1.10.2020   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 324/21


Parecer do Comité das Regiões Europeu — Aplicação dos acordos de comércio livre (ACL): o ponto de vista local e regional

(2020/C 324/04)

Relator:

Michael MURPHY (IE-PPE), membro do Conselho do Condado de Tipperary

Texto de referência:

Relatório da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões sobre a aplicação dos acordos de comércio livre — 1 de janeiro de 2018-31 de dezembro de 2018

COM(2019) 455 final

RECOMENDAÇÕES POLÍTICAS

O COMITÉ DAS REGIÕES EUROPEU

Observações gerais

1.

acolhe com agrado o relatório anual da Comissão sobre a aplicação dos acordos de comércio livre (ACL); considera que constitui não só um passo fundamental para aumentar a transparência, mas também um instrumento eficaz para oferecer aos cidadãos informações de base objetivas sobre os acordos comerciais negociados pela UE;

2.

salienta o importante potencial da política comercial da UE para a consecução dos objetivos da UE, especialmente em termos de crescimento sustentável, realização dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, emprego, criação de postos de trabalho e investimento na UE; entende, porém, que a crise provocada pela COVID-19 constitui um grande choque para as economias europeia e mundial e criará uma distorção das oportunidades proporcionadas pelo comércio mundial às PME europeias. De acordo com um inquérito recente da DG Comércio, o comércio mundial deverá recuar entre 10 % e 16 % em 2020, e, na EU-27, as exportações para países terceiros deverão cair entre 9 % e 15 %, o que corresponde a valores entre 282 e 470 mil milhões de euros (1);

3.

recorda que 36 milhões de empregos na UE, dos quais 13,7 milhões ocupados por mulheres, dependem das exportações para países terceiros, que entre 2000 e 2017 os empregos da UE apoiados por exportações para o resto do mundo aumentaram 66 %, o que representa 14,3 milhões de empregos adicionais, e que a percentagem de emprego na UE apoiada por vendas de bens e serviços ao resto do mundo, em relação ao emprego total, aumentou de 10,1 % em 2000 para 15,3 % em 2017 (2); observa com preocupação que, devido à pandemia de COVID-19, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) prevê, para 2020, a perda de 12 milhões de empregos só na Europa;

4.

destaca a importância de um comércio livre internacional baseado em regras, que beneficie todos os parceiros comerciais; insta a Comissão a continuar a defender os interesses comerciais da UE e a combater a tendência crescente do protecionismo;

5.

observa que os ACL da UE têm impacto a nível regional; solicita, por conseguinte, à Comissão que, de forma sistemática, o mantenha informado e tenha em consideração, numa fase precoce das negociações, os eventuais impactos locais e regionais do comércio;

6.

considera que os ACL devem ser adaptados às pequenas e médias empresas (PME), da mesma forma que as PME se devem adaptar aos ACL; salienta, a este respeito, o papel fundamental dos órgãos de poder local e regional na «tradução» dos ACL para as PME no terreno;

7.

salienta a responsabilidade conjunta de todos os níveis de governação em assegurar que os benefícios da globalização são distribuídos de forma equitativa e que os impactos negativos são atenuados;

8.

manifesta preocupação com o aumento pronunciado de medidas incompatíveis com a OMC e com as novas disposições não pautais discriminatórias que ameaçam criar encargos regulamentares para ambas as partes, tornando-se a nova normalidade no comércio mundial; considera que os programas de apoio da UE existentes e o respetivo controlo devem ser reavaliados, em conformidade com as regras de concorrência da UE, para apoiar, através de medidas corretivas, as regiões prejudicadas pelas guerras comerciais;

9.

saúda o facto de a Comissão ter criado, em 22 de dezembro de 2017, um Grupo de Peritos sobre Acordos Comerciais, que deverá aumentar a transparência e a inclusividade da política comercial da UE; assinala que nenhum dos 28 peritos deste grupo (3) representa um órgão ou associação de poder local ou regional; insta a Comissão a manter o grupo de peritos no seu formato atual e a conservar a posição do CR como observador, solicitando, caso a estrutura geral do grupo de peritos seja alterada, ser convidado a participar na qualidade de membro;

10.

congratula-se por 29 % a 31 % do comércio da UE estar abrangido por acordos comerciais preferenciais;

Recomendações relacionadas com a COVID-19

11.

congratula-se com o anúncio da Comissão sobre o lançamento de um processo de revisão da política comercial, que deverá conduzir a uma nova estratégia até ao final do ano; insta, porém, a Comissão a assegurar que esta revisão trate com a diligência e a atenção devidas a questão da aplicação dos acordos de comércio livre nas regiões e nos municípios dos Estados-Membros;

12.

observa que a pandemia de COVID-19 destacou que as economias mundiais estão fortemente interligadas e que, em período de crise, nenhum país pode produzir por si só todos os bens de que necessita; insta, por conseguinte, a Comissão a prosseguir o seu trabalho sobre a reforma da OMC, com vista a assegurar um sistema de comércio mundial justo, aberto e baseado em regras; assinala, neste sentido, que, em caso de distorção da concorrência a nível mundial, a UE deve utilizar plenamente os seus instrumentos de defesa comercial e desenvolver novos instrumentos para combater as práticas de distorção de mercado de países terceiros;

13.

exorta a Comissão a prosseguir o seu trabalho de combate à distorção da concorrência no mercado único causada por subvenções estrangeiras; a este respeito, aguarda a publicação do Livro Branco da Comissão sobre um instrumento relativo às subvenções estrangeiras; assinala que os progressos nesta matéria são particularmente importantes para assegurar condições de concorrência equitativas para as empresas da UE em domínios como a adjudicação de contratos públicos;

14.

observa que, em última análise, as regiões e os respetivos governos estão na linha da frente da luta contra a crise, dando resposta aos seus impactos na saúde e na economia; considera, por conseguinte, que a UE tem de trabalhar no sentido de criar reservas estratégicas de equipamento essencial, de modo que as regiões estejam preparadas para futuras pandemias; congratula-se, a este respeito, com o conceito da Comissão de «autonomia estratégica aberta», que visa a diversificação das cadeias de abastecimento mundiais e a repatriação de uma parte da produção de materiais críticos;

15.

congratula-se com a nova proposta sobre o Quadro Financeiro Plurianual, de 27 de maio, incluindo a nova iniciativa REACT-EU e o reforço temporário no âmbito do instrumento Next Generation EU; neste contexto, acolhe favoravelmente os fundos adicionais afetados à política de coesão, que podem ser utilizados para combater o impacto económico da crise, nomeadamente através da disponibilização de investimento e liquidez no terreno para as PME afetadas, em particular nos setores que mais sofreram. Tal assegurará o resgate do maior número possível de empresas e empregos;

16.

congratula-se com a simplificação da execução de diversos programas de financiamento da UE, incluindo o InvestEU, à luz da crise provocada pela COVID-19; insta, contudo, a Comissão a manter o sistema de melhoria do acesso ao financiamento em toda uma gama de programas depois da pandemia, a fim de permitir que as PME europeias transformem a digitalização e as técnicas de descarbonização em oportunidades rentáveis para criar crescimento económico sustentável e empregos;

Aproveitar todo o potencial dos acordos comerciais — perspetivas das regiões e das empresas

17.

concorda plenamente com o ponto de vista da Comissão, segundo o qual as empresas europeias só podem beneficiar dos acordos comerciais da UE se tiverem informações pertinentes sobre o conteúdo desses acordos e compreenderem como funcionam na prática; salienta a necessidade de envolver os representantes regionais nos esforços para melhorar a aplicação dos ACL; sublinha, neste contexto, a importância de elaborar planos de ação para a aplicação dos ACL adaptados a cada Estado-Membro, às respetivas regiões e aos interesses das empresas regionais;

18.

observa com preocupação que a complexidade das regras de origem e dos formulários administrativos exigidos pelos parceiros comerciais da UE para a concessão de preferências às empresas da UE, bem como o esforço necessário para comprovar a origem preferencial, parecem desproporcionados para as PME europeias, que não dispõem dos mesmos recursos que as grandes empresas;

19.

reitera a sua posição de longa data de que os futuros acordos comerciais da UE não devem impedir nenhum nível de governo de prestar, apoiar ou regular os serviços públicos, nem os devem impedir de alargar o leque de serviços que prestam aos cidadãos;

20.

recorda que a maior parte das atividades de exportação das PME ocorre no mercado único (4), e que apenas cerca de metade das PME vende os seus produtos a países não pertencentes à EU-28 (5); observa ainda que as atividades de exportação das PME se encontram muito concentradas, já que seis Estados-Membros (6) representam mais de dois terços do total das exportações das PME europeias;

21.

salienta que, segundo um inquérito recente realizado pelo CR e pela Eurochambres, para uma aplicação eficaz dos ACL é necessário o seguinte (7):

a)

colmatar o défice de conhecimento relativamente aos ACL da UE, fornecendo informações práticas sobre a forma como as PME podem utilizar concretamente um determinado ACL e organizando atividades de informação adicionais com a comunidade empresarial a nível regional e local (formações, seminários, ateliês, exposições itinerantes, etc.);

b)

facilitar a utilização das ferramentas gratuitas disponíveis destinadas a apoiar as empresas e as PME, e sensibilizar o público para a sua existência;

c)

abordar a complexidade e a falta de coerência das regras de origem e dos regimes aduaneiros;

d)

disponibilizar rapidamente uma calculadora de regras de origem, em linha e gratuita, enquanto apoio de primeira linha suplementar para as PME da UE, fornecendo-lhes uma orientação face às complexidades destas regras nos acordos comerciais da UE;

22.

considera que é necessário envidar mais esforços para divulgar informações sobre o funcionamento do comércio internacional, em particular a nível dos Estados-Membros e dos seus órgãos de poder local e regional, que têm um papel fundamental a desempenhar graças ao seu conhecimento e proximidade das PME no terreno; reconhece, por conseguinte, que tal representa uma oportunidade para o CR e a Comissão colaborarem de forma sistemática a fim de divulgar informações pertinentes e desenvolver ferramentas interativas pertinentes, como uma calculadora de regras de origem para as PME;

23.

felicita a Comissão pelos progressos realizados no que se refere ao portal em linha, que integrará duas bases de dados, ou seja, a base de dados de acesso ao mercado e o Trade Helpdesk;

24.

congratula-se igualmente com os instrumentos utilizados pela Comissão para promover e apoiar as PME da UE nos seus esforços de internacionalização, para que sejam mais competitivas a nível mundial, e salienta a necessidade de assegurar uma abordagem ascendente na aplicação destes instrumentos;

25.

manifesta preocupação com as questões pendentes a resolver com os parceiros comerciais, apresentadas no relatório da Comissão, nomeadamente o facto de continuar a haver entraves ao acesso dos produtos da UE a uma série de mercados em países parceiros; considera que se deve atribuir elevada prioridade ao reconhecimento mútuo e não burocrático das normas técnicas;

Assegurar que o envolvimento económico a nível mundial não conduz a desigualdades entre as regiões da UE

26.

considera que, não obstante o crescimento económico global desencadeado pelos ACL, alguns setores económicos, juntamente com as regiões que os acolhem, podem ser afetados negativamente;

27.

apoia o ponto de vista da Comissão segundo o qual os acordos comerciais da UE têm um grande potencial para fomentar as exportações de produtos agrícolas da UE, mas manifesta preocupação com o facto de o projeto de relatório intercalar sobre a avaliação do impacto do acordo comercial com o Mercosul em termos de sustentabilidade indicar que se preveem efeitos negativos sobre o setor agrícola e as zonas rurais da UE, razão pela qual alguns Estados Membros rejeitam o acordo nos seus termos atuais; insiste igualmente em que o acordo com o Mercosul deve ser avaliado na perspetiva do objetivo de redução das emissões de gases com efeito de estufa. A este respeito, a ratificação do acordo UE-Mercosul deverá estar condicionada à adoção de medidas que invertam o atual nível recorde de desflorestação na floresta amazónica do Brasil;

28.

salienta que, segundo o inquérito realizado pelo CR em cooperação com a Eurochambres sobre a aplicação dos ACL, o aumento da pressão concorrencial das empresas estrangeiras foi também identificado como uma preocupação assinalável para as regiões quando da entrada em vigor dos acordos comerciais da UE (8);

29.

frisa que, tal como foi sublinhado num estudo do Serviço de Estudos do Parlamento Europeu (9), baseado numa análise dos fluxos comerciais em alguns Estados-Membros, os resultados das regiões em termos de exportações mostram uma forte correlação positiva com o PIB, e que, em cada Estado-Membro analisado, o comércio se encontra muito concentrado em poucas regiões;

30.

recorda que a Comissão reconheceu o impacto desigual da globalização no território no Documento de reflexão — Controlar a globalização e no Documento de reflexão — O futuro das finanças da UE, no qual sublinhou que embora as vantagens da globalização se façam sentir a grande escala, os custos estão com frequência localizados;

31.

salienta que a resolução das desigualdades acima referidas exige uma resposta a nível da UE para assegurar que nenhuma pessoa ou região fique para trás;

32.

está firmemente convicto de que as avaliações do impacto territorial podem ser instrumentos poderosos para identificar e quantificar, numa fase inicial, os eventuais impactos assimétricos dos acordos comerciais nas regiões europeias, permitindo assim aos territórios em causa adotar as políticas públicas adequadas para enfrentar o impacto; considera que este aspeto é fundamental para a formulação de políticas comerciais sólidas, transparentes e baseadas em dados concretos;

33.

salienta, em particular, o papel da política de coesão na melhoria da competitividade dos territórios da UE mediante investimentos específicos adaptados às necessidades de qualquer território concreto em setores-chave como as infraestruturas de rede, a investigação e a inovação, as PME, os serviços informáticos, a ação ambiental e climática, o emprego de qualidade e a inclusão social;

34.

recorda, à luz dos fortes indícios em matéria de padrões regionais no comércio internacional, que, caso a UE tencione liberalizar mais o comércio, é imperativo fazer preceder cada iniciativa importante de uma avaliação de impacto centrada nos possíveis efeitos ao nível nacional e, sobretudo, infranacional;

35.

congratula-se com o facto de, no seu plano de recuperação para a Europa, de maio de 2020, a Comissão propor o reforço dos seus instrumentos de emergência, incluindo o Fundo Europeu de Ajustamento à Globalização (FEG), tornando-os mais flexíveis, de modo que os recursos possam ser mobilizados de forma rápida e em escala, sempre que necessário; espera que a Comissão apresente rapidamente a sua proposta e realça (10), neste contexto, que a anterior proposta relativa ao FEG para o período de financiamento 2021-2027 previa limiares de elegibilidade relativamente elevados (pelo menos 250 despedimentos) (11) e uma dotação financeira reduzida de 225 milhões de euros por ano;

A política comercial como instrumento fundamental para reforçar a sustentabilidade

36.

está firmemente convicto de que a política comercial tem um importante papel a desempenhar para assegurar que a globalização tem efeitos positivos a nível económico, social, territorial e ambiental para os cidadãos e as empresas tanto na Europa como no resto do mundo;

37.

recorda que, de acordo com um inquérito especial do Eurobarómetro de 2019 (12), houve um aumento não só da percentagem de inquiridos que se afirmam preocupados com os impactos ambientais negativos do comércio internacional, como também do número de inquiridos que consideram não beneficiar do comércio internacional devido ao seu impacto ambiental;

38.

recorda que o Pacto Ecológico deve integrar as políticas comercial, económica, regulamentar e da concorrência, num esforço global para proteger o ambiente e fixar objetivos ambientais ambiciosos para a indústria no seu conjunto;

39.

considera que poderia ser utilizado um mecanismo de combate à «fuga de carbono» para assegurar condições de concorrência equitativas; observa, no entanto, que esta medida deve encontrar um equilíbrio entre as preocupações ambientais, comerciais e de equidade, para evitar desencadear medidas de retaliação contra as exportações dos países da UE, que prejudicariam a indústria europeia;

40.

apoia firmemente o plano de ação de 15 pontos da Comissão enquanto instrumento essencial para tornar mais eficazes os capítulos sobre comércio e desenvolvimento sustentável, que fazem parte de todos os acordos comerciais da UE modernos; no entanto, tal só pode ser executado mediante cláusulas adequadas que assegurem a aplicabilidade e a verificabilidade dos requisitos de sustentabilidade, bem como a aplicação de sanções em caso de incumprimento;

41.

entende, no que diz respeito à questão de saber se o incumprimento de uma disposição do capítulo sobre comércio e desenvolvimento sustentável deve ter determinadas consequências comerciais (relacionadas com o comércio), que devem ser previstos mecanismos de sanção para os países que praticam a concorrência desleal, por exemplo, desrespeitando as normas fundamentais da OIT ou as obrigações em matéria de sustentabilidade;

42.

destaca a necessidade de melhorar a aplicação dos capítulos sobre comércio e desenvolvimento sustentável nos acordos comerciais da UE através de medidas não vinculativas e de uma melhor utilização dos recursos diplomáticos da UE e dos Estados-Membros;

43.

solicita ainda que os acordos comerciais da UE prevejam regras rigorosas em matéria de preços de transferência incorretos ou abusivos e de evasão fiscal para as empresas cotadas em bolsa;

44.

partilha o ponto de vista segundo o qual os capítulos sobre comércio e desenvolvimento sustentável podem, através do comércio, melhorar as condições no que diz respeito, por exemplo, ao trabalho digno, à proteção do ambiente e à luta contra as alterações climáticas, a fim de alcançar uma mudança política eficaz e sustentável (13) em países terceiros; observa, contudo, que estas questões são, por definição, o resultado de processos democráticos que têm lugar na ordem constitucional de cada país;

45.

congratula-se, a este respeito, com a decisão da Comissão de nomear um responsável pelo comércio para acompanhar de perto a aplicação das disposições em matéria de clima, ambiente e trabalho previstas nos acordos comerciais da UE, e está confiante de que este responsável estabelecerá canais de comunicação sólidos com a sociedade civil e os órgãos de poder local e regional; insta a Comissão a assegurar-se de que o gabinete deste responsável dispõe de recursos adequados, por forma a garantir a consecução dos seus objetivos;

46.

remete, neste contexto, para o seu estudo intitulado «A dimensão democrática das negociações da UE sobre os acordos comerciais: papel e responsabilidades dos cidadãos e dos órgãos de poder local e regional», o qual frisa que não basta disponibilizar informações para garantir um processo transparente e participativo, cumprindo prestar especial atenção aos mecanismos, a nível nacional e local, destinados a assegurar o acesso a essas informações. São sobretudo os órgãos de poder local e regional que destacam a frequente ausência de mecanismos formais de diálogo com os níveis nacionais no domínio da política comercial, fenómeno ainda mais notório a nível da UE;

47.

considera, paralelamente, que a política comercial da UE não deve prejudicar os esforços da União em matéria de ajuda ao desenvolvimento nos países terceiros e apela a uma abordagem equilibrada do comércio livre quando se tratem de economias mais frágeis; recorda a importância do comércio livre e justo, e salienta o potencial que a integração económica inter-regional e intrarregional oferece para a redução da pobreza; apela para uma maior coerência das políticas nos setores do comércio internacional e do desenvolvimento, e toma nota de que a UE passou da ajuda internacional ao desenvolvimento para uma abordagem de parceria mais equitativa;

Atenuar o impacto negativo de desenvolvimentos específicos em determinados setores e regiões

48.

insta todos os principais intervenientes institucionais a prestarem especial atenção às ligações comerciais existentes entre as regiões da UE-27 e o Reino Unido, que determinarão em grande medida o impacto da saída do Reino Unido nas economias respetivas; importa conceber medidas adequadas para os setores e territórios que possam sofrer um impacto particularmente negativo;

49.

acolhe favoravelmente as recomendações da Comissão ao Conselho, de 3 de fevereiro de 2020, no sentido de encetar negociações sobre uma nova parceria com o Reino Unido; entende que a Comissão deve assegurar-se de que o acordo negociado defende os interesses da UE;

50.

remete para o documento de posição da delegação espanhola no Comité das Regiões (14) e lamenta que a decisão tomada pelos Estados Unidos de introduzir direitos aduaneiros suplementares para os produtos europeus, ascendendo a 7,496 mil milhões de dólares, em retaliação pelos auxílios concedidos ao fabricante de aeronaves Airbus pela UE e por determinados governos dos Estados-Membros, tenha impacto principalmente nos produtos agrícolas e agroalimentares produzidos nos Estados-Membros da UE;

51.

salienta que os direitos aduaneiros dos EUA sobre o aço conduziram a importantes desvios do comércio de produtos siderúrgicos de países terceiros, que chegam em quantidades cada vez maiores ao mercado europeu. A eficácia das medidas de salvaguarda da UE no setor do aço deve ser reavaliada à luz da revisão em baixa das perspetivas económicas na indústria do aço, a fim de evitar prejuízos adicionais para as empresas siderúrgicas nacionais. A revogação de aumentos anteriores dos contingentes pautais deve ser explicitamente ponderada no âmbito dessa reavaliação;

Assegurar condições de concorrência equitativas para as empresas da UE num sistema de comércio baseado em regras

52.

recorda que as sanções impostas pela UE a países terceiros por várias razões geopolíticas não relacionadas com o comércio são objeto de retaliação através de outras sanções que afetam de forma desproporcionada algumas regiões com relações comerciais estabelecidas nos referidos países terceiros; considera que importa assegurar o equilíbrio justo entre a adoção de medidas de correção e a preservação da concorrência e que os programas de apoio da UE existentes devem ser reavaliados para apoiar as regiões prejudicadas pelas guerras comerciais;

53.

chama a atenção para os recentes apelos para a adoção de uma política comercial da UE mais assertiva, que defenda as tecnologias, as empresas e os mercados contra as práticas comerciais desleais por parte do exterior, e considera que a UE necessita de uma política comercial mais proativa, pronta a proteger as suas empresas através quer da realização de medidas de compensação adequadas que acompanhem o desenvolvimento recente da cadeia de valor, quer da elaboração de um quadro jurídico vinculativo aplicável aos conflitos comerciais; congratula-se com o apoio da UE ao multilateralismo e com as várias ideias apresentadas para a reforma da OMC, bem como com a atitude proativa da Comissão relativamente ao impasse em que se encontra o órgão de recurso da OMC, ou seja, o estabelecimento de mecanismos provisórios em matéria de arbitragem de recursos com o Canadá e a Noruega;

54.

observa, no entanto, que embora seja razoável prever que nenhum país se possa isolar da globalização sem incorrer em custos enormes, o risco de colapso do sistema de comércio multilateral é real e a UE tem de refletir sobre um plano B;

55.

apoia firmemente a proposta da Comissão de alterar o regulamento de execução, a fim de permitir à Comissão adotar medidas de retaliação caso um parceiro impeça que o diferendo atinja o ponto em que essa autorização poderia ser concedida;

56.

partilha a opinião de que a UE deve passar à ofensiva para assegurar a reciprocidade e combater o protecionismo no acesso aos mercados de contratos públicos em países terceiros;

57.

lamenta, por conseguinte, o impasse nas negociações interinstitucionais sobre a proposta revista de um instrumento internacional de contratação pública (15), apresentada pela Comissão em 2016.

Bruxelas, 2 de julho de 2020.

O Presidente do Comité das Regiões Europeu

Apostolos TZITZIKOSTAS


(1)  https://trade.ec.europa.eu/doclib/docs/2020/may/tradoc_158764.pdf

(2)  http://trade.ec.europa.eu/doclib/docs/2018/november/tradoc_157516.pdf

(3)  http://trade.ec.europa.eu/doclib/docs/2017/december/tradoc_156487.pdf

(4)  Serviço de Estudos do Parlamento Europeu, CETA implementation: SMEs and regions in focus [Aplicação do CETA: foco nas PME e nas regiões], estudo realizado a pedido do CR, 18 de novembro de 2019, disponível em: http://www.europarl.europa.eu/thinktank/en/document.html?reference=EPRS_IDA(2019)644179

(5)  Flash Eurobarómetro n.o 421, Internacionalização das PME, outubro de 2015.

(6)  Bélgica, Alemanha, Espanha, Itália, Países Baixos e Reino Unido.

(7)  Inquérito da Eurochambres e do CR — «Implementation of Free Trade Agreements — challenges and opportunities for businesses and regions» [Aplicação dos acordos de comércio livre — Desafios e oportunidades para as empresas e as regiões], https://cor.europa.eu/en/events/Documents/ECON/Survey_Note_CoR-Eurochambres_Survey_15_November_2019.pdf

(8)  Inquérito do Comité das Regiões Europeu e da Eurochambres sobre a aplicação dos ACL, agosto-outubro de 2019.

(9)  Serviço de Estudos do Parlamento Europeu, Interactions between trade, investment and trends in EU industry: EU regions and international trade [Interações entre o comércio, o investimento e as tendências na indústria da UE: as regiões europeias e o comércio internacional], estudo realizado a pedido do CR, 27 de outubro de 2017, disponível em: http://www.europarl.europa.eu/thinktank/en/document.html?reference=EPRS_STU(2017)608695

(10)  Parecer do Comité das Regiões Europeu — Reforçar a resiliência territorial: capacitar as regiões e os municípios para enfrentarem a globalização (JO C 54 de 13.2.2018, p. 32).

(11)  Em particular tendo em conta o facto de que o programa norte-americano equivalente de ajustamento às mudanças estruturais («Trade Adjustment Assistance» — TAA) não prevê qualquer limiar de despedimentos.

(12)  https://ec.europa.eu/commfrontoffice/publicopinion/index.cfm/survey/getsurveydetail/instruments/flash/surveyky/2246.

https://ec.europa.eu/commission/presscorner/detail/pt/ip_19_6294

(13)  Parlamento Europeu, «Free trade or geo-economics? Trends in world trade» [Comércio livre ou geoeconomia? Tendências do comércio mundial], Departamento Temático das Relações Externas, Direção-Geral das Políticas Externas da União, setembro de 2019.

(14)  Posição da delegação espanhola no Comité das Regiões sobre o impacto dos diferendos comerciais e da introdução de novos direitos aduaneiros nos produtos agrícolas e agroalimentares e nas economias regionais e locais da UE — https://cor.europa.eu/pt/news/Pages/US-tariffs-on-EU-agri-food-products.aspx

(15)  https://trade.ec.europa.eu/doclib/docs/2019/march/tradoc_157728.pdf