9.4.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 123/76


Parecer do Comité Económico e Social Europeu «Proposta de decisão do Parlamento Europeu e do Conselho relativa a um programa geral de ação da União para 2030 em matéria de ambiente»

[COM (2020) 652 final — 2020/0300 (COD)]

(2021/C 123/12)

Relator-geral:

Lutz RIBBE

Consulta

Parlamento Europeu, 11.11.2020

Conselho, 5.11.2020

Base jurídica

Artigo 192.o, n.o 1, e artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente

Data da decisão da Mesa

1.12.2020

Adoção em plenária

27.1.2021

Reunião plenária n.o

557

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

227/4/4

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) considera que a proposta, ora apresentada, de um 8.o Programa de Ação em matéria de Ambiente (PAA) apenas tem um valor acrescentado muito marginal, na medida em que se limita ao anúncio de melhorias no modelo de acompanhamento e na apresentação de relatórios. De resto, a proposta caracteriza-se mais por descrições gerais da situação e declarações de intenção do que por um conteúdo de substância e ações. O que se pretende é melhorar a governação, mas para tanto não é necessário um «programa de ação».

1.2.

O CESE interroga-se se é realmente necessário um 8.o PAA para impulsionar a política ambiental da UE, que já se encontra no cerne da política da UE, quanto mais não seja através do Pacto Ecológico Europeu.

1.3.

O CESE entende que a proposta apresentada pela Comissão vem corroborar firmemente a sua posição, para a qual o Comité tem vindo a chamar a atenção há anos, ou seja: não falta conhecimento sobre o que deve ser feito; o que falta é a execução de medidas já conhecidas, muitas vezes decididas há muito tempo, e vontade política.

1.4.

O CESE consideraria útil, por exemplo, se as iniciativas estratégicas apresentadas pela Comissão para executar o Pacto Ecológico Europeu, tais como a Estratégia de Biodiversidade, a Estratégia do Prado ao Prato ou o Plano de Ação para a Economia Circular, com os respetivos requisitos concretos, fossem integradas no 8.o PAA, permitindo a sua adoção conjunta. Mais ainda: o Conselho e o Parlamento Europeu poderiam obrigar a Comissão também, através de um 8.o PAA, a prosseguir e a aprofundar o Pacto Ecológico Europeu, conferindo-lhe o mandato explícito para apresentar, o mais tardar no novo mandato, uma proposta legislativa de uma «Agenda da UE para 2050» (como um «Pacto Ecológico Europeu 2» modificado e alargado), que seria aditada ao 8.o PAA como anexo sob a forma de catálogo de medidas concreto e exaustivo. No entanto, tal não está previsto.

1.5.

Por conseguinte, o CESE insta para que se lance um debate de fundo sobre o significado e a utilidade dos programas de ação em matéria de ambiente e reitera o seu apelo para a elaboração de uma «Agenda de Sustentabilidade da UE para 2050» separada. Considera que o Pacto Ecológico Europeu constitui uma base eficaz e sólida para o efeito.

2.   Contexto do parecer

Programas de ação da UE em matéria de ambiente

2.1.

Desde o início da década de 1970, são elaborados programas de ação em matéria de ambiente (PAA) a nível da UE, tendo o 7.o PAA terminado a sua vigência em 31 de dezembro de 2020.

2.2.

Na sua proposta de um 8.o PAA, a Comissão afirma que os programas em matéria de ambiente «têm guiado o desenvolvimento da política ambiental da UE». Contudo, também se vê forçada a admitir indiretamente que esses programas, afinal, não terão produzido o efeito esperado, concluindo que «os progressos relacionados com a proteção da natureza, a saúde e a integração das políticas não foram suficientes». Remete, a este respeito, para o relatório publicado em 4 de dezembro de 2019 pela Agência Europeia do Ambiente intitulado «The European Environment — state and outlook» [O ambiente europeu — estado e perspetivas] (SOER 2020), segundo o qual «os atuais desafios ambientais, climáticos e de sustentabilidade são de uma escala e urgência sem precedentes e requerem ações imediatas e concertadas e soluções sistémicas urgentes». Pois, «com o atual modelo de crescimento, prevê-se que continuem a aumentar as pressões ambientais, causando efeitos nocivos diretos e indiretos sobre a saúde e o bem-estar humanos. Tal é particularmente verdadeiro para os setores de maior impacto ambiental: setor alimentar, mobilidade, energia, infraestruturas e edifícios».

2.3.

Esta declaração está em consonância com o relatório de 2020 sobre o desenvolvimento sustentável da Europa, apresentado em dezembro último pela Rede de Soluções para o Desenvolvimento Sustentável (RSDS) e pelo Instituto para a Política Europeia do Ambiente. Segundo uma das principais conclusões deste relatório, é nos domínios da agricultura e alimentação sustentáveis, do clima e da biodiversidade que a Europa enfrenta os maiores desafios no cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).

2.4.

A Comissão clarifica que, através do Pacto Ecológico Europeu publicado em 11 de dezembro de 2019, estabeleceu uma agenda ambiciosa para a) fazer da UE o primeiro continente com impacto neutro no clima até 2050, b) proteger, conservar e reforçar o capital natural da União Europeia, bem como c) proteger a saúde e o bem-estar dos cidadãos contra riscos e impactos relacionados com o ambiente.

2.5.

O Conselho, o Parlamento Europeu e o Comité das Regiões solicitaram, contudo, à Comissão que apresentasse uma proposta de um 8.o PAA, a ser adotada em seguida pelo Conselho e pelo PE. A Comissão apresentou esta Proposta de decisão do Parlamento Europeu e do Conselho relativa a um programa geral de ação da União para 2030 em matéria de ambiente (8.o PAA), agora em apreço, em 14 de outubro de 2020, isto é, quase um ano após a apresentação do Pacto Ecológico Europeu e apenas dois meses e meio antes de expirar o 7.o PAA.

Conteúdo do 8.o PAA

2.6.

O 8.o PAA é composto por apenas seis artigos.

2.7.

O artigo 2.o enumera os objetivos ambientais da UE já conhecidos e também reconhecidos pelo Conselho e pelo PE, como a redução dos gases com efeito de estufa, a neutralidade climática até 2050, a adaptação às alterações climáticas, a ambição de poluição zero por um ambiente livre de substâncias tóxicas, a proteção, preservação e restauração da biodiversidade, etc., e declara-os os «objetivos temáticos prioritários» do 8.o PAA. Ao contrário do 7.o PAA, não são descritos concretos instrumentos ou medidas para alcançar os objetivos ou executar as ações ambientais, o que é surpreendente, tanto mais que alguns dos requisitos estabelecidos são particularmente elevados. Tal é o caso da premissa de que se deve «avançar para um modelo de crescimento regenerativo que restitua ao planeta mais do que lhe retira» (1).

2.8.

O artigo 3.o menciona igualmente apenas as «condições» necessárias para alcançar os objetivos prioritários há muito conhecidas. Entre estas, contam-se as seguintes:

a aplicação plena, eficaz e eficiente da legislação ambiental e climática em vigor;

a integração dos objetivos prioritários em todas as estratégias, iniciativas legislativas e não legislativas, programas, investimentos e projetos pertinentes a nível da União e a nível nacional, regional e local;

a eliminação progressiva dos subsídios prejudiciais a nível da União e a nível nacional.

2.9.

O artigo 4.o descreve a questão central propriamente dita do 8.o PAA. Trata-se de uma promessa de melhorar o quadro de acompanhamento e apresentação de relatórios, a fim de proporcionar aos decisores políticos e ao público uma melhor panorâmica dos progressos (ou lacunas). Salienta-se, nomeadamente, que o Conselho e o CESE, por exemplo, apelaram para que a medição do desempenho económico e do progresso social fosse «para além do PIB». Além disso, deverão ser desenvolvidos «indicadores-chave» para acompanhar melhor, por exemplo, a biodiversidade ou a economia circular. À Agência Europeia do Ambiente e à Agência Europeia dos Produtos Químicos incumbe um papel fundamental neste contexto, pelo que o seu pessoal deve ser reforçado.

2.10.

Por último, o artigo 5.o prevê que a Comissão realize, até 31 de março de 2029, uma avaliação do 8.o PAA; por conseguinte, não está previsto um balanço intercalar.

2.11.

O artigo 6.o regulamenta a entrada em vigor.

3.   Observações

3.1.

O CESE concorda com a Comissão quanto ao facto de os programas de ação em matéria de ambiente terem, durante muito tempo, orientado o desenvolvimento da política ambiental da UE. Não obstante, a política ambiental das décadas de 70, 80 ou 90 já não é comparável à de hoje, o que levanta a questão do papel e da função destes programas de ação.

3.2.

É por este motivo que o CESE se interroga se é realmente necessário um 8.o PAA para impulsionar a política ambiental da UE, que já se encontra no cerne da política da UE, quanto mais não seja através do Pacto Ecológico Europeu. Tal é pertinente, em especial, pelo facto de a proposta do 8.o PAA se caracterizar mais por descrições gerais da situação e declarações de intenção do que por um conteúdo de substância e ações. Trata-se de um programa de ação sem ações.

3.3.

Naturalmente, o CESE também não duvida de que as prioridades enunciadas no artigo 2.o são adequadas e que as «condições favoráveis para alcançar os objetivos prioritários» estabelecidas no artigo 3.o estão corretas. No entanto, a questão é saber que vantagens advêm para a política ambiental se o 8.o PAA praticamente se limita a repetir os objetivos estabelecidos no Pacto Ecológico Europeu, sem indiciar sequer instrumentos de execução ou ações que se tornariam vinculativos por decisão do Conselho e do Parlamento Europeu. É também legítimo perguntar quais são os benefícios reais da mera enumeração de «condições» bem conhecidas se não é apresentado e adotado um plano vinculativo para cumprir essas condições.

3.4.

O CESE entende que a proposta apresentada pela Comissão vem corroborar firmemente a sua posição, para a qual o Comité tem vindo a chamar a atenção há anos, ou seja: não falta conhecimento sobre o que deve ser feito; o que falta é a execução de medidas já conhecidas, muitas vezes decididas há muito tempo, e vontade política. A Comissão e, em alguns casos, também o Tribunal de Justiça Europeu denunciam há anos que, frequentemente, os Estados-Membros não aplicam de forma adequada muitas das normas ambientais em vigor. Nenhum programa de ação ambiental pode compensar a falta de aplicação legislativa ou de vontade política.

3.5.

Mesmo na ausência de um programa de ação em matéria de ambiente, as instituições europeias e os Estados-Membros têm oportunidades suficientes para cumprir as promessas feitas. A política de biodiversidade é exemplo disso.

3.6.

A proteção, a preservação e a restauração da natureza são enunciadas explicitamente como «objetivo prioritário» em todos (!) os programas de ação em matéria de ambiente desde o 2.o PAA (em vigor de 1977 a 1981); agora, o 8.o PAA fá-lo novamente. Não é nada abonatório para os programas de ação anteriores que a biodiversidade esteja no centro destes programas há mais de 40 anos (!) e que, ainda assim, a Comissão afirme, na sua Estratégia de Biodiversidade de maio de 2020, que a natureza se encontra «numa situação de crise».

3.7.

No entanto, para além de todos os programas de ação em matéria de ambiente, existem ideias e propostas claras sobre a forma de remediar a situação. Por exemplo, a Estratégia de Biodiversidade (2) apresentada pela Comissão contém uma longa lista de ações. Tanto o Conselho como o Parlamento Europeu tiveram, nomeadamente no âmbito da reforma da política agrícola comum (PAC), oportunidades suficientes para cumprir os requisitos concretos dessa estratégia. Foi uma oportunidade desperdiçada. O CESE não entende o que poderia agora melhorar com o 8.o PAA, a adotar pelo Conselho e pelo PE.

3.8.

Por outro lado, torna-se assim claro de que forma um 8.o PAA poderia trazer valor acrescentado: integrando formalmente a Estratégia de Biodiversidade, apresentada pela Comissão para a execução do Pacto Ecológico Europeu, e a Estratégia do Prado ao Prato (e outros documentos estratégicos semelhantes), com os respetivos requisitos concretos, o que levaria o Conselho e o Parlamento a aprovar a execução das propostas concretas.

3.9.

Mais ainda: o Conselho e o PE poderiam obrigar a Comissão também, através de um 8.o PAA, a prosseguir e a aprofundar o Pacto Ecológico Europeu, conferindo-lhe o mandato explícito para apresentar, o mais tardar no novo mandato, uma proposta legislativa de uma «Agenda da UE para 2050» (como um «Pacto Ecológico Europeu 2» modificado e alargado), que seria aditada ao 8.o PAA como anexo sob a forma de catálogo de medidas concreto e exaustivo.

3.10.

No entanto, nada disto está atualmente previsto e, por conseguinte, o valor acrescentado do 8.o PAA, tal como apresentado, é marginal, limitando-se ao anúncio de melhorias no modelo de acompanhamento e na apresentação de relatórios. Ora, para melhorar o acompanhamento e a governação, por mais importantes que sejam estes dois aspetos, não é necessário um «programa de ação».

4.   Observações finais

4.1.

A Comissão atribui, claramente, aos últimos programas de ação em matéria de ambiente e ao próximo 8.o PAA maior importância e impacto do que o CESE. A título de exemplo, o Comité não perfilha a opinião da Comissão de que «o 7.o PAA antecipou a Agenda 2030 das Nações Unidas». A Agenda 2030 das Nações Unidas é tão mais complexa que não poderia refletir-se numa política ambiental europeia por mais inovadora que esta seja. Cada política ambiental deve, obviamente, ter em conta também as questões relacionadas com a pobreza, a fome e a educação ou as questões de género, mas não é possível dar-lhes uma resposta adequada unicamente sob este prisma.

4.2.

É precisamente por esta razão que o CESE defende a elaboração de uma «Agenda da UE para 2050» separada, que, obviamente, deve incluir também uma forte vertente ambiental. Nem mesmo o atual Pacto Ecológico Europeu é suficiente para aplicar a Agenda 2030 das Nações Unidas, uma vez que as questões sociais — tanto no contexto europeu como mundial — não são suficientemente tratadas nos diversos temas. O CESE faz questão de salientar, porém, que considera o Pacto Ecológico Europeu uma base adequada e sólida para uma estratégia abrangente do desenvolvimento sustentável denominada «Agenda da UE para 2050».

4.3.

O CESE recomenda igualmente que as ambições políticas enunciadas nos textos da Comissão sejam formuladas de modo a que os cidadãos europeus possam visualizar a sua concretização. O 8.o PAA fala da promoção de um «modelo de crescimento regenerativo que restitua ao planeta mais do que lhe retira». Para muitos cidadãos, e também responsáveis políticos, pode não ser claro o que significa «modelo de crescimento regenerativo» nem como podemos, na vida quotidiana, restituir ao planeta mais do que o que dele retiramos.

4.4.

Por último, o CESE recomenda vivamente o lançamento de um debate geral sobre o papel dos eventuais programas de ação em matéria de ambiente no futuro. Para o efeito, seria útil antecipar a realização de uma avaliação em vez de esperar até nove meses antes do termo do 8.o PAA.

Bruxelas, 27 de janeiro de 2021.

A Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


(1)  https://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=COM:2020:0652:FIN:PT:PDF, artigo 2.o, n.o 2, alínea c).

(2)  Estratégia de Biodiversidade da UE para 2030, COM(2020) 380 final.