceiro.
Dada a dimensão transfronteiras e internacional da criminalidade organizada, as informações sobre viagens são essenciais para identificar passageiros de alto risco que não são conhecidos das autoridades responsáveis pela aplicação da lei e para estabelecer ligações entre membros de grupos criminosos. O tratamento dos dados dos registos de identificação dos passageiros (PNR) ajuda as autoridades competentes a identificar as pessoas implicadas em atividades criminosas cometidas por grupos organizados. Para assegurar a plena exploração do potencial deste instrumento, a Comissão continuará a acompanhar a aplicação plena e efetiva da Diretiva Registos de Identificação dos Passageiros e a apoiar a cooperação e o intercâmbio de dados PNR entre Estados-Membros, nomeadamente através do intercâmbio de boas práticas, da formação e do desenvolvimento das capacidades necessárias. As informações antecipadas sobre os passageiros (API), ou seja, os dados biográficos dos passageiros recolhidos pelas transportadoras aéreas durante o registo (check-in), são igualmente muito valiosas, nomeadamente devido à sua complementaridade com os dados dos registos de identificação dos passageiros. Uma revisão do atual quadro jurídico permitiria uma série de melhorias, nomeadamente em termos de exatidão e exaustividade dos dados. Mais importante ainda, a Comissão analisará a possível utilização dos dados API para pesquisar sistematicamente os dados da Europol a fim de combater a criminalidade organizada e, eventualmente, o alargamento da sua utilização às deslocações no interior do espaço Schengen e aos transportadores por vias navegáveis e aos autocarros. Com este objetivo, a Comissão apresentará, no primeiro semestre de 2022, uma proposta de revisão da Diretiva Informações Antecipadas sobre Passageiros com base numa avaliação de impacto na qual estas opções e as respetivas repercussões serão analisadas mais aprofundadamente.
1.2.Quadros de cooperação avançada
A maior parte da cooperação policial em toda a UE baseia-se na Convenção de Aplicação do Acordo de Schengen de 1990. Este alicerce é complementado por outros instrumentos da UE, como a Decisão-Quadro 2006/960/JAI do Conselho relativa à simplificação do intercâmbio de dados e informações entre as autoridades de aplicação da lei dos Estados-Membros da União Europeia, ou pelos capítulos 4 e 5 da Decisão 2008/615/JAI do Conselho, de 23 de junho de 2008, relativa ao aprofundamento da cooperação transfronteiras, em particular no domínio da luta contra o terrorismo e a criminalidade transfronteiras (Prüm).
Os Estados-Membros complementaram este quadro com um conjunto complexo de acordos bilaterais e multilaterais. Consequentemente, o nível de cooperação entre os Estados-Membros é desigual, criando obstáculos operacionais que impedem uma cooperação transfronteiras eficaz.
A Comissão elaborará uma proposta legislativa relativa a um código de cooperação policial da UE. Este código basear-se-á nos resultados de um estudo externo que está em curso e num processo de consulta exaustivo, tendo em conta a competência dos Estados-Membros. O objetivo é racionalizar e desenvolver os vários instrumentos de cooperação policial, incluindo a legislação pertinente da UE, as orientações do Conselho e as boas práticas dos Estados-Membros decorrentes de acordos bilaterais e multilaterais, num código de regras coerente e moderno que abranja igualmente os instrumentos de investigação.
Além disso, a fim de eliminar potenciais obstáculos à cooperação transfronteiras, especificamente contra as estruturas de criminalidade organizada, a Comissão lançou um estudo externo para determinar se a Decisão-Quadro do Conselho de 2008 relativa à luta contra a criminalidade organizada continua a ser adequada à sua finalidade.
A Europol desempenha um papel importante enquanto plataforma de informações criminais da UE, apoiando a cooperação policial e o intercâmbio de informações e elaborando, de quatro em quatro anos, o relatório sobre a avaliação da ameaça da criminalidade grave e organizada na União Europeia (SOCTA UE). A fim de satisfazer as necessidades operacionais prementes, como a cooperação com partes privadas ou o tratamento de grandes conjuntos de dados, a Comissão propôs, em dezembro de 2020, reforçar o mandato da Europol. As novas competências e instrumentos previstos na proposta permitirão à Europol reforçar o seu apoio à luta contra a criminalidade organizada. Tanto o Parlamento Europeu como o Conselho prosseguem os trabalhos sobre os respetivos mandatos com vista às futuras negociações interinstitucionais, que deverão começar ainda este ano. A Comissão facilitará as negociações e visa um rápido acordo dos colegisladores até ao final de 2021.
Um dos principais instrumentos para executar a presente estratégia e intensificar os esforços contra as estruturas de criminalidade organizada através de operações coordenadas é a Plataforma Multidisciplinar Europeia contra as Ameaças Criminosas (EMPACT). Desde 2010, a EMPACT permite aos Estados-Membros identificar as ameaças criminosas prioritárias para a UE que exigem uma ação coletiva e enfrentar estas ameaças criminosas através de uma cooperação estruturada a nível da UE entre as autoridades responsáveis pela aplicação da lei, as autoridades aduaneiras, as autoridades fiscais, os magistrados, as instituições e agências europeias e, quando pertinente, os países terceiros, as organizações internacionais e o setor privado
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Através da EMPACT, os Estados-Membros e os seus parceiros realizam mais de 200 ações operacionais conjuntas todos os anos, destinadas a combater a criminalidade organizada, por exemplo, elaborando um quadro de informações criminais sobre as prioridades da UE em matéria de criminalidade, desenvolvendo as capacidades de aplicação da lei para visar crimes específicos, reforçando a cooperação com parceiros internacionais, realizando atividades de prevenção e investigações conjuntas sobre fenómenos criminosos específicos ou grupos criminosos específicos e abordando os métodos utilizados por estes grupos criminosos para branquear capitais, cometer crimes em linha ou obter documentos fraudulentos. Embora a EMPACT já apresente resultados operacionais significativos, por exemplo, em termos de drogas apreendidas ou de criminosos detidos, atualmente o seu potencial não é plenamente explorado. A sua complexidade, a falta de conhecimento por parte dos agentes de primeira linha e o financiamento insuficiente nem sempre garantem a apropriação e a participação ativa dos Estados-Membros e dos parceiros externos e constituem um obstáculo ao desenvolvimento de operações mais complexas que prejudicariam mais significativamente os grupos de criminalidade organizada.
A Comissão trabalhará, juntamente com todas as partes interessadas pertinentes da EMPACT, para pôr em prática uma série de medidas, descritas pormenorizadamente no documento de trabalho dos serviços da Comissão que acompanha a presente estratégia, a fim de explorar plenamente o potencial da EMPACT e transformá-la num verdadeiro instrumento emblemático da UE para a cooperação operacional multidisciplinar e entre vários serviços no quadro da luta contra a criminalidade organizada a nível da UE.
A Comissão avaliará igualmente a viabilidade de inscrever o mecanismo da EMPACT na legislação da UE. Tal estabeleceria firmemente a EMPACT enquanto instrumento fundamental da UE para a cooperação operacional entre os Estados-Membros e as agências e organismos competentes da UE na luta contra a criminalidade internacional grave e organizada. Tornaria a EMPACT o vetor permanente da cooperação estrutural entre as estratégias e ações europeias e nacionais em matéria de criminalidade, com uma metodologia e abordagem harmonizadas, enquanto fundamento jurídico das parcerias conjuntas ad hoc baseadas nas necessidades operacionais. A Comissão procurará igualmente reforçar de modo significativamente o financiamento da EMPACT, de modo a permitir-lhe desenvolver operações mais complexas. A Comissão estudará também, juntamente com todas as partes interessadas pertinentes, a possibilidade de racionalizar a atual EMPACT em função de quatro pilares modernizados e atualizados, complementados por princípios orientadores para combater a criminalidade organizada. Além disso, procurará reforçar o papel das redes e dos grupos de peritos europeus no apoio às ações da EMPACT. Por último, a Comissão, juntamente com o Serviço Europeu para a Ação Externa, promoverá uma maior associação dos países terceiros às atividades da EMPACT e encorajará o desenvolvimento da metodologia da EMPACT fora da UE, adaptando-a às necessidades operacionais.
Para levar os criminosos a julgamento, é necessário que as autoridades policiais e judiciárias trabalhem em estreita colaboração: uma resposta eficaz à criminalidade organizada exige medidas adicionais para reforçar a cooperação judiciária. As recomendações do Parlamento e as conclusões do Conselho apelam à melhoria do funcionamento prático do mandado de detenção europeu. Por conseguinte, a Comissão assegura a correta aplicação, na sequência do relatório da Comissão sobre a aplicação do mandado de detenção europeu, e fornecerá orientações num manual atualizado.
Além disso, para evitar investigações paralelas sobre os criminosos que operam em várias jurisdições, poderão ser necessárias regras comuns que permitam aos Estados-Membros transferir processos penais para outro Estado-Membro, por exemplo, o Estado-Membro de nacionalidade do suspeito, tendo em conta a Decisão-Quadro relativa à prevenção de conflitos de exercício de competência. A Comissão está a estudar esta questão de modo mais aprofundado a fim de apreciar a necessidade de uma ação da UE neste domínio. Está também a analisar os problemas relacionados com a recolha, a transferência e a utilização de elementos de prova nos processos transfronteiras, bem como as possíveis vias a seguir.
A comunicação e a partilha de informações no seio das equipas de investigação conjuntas é essencial. Por conseguinte, a Comissão envidará esforços para desenvolver uma plataforma de colaboração para as equipas de investigação conjuntas, bem como para reforçar a cooperação da Eurojust com os países terceiros. Além disso, tal como anunciado na Comunicação sobre a digitalização da justiça na UE, a Comissão apresentará, até ao final de 2021, uma proposta para permitir a comunicação eletrónica segura e o intercâmbio de informações e documentos entre tribunais, autoridades nacionais e agências no domínio da justiça e dos assuntos internos, quando pertinente. A Comissão apoiará igualmente a modernização do sistema de gestão dos processos da Eurojust, a fim de ajudar a Eurojust a prestar informações às autoridades nacionais e a desenvolver as ligações judiciais entre as investigações em curso. Tal deverá permitir à Eurojust trabalhar eficazmente com os seus parceiros, em especial a Europol e a Procuradoria Europeia, ajudando a coordenar as investigações a nível nacional e a evitar investigações paralelas com o objetivo de assegurar a eficácia da ação penal.
1.3. Cooperação internacional
A cooperação policial fora da União é necessária para desmantelar as redes criminosas que operam à escala mundial e as rotas de transporte. É essencial intensificar a cooperação internacional, nomeadamente através das atividades das agências no domínio da justiça e dos assuntos internos pertinentes, em particular em relação aos países abrangidos pela política de vizinhança e de alargamento.
Urge continuar a desenvolver os serviços de informações sobre a criminalidade grave e organizada na Europol e reforçar o intercâmbio de informações e as ações de investigação com os países terceiros e as regiões que constituem importantes centros de criminalidade organizada de alto risco que afetam os Estados-Membros da UE, nomeadamente através do destacamento de agentes de ligação bilaterais dos Estados-Membros para essas zonas críticas. A Comissão recebeu diretrizes para a negociação de acordos internacionais com países terceiros com vista ao intercâmbio de dados pessoais com a Europol e a permitir a cooperação judiciária com a Eurojust, e esforçar-se-á por avançar nestas difíceis negociações.
Além disso, os programas e projetos de cooperação internacional da UE são pertinentes para a criação de redes transcontinentais de aplicação da lei e de justiça penal. A Comissão continuará a intensificar o apoio a tais redes e operações conjuntas.
A abordagem da UE em matéria de segurança externa no âmbito da política externa e de segurança comum e da política comum de segurança e defesa continua a ser uma componente essencial dos esforços da UE para lutar contra a criminalidade organizada, a fim de reforçar a estabilidade e proteger os interesses europeus em matéria de segurança. O alto representante/vice-presidente, com o apoio do Serviço Europeu para a Ação Externa, continuará a desempenhar um papel decisivo para reforçar a cooperação estratégica e operacional com países terceiros e organizações internacionais, explorando ao máximo os seus instrumentos de política externa, tais como os diálogos de alto nível, a rede de peritos em matéria de luta contra o terrorismo/segurança nas delegações da UE e, quando aplicável, as missões e operações no âmbito da política comum de segurança e defesa. Além disso, a Comissão e o Serviço Europeu para a Ação Externa continuarão a dar prioridade aos projetos de reforço das capacidades nos países terceiros, em particular nos países abrangidos pela política de vizinhança e de alargamento, tanto para apoiar a cooperação operacional com os Estados-Membros e as agências da UE, como para dotar os parceiros dos instrumentos que lhes permitam erradicar estruturas criminosas complexas suscetíveis de afetar a UE.
A Interpol é outro interveniente fundamental em matéria de cooperação internacional contra a criminalidade organizada. As 18 bases de dados da Interpol contêm mais de 100 milhões de registos policiais, nomeadamente sobre criminosos procurados, suspeitos de terrorismo, impressões digitais, veículos roubados, documentos de viagem furtados e extraviados, armas e armas de fogo. Estas bases de dados permitem às autoridades policiais e judiciárias identificar ligações, facilitando assim as investigações sobre a criminalidade organizada transnacional. A Comissão está a adotar, a par da presente estratégia, uma recomendação ao Conselho para autorizar a abertura de negociações com a Interpol com vista à celebração de um acordo de cooperação entre a UE e a Interpol, a fim de melhorar a cooperação e satisfazer as necessidades operacionais.
O principal instrumento internacional que permite a cooperação e o auxílio judiciário mútuo no quadro das investigações sobre a criminalidade organizada é a Convenção das Nações Unidas contra a Criminalidade Organizada Transnacional (UNTOC), na qual são partes a UE e os Estados-Membros. Em 2021, a Comissão atualizará a declaração de competência para a harmonizar com as alterações introduzidas pelo Tratado de Lisboa e para assegurar que a Procuradoria Europeia possa recorrer às disposições da UNTOC em matéria de auxílio judiciário mútuo internacional para cooperar com as autoridades dos países terceiros. Além disso, a Comissão estudará a possibilidade de notificar a Procuradoria Europeia enquanto autoridade responsável no contexto dos acordos de cooperação existentes a nível da União com países terceiros e, se necessário, ponderará a possibilidade de encetar negociações com determinados países terceiros prioritários selecionados. Tal como indicado na Declaração de Quioto adotada no 14.º Congresso das Nações Unidas sobre a prevenção da criminalidade e a justiça penal, a União e os Estados-Membros estão plenamente empenhados em reforçar o quadro internacional de promoção do Estado de direito, prevenção da criminalidade e justiça penal, nomeadamente através da participação ativa nos processos em curso de revisão da aplicação da UNTOC e da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção (UNCAC).
Principais ações:
A Comissão:
·proporá o reforço do quadro jurídico de Prüm (4.º trimestre de 2021),
·proporá a criação de um código de cooperação policial da UE (4.º trimestre de 2021),
·proporá a revisão da Diretiva Informações Antecipadas sobre Passageiros (1.º trimestre de 2022),
·criará uma plataforma de colaboração para as equipas de investigação conjuntas (4.º trimestre de 2021),
·trabalhará com todas as partes interessadas pertinentes com o objetivo de racionalizar, expandir e modernizar a Plataforma Multidisciplinar Europeia contra as Ameaças Criminosas (EMPACT) e de a tornar o instrumento emblemático da UE para lutar contra a criminalidade internacional grave e organizada através de um conjunto de ações e de uma proposta legislativa (2023),
·reforçará significativamente o financiamento da EMPACT através do Fundo para a Segurança Interna para o período de 2021-2027,
·dará início às negociações de acordos de cooperação entre a Eurojust e alguns países terceiros,
·intensificará as negociações sobre a cooperação entre a Europol e os países terceiros,
·reforçará, juntamente com o Serviço Europeu para a Ação Externa, a cooperação internacional com os países terceiros e as organizações internacionais.
O Parlamento Europeu e o Conselho são convidados a:
·avançar nas negociações legislativas sobre a revisão do Regulamento Europol, incluindo as alterações do Regulamento relativo ao Sistema de Informação de Schengen, com o objetivo de alcançar rapidamente um acordo.
O Conselho é convidado a:
·adotar a recomendação para abrir as negociações com a Interpol com vista à celebração de um acordo de cooperação entre a UE e a Interpol.
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2.Investigações eficazes: desmantelar as estruturas da criminalidade organizada e combater os crimes altamente prioritários
2.1. Intensificar os esforços para combater as estruturas da criminalidade organizada
As investigações policiais não devem limitar-se à apreensão de artigos ilegais ou à detenção de pequenos criminosos, mas visar intervenientes e redes que constituem a espinha dorsal dos ecossistemas criminosos.
Uma vez que a maioria das organizações criminosas está estruturada em torno de um grupo central ou de forma hierárquica, o panorama da criminalidade organizada caracteriza-se por um ambiente em rede onde diferentes grupos e indivíduos cooperam sistematicamente através de «empreendimentos conjuntos» no seio de redes criminosas pouco estruturadas e fluidas. As organizações criminosas que orquestram as cadeias de abastecimento nos mercados criminosos internacionais cooperam com grupos de menor dimensão especializados em determinadas atividades, bem como com indivíduos que desempenham papéis centrais que prestam serviços a criminosos, como fraude documental, aconselhamento jurídico, comunicações cifradas ou transporte. A capacidade dos grupos criminosos de se ligarem uns aos outros mina os esforços das autoridades responsáveis pela aplicação da lei, uma vez que cada segmento da cadeia criminosa pode ser facilmente substituído em caso de intervenção dessas autoridades.
Perante este cenário, é crucial intensificar o desmantelamento das estruturas de criminalidade organizada, visando os grupos que representam um risco mais elevado para a segurança da Europa e os indivíduos que ocupam os escalões superiores das organizações criminosas. Para o efeito, alguns Estados-Membros criaram estruturas a nível nacional ou organismos especializados na aplicação da lei e no sistema judiciário para lutar contra as organizações de tipo mafioso. Estas experiências revelaram-se eficazes para estimular uma abordagem estratégica que promova os esforços conducentes ao desmantelamento das infraestruturas criminosas. Além disso, a criação de unidades policiais ou de organismos judiciários específicos facilitaria uma maior cooperação transfronteiras. A Comissão promoverá o intercâmbio de boas práticas para facilitar a reprodução de tais modelos em todos os Estados-Membros, adaptados às especificidades nacionais.
A nível europeu, a cooperação operacional contra grupos de criminalidade organizada de tipo mafioso levada a cabo através da rede @ON facilita o destacamento no local de investigadores especializados em todos os Estados-Membros para prestar assistência nas investigações sobre grupos de criminalidade organizada transfronteiras. Outro marco importante é o trabalho realizado pela Europol em conjunto com os Estados-Membros para identificar e realizar atividades de informação e investigação relativas a alvos de grande importância selecionados, nomeadamente membros presumidos de organizações criminosas que representam um risco particularmente elevado para dois ou mais Estados-Membros.
Para intensificar a ação contra as organizações criminosas, é indispensável uma maior cooperação estrutural. A elaboração de critérios comuns a todos os Estados-Membros para identificar alvos de grande importância e a facilitação da cooperação operacional e do intercâmbio de informações em tempo real permitiria desenvolver um maior número de investigações conjuntas e sistemáticas sobre as pessoas que desempenham um papel fundamental numa rede criminosa. A atual rede @ON deveria ser reforçada através da adesão de todos os Estados-Membros e da elaboração de boas práticas, bem como através de uma ligação mais estreita à EMPACT no seu trabalho de luta contra as redes criminosas.
Uma maior ênfase nas investigações sobre a criminalidade organizada exige igualmente um quadro de informações mais sólido sobre os grupos de criminalidade organizada que estão no centro da complexa teia de redes de criminalidade organizada. A Europol e os Estados-Membros devem prosseguir o seu trabalho para desenvolver quadros estratégicos e táticos baseados na obtenção de informações sobre os grupos que constituem uma maior ameaça à segurança da Europa, nomeadamente através da elaboração de relatórios ad hoc que complementem a Avaliação da Ameaça da Criminalidade Grave e Organizada (SOCTA) da UE. Neste contexto, o intercâmbio de informações estratégicas com outros intervenientes, incluindo as missões e operações da política comum de segurança e defesa, pode ser benéfico. Além disso, é necessária uma melhor visão global da dimensão das atividades criminosas e das ações empreendidas pelos Estados-Membros. Dada a opacidade da criminalidade organizada, é difícil medir e quantificar estas atividades, e os dados e as estatísticas à disposição da União Europeia são fragmentados e recolhidos principalmente graças a obrigações de comunicação de informações dispersas por vários atos legislativos. Com base nos resultados de um estudo abrangente já realizado, a Comissão avaliará a necessidade de uma recolha mais sistemática de estatísticas neste domínio.
2.2. Uma resposta adaptada a formas específicas de criminalidade
De acordo com o relatório SOCTA UE 2021, os grupos de criminalidade organizada ativos na Europa estão envolvidos numa série de atividades criminosas, estando a maioria dos grupos criminosos implicados no tráfico de droga, no crime organizado contra a propriedade, seguido da fraude (incluindo a fraude aduaneira, a fraude no domínio dos impostos especiais de consumo e a fraude ao IVA), da introdução clandestina de migrantes e do tráfico de seres humanos. Embora alguns grupos se tenham especializado num mercado criminoso específico, outros tornaram-se cada vez mais multifacetados, utilizando os lucros de uma atividade criminosa para financiar a sua expansão para outras áreas da criminalidade. As formas específicas de criminalidade exigem uma resposta específica de um ponto de vista legislativo e de políticas.
A UE estabeleceu regras relativas aos crimes graves, como a introdução clandestina de migrantes, para detetar e proibir novas substâncias psicoativas, para controlar a posse e o comércio de armas de fogo e para impedir a reativação de armas neutralizadas. O tráfico de droga continua a ser uma importante fonte de rendimento para os grupos de criminalidade organizada. A UE definiu as prioridades neste domínio para os próximos cinco anos na Estratégia da UE em matéria de Drogas (2021-2025), adotada pelo Conselho em dezembro de 2020. Os debates sobre o plano de ação de luta contra a droga conexo prosseguem no Conselho, enquanto a Comissão prepara as primeiras iniciativas para aplicar a Estratégia e o plano de ação.
As armas de fogo constituem um vetor essencial que facilita a violência crescente por parte dos grupos criminosos, permitindo-lhes intimidar os seus adversários e exercer controlo sobre os seus membros e mercados. A fim de limitar a disponibilidade de armas de fogo nas mãos de criminosos, a Comissão deu início à aplicação do novo Plano de Ação da UE sobre o Tráfico de Armas de Fogo para 2020-2025. Publicará o relatório sobre a aplicação da Diretiva Armas de Fogo, identificando as primeiras soluções para melhorar o quadro jurídico.
A introdução clandestina de migrantes continua a ser uma atividade fundamental para os grupos de criminalidade organizada, que põe em perigo os migrantes e compromete os objetivos de gestão da migração da UE. Em 2021, a Comissão adotará um novo plano de ação contra a introdução clandestina de migrantes para combater as redes criminosas envolvidas neste crime, apoiar a aplicação da lei e a cooperação entre serviços e estimular a cooperação com os países terceiros e, quando pertinente, com as missões e operações da política comum de segurança e defesa.
O tráfico de seres humanos, uma forma de crime particularmente abominável, é frequentemente cometido por grupos de criminalidade organizada que recrutam cada vez mais as suas vítimas em linha, falsificam documentos de identidade e autorizações de trabalho e exploram as vítimas para fins sexuais, trabalho forçado, criminalidade forçada ou mendicidade. Embora as prioridades e ações da presente estratégia abranjam o tráfico de seres humanos, a Comissão propõe também, paralelamente, uma estratégia específica da UE consagrada à luta contra o tráfico de seres humanos para o período de 2021-2025, na qual abordará as especificidades deste crime.
A cibercriminalidade está a tornar-se mais agressiva e conflituosa. A rápida digitalização da sociedade, que registou um aumento súbito com a pandemia de COVID-19, cria novas vulnerabilidades que podem ser exploradas pelos criminosos envolvidos em crimes específicos da cibercriminalidade. No último ano, registou-se um aumento, tanto em número como em grau de sofisticação, dos ciberataques, como a criação e a propagação de programas maliciosos, a pirataria informática para roubar dados pessoais ou industriais sensíveis ou os ataques de negação de serviço.
O Centro Europeu da Cibercriminalidade da Europol (EC3), criado em 2013, desempenhou um papel fundamental no seguimento da exploração da pandemia de COVID-19 pela criminalidade organizada e na elaboração de materiais de sensibilização e relatórios para informar os Estados-Membros e o público, bem como no apoio às investigações sobre burlas em linha cometidas por grupos de criminalidade organizada. Além disso, publicou os seus relatórios periódicos sobre a Avaliação da ameaça da criminalidade organizada dinamizada pela Internet (iOCTA), que constituem uma importante fonte de informação para estabelecer prioridades operacionais e estratégicas.
Em consonância com a Estratégia da UE para uma luta mais eficaz contra o abuso sexual de crianças, de 2020, e com a Estratégia global da UE sobre os direitos da criança (2021-2025), em 2021 a Comissão proporá legislação para melhorar a proteção das crianças contra o abuso sexual de crianças, inclusivamente exigindo que os fornecedores de serviços em linha pertinentes detetem os conteúdos de pornografia infantil conhecidos e os denunciem às autoridades públicas. A legislação assegurará igualmente a coerência com outras iniciativas legislativas, em especial com a proposta legislativa sobre os serviços digitais. A Comissão continua igualmente a apoiar o Parlamento Europeu e o Conselho para alcançar o mais rapidamente possível um acordo sobre a proposta de regulamento relativo aos esforços voluntários de determinados fornecedores de serviços na luta contra o abuso sexual de crianças em linha. Paralelamente, a Europol tem apoiado a expansão da sua bem-sucedida campanha «Trace An Object», que recolhe, mediante uma contribuição colaborativa, informações sobre objetos individuais nas imagens que mostram abusos sexuais de crianças e que podem ajudar a restringir a localização geográfica de um abuso e, por conseguinte, contribuir em última instância para a identificação e o resgate das vítimas.
A transição para economias sem numerário, acelerada ainda mais pela pandemia, criou novas oportunidades de fraude e contrafação de meios de pagamento que não em numerário, como cartões de crédito e instrumentos de pagamento em linha, o que representa uma grave ameaça para a segurança da UE. Constituem uma importante fonte de rendimento para a criminalidade organizada e favorecem a prática de atividades criminosas como o tráfico de droga e o tráfico de seres humanos. Em 2019, a UE adotou regras mais rigorosas que devem ser aplicadas pelos Estados-Membros até 31 de maio de 2021. A Comissão acompanhará de perto os progressos realizados para assegurar a plena eficácia das novas regras.
A fraude, incluindo a fraude aduaneira, a fraude no domínio dos impostos especiais de consumo e a fraude ao IVA, constitui outro domínio da criminalidade que está a tornar-se cada vez mais atrativo para a criminalidade organizada. Para além dos esforços envidados pela Europol e pela Eurojust neste domínio, a Procuradoria Europeia investigará as infrações relativas à participação numa organização criminosa e reprimirá os seus autores, se as atividades criminosas de tal organização se centrarem na prática de infrações lesivas do orçamento da União, incluindo a fraude transfronteiriça grave ao IVA.
A contrafação de produtos é um crime com grande impacto. Os produtos de contrafação representam 6,8 % das importações da UE e constituem uma fonte significativa de rendimento para os grupos de criminalidade organizada. Os produtos médicos, de saúde e de higiene constituem uma parte considerável e crescente da contrafação, um fenómeno que aumentou de forma alarmante com a pandemia de COVID-19. A criminalidade organizada tem-se dedicado à produção e ao fornecimento de equipamentos de proteção, kits de teste e produtos farmacêuticos de contrafação, e existe o risco de os grupos de criminalidade organizada tentarem explorar as oportunidades que surgem na UE devido à elevada procura de vacinas. As autoridades responsáveis pela aplicação da lei, juntamente com a Europol e o Organismo Europeu de Luta Antifraude, estão a realizar com êxito operações importantes que conduzem a detenções e apreensões significativas de produtos de contrafação, incluindo produtos médicos, brinquedos, alimentos e bebidas. No entanto, são necessários mais esforços para reforçar a cooperação operacional a fim de combater a contrafação. Os grupos de criminalidade organizada estão cada vez mais envolvidos em crimes como a contrafação de pesticidas e a utilização fraudulenta do logótipo biológico da UE. Com base nos seus controlos oficiais e no seu quadro de aplicação, a Comissão continuará a intensificar os seus esforços para combater a fraude alimentar e trabalhará para capacitar as autoridades nacionais, instaurar uma política de tolerância zero e reforçar a prevenção, os controlos, a dissuasão e a aplicação de sanções eficazes.
Para o efeito, a Comissão adotou, em novembro de 2020, o Plano de Ação em matéria de propriedade intelectual e criará, em 2022, um conjunto de instrumentos da UE contra a contrafação que estabelecerá os princípios para a ação conjunta, a cooperação e a partilha de dados entre as autoridades responsáveis pela aplicação da lei, os titulares de direitos e os intermediários. Uma vez que a contrafação de produtos médicos ocorre principalmente em países terceiros, é importante reforçar a governação a nível mundial, nomeadamente através da adesão e ratificação, pelos Estados-Membros da UE e, eventualmente, pela própria União, da Convenção do Conselho da Europa relativa à contrafação de medicamentos (Convenção Medicrime), que foi assinada por 14 Estados-Membros e ratificada por apenas seis deles.
A criminalidade ambiental merece especial atenção devido aos seus efeitos nocivos sobre a biodiversidade e sobre o ambiente, a saúde e a coesão social na UE e nos países terceiros. Todos os tipos de espécies selvagens (plantas, animais e produtos derivados), bem como os animais de companhia, continuam a ser comercializados ilegalmente, amiúde em grande escala, por vezes com efeitos potencialmente devastadores. A gestão e as transferências ilegais de resíduos lesam as indústrias legítimas de tratamento e de reciclagem de resíduos. A UE adotou legislação para regulamentar o comércio legal de espécies selvagens e de resíduos e exigiu que os Estados-Membros criminalizassem e estabelecessem sanções aplicáveis a um vasto leque de infrações ambientais. Estes instrumentos legislativos foram complementados com o Plano de Ação da UE contra o Tráfico de Animais Selvagens de 2016 e o Plano de Ação de 2018 da UE sobre a Conformidade e a Governação em matéria de Ambiente. O Organismo Europeu de Luta Antifraude desenvolveu significativamente as suas atividades operacionais na luta contra o comércio ilícito de bens que colocam o ambiente em risco.
Apesar destes esforços, as autoridades de inspeção, as autoridades responsáveis pela aplicação da lei e as autoridades judiciárias não dispõem frequentemente da capacidade e dos recursos necessários para detetar, investigar e reprimir eficazmente os crimes ambientais. É o caso, em particular, dos Estados-Membros em que não existem organismos especializados responsáveis pela aplicação da lei e pela ação penal e que não dispõem de uma abordagem estratégica estabelecida para combater a criminalidade ambiental. É necessário reforçar a capacidade das autoridades responsáveis pela aplicação da lei a nível nacional e da UE. As sanções impostas não são suficientemente dissuasivas e a coordenação e o intercâmbio de informações nos Estados-Membros e entre os mesmos, em especial entre as autoridades administrativas e os organismos responsáveis pela aplicação da lei, é insuficiente. A Comissão está a rever o Regulamento da UE relativo a transferências de resíduos e o Plano de Ação contra o Tráfico de Animais Selvagens. A Diretiva Criminalidade Ambiental será revista para clarificar o âmbito de aplicação dos crimes ambientais, oferecer maior precisão no que diz respeito às sanções, facilitar a utilização de instrumentos de investigação eficazes e promover a cooperação e a partilha de informações transfronteiras. Além disso, será reforçada a cooperação através das redes europeias para a aplicação da legislação ambiental. Por último, uma vez que a dimensão internacional do tráfico de espécies selvagens é crucial, a Comissão promoverá a adoção de um protocolo adicional no quadro da UNTOC.
O tráfico de bens culturais tem um impacto devastador no património cultural dos países, proporciona meios de financiamento às organizações criminosas e é fundamental para o branqueamento de capitais. Para dar uma resposta eficaz a este crime, é necessário melhorar o acompanhamento e o intercâmbio de informações, reforçar a cooperação policial e aduaneira, melhorar a cooperação no domínio da justiça e assuntos internos e da política comum de segurança e defesa no terreno e recorrer aos conhecimentos especializados dos diferentes intervenientes públicos e privados. A possibilidade de dispor de um acesso rápido a arqueólogos e historiadores de arte pode contribuir significativamente para as investigações sobre o tráfico de bens culturais. A fim de combater esta forma singular de criminalidade, a Comissão continuará a apoiar o reforço de capacidades dos peritos em património cultural, incluindo uma rede constituída por estes peritos, a que os Estados-Membros poderiam recorrer no quadro da EMPACT. A sua cooperação estruturada com as autoridades responsáveis pela aplicação da lei será apoiada de modo a facilitar as investigações, bem como o financiamento de projetos sobre o tráfico de bens culturais. Além disso, a Comissão examinará outras ações necessárias para combater este fenómeno, nomeadamente através da melhoria da rastreabilidade em linha e fora de linha dos bens culturais no mercado interno e da cooperação com os países terceiros onde os bens culturais são saqueados. Para o efeito, a Comissão proporá, em 2022, um plano de ação para combater o comércio ilícito de bens culturais.
Principais ações:
A Comissão:
·proporá alterações à Diretiva Criminalidade Ambiental (4.º trimestre de 2021),
·reforçará as disposições relativas à luta contra as transferências ilegais de resíduos no âmbito da sua proposta de alteração do Regulamento relativo a transferências de resíduos (2.º trimestre de 2021),
·criará um conjunto de instrumentos da UE contra a contrafação definindo os princípios para a ação conjunta, a cooperação e a partilha de dados entre as autoridades responsáveis pela aplicação da lei, os titulares de direitos e os intermediários (2022),
·proporá um plano de ação contra o tráfico de bens culturais (2022),
·avaliará a possibilidade de a União aderir à Convenção Medicrime do Conselho da Europa.
Insta-se os Estados-Membros a:
·aderir à rede @ON sobre grupos de criminalidade organizada de tipo mafioso e a reforçá-la, bem como a estudar uma integração mais estruturada de uma abordagem orientada contra as redes criminosas na EMPACT,
·criar ou continuar a desenvolver estruturas de coordenação a nível nacional ou organismos especializados nas autoridades responsáveis pela aplicação da lei e nas autoridades judiciárias, centrados no combate às estruturas da criminalidade organizada,
·aderir à Convenção Medicrime do Conselho da Europa e ratificá-la.
Insta-se os Estados-Membros e a Europol a:
·elaborar critérios comuns de identificação para selecionar e investigar alvos de grande importância e dar prioridade às investigações sobre indivíduos e redes criminosas que representem o maior risco para a segurança na UE,
·desenvolver um quadro de informações estratégico e tático sobre os grupos de criminalidade organizada de alto risco,
·reforçar a cooperação estratégica e operacional na luta contra a contrafação de produtos médicos, nomeadamente com o Organismo Europeu de Luta Antifraude e o Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia e a nível mundial.
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3.Eliminar os lucros gerados pela criminalidade organizada e prevenir a sua infiltração na economia legal e na sociedade
3.1. Reforço das medidas de recuperação de bens e de combate ao branqueamento de capitais, promoção das investigações financeiras
A criminalidade organizada na UE assenta fundamentalmente na capacidade de branquear grandes quantidades de lucros provenientes de atividades criminosas. Embora três quartos das organizações criminosas continuem a recorrer a métodos básicos para esconder os seus ganhos ilícitos, como o investimento em bens imóveis ou noutros bens de elevado valor, outras recorrem a métodos cada vez mais sofisticados, com a ajuda de branqueadores de capitais de colarinho branco. O rasto financeiro deixado pelos criminosos é um indicador essencial da sua atividade, fornecendo pistas úteis aos investigadores e elementos de prova inestimáveis para incriminar os autores dos crimes. Por conseguinte, a luta contra os delitos financeiros é crucial para detetar atividades criminosas, dissuadir os criminosos da prática de crimes e prevenir a sua infiltração na economia legal e na sociedade.
Apesar do desenvolvimento dos quadros jurídicos de combate ao branqueamento de capitais e de recuperação de bens, apenas uma pequena parte das atividades de branqueamento de capitais é detetada, e apenas 1 % dos bens de origem criminosa são confiscados. Esta situação foi agravada pela crescente utilização de canais financeiros com uma supervisão mais limitada do que a do setor bancário, como as moedas virtuais.
É necessário reforçar a luta contra os delitos financeiros. Tal como salientado no plano de ação para uma política abrangente da União em matéria de luta contra o branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo de 2020, é necessário melhorar significativamente o quadro da UE em matéria de luta contra o branqueamento de capitais para corrigir as grandes divergências na sua aplicação e as deficiências graves na aplicação das regras. O potencal das investigações financeiras não está a ser plenamente utilizado, em parte devido à capacidade insuficiente das autoridades responsáveis pela aplicação da lei para levar a cabo estes inquéritos complexos e onerosos.
Além disso, a capacidade de privar os criminosos dos bens obtidos ilegalmente é ainda dificultada pelo facto de o quadro jurídico em matéria de confisco ter um âmbito de aplicação restrito em termos de bens e atividades criminosas abrangidos. Além disso, atualmente os gabinetes de recuperação de bens enfrentam dificuldades no que se refere à deteção de bens, uma vez que não dispõem, por exemplo, de poderes temporários de congelamento, a fim de prevenir o desaparecimento dos bens, nem de acesso direto e imediato a determinados registos públicos, como registos prediais centrais ou registos centrais de empresas. Além disso, os bens recuperados nem sempre são geridos de forma eficiente e não são suficientemente utilizados para indemnizar as vítimas ou beneficiar a sociedade.
Tal como anunciado no Plano de Ação contra o branqueamento de capitais de 2020, assegurar a aplicação efetiva do atual quadro em matéria de luta contra o branqueamento de capitais é uma prioridade. Para além dos esforços para assegurar uma aplicação adequada, a Comissão está a elaborar propostas legislativas destinadas a reforçar e desenvolver o quadro da UE em matéria de luta contra o branqueamento de capitais propondo, no segundo trimestre de 2021, o estabelecimento de um conjunto único de regras diretamente aplicáveis, o reforço da supervisão a nível da UE e a criação de um mecanismo de coordenação e apoio da UE às Unidades de Informação Financeira.
É igualmente necessário continuar a promover uma cultura de investigações financeiras precoces em todos os Estados-Membros e reforçar a capacidade dos investigadores para fazer face à dimensão financeira da criminalidade organizada. As conclusões do Conselho sobre o reforço das investigações financeiras de 2020 exortam os Estados-Membros a assegurar que as investigações financeiras façam parte integrante de todos os tipos de investigações criminais respeitantes à criminalidade organizada. Além disso, graças à criação do Centro Europeu de Criminalidade Económica e Financeira, a Europol reforçou as suas capacidades para ajudar os Estados-Membros a realizar investigações financeiras.
É igualmente essencial intensificar os esforços em matéria de congelamento e de confisco através do reforço do quadro jurídico a nível da UE, bem como das capacidades operacionais dos gabinetes de recuperação de bens. Devem ser estudadas medidas de confisco não baseadas em condenações, uma vez que estas podem contribuir para aumentar a quantidade de bens confiscados quando, por exemplo, não é possível ligar os bens obtidos a uma condenação penal. A fim de prever um regime de confisco mais sólido e dotar os gabinetes de recuperação de bens nacionais de um mandato mais eficaz, a Comissão proporá, em 2022, uma revisão da Diretiva sobre o congelamento e a perda dos instrumentos e produtos do crime na União Europeia, de 2014, e da Decisão do Conselho, de 2007, relativa aos gabinetes de recuperação de bens, a fim de alargar a lista de infrações penais abrangidas, introduzir regras mais eficazes sobre a perda não baseada numa condenação; assegurar uma gestão eficaz e a reutilização social dos bens cuja perda tenha sido decidida e a compensação das vítimas de crimes e reforçar a capacidade dos gabinetes de recuperação de bens para detetar e identificar bens ilícitos.
Além disso, a Comissão estudará as opções possíveis no que diz respeito ao lançamento sistemático de investigações financeiras e de investigações financeiras após uma condenação. O rápido acesso a informações financeiras é essencial para a realização de investigações financeiras eficazes e para a deteção e o confisco bem-sucedidos de bens. Por conseguinte, é da máxima importância que os Estados-Membros procedam à transposição atempada da Diretiva que visa facilitar o acesso a informações financeiras e de outro tipo, que proporciona às autoridades responsáveis pela aplicação da lei acesso aos registos centralizados de contas bancárias e reforça a cooperação entre as autoridades responsáveis pela aplicação da lei e as Unidades de Informação Financeira. A Comissão procederá igualmente à revisão da diretiva e do quadro em matéria de luta contra o branqueamento de capitais, a fim de proporcionar às autoridades responsáveis pela aplicação da lei acesso à futura plataforma que interligará os registos das contas bancárias em toda a União.
Simultaneamente, será necessário melhorar a cooperação internacional no que diz respeito à resposta repressiva ao branqueamento de capitais. Os Estados-Membros devem utilizar plenamente as possibilidades oferecidas pela rede operacional contra o branqueamento de capitais (AMON), uma rede internacional informal de unidades de combate ao branqueamento de capitais, e pela Rede Camden Interserviços de Recuperação de Bens (CARIN), uma rede informal de profissionais das autoridades policiais e judiciárias especializados no domínio da deteção, congelamento, apreensão e confisco de bens. A Comissão proporá igualmente a ratificação, em nome da UE, da Convenção de Varsóvia do Conselho da Europa relativa ao Branqueamento, Deteção, Apreensão e Perda dos Produtos do Crime.
3.2. Reforço das medidas de combate à corrupção
A corrupção é uma componente central do modus operandi dos grupos de criminalidade organizada. Estes grupos subornam, intimidam e recorrem à força contra funcionários públicos e pessoal afeto a entidades fundamentais, como os portos, com o objetivo de passarem despercebidos, obterem informações ou facilitarem as suas atividades. Ao abrigo das atuais normas da UE em matéria de luta contra a corrupção, os Estados-Membros são obrigados a criminalizar a corrupção ativa e passiva dos funcionários públicos, estabelecer sanções adequadas e assegurar que os empresários que corrompem funcionários sejam responsabilizados penalmente. No entanto, estes instrumentos não abrangem determinadas infrações relacionadas com a corrupção, como o tráfico de influência, o abuso de poder, o enriquecimento ilícito, a apropriação indevida ou outras formas de desvio de bens por um funcionário público. Mais recentemente, a União introduziu uma nova legislação que protege os denunciantes e exige a criação de canais seguros para a denúncia de práticas corruptas. O relatório anual sobre o Estado de direito analisa a situação dos Estados-Membros também em relação às políticas de luta contra a corrupção.
A fim de intensificar os esforços a nível da UE, a Comissão avaliará as normas da UE em vigor em matéria de luta contra a corrupção, que foram adotadas há vinte anos, para determinar se estão atualizadas em relação à evolução das práticas criminosas e para assegurar que abrangem todas as infrações relacionadas com a corrupção.
As várias formas de corrupção ligadas à criminalidade organizada num contexto transnacional justificam igualmente a necessidade de melhorar a partilha de conhecimentos especializados, de boas práticas, de dados e de informações entre os Estados-Membros e com a sociedade civil. A fim de apoiar eficazmente as investigações criminais através do intercâmbio de dados, é crucial ter uma visão global e uma boa compreensão dos riscos e das ameaças causados pela corrupção antes de estes se traduzirem em crimes relacionados com a corrupção.
A pandemia de COVID-19 acrescentou toda uma nova série de riscos graves de corrupção: a mobilização de recursos em grande escala para dar resposta à crise sanitária e económica criou indiretamente novas oportunidades para a corrupção. É necessário reforçar a capacidade das autoridades nacionais para lutar contra os casos de corrupção altamente complexos relacionados com a criminalidade organizada, em particular criando estruturas especializadas no domínio da luta contra a corrupção. É importante que os Estados-Membros continuem a utilizar o financiamento disponível e os instrumentos de apoio técnico disponibilizados pela Comissão a fim de reforçar a sua abordagem estrutural e estratégica, os seus instrumentos regulamentares e operacionais e a sua capacidade no domínio da luta contra a corrupção. Além disso, dado o papel crucial que os meios de comunicação social desempenham na revelação de casos de corrupção, é extremamente importante garantir a segurança dos jornalistas de investigação em toda a União, incluindo contra a litigância de má-fé. Tal como anunciado no Plano de Ação para a Democracia Europeia, em 2021 a Comissão publicará uma recomendação sobre a segurança dos jornalistas e apresentará uma iniciativa para combater a litigância de má-fé contra os jornalistas e os defensores de direitos.
A UE é parte na Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção desde 2008, pelo que a sua aplicação deste instrumento será objeto de exame em conformidade com as disposições nela previstas. A UE e os Estados-Membros estão a trabalhar, no âmbito do Grupo de Estados contra a Corrupção (GRECO) do Conselho da Europa e do G20, para continuarem a fazer progressos na prevenção e na luta contra a corrupção. A sessão extraordinária da Assembleia Geral das Nações Unidas, prevista para junho de 2021, representará uma grande oportunidade para progredir na luta contra a corrupção a nível mundial.
Os Estados-Membros são igualmente obrigados a criminalizar e a exercer a ação penal relativamente aos atos de corrupção cometidos por cidadãos e empresas da UE em países parceiros, em consonância com as obrigações que lhes incumbem por força da Convenção da OCDE sobre a Luta contra a Corrupção de Agentes Públicos Estrangeiros nas Transações Comerciais Internacionais. O exercício da ação penal e o julgamento coerentes dos atos de corrupção cometidos no estrangeiro desempenharão um papel importante na luta contra a corrupção a nível mundial.
3.3. Lutar contra a infiltração na economia e na sociedade
Os grupos criminosos investem parte dos seus consideráveis lucros em empresas legais de setores tão variados como o imobiliário e a construção, os transportes ou a hotelaria e restauração. Ao controlarem empresas nesses setores, as organizações criminosas conseguem proceder ao branqueamento dos bens ilegais e maximizar os seus lucros. A infiltração da criminalidade organizada prejudica a economia lícita e distorce as regras do mercado. Devido à situação económica gerada pela pandemia de COVID-19, existe um risco acrescido de a criminalidade organizada se apoderar de empresas enfraquecidas e se infiltrar em setores de atividade inteiros. Já há elementos que comprovam a existência de tentativas criminosas de defraudar os vários mecanismos financeiros criados para apoiar a recuperação económica. A fim de enfrentar esta ameaça e identificar os pontos-chave que necessitam de intervenção e sensibilização, os Estados-Membros e a Europol devem criar um quadro de informações sobre o alcance e o nível dos investimentos criminosos, os métodos de infiltração e os setores em risco.
Seria possível extrair ensinamentos do intercâmbio de boas práticas promovido através da Rede Europeia para a abordagem administrativa, um método através do qual as autoridades locais, em colaboração com as autoridades responsáveis pela aplicação da lei e a sociedade civil, utilizam instrumentos administrativos, como procedimentos de obtenção de licenças, concursos e subsídios, para prevenir a infiltração da criminalidade organizada em empresas legais e infraestruturas administrativas. Devem ser atribuídas competências às autoridades locais, no pleno respeito dos direitos fundamentais, para criar obstáculos que protejam o tecido económico da criminalidade organizada.
A dimensão local é igualmente fundamental para reduzir o espaço para os grupos criminosos engrossarem as suas fileiras. Os indivíduos criados num ambiente de criminalidade organizada e em zonas socioeconómicas desfavorecidas são mais vulneráveis ao recrutamento para atividades criminosas. Começando por cometer pequenos delitos ou por desempenhar papéis menores na organização, estes indivíduos poderão tornar-se membros e líderes de organizações criminosas no futuro. Algumas ações específicas em certos bairros e comunidades têm-se revelado bem-sucedidas na oferta de alternativas que impedem os jovens de se dedicarem a uma vida de violência e criminalidade. Além disso, as atividades de prevenção da criminalidade, como o policiamento de proximidade ou as campanhas de sensibilização em zonas particularmente afetadas por atividades criminosas, são essenciais para aumentar a resiliência da sociedade contra as atividades dos grupos de criminalidade organizada. A Comissão reforçará o intercâmbio de conhecimentos e de boas práticas em matéria de prevenção da criminalidade através da Rede Europeia de Prevenção da Criminalidade.
Principais ações:
A Comissão:
·proporá a revisão da Diretiva sobre o congelamento e a perda dos instrumentos e produtos do crime na União Europeia e da Decisão do Conselho relativa aos gabinetes de recuperação de bens (2022),
·avaliará as normas da UE em vigor em matéria de luta contra a corrupção (2022),
·promoverá a cooperação e o intercâmbio de informações sobre a ligação entre a corrupção e a criminalidade organizada, nomeadamente através da Europol.
Insta-se os Estados-Membros a:
·realizar investigações financeiras de forma sistemática no quadro das investigações sobre a criminalidade organizada e, sempre que o ambiente financeiro indicar a presença de bens de origem criminosa, realizar, de forma sistemática, investigações sobre a recuperação de bens,
·transpor rapidamente a diretiva que visa facilitar o acesso a informações financeiras, até ao prazo previsto de agosto de 2021,
·proceder ao intercâmbio de informações estratégicas com os setores em risco de serem infiltrados por grupos de criminalidade organizada (parcerias público-privadas),
·melhorar a especialização dos serviços responsáveis pela aplicação da lei e reforçar os organismos responsáveis pelas investigações, ações penais e processos judiciais de casos de corrupção de alto nível.
Insta-se os Estados-Membros e a Europol a:
·melhorar o quadro de informações sobre a ameaça de infiltração na economia legal, avaliando os riscos e os métodos utilizados pelos grupos de criminalidade organizada.
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4.Preparar as autoridades policiais e o sistema judiciário para a era digital
4.1. Acesso a pistas e elementos de prova digitais
A procura de pistas e de elementos de prova, incluindo o acesso lícito a dados de comunicações, constitui a pedra angular das investigações policiais e das ações penais, permitindo levar os criminosos a julgamento. Uma vez que as nossas vidas e atividades se desenrolam, mais do que nunca, em linha, as pegadas do crime também são digitais. A criminalidade organizada é planeada, praticada e ocultada em linha, onde são comercializadas substâncias e produtos ilegais e se procuram formas engenhosas de proceder ao branqueamento dos lucros sem os obstáculos das fronteiras físicas. A dimensão do problema é amplificada pela rápida evolução das tecnologias. A passagem de algumas pistas e elementos de prova de um espaço físico para um espaço em linha acarreta uma série de desafios, incluindo a velocidade a que os dados podem ser transferidos entre jurisdições ou a capacidade de se esconderem por detrás da cifragem. Além disso, alguns instrumentos de recolha de elementos de prova e medidas concebidas para os elementos de prova materiais ainda não estão totalmente adaptados ao mundo digital. Tal pode dificultar ou atrasar as investigações criminais e as ações penais, uma vez que os dados não estão disponíveis ou acessíveis em tempo útil.
Geralmente, as investigações sobre a criminalidade organizada exigem o acesso a dados de comunicações eletrónicas para estabelecer uma ligação entre o crime, o autor e as suas vítimas, bem como para localizar as redes criminosas. Dada a dimensão e a estrutura de uma rede de criminalidade organizada, estas comunicações são difíceis de detetar pelas autoridades responsáveis pela aplicação da lei se estas não tiverem acesso retrospetivo aos metadados das comunicações. A ausência de tais dados torna particularmente difícil a identificação dos intervenientes centrais que exercem uma influência determinante na sombra. Por conseguinte, muitas vezes a identificação e a detenção apenas afetam as posições mais baixas destas redes, ou seja, aqueles que se encontravam no local do crime, e não os intervenientes principais. Além disso, os grupos de criminalidade organizada utilizam tecnologia moderna para organizar a entrega de droga seguinte, partilhar alvos promissores para o assalto seguinte, acordar o ponto de encontro para cometer um assalto à mão armada ou, no caso de grupos de cibercriminalidade organizada, lançar ataques de programas maliciosos contra serviços bancários em linha.
Para assegurar o acesso aos elementos de prova e às pistas de investigação digitais, os Estados-Membros criaram quadros de conservação de dados. Tendo em conta o princípio da confidencialidade das comunicações eletrónicas, os prestadores de serviços de comunicações poderão ter apagado os metadados quando as autoridades responsáveis pela aplicação da lei solicitarem acesso aos mesmos. Nesses casos, poderão perder-se elementos de prova importantes, a menos que os prestadores de serviços de comunicações sejam obrigados por lei a armazenar os metadados das comunicações durante um período razoavelmente mais longo ao abrigo de um quadro legislativo que regule a conservação de dados. Corre-se assim o risco de criar obstáculos às investigações sobre crimes ou à identificação das vítimas. Os metadados das comunicações revestem particular importância, por exemplo, na investigação e na repressão da cibercriminalidade, constituem frequentemente o principal meio de deteção do crime e são elementos de prova essenciais. Podem igualmente constituir um meio importante para corroborar (ou refutar) outros tipos de elementos de prova relacionados com os factos de um processo. Além disso, a complexidade das atividades da criminalidade organizada, como o tráfico ilegal de droga ou de seres humanos ou o branqueamento de capitais, e o tempo necessário para investigar esse tipo de criminalidade, já que os suspeitos vão surgindo no decurso da investigação, sublinham a importância da conservação dos dados.
Simultaneamente, as medidas de conservação de dados suscitam questões importantes em relação à sua ingerência nos direitos fundamentais, incluindo o direito à privacidade e à proteção dos dados pessoais. Nos seus recentes acórdãos sobre a conservação de dados, o Tribunal de Justiça da União Europeia confirmou a sua jurisprudência anterior, segundo a qual os dados das comunicações eletrónicas são confidenciais e, em princípio, os dados de tráfego e de localização não podem ser conservados de forma generalizada e indiferenciada. O âmbito de aplicação das medidas de conservação de dados só pode ser justificado em relação à sua ingerência nos direitos fundamentais quando as medidas forem necessárias e proporcionadas em relação ao objetivo perseguido. O Tribunal estabeleceu exceções delimitadas a esta regra relativas à segurança nacional, à defesa e à segurança pública ou à prevenção, investigação, deteção e repressão de crimes. A Comissão analisará e delineará possíveis soluções, em consonância com os acórdãos do Tribunal, que satisfaçam as necessidades das autoridades responsáveis pela aplicação da lei e do sistema judiciário de uma forma que seja operacionalmente útil, tecnicamente possível e juridicamente sólida, o que inclui respeitar plenamente os direitos fundamentais. Antes do final de junho de 2021, consultará os Estados-Membros com vista a definir a via a seguir.
Uma resposta policial eficaz exige igualmente o acesso, em tempo útil, aos elementos de prova digitais que estejam na posse de prestadores numa jurisdição diferente. Em 2018, a Comissão propôs o pacote legislativo em matéria de provas eletrónicas para facilitar o acesso transnacional a elementos de prova eletrónicos com base nas ordens europeias de entrega e de conservação de provas. Atualmente, o Parlamento Europeu e o Conselho estão a participar em debates interinstitucionais, apoiados pela Comissão, para encontrar a base de entendimento comum necessária para a rápida adoção destas propostas. Além disso, no âmbito dos esforços envidados para acelerar a digitalização das autoridades responsáveis pela aplicação da lei e do sistema judiciário
, todos os Estados-Membros devem participar no sistema de intercâmbio digital de provas eletrónicas (eEDES). Paralelamente, são necessários progressos rápidos nas negociações internacionais multilaterais e bilaterais para facilitar a cooperação com parceiros internacionais e estabelecer regras compatíveis a nível internacional para o acesso transnacional a provas eletrónicas.
Tendo em conta a escala crescente dos ataques, a recolha de elementos de prova eletrónicos o mais rapidamente possível e antes da reparação continua a ser essencial para o êxito das investigações, o que contribui para um efeito dissuasivo. Para este fim, as autoridades responsáveis pela aplicação da lei e a comunidade da cibersegurança devem cooperar estreitamente a fim de assegurar uma resposta coletiva e global. Além disso, as investigações exigem um acesso rápido e fiável aos dados WHOIS, nomeadamente para ajudar a identificar grupos de criminalidade organizada que abusam regularmente do sistema de nomes de domínio (DNS) e de outros protocolos Internet nos seus ciberataques ou para cometer outros crimes, como burlas ou a difusão de produtos e serviços ilegais.
A cifragem é essencial para o mundo digital, tornando seguros os sistemas e as transações digitais e protegendo também uma série de direitos fundamentais, incluindo a liberdade de expressão, a privacidade e a proteção de dados. No entanto, se utilizada para fins criminosos, permite camuflar a identidade dos criminosos e esconder o conteúdo das suas comunicações. A Comissão propôs, no seu 11.º relatório mensal sobre os progressos alcançados rumo a uma União da Segurança genuína e eficaz
, um conjunto de seis medidas concretas para ajudar as autoridades policiais e judiciárias quando são confrontadas com a cifragem dos dados armazenados em dispositivos (como telefones ou unidades de discos rígidos) nas investigações criminais, sem proibir, limitar ou enfraquecer a cifragem. No quadro destas medidas, a nova plataforma de decifragem da Europol lançada pela Comissão em dezembro de 2020 contribuirá para enfrentar estes desafios. Foram desenvolvidos módulos de formação e cursos-piloto ministrados pelo Grupo Europeu de Formação e Educação em Cibercrime (ECTEG) e financiados através do Fundo para a Segurança Interna - Polícia. Estes cursos farão parte da oferta de formação habitual da Academia Europeia de Polícia (CEPOL).
Para além dos dispositivos convencionais, o nicho de mercado dos dispositivos de comunicação cifrados, que também são adquiridos e utilizados pelos grupos de criminalidade organizada, está a crescer. Conforme demonstrado pelas recentes operações relativas às redes Encrochat e Sky ECC, as autoridades da UE responsáveis pela aplicação da lei precisam de desenvolver continuamente a sua capacidade para tratar informações cifradas no contexto das investigações criminais, em consonância com o direito aplicável.
Em dezembro de 2020, o Conselho adotou uma resolução que apela a um debate ativo com o setor tecnológico e à elaboração de um quadro regulamentar adequado que permita às autoridades nacionais desempenhar eficazmente as suas funções operacionais, preservando simultaneamente a privacidade, os direitos fundamentais e a segurança das comunicações. Além disso, o Conselho solicitou a melhoria da coordenação dos esforços dos Estados-Membros e das instituições e organismos da União Europeia. Conforme já anunciado na Agenda em matéria de Luta contra o Terrorismo
, a Comissão está a trabalhar para identificar soluções técnicas, operacionais e jurídicas que assegurem o acesso lícito às informações cifradas, mantendo simultaneamente a eficácia da cifragem na proteção da privacidade e da segurança das comunicações.
Em 2020, a Comissão, juntamente com o setor, peritos em criptografia, membros de organizações da sociedade civil e autoridades competentes, conduziu um processo de consulta dos peritos para identificar as soluções técnicas suscetíveis de ajudar as empresas a detetar especificamente o abuso sexual de crianças nas comunicações eletrónicas cifradas de ponta a ponta. A Comissão apoiará a investigação para identificar as soluções técnicas mais viáveis que poderiam ser reforçadas e aplicadas de forma viável e legal pelas empresas.
Em termos mais gerais, a Comissão orientará o processo para analisar, com as partes interessadas pertinentes, as capacidades e as abordagens existentes para permitir o acesso lícito e direcionado a informações cifradas no contexto das investigações criminais e das ações penais. Estas abordagens não devem provocar um enfraquecimento geral da cifragem ou dar origem a uma vigilância indiscriminada. Esta análise não se centrará apenas na eliminação dos atuais obstáculos, mas antecipará também a provável evolução das tecnologias de cifragem e decifragem e a cooperação necessária com o meio académico e o setor privado para o efeito. Além disso, a Comissão está a intensificar os seus esforços no domínio da normalização para manter as capacidades de interceção legal no contexto da tecnologia 5G e noutros contextos. Na sequência deste processo, a Comissão sugerirá, em 2022, um caminho a seguir para abordar a questão do acesso lícito e direcionado às informações cifradas no contexto das investigações criminais e das ações penais, com base num levantamento exaustivo da forma como os Estados-Membros tratam a cifragem, juntamente com um processo que envolve múltiplas partes interessadas para examinar e avaliar as opções concretas (jurídicas, éticas e técnicas).
4.2. Instrumentos e tecnologias eficazes
Frequentemente, as autoridades responsáveis pela aplicação da lei não dispõem dos meios necessários para adquirir os instrumentos adequados necessários para realizar investigações digitais. Atualmente, mais de 80 % dos crimes têm uma componente digital; mesmo quando os crimes são cometidos fora de linha, quase todos os agentes das autoridades responsáveis pela aplicação da lei e procuradores precisam de possuir conhecimentos básicos sobre a forma de investigar crimes em linha. Para detetar e reprimir a criminalidade organizada, os investigadores precisam de detetar atividades suspeitas em linha, seguir transações criminosas em moeda virtual, compreender o que encontraram (os dados podem ser cifrados ou têm de ser contextualizados tendo em conta outros dados), conservar os dados e utilizá-los como elementos de prova eletrónicos em tribunal.
Urge aumentar as capacidades e as competências dos serviços policiais e jusiciários não especializados. Além disso, faltam conhecimentos especializados em domínios específicos dasinvestigações digitais, como a criminalística da Internet das coisas. As autoridades responsáveis pela aplicação da lei e o sistema judiciário devem acompanhar as tecnologias em rápido desenvolvimento utilizadas pelos criminosos e as suas atividades transfronteiras. Tal exige uma coordenação no desenvolvimento de instrumentos e formações, entre Estados-Membros e entre setores, em domínios como a criminalística digital, as informações de fontes abertas, as criptomoedas e as investigações na Internet obscura, com o objetivo, por exemplo, de obter acesso a fóruns onde se vendem bens e serviços ilegais e, sempre que possível, desmantelá-los. Além disso, as autoridades nacionais nem sempre conseguem recorrer a soluções técnicas de fonte aberta devido ao desconhecimento das soluções que foram desenvolvidas e estão disponíveis, às diferenças em termos de requisitos e níveis de conhecimentos especializados, bem como à falta de apoio para o seu desenvolvimento e manutenção. Simultaneamente, a falta de coordenação entre as várias autoridades e Estados-Membros acarreta riscos de duplicação de iniciativas. Os mecanismos existentes na UE (EMPACT, agências da UE como a Europol, a CEPOL e a Eurojust, redes de profissionais, programas de financiamento como o Fundo para a Segurança Interna) podem desempenhar um papel fundamental para promover uma abordagem mais eficaz das investigações em linha, graças a ações coordenadas e bem orientadas para o desenvolvimento de capacidades e competências.
As necessidades dos investigadores em linha têm de ser identificadas de forma fiável. A Europol, em conformidade com o seu mandato, e o polo europeu de inovação para a segurança interna devem coordenar uma análise abrangente das lacunas e das necessidades tecnológicas no domínio da investigação digital, bem como uma análise prospetiva, que são fundamentais para orientar os programas no domínio da investigação, da inovação e do desenvolvimento e os instrumentos políticos que contribuem para o reforço das capacidades. É importante que as entidades e redes pertinentes apoiem este trabalho. Neste contexto, a Europol e o polo europeu de inovação para a segurança interna devem estabelecer prioridades no domínio da investigação e do desenvolvimento, que serão validadas pelos Estados-Membros
. Para proporcionar uma visão clara dos mecanismos práticos existentes e dos recursos disponíveis para apoiar a capacidade das autoridades responsáveis pela aplicação da lei no domínio das investigações digitais, e para clarificar as funções e as responsabilidades das entidades envolvidas, a Comissão consultará os Estados-Membros e outras partes interessadas até ao final de 2021 e realizará o seguimento, conforme necessário.
A investigação e a inovação são necessárias, tanto para as tecnologias de investigação como para combater a criminalidade facilitada pela tecnologia. O Programa de Investigação e Inovação da UE, Horizonte 2020, financiou o desenvolvimento de soluções tecnológicas inovadoras para aumentar a capacidade das autoridades nacionais para lutar contra a criminalidade organizada. Este trabalho será reforçado com o novo programa Horizonte Europa, que financiará projetos de investigação para melhorar o quadro de informações sobre a criminalidade organizada, desenvolver instrumentos e programas de formação e reforçar a cooperação entre serviços.
A Comissão facilitará o acesso aos conjuntos de dados de alta qualidade necessários para desenvolver instrumentos de investigação, incluindo os sistemas de inteligência artificial, que satisfaçam as necessidades das autoridades responsáveis pela aplicação da lei no quadro das investigações criminais, nomeadamente para a análise de grandes quantidades de dados ou para investigações na Internet obscura. Para o efeito, a Comissão apoiará, no âmbito do Programa Europa Digital, a criação de um espaço europeu de dados de segurança que será fundamental para desenvolver, formar e avaliar os instrumentos destinados às autoridades responsáveis pela aplicação da lei e contribuirá para a Estratégia Europeia para os Dados, no pleno respeito dos direitos fundamentais. Além disso, a Comissão apoiará os Estados-Membros em relação aos projetos-piloto sobre soluções de inteligência artificial que ajudarão a promover a aceitação da inovação pela comunidade de autoridades responsáveis pela aplicação da lei. As autoridades responsáveis pela aplicação da lei, a indústria e o meio académico devem cooperar no quadro de uma rede apoiada por financiamento da UE para desenvolver instrumentos e soluções a nível da UE que satisfaçam as necessidades das autoridades responsáveis pela aplicação da lei da UE, apoiando assim o trabalho da Europol na prestação de serviços e de soluções técnicas às autoridades responsáveis pela aplicação da lei da UE. Essa rede deve assegurar a sustentabilidade dos projetos do Horizonte Europa e do Fundo para a Segurança Interna e apoiar a Europol nesse esforço.
A rede deve apresentar gratuitamente os seus resultados às autoridades responsáveis pela aplicação da lei através da Europol e melhorar continuamente as soluções existentes. Para o efeito, a Europol dever tornar-se o «balcão único» para a disponibilização de acesso a instrumentos e serviços, como a análise de programas maliciosos, às autoridades nacionais responsáveis pela aplicação da lei.
4.3. Melhorar o acesso às competências, aos conhecimentos e às competências operacionais
Embora a investigação e a análise dos elementos de prova digitais esteja no cerne da maioria das investigações, o nível das competências necessárias no domínio do processo penal, das táticas e técnicas de investigação digital ou da criminalística digital ainda não está disponível em alguns Estados-Membros e precisa de ser alargado e aprofundado na maioria deles. Além disso, o acesso a competências operacionais especializadas de ponta em domínios específicos, como a criminalística da Internet das coisas, continua a constituir um problema para vários Estados-Membros.
O desenvolvimento da formação deve basear-se numa definição das competências necessárias para realizar investigações digitais e dos perfis profissionais associados (por exemplo, analista de dados, investigador em linha ou perito em criminalística digital). Para o efeito, a Europol e a CEPOL devem colaborar com os Estados-Membros para definir e atualizar periodicamente um «quadro das competências em matéria de formação». Neste contexto, a Comissão deve apoiar o desenvolvimento de materiais de formação, através do Grupo Europeu de Formação e Educação em Cibercrime (ECTEG), e apoiar a oferta de ações de formação a nível nacional através dos instrumentos disponíveis.
A CEPOL e a Rede Europeia de Formação Judiciária (REFJ) devem avaliar regularmente as necessidades de formação e nesta base estabelecer prioridades em matéria de oferta de formação, igualmente com vista a continuar a desenvolver as competências digitais gerais das autoridades policiais e judiciárias. Com base no quadro de competências de formação, a CEPOL deve igualmente trabalhar em estreita colaboração com os profissionais e com os Estados-Membros para criar regimes de certificação/acreditação para peritos em investigação digital. Tais regimes (1) aumentariam o número de peritos capazes de ministrar formação em domínios específicos; (2) facilitariam a cooperação transfronteiras, uma vez que a certificação/acreditação daria garantias relativamente à recolha e ao tratamento dos elementos de prova, assegurando a sua admissibilidade em tribunal também noutras jurisdições; e (3) facilitariam a identificação de investigadores especializados.
As investigações digitais podem exigir conhecimentos especializados que escasseiam na UE, nomeadamente no que se refere a criptomoedas, programas informáticos de sequestro ou investigações na Internet obscura. Os Estados-Membros devem identificar os peritos que desenvolveram competências de ponta nestes domínios para se apoiarem mutuamente nas operações em que tais conhecimentos especializados sejam necessários. A Comissão ajudará a Europol a criar mecanismos para assegurar que as autoridades e os peritos dos Estados-Membros recebem incentivos adequados para fazer parte de um grupo de peritos.
Principais ações:
A Comissão:
·analisará e delineará possíveis soluções sobre a conservação de dados para as autoridades policiais e judiciárias e consultará os Estados-Membros sobre as mesmas até ao final de junho de 2021,
·proporá uma via a seguir para abordar a questão do acesso lícito e direcionado por parte das autoridades responsáveis pela aplicação da lei a informações cifradas no contexto de investigações criminais. Esta abordagem deve basear-se num levantamento exaustivo da forma como os Estados-Membros tratam a cifragem e num processo que envolve múltiplas partes interessadas para estudar e avaliar as opções lícitas concretas,
· incentivará e facilitará a plena e rápida participação dos Estados-Membros no sistema de intercâmbio digital de provas eletrónicas (e-EDES),
·desenvolverá, através do seu Centro Comum de Investigação, um instrumento de monitorização para recolher informações sobre as atividades ilegais que se desenvolvem na Internet obscura,
·apoiará o desenvolvimento de módulos e materiais de formação e apoiará a formação ministrada pela CEPOL, pela REFJ e pelas instituições nacionais de formação.
Insta-se a Europol a:
·coordenar uma análise abrangente das lacunas e das necessidades tecnológicas no domínio da investigação digital,
·criar um repositório de instrumentos que permram às autoridades responsáveis pela aplicação da lei identificar e aceder às soluções mais avançadas,
·criar e manter uma base de dados de peritos em investigações e em criminalística em domínios especializados, como a Internet das Coisas ou as criptomoedas.
Insta-se a CEPOL a:
·criar regimes de certificação/acreditação para os peritos em investigação digital,
·proporcionar e atualizar regularmente um quadro de competências de formação, em conjunto com a Europol.
Insta-se o Parlamento Europeu e o Conselho a:
·adotar, com caráter de urgência, as propostas relativas às provas eletrónicas, a fim de garantir às autoridades um acesso imediato e fiável às provas eletrónicas.
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Conclusão
A presente estratégia estabelece as prioridades, as ações e as metas a alcançar nos próximos cinco anos para que a UE esteja em melhores condições de lutar contra a criminalidade organizada. No entanto, o fenómeno da criminalidade está em constante evolução, pelo que é essencial identificar as novas tendências e reagir rapidamente aos novos desenvolvimentos. A União e os seus Estados-Membros devem antecipar as ações das organizações criminosas.
Por conseguinte, chegou o momento de intensificar a ação coletiva da União contra a criminalidade organizada, reforçando os instrumentos existentes para apoiar a cooperação transfronteiras, incluindo a cooperação através das agências no domínio da justiça e dos assuntos internos, combatendo a criminalidade considerada altamente prioritária e desmantelando as estruturas em que se apoia, reprimindo os delitos financeiros e os seus métodos corruptos para se infiltrarem na economia e combatendo a utilização das novas tecnologias por parte dos criminosos. A legislação só é eficaz se a sua aplicação também o for. Por esta razão, é importante que os Estados-Membros apliquem plena e corretamente os instrumentos existentes da UE. A Comissão continuará a desempenhar o seu papel; apoiará e proporcionará orientações contínuas aos Estados-Membros e estará pronta para reagir rapidamente se a legislação da UE for violada.
As autoridades no terreno devem ser capazes de utilizar plenamente os instrumentos existentes, a fim de desmantelar as atividades criminosas e o modelo de negócio das organizações criminosas. Para alcançar este objetivo, as medidas apresentadas na presente estratégia devem ser acompanhadas de uma nova cultura em que as autoridades policiais e judiciárias verifiquem sistematicamente as possíveis ligações transfronteiras e internacionais durante as investigações de casos de criminalidade organizada. O intercâmbio de agentes dos serviços responsáveis pela aplicação da lei, de procuradores e de juízes, nomeadamente com países terceiros, bem como as novas oportunidades de formação, podem ajudar a concretizar este objetivo.
A Comissão está empenhada em dar o seu contributo para esta nova dinâmica contra a criminalidade organizada e insta o Parlamento Europeu e o Conselho a participarem neste esforço comum, que é essencial para garantir a segurança na UE, proteger a economia europeia e salvaguardar o Estado de direito e os direitos fundamentais.