Bruxelas, 18.11.2020

COM(2020) 746 final

Recomendação de

RECOMENDAÇÃO DO CONSELHO

sobre a política económica da área do euro

{SWD(2020) 276 final}


Recomendação de

RECOMENDAÇÃO DO CONSELHO

sobre a política económica da área do euro

O CONSELHO DA UNIÃO EUROPEIA,

Tendo em conta o Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, nomeadamente o artigo 136.º, em conjugação com o artigo 121.º, n.º 2,

Tendo em conta o Regulamento (CE) n.º 1466/97 do Conselho, de 7 de julho de 1997, relativo ao reforço da supervisão das situações orçamentais e à supervisão e coordenação das políticas económicas 1 , nomeadamente o artigo 5.º, n.º 2,

Tendo em conta o Regulamento (UE) n.º 1176/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de novembro de 2011, sobre prevenção e correção dos desequilíbrios macroeconómicos 2 , nomeadamente o artigo 6.º, n.º 1,

Tendo em conta a recomendação da Comissão Europeia,

Tendo em conta as conclusões do Conselho Europeu,

Tendo em conta o parecer do Comité Económico e Financeiro,

Tendo em conta o parecer do Comité de Política Económica,

Considerando o seguinte:

(1)Em resultado da pandemia de COVID-19, a economia da área do euro sofreu uma recessão súbita e profunda durante o primeiro semestre de 2020, mantendo-se vulnerável à crise sanitária que ainda não terminou. A crise gerada pela pandemia causou uma série de choques violentos, tanto do lado da procura como do lado da oferta, traduzidos num declínio previsto do PIB de 7,8 % em 2020. Prevê-se agora que a retoma em 2021 seja mais lenta do que o previsto inicialmente e que o considerável hiato do produto (cerca de -7,0 % do PIB potencial em 2020) não seja eliminado até ao final de 2021. Existe ainda uma grande incerteza quanto às perspetivas económicas, dada a imprevisibilidade da evolução da pandemia e das alterações comportamentais dos agentes económicos. A intervenção rápida a nível nacional e da União, nomeadamente através do pacote Next Generation EU, contribuiu decisivamente para compensar parte dos efeitos mais negativos do choque, estabilizando os mercados. Tanto o consumo privado como o investimento foram gravemente afetados, com repercussões sobre os preços e os salários. As perspetivas do mercado de trabalho também se agravaram, pondo um termo abrupto a um período de sete anos consecutivos de melhorias. No entanto, graças ao êxito das ambiciosas medidas aplicadas por todos os Estados-Membros, nomeadamente regimes de redução do tempo de trabalho e outras políticas de apoio para evitar despedimentos em massa e grandes perdas de rendimento, o aumento do desemprego foi contrariado pela diminuição das taxas de atividade à medida que alguns trabalhadores perderam o incentivo para se manterem no mercado de trabalho e diminuiu o número total de horas trabalhadas.

(2)A crise gerada pela pandemia de COVID-19 tem agravado as divergências económicas já existentes entre os Estados-Membros da área do euro. São vários os fatores que contribuem para essas divergências, nomeadamente: a intensidade e o momento em que foi sentido o impacto inicial da COVID-19; a dimensão e a importância económica relativas de setores que requerem muito contacto físico (nomeadamente o turismo e a hotelaria) e as margens de manobra disponíveis nos diferentes orçamentos. Essas diferenças afetam a confiança, os investimentos e as perspetivas de crescimento, podendo agravar as disparidades regionais preexistentes. No longo prazo, a crise atual corre o risco de ter efeitos negativos permanentes no crescimento potencial e nas disparidades de rendimento, dada a redução do capital físico e humano (material e imaterial). Isto poderá provocar um crescimento ainda menor da produtividade e do rendimento do trabalho.

(3)A reação rápida e determinada da União, incluindo através do instrumento Next Generation EU, que inclui o Mecanismo de Recuperação e Resiliência, reforçou a confiança dos mercados e demonstrou a união dos Estados-Membros nos esforços coordenados para relançar o crescimento económico e aumentar a resiliência económica e social. Foram também imediatamente adotados novos instrumentos para a União e para a área do euro. Esses instrumentos permitiram criar uma rede de segurança para os trabalhadores (através do instrumento europeu de apoio temporário para atenuar os riscos de desemprego numa situação de emergência - SURE) 3 , as empresas (através de um mecanismo do Banco Europeu de Investimento) e os Estados-Membros, estabilizando os custos de financiamento das dívidas soberanas, nomeadamente através da garantia de apoio na crise pandémica no quadro do Mecanismo Europeu de Estabilização 4 . A resposta política dada pela União contemplou igualmente a ativação da cláusula de derrogação de âmbito geral do Pacto de Estabilidade e Crescimento e a definição de um quadro temporário para se recorrer à flexibilidade possível no âmbito das regras da UE em matéria de auxílios estatais 5 . Graças à Iniciativa de Investimento de Resposta ao Coronavírus + (CRII e CRII+) 6 , os fundos da política de coesão foram redirecionados para onde serão mais necessários.

(4)A adoção de políticas adequadas no contexto do Next Generation EU e do seu principal instrumento, o Mecanismo de Recuperação e Resiliência, ajudará os Estados-Membros a empreender reformas que promovam o crescimento e a melhorar o nível e a qualidade dos investimentos efetuados, em consonância com os objetivos de resiliência e com a dupla transição ecológica e digital. Tal deverá contribuir para reforçar o capital humano e apoiar transições profissionais dos trabalhadores bemsucedidas, o que, junto com os fundos da política de coesão, será essencial para garantir a coesão, aumentar a produtividade e reforçar a resiliência económica e social. Os objetivos da UE em matéria de crescimento e os desafios estruturais nacionais, incluindo os identificados nas recomendações específicas por país formuladas em 2019 e 2020, são decisivos neste âmbito. A Estratégia Anual de Crescimento Sustentável 7 , que promove estes objetivos, propõe sete iniciativas emblemáticas: 1) Reforço da capacidade energética, 2) Renovação, 3) Recarregamento e reabastecimento, 4) Interligação, 5) Modernização, 6) Expansão e 7) Requalificação e melhoria das competências. As referidas iniciativas constituem desafios comuns que requerem investimentos e reformas coordenados. Os EstadosMembros devem canalizar os investimentos, executar as reformas e integrar numa maior medida as suas cadeias de valor nestas áreas emblemáticas. A proposta de regulamento Mecanismo de Recuperação e Resiliência prevê, nomeadamente, que os planos de recuperação e resiliência dos Estados-Membros da área do euro sejam coerentes com os desafios e prioridades identificados na recomendação do Conselho sobre a política económica da área do euro. Essa coerência deve ser apreciada quando forem avaliados os planos de recuperação e de resiliência.

(5)Para amortecer o impacto da pandemia de COVID-19, a área do euro requer uma combinação de políticas que apoie a economia e seja coordenada, abrangente e coerente. O objetivo é limitar o impacto negativo de longo prazo no mercado de trabalho, reduzir as divergências económicas e sociais mais graves, corrigir os desequilíbrios e eliminar outros riscos macroeconómicos relevantes e, em geral, prevenir consequências negativas para o crescimento económico potencial no médio prazo. A coerência entre as três dimensões principais dessa combinação de políticas para a área do euro (monetária, orçamental e estrutural) é fundamental para assegurar uma orientação política global de apoio à economia da área do euro.

(6)As intervenções oportunas do Banco Central Europeu (BCE) em matéria de política monetária tiveram por objetivo preservar os canais de transmissão monetária e salvaguardar a estabilidade dos preços no médio prazo. O BCE anunciou importantes aquisições adicionais de ativos dos setores público e privado, que se elevarão a 1,47 biliões de EUR no âmbito do programa de compra de ativos (120 000 milhões de EUR até ao final de 2020) 8 e do programa de compra de ativos por pandemia (1,35 biliões de EUR até, pelo menos, meados de 2021) 9 .

(7)Prevê-se que a orientação de política orçamental seja fortemente expansionista em 2020 e continue a apoiar a economia em 2021, tanto a nível da área do euro como a nível nacional. A coordenação das políticas orçamentais nacionais, dentro do pleno respeito do Pacto de Estabilidade e Crescimento, é crucial para se responder eficazmente ao choque causado pela pandemia de COVID-19 e para o bom funcionamento da União Económica e Monetária. Em 20 de março de 2020, a Comissão concluiu que a economia da UE enfrentava uma recessão económica grave e que estavam reunidas as condições necessárias para se poder ativar a cláusula de derrogação de âmbito geral do Pacto de Estabilidade e Crescimento. Essa conclusão foi aprovada pelos ministros das Finanças dos Estados-Membros 10 . Os EstadosMembros adotaram importantes medidas orçamentais para conter a pandemia e prestar apoio aos particulares e às empresas mais afetados, incluindo apoio excecional à liquidez, sobretudo através de garantias prestadas a empresas e a bancos para assegurar o fluxo de crédito. Será também prestado um apoio orçamental coordenado a nível da UE, nomeadamente através do Mecanismo de Recuperação e Resiliência.

(8)O impacto económico da COVID-19 está a ter repercussões muito negativas nas finanças públicas. Assim que as condições sanitárias e económicas o permitam, a reorientação das políticas orçamentais de modo a alcançar situações orçamentais prudentes no médio prazo, nomeadamente mediante a eliminação progressiva das medidas de apoio às empresas e aos particulares, contribuirá para a sustentabilidade orçamental a médio prazo. Isto terá de ser feito de modo a atenuar o impacto da crise em termos sociais e do mercado laboral. As reformas destinadas a melhorar a composição dos orçamentos nacionais e a assegurar a sustentabilidade orçamental a mais longo prazo, nomeadamente tendo em conta as alterações climáticas e os desafios em matéria de saúde, afiguram-se particularmente pertinentes. A melhoria da composição dos orçamentos nacionais, nomeadamente através da análise das despesas públicas e do enquadramento adequado dos contratos públicos, pode criar a muito necessária margem de manobra orçamental. A ecologização do orçamento também pode contribuir para se enfrentar os desafios da atenuação das alterações climáticas e da proteção do ambiente. Sistemas de saúde e de proteção social adequados, eficientes e inclusivos proporcionam uma proteção muito necessária aos mais carenciados, desempenhando um papel fundamental enquanto estabilizadores automáticos e preservando a sustentabilidade orçamental. Do mesmo modo, as reformas que reforçam o funcionamento dos mercados de trabalho, de capitais, dos produtos e dos serviços – através de uma execução e de uma sequenciação adequadas – aumentam o produto potencial, evitando simultaneamente o impacto negativo a curto prazo na procura agregada.

(9)A crise gerada pela COVID-19 veio reforçar a importância das reformas para criar sistemas de receitas públicas mais eficientes e mais justos. Uma vez que a carga fiscal sobre o trabalho na maioria dos Estados-Membros da área do euro continua a ser elevada, as reformas em causa deverão prever a transferência da carga fiscal para bases de tributação menos nocivas para a oferta de mão de obra, a produtividade, o investimento e o crescimento, tendo simultaneamente em consideração o respetivo impacto distributivo. Um recurso mais frequente à fiscalidade ambiental e/ou a outras formas de fixação do preço das externalidades pode contribuir para um crescimento sustentável, incentivando a adoção de comportamentos mais ecológicos. As medidas adotadas para combater o planeamento fiscal agressivo e a elisão fiscal, tanto a nível internacional como da União, poderão tornar os sistemas fiscais mais eficientes e mais justos. Além disso, a globalização e a digitalização da economia criaram uma divergência entre o local onde o valor é criado e aquele onde os impostos são pagos. A OCDE tem procurado soluções de consenso global que permitam responder aos problemas fiscais suscitados pela digitalização da economia.

(10)A realização prioritária de reformas que combatam os estrangulamentos ao investimento e as restrições do lado da oferta é particularmente importante, dado o elevado nível de incerteza causado pelo choque da pandemia e o seu efeito negativo no investimento. É importante adotar medidas que acelerem a absorção dos fundos da UE e façam uma utilização eficaz e eficiente dos recursos, em especial nos Estados-Membros mais atrasados neste domínio e em que os fundos da UE financiam parte significativa do investimento. As reformas que permitam reduzir os encargos administrativos das empresas (por exemplo, a digitalização da administração pública, incluindo a identificação eletrónica, e as reformas judiciais) e prevenir a utilização indevida de fundos (por exemplo, corrupção, fraude e branqueamento de capitais 11 ) podem melhorar o ambiente empresarial e ajudar a impulsionar o investimento, o emprego e a criação de empresas.

(11)A crise gerada pela COVID-19 causou uma enorme perda de receitas para muitas empresas, suscitando riscos para a sua solvência, em toda a área do euro. A existência de quadros eficientes em matéria de insolvência desempenha um papel crucial para se apoiar as empresas viáveis que se deparam com problemas temporários e assegurar o encerramento ordenado das que não sejam viáveis. A melhoria dos quadros de insolvência pode também ajudar a solucionar o provável aumento dos empréstimos não produtivos e manter a concessão de crédito à economia, facilitando o saneamento dos balanços dos bancos e estimulando o investimento transfronteiras a mais longo prazo. Neste contexto, foi adotada a Diretiva sobre reestruturação e insolvência (2019/1023) 12 , a fim de estabelecer normas mínimas na legislação nacional em matéria de solvência dos Estados-Membros, assegurando que os devedores em dificuldades financeiras dispõem de quadros jurídicos em matéria de reestruturação preventiva, prevendo procedimentos conducentes a um perdão das dívidas contraídas por empresários sobre-endividados e aumentando a eficiência dos diferentes tipos de processos de insolvência. É importante que se proceda à transposição e aplicação da referida diretiva. A Comissão Europeia anunciou igualmente, no quadro do Plano de Ação para a Criação de uma União dos Mercados de Capitais de setembro de 2020 13 , a realização de esforços para assegurar uma harmonização mínima ou uma maior convergência em domínios específicos do direito da insolvência no setor não bancário. Além disso, existe margem para os Estados-Membros avaliarem melhor a eficiência e eficácia dos respetivos quadros de insolvência, em conformidade com as melhores práticas internacionais, resolvendo os problemas ainda existentes 14 .

(12)O aprofundamento do mercado único de bens e serviços e a adaptação da área do euro à era digital poderão ser um importante motor de crescimento, convergência e resiliência. A moeda comum e o mercado único têm, conjuntamente, dado um contributo importante para criar melhores condições para a estabilização económica e o crescimento a longo prazo. A crise gerada pela COVID-19 impulsionou o uso de ferramentas digitais, salientou a importância do mercado único digital e acelerou a utilização de métodos de pagamento digital, sem recurso a numerário. No entanto, o mercado único ainda não está concluído, em especial no domínio dos serviços e mais especificamente no comércio a retalho e nos serviços profissionais. O mercado único tem potencial para eliminar fatores de rigidez dos preços que prejudicam o mecanismo de transmissão da política monetária e a resiliência económica. O mercado único contribui para a mobilidade dos fatores de produção, permitindo aos diferentes setores, regiões e EstadosMembros minimizarem os custos económicos (por exemplo, o desemprego) na sequência de choques económicos. Para se alcançar uma maior integração do mercado único de bens e serviços, importa eliminar todas as restrições desnecessárias que ainda subsistem, reforçar os mecanismos de fiscalização do mercado e adotar medidas que garantam as capacidades administrativas necessárias para se atingir esses objetivos.

(13)As reformas e o investimento destinado a melhorar a integração no mercado de trabalho e as transições profissionais, nomeadamente os empregos nos domínios digital e ecológico, são cruciais para aumentar a resiliência económica e social e apoiar a recuperação. As medidas adotadas imediatamente para fazer face à crise, tanto a nível nacional como da União, limitaram o impacto económico e social negativo nos trabalhadores. Simultaneamente, mostra-se ainda mais urgente proceder-se finalmente a uma série de reformas há muito preconizadas: políticas ativas eficazes do mercado de trabalho, incluindo apoio individualizado, melhoria da qualidade e da inclusividade dos sistemas de ensino e formação, a fim de reforçar os resultados escolares desde as primeiras fases da vida, medidas fortes de reconversão e atualização de competências e o investimento na educação e formação de adultos e nas plataformas de aprendizagem em linha, prevenindo a escassez de competências, aumentando as perspetivas de emprego dos segmentos mais vulneráveis da população ativa, incluindo os jovens e os desempregados de longa duração, bem como colmatar as disparidades entre homens e mulheres. A criação de empregos de qualidade e a melhoria das condições de trabalho, nomeadamente através da garantia de salários mínimos adequados e do combate à segmentação do mercado de trabalho, são essenciais para apoiar uma recuperação sustentável e inclusiva. O diálogo social e a negociação coletiva desempenham um papel importante na conceção e execução com êxito das políticas.

(14)O acesso a sistemas de saúde e de proteção social adequados, inclusivos e sustentáveis, que funcionem como estabilizadores automáticos nos períodos de crise, é fundamental para garantir a resiliência económica e social. Estes sistemas contribuem para manter um nível de vida digno e uma boa saúde da população, o que é fundamental para uma economia laboral produtiva, ao longo de todo o ciclo económico. Os investimentos destinados a apoiar as reformas no setor da saúde e a resiliência dos sistemas de saúde devem continuar a ser uma prioridade para os Estados-Membros. O cumprimento do Pilar Europeu dos Direitos Sociais 15 é fundamental para nortear essas políticas. Na presente situação de crise, tornou-se ainda mais importante assegurar uma cobertura adequada da proteção social para todas as pessoas, tanto em termos de cuidados de saúde como de cuidados continuados de qualidade, assim como em termos de substituição de rendimentos para todos os trabalhadores, incluindo os que têm contratos atípicos e os trabalhadores por conta própria. Muitos Estados-Membros adotaram medidas temporárias de apoio ao rendimento e de assistência social a favor dos grupos mais vulneráveis e de menores rendimentos e dos trabalhadores sem direito a subsídio de desemprego. Foram tomadas medidas quanto às prestações sociais, às condições de elegibilidade e às prestações adicionais em espécie. O reforço da adequação e da cobertura dos sistemas de proteção social deve ser feito de modo a garantir a sustentabilidade a longo prazo das finanças públicas e a equidade entre gerações.

(15)Embora tenha havido progressos significativos nos últimos anos, os efeitos económicos da pandemia vieram exercer novas pressões sobre o setor financeiro. A banca da área do euro entrou na presente crise com uma maior capacidade de absorção de perdas, comparativamente com o início da crise financeira mundial. Juntamente com as medidas de política monetária e orçamental, foi assim possível evitar maiores restrições das condições de financiamento do mercado, para além da fase inicial da crise, tendo continuado a ser garantida a concessão de crédito ao setor privado. A crise é suscetível de exercer maior pressão sobre os níveis de rendibilidade já baixos e os rácios de empréstimos não produtivos da banca europeia, assim como sobre o setor financeiro não bancário, que registou saídas e perdas de valorização só parcialmente recuperadas. Isto poderá dificultar a concessão de crédito, elemento crucial para garantir a retoma. A intervenção rápida e determinada dos poderes políticos permitiu suster a confiança, ajudando a preservar a estabilidade macrofinanceira. Para reduzir os riscos, é fundamental quebrar o ciclo vicioso entre as vulnerabilidades do setor empresarial e os riscos para o setor financeiro, solucionando as deficiências estruturais e reforçando assim a rendibilidade. Embora ajudem a proteger as empresas e a banca, as garantias de empréstimo concedidas pelos Estados constituem igualmente passivos contingentes para os orçamentos dos Estados-Membros. Na falta de um sistema eficaz que permita distinguir entre as empresas viáveis e as não viáveis, a prorrogação das moratórias no quadro de insolvências e a reestruturação dos empréstimos não produtivos requerem que sejam adotadas decisões difíceis, o que pode prejudicar a boa afetação dos fundos e agravar as perdas decorrentes das eventuais falências.

(16)Continua a ser fundamental concluir a arquitetura da União Económica e Monetária (UEM). Colmatar as lacunas existentes poderá contribuir para a estabilidade e a resiliência da área do euro, reforçando o papel internacional do euro, que se tem mantido geralmente estável nos últimos anos. Para além da sua função de estabilização a curto prazo e do seu papel no apoio à recuperação, o instrumento Next Generation EU tem potencial para beneficiar a UEM a mais longo prazo. Aumentar a resiliência da área do euro a futuros choques, mediante a emissão em grande escala de títulos de dívida denominados em euros, incluindo obrigações «verdes» e «sociais», aumentará a profundidade e a liquidez do mercado de títulos de dívida denominados em euros de elevada qualidade, reforçando igualmente o papel do euro como moeda de reserva internacional. No entanto, ainda faltam alguns elementos importantes da UEM, como a conclusão da União Bancária e da União dos Mercados de Capitais. É crucial reforçar a União Bancária, de modo a assegurar a estabilidade financeira, reduzir a fragmentação financeira e proteger a concessão de crédito à economia em tempos de crise. É prioritário levar a bom porto as reformas do Mecanismo Europeu de Estabilidade, incluindo a criação de um mecanismo de salvaguarda para o Fundo Único de Resolução. Esse mecanismo deve ser tornado operacional e deve ter prioridade, logo que tenham sido efetuados progressos suficientes quanto à redução dos riscos. Deverão ser prosseguidos os trabalhos para encontrar soluções destinadas a superar as limitações da configuração atual para a injeção de liquidez no âmbito da resolução. A conclusão da União dos Mercados de Capitais constitui igualmente uma prioridade fundamental, como ficou patente no novo plano de ação de setembro de 2020. Uma UEM forte e resiliente é igualmente importante para reforçar o papel internacional do euro e assegurar a autonomia económica e financeira da União. A Comissão vai apresentar uma comunicação nesse sentido, respeitando plenamente o mercado interno da União e agindo de forma aberta e transparente quanto aos Estados-Membros que não integram a área do euro.

RECOMENDA que, durante o período 2021-2022, os Estados-Membros da área do euro adotem medidas a nível individual, através dos respetivos planos de recuperação e resiliência, e coletivamente, no âmbito do Eurogrupo, a fim de:

1.Definir orientações políticas que promovam a retoma económica

Enquanto persistir a emergência sanitária e ao longo de 2021, as políticas orçamentais deverão continuar a apoiar a economia em todos os Estados-Membros da área do euro.

As medidas políticas a adotar devem ser adaptadas às circunstâncias específicas de cada país e ser oportunas, temporárias e devidamente orientadas. Uma vez que persistem os riscos de revisão em baixa, os Estados-Membros devem prosseguir a coordenação das suas ações a fim de combater eficazmente a pandemia, apoiar a economia e assegurar que a retoma é sustentável.

Logo que as condições epidemiológicas e económicas o permitam, devem ser progressivamente eliminadas as medidas de apoio às empresas e aos particulares, minimizando o impacto da crise no plano social e laboral, prosseguindo-se políticas orçamentais com vista a alcançar uma situação orçamental prudente no médio prazo e assegurar a sustentabilidade da dívida, reforçando simultaneamente o investimento.

Os Estados-Membros deverão levar a cabo reformas para reforçar a cobertura, adequação e sustentabilidade dos sistemas de saúde e de proteção social.

Devem igualmente prestar especial atenção à qualidade das medidas orçamentais. Deverá também ser melhorada a gestão das finanças públicas, nomeadamente os investimentos e a ecologização do orçamento, assim como o enquadramento da adjudicação de contratos públicos. Deverá ainda recorrer-se à análise das despesas para que as despesas públicas privilegiem as necessidades em termos de recuperação e de resiliência.

2.Promover a convergência, a resiliência e o crescimento sustentável e inclusivo

Importa reduzir o risco de agravamento das divergências e reforçar a resiliência económica e social na área do euro mediante reformas que reforcem a produtividade e o emprego, garantindo a boa afetação dos recursos e melhorando o funcionamento dos mercados e da administração pública. Importa ainda aumentar os níveis de investimento público e privado para apoiar a recuperação no quadro de uma dupla transição, ecológica e digital, que seja inclusiva e justa.

Deve igualmente ser prosseguida a integração do mercado único de bens e serviços, incluindo o digital, eliminando as restrições desnecessárias, reforçando a fiscalização do mercado e criando as capacidades administrativas adequadas.

Devem também ser adotadas políticas ativas do mercado de trabalho, apoiando as transições profissionais, nomeadamente para uma economia «verde» e digital. Devem ser promovidas condições laborais justas e que previnam a segmentação do mercado de trabalho. Deve ser assegurada a participação efetiva dos parceiros sociais na definição das políticas, assim como reforçado o diálogo social e a negociação coletiva. Importa criar sistemas de educação e formação inclusivos e investir nas qualificações, de modo a prevenir a escassez de competências.

Importa igualmente prosseguir a busca de uma solução global consensual para responder aos desafios fiscais suscitados pela digitalização da economia no âmbito da OCDE e estar pronto para avançar com medidas a nível da UE até junho de 2021. Importa, por último, realizar progressos no combate ao planeamento fiscal agressivo, reduzir a carga fiscal e promover a transferência da carga fiscal para o carbono e para a fiscalidade ambiental.

3.Reforçar os enquadramentos institucionais nacionais

Devem ser prosseguidas e antecipadas as reformas destinadas a eliminar os estrangulamentos do investimento e a assegurar uma utilização eficiente e atempada dos fundos da UE, nomeadamente do Mecanismo de Recuperação e Resiliência. Importa reforçar a eficácia e a digitalização da administração pública, incluindo os sistemas judiciais e da saúde, assim como os serviços públicos de emprego. Importa reduzir os encargos administrativos impostos às empresas e melhorar o ambiente empresarial. Importa ainda criar um enquadramento eficaz para combater a fraude, a corrupção e o branqueamento de capitais.

Devem ser promovidas ações concretas para aumentar a eficiência, a eficácia e a proporcionalidade dos quadros de insolvência, eliminando exposições não produtivas e garantindo uma afetação eficiente do capital.

4.Assegurar a estabilidade macrofinanceira

Importa manter abertos os canais de crédito à economia e adotar medidas para apoiar as empresas viáveis pelo tempo que for necessário durante esta emergência sem precedentes.

É necessário que a banca mantenha balanços sólidos, resolvendo nomeadamente o problema dos empréstimos não produtivos, graças ao desenvolvimento de mercados secundários para este tipo de empréstimos.

5.Completar a União Económica e Monetária e reforçar o papel internacional do euro

É necessário prosseguir o aprofundamento da UEM, reforçando a resiliência da área do euro e concluindo a União Bancária e a União dos Mercados de Capitais, bem como adotar iniciativas para implementar o financiamento digital, serviços financeiros de retalho e políticas em matéria de financiamento sustentável.

Importa aumentar, enquanto prioridades a curto prazo, a eficiência, a proporcionalidade e a coerência global do quadro de gestão de crises bancárias e do mecanismo de seguro dos depositantes, incluindo redes de segurança sólidas para a União Bancária.

Os progressos realizados nestes domínios contribuirão para reforçar o papel internacional do euro e promover os interesses económicos da Europa à escala mundial, respeitando plenamente o mercado interno da União.

Feito em Bruxelas, em

               Pelo Conselho

               O Presidente

(1)    JO L 209 de 2.8.1997, p. 1.
(2)    JO L 306 de 23.11.2011, p. 25.
(3)    JO L 159 de 20.5.2020, p. 1.
(4)     https://www.consilium.europa.eu/media/44011/20200508-pcs-term-sheet-final.pdf  
(5)    JO C 91I de 20.3.2020, p. 1, JO C 112I de 4.4.2020, p. 1, JO C 164 de 13.5.2020, p. 3, JO C 218 de 2.7.2020, p. 3.
(6)    JO L 99 de 31.3.2020, p. 5.
(7)    COM/2020/575 final.
(8)    JO L 157 de 15.6.2016, p. 28.
(9)    JO L 91 de 25.3.2020, p. 1.
(10)     https://www.consilium.europa.eu/pt/press/press-releases/2020/03/23/statement-of-eu-ministers-of-finance-on-the-stability-and-growth-pact-in-light-of-the-covid-19-crisis/  
(11)    Comunicação COM (2019) 360 final da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho, de 24 de julho de 2019, «Para uma melhor aplicação do quadro da UE em matéria de luta contra o branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo».
(12)    JO L 172 de 26.6.2019, p. 18.
(13)    COM(2020) 590 final.
(14)    O Eurogrupo identificou uma série de princípios, incluindo a identificação precoce de dificuldades no reembolso das dívidas e a disponibilidade de processos de reestruturação numa etapa precoce. Ver: https://www.consilium.europa.eu/pt/meetings/eurogroup/2016/04/22/
(15)    Proclamação Interinstitucional sobre o Pilar Europeu dos Direitos Sociais, JO C 428 de 13.12.2017, p. 10.