11.2.2020   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 47/76


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de diretiva do Conselho que altera a Diretiva 2006/112/CE relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado e a Diretiva 2008/118/CE relativa ao regime geral dos impostos especiais de consumo no que respeita ao esforço de defesa no âmbito da União»

[COM(2019) 192 final — 2019/0096 (CNS)]

(2020/C 47/11)

Relator: Benjamin RIZZO

Consulta

Conselho da União Europeia, 13.5.2019

Base jurídica

Artigo 113.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social

Adoção em secção

17.10.2019

Adoção em plenária

30.10.2019

Reunião plenária n.o

547

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

204/2/5

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O CESE reconhece o objetivo da Comissão de assegurar a igualdade de tratamento, para efeitos de IVA, entre as forças armadas dos Estados-Membros que colaboram no âmbito da UE e as forças armadas da OTAN destacadas na UE, que já beneficiam da isenção de IVA. Criar condições equitativas neste domínio é um objetivo razoável.

1.2.

O CESE compreende os motivos da criação de algumas estruturas da UE desde 2000 que se destinam a administrar as forças armadas destacadas na UE para sua segurança e defesa. A partir de agora, com um diretor-geral responsável pela defesa, estas estruturas serão mais bem utilizadas e supervisionadas.

1.3.

O CESE observa que as duas condições que a Comissão apresenta na sua proposta para a concessão da isenção são que as forças armadas estejam destacadas fora do seu próprio Estado-Membro, por um lado, e que participem num esforço comum de defesa europeu, por outro.

1.4.

O CESE reconhece que alguns domínios não são abrangidos pela nova isenção, em particular no que diz respeito a ações em prol da segurança, a missões humanitárias de salvamento e aos casos em que a cláusula de solidariedade é evocada. Consequentemente, as isenções globais do IVA limitam-se às «operações militares», aplicando-se uma interpretação restritiva desse conceito.

1.5.

O CESE propõe que as diferentes autoridades fiscais nacionais disponham de um sistema único para a aplicação das novas isenções. Assim, recomenda à Comissão que crie, através do seu grupo de controlo do IVA, um sistema específico no qual as faturas isentas de IVA emitidas pelos fornecedores às forças armadas tenham de ser inseridas para beneficiarem da isenção prevista na proposta da Comissão. Desta forma, utilizar-se-á um sistema uniforme em todos os Estados-Membros.

1.6.

O CESE considera que as informações sobre os custos/benefícios das isenções previstas na proposta da Comissão devem ser mais bem calculadas, de modo a permitir a disponibilização, em breve, de um relatório mais realista sobre essas isenções. Tal incentivará a elaboração de relatórios melhores e mais transparentes para os Estados-Membros e a opinião pública em geral.

2.   Proposta da Comissão

2.1.

Com a sua proposta de diretiva do Conselho que altera a Diretiva 2006/112/CE (1) relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado e a Diretiva 2008/118/CE (2) relativa ao regime geral dos impostos especiais de consumo no que respeita ao esforço de defesa no âmbito da União, publicada em 24 de março de 2019, a Comissão Europeia apresentou o seu plano para isentar do imposto sobre o valor acrescentado (IVA) e dos impostos especiais de consumo as entregas de bens e prestações de serviços às forças armadas quando estas estão destacadas fora do seu próprio Estado-Membro e participam num esforço de defesa europeu.

2.2.

Nos termos do artigo 2.o da Diretiva 2006/112/CE do Conselho relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, o âmbito de aplicação do IVA abrange todas as entregas de bens e prestações de serviços efetuadas a título oneroso por um sujeito passivo no território de um Estado-Membro e todas as importações de bens na União Europeia.

2.3.

A diretiva estabelece uma lista comum de isenções de IVA destinadas a garantir que os recursos próprios da UE são cobrados de modo uniforme em todos os Estados-Membros. Atualmente, a lista de isenções não inclui as entregas de bens e prestações de serviços para fins de segurança e defesa. Por conseguinte, os bens entregues ou os serviços prestados às forças armadas, ou ainda os bens por elas importados, estão sujeitos a IVA.

2.4.

Por outro lado, a Diretiva IVA prevê atualmente uma isenção para entregas de bens e prestações de serviços às forças armadas de qualquer Estado parte no Tratado do Atlântico Norte que participe num esforço comum de defesa fora do seu próprio Estado. Esta isenção foi criada para responder a situações em que «se quebrou o círculo de receitas e de despesas, uma vez que o IVA sobre essas entregas de bens e prestações de serviços constituiria normalmente uma receita para o Estado em que as forças armadas estão situadas, e não para o seu próprio Estado».

2.5.

A Diretiva 2008/118/CE do Conselho relativa ao regime geral dos impostos especiais de consumo prevê uma isenção semelhante do imposto especial de consumo para a circulação de produtos sujeitos a impostos especiais de consumo destinados às forças armadas de qualquer membro da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN).

2.6.

Os impostos especiais de consumo ao abrigo da legislação da UE são aplicados às bebidas alcoólicas, aos produtos de tabaco e aos produtos energéticos (carburantes e combustíveis para aquecimento, como a gasolina, a eletricidade, o gás natural e o carvão). A estrutura dos impostos e as taxas mínimas estão harmonizadas a nível da UE.

2.7.

Embora o esforço de defesa da OTAN esteja abrangido pela isenção por força da Diretiva IVA (desde 1977) e da Diretiva Impostos Especiais de Consumo (desde 1993), não está atualmente em vigor uma isenção para as entregas e as prestações relacionadas com o esforço comum de defesa no âmbito da União.

2.8.

A política comum de segurança e defesa (PCSD) (3), criada inicialmente (em 2000) como política europeia de segurança e defesa (PESD), é um instrumento fundamental para o desenvolvimento gradual de uma política de defesa comum da União. O Tratado de Lisboa representou um contributo importante para o desenvolvimento da PCSD, criando o Serviço Europeu para a Ação Externa (SEAE), entre outros, a fim de apoiar a alta representante para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança em todas as suas responsabilidades, incluindo a PCSD.

2.9.

O Tratado da União Europeia (TUE) contém igualmente uma cláusula de assistência mútua e permite aos Estados-Membros reforçar o seu setor militar através de uma «cooperação estruturada permanente» (CEP) (4).

2.10.

O Comité Militar da UE (CMUE) (5), criado em 2001, é o órgão militar mais elevado do Conselho, que «dirige todas as atividades militares no âmbito da UE e presta aconselhamento sobre o planeamento e a execução de missões e operações militares no âmbito da PCSD, bem como sobre o desenvolvimento de capacidades militares».

2.11.

Em junho de 2016, a estratégia global para a política externa e de segurança da União Europeia (EUGS) (6) lançou as bases para continuar a desenvolver a PCSD em torno de três prioridades fundamentais: dar resposta aos conflitos e crises externos, desenvolver as capacidades dos parceiros e proteger a União e os seus cidadãos.

2.12.

Em março de 2018, a Comissão e a alta representante apresentaram uma comunicação conjunta sobre o plano de ação para a mobilidade militar (7). O plano de ação reconhece a necessidade de «igualdade de tratamento dos esforços de defesa, a fim de reduzir os encargos administrativos e, por conseguinte, os atrasos e os custos da mobilidade militar».

2.13.

Mais concretamente, a comunicação conjunta afirma que «as medidas para facilitar a mobilidade militar dizem igualmente respeito às atuais regras em matéria de imposto sobre o valor acrescentado. Os esforços de defesa, em especial de mobilidade militar, requerem serviços e materiais de formação, alojamento e refeições/serviços de restauração, combustíveis, entre outros fornecimentos, em princípio sujeitos a IVA. No quadro do grupo de trabalho ad hoc sobre a mobilidade, os Estados-Membros identificaram a necessidade de assegurar que os esforços de defesa sejam tratados em pé de igualdade, a fim de reduzir os encargos administrativos e evitar, assim, atrasos e custos de mobilidade militar, e incentivar os Estados-Membros a colaborar».

2.14.

Na sequência de tal pedido, a proposta da Comissão ora em apreço alinha, na medida do possível, o tratamento para efeitos de IVA e a isenção do imposto especial de consumo no âmbito dos esforços de defesa empreendidos no quadro da UE e da OTAN. De acordo com a proposta, as atividades da PCSD abrangidas pelas isenções são: i) missões e operações militares; ii) agrupamentos táticos; iii) assistência mútua. Além disso, as atividades da CEP e da AED também serão abrangidas.

2.15.

Importa assinalar que, de acordo com a proposta da Comissão, as entregas de bens e as prestações de serviços às forças armadas e ao elemento civil que as acompanha só podem beneficiar da isenção quando as referidas forças armadas se encontrem afetas a um esforço de defesa realizado para a execução de uma atividade da União no âmbito da PCSD.

2.16.

Por conseguinte, as isenções não abrangem o destacamento de forças armadas apenas para fins de segurança, para missões humanitárias e de salvamento ou quando seja invocada a cláusula de solidariedade prevista no artigo 222.o do TFUE, sem implicações no domínio da defesa.

2.17.

Com base numa estimativa prudente, é possível afetar 530 milhões de euros — de um total de 5,3 mil milhões em despesas com a defesa — a atividades subcontratadas que serão abrangidas pela proposta da Comissão, o que poderá traduzir-se numa possível perda de receitas do IVA para todos os Estados-Membros de cerca de 80 milhões de euros (pressupondo uma taxa média de IVA de 18%).

2.18.

No que diz respeito aos impostos especiais de consumo, os produtos energéticos e a eletricidade devem constituir o principal objeto de isenção. Tal como acontece com o IVA, pode presumir-se que, no futuro, cerca de 10% desses custos passarão a estar isentos de impostos especiais de consumo. No entanto, não existem dados disponíveis que possam servir de base para quantificar o impacto.

2.19.

Os Estados-Membros terão de adotar e publicar, até 30 de junho de 2022, as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento às novas regras, devendo comunicar o texto dessas disposições à Comissão.

3.   Observações na generalidade e na especialidade

3.1.

A proposta da Comissão completa o plano de ação sobre o IVA de 2016, destinado a modernizar o sistema do IVA, com um modelo mais simples, mais resistente à fraude e mais favorável às empresas. As referidas alterações relativas ao domínio militar inserem-se, por conseguinte, numa reforma mais ampla e farão parte do novo sistema desde o início. Assim, evitar-se-ão todas as eventuais questões relacionadas com alterações futuras a um sistema já em vigor.

3.2.

A proposta da Comissão altera a lista atual constante da Diretiva 2006/112/CE, criando uma nova isenção. Esta alteração substancial visa permitir uma situação com «condições equitativas», do ponto de vista do IVA, entre as operações da OTAN, por um lado, e as operações realizadas no âmbito de um quadro comum pelas forças militares dos Estados-Membros, por outro. Deste modo, haverá coerência e o âmbito de aplicação das isenções será semelhante para os esforços de defesa da União Europeia e da OTAN.

3.3.

O CESE observa que as atuais isenções para as atividades de defesa da OTAN, já enquadradas e limitadas no seu âmbito, não serão alargadas, uma vez que se trata de um mero alinhamento a favor das operações militares realizadas no âmbito de um quadro comum.

3.4.

A escolha da redação das disposições da nova diretiva de modo semelhante aos parágrafos existentes relativos às forças armadas da OTAN é coerente com o objetivo final da Comissão de lograr a igualdade de tratamento entre essas operações e os esforços militares realizados no âmbito de um quadro comum da UE.

3.5.

O CESE observa que não haverá implicações negativas para o orçamento da UE, uma vez que o recurso próprio baseado no rendimento nacional bruto (RNB) compensa qualquer despesa não coberta pelos recursos próprios tradicionais e pelos recursos próprios provenientes do IVA. Os recursos próprios provenientes do IVA não cobrados oriundos de determinados Estados-Membros serão compensados por todos os Estados-Membros através do recurso próprio baseado no RNB.

3.6.

A proposta observa o princípio da subsidiariedade, uma vez que a legislação da UE é mais adequada do que várias regras nacionais para coordenar a aplicabilidade do IVA a operações militares específicas em todo o mercado interno. Os Estados-Membros foram consultados no âmbito do Grupo sobre o Futuro do IVA e confirmaram, de um modo geral, a necessidade de agir a nível da UE, o que justifica a escolha de uma proposta de diretiva.

3.7.

A proposta também parece respeitar o princípio da proporcionalidade, uma vez que não excede o necessário para cumprir os objetivos dos Tratados ligados à definição gradual de uma política de defesa comum no âmbito da PCSD. O CESE subscreve este objetivo ambicioso de longo prazo.

3.8.

A escolha de manter a coerência entre o IVA e os impostos especiais de consumo, abordando as duas isenções numa única proposta, parece razoável e capaz de justificar uma das raras ocasiões em que os impostos especiais de consumo e o IVA são regulados em conjunto pela legislação da UE.

3.9.

No entanto, o CESE propõe uma maior especificação do âmbito de aplicação da isenção a conceder tanto no sistema do IVA como no regime dos impostos especiais de consumo. Com efeito, afigura-se judicioso determinar com precisão o perímetro específico dessa isenção, a fim de garantir a segurança jurídica e a previsibilidade dos sistemas do IVA e dos impostos especiais de consumo.

3.10.

No que se refere à necessidade de clareza e previsibilidade da lei, é de salientar que as isenções concedidas serão principalmente aplicadas e avaliadas, de diferentes perspetivas, pelos fornecedores nacionais que operam no domínio militar e pelas autoridades fiscais nacionais. As autoridades fiscais nacionais instruirão os fornecedores nacionais que operam no domínio militar quanto à configuração das suas faturas de IVA para as forças armadas.

3.11.

A este respeito, o CESE recomenda à Comissão que emita — através de uma nota explicativa ou de orientações emitidas pelo Comité do IVA — regras de aplicação pormenorizadas para as autoridades fiscais nacionais e as empresas, a fim de evitar complicações técnicas nos Estados-Membros. A prática anterior de isenção da OTAN revelar-se-á certamente útil, servindo de orientação numa fase inicial.

3.12.

Por último, o CESE sublinha que um novo regime de isenção — como o estabelecido na proposta da Comissão — exige, sem dúvida, mecanismos de controlo adequados para supervisionar a sua aplicação concreta. Por conseguinte, o CESE propõe à Comissão que desenvolva e lance um sistema, através do seu grupo de controlo do IVA, de modo a aplicar um sistema adequado em todos os Estados-Membros para o controlo do novo regime de isenção, com vista a recolher das autoridades fiscais nacionais, sempre que possível e viável, todas as informações práticas pertinentes.

3.13.

Um tal sistema pode contribuir para a aplicação eficaz e, simultaneamente, transparente da nova isenção, permitindo igualmente realizar uma análise rigorosa de avaliação do impacto ex post. Assim, os Estados-Membros poderiam adotar uma plataforma comum, criando um sistema único a ser seguido por todos os Estados-Membros em vez da utilização de sistemas diferentes em diferentes países.

3.14.

Recomenda-se a realização de uma estimativa dos custos mais pormenorizada e eficaz para compreender o efeito desta isenção do IVA, uma vez que estes impostos fazem parte dos impostos pagos pelo público em geral e impõe-se maior transparência. É também evidente que, no caso de grandes catástrofes naturais, o custo desta isenção pode ser muito maior.

Bruxelas, 30 de outubro de 2019.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Luca JAHIER


(1)  Diretiva 2006/112/CE do Conselho relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (JO L 347 de 11.12.2006, p. 1).

(2)  Diretiva 2008/118/CE do Conselho relativa ao regime geral dos impostos especiais de consumo e que revoga a Diretiva 92/12/CEE (JO L 9 de 14.1.2009, p. 12).

(3)  A política comum de segurança e defesa (PCSD) é parte integrante da política externa e de segurança comum (PESC) da União. A PCSD está consagrada no Tratado da União Europeia (TUE). O artigo 41.o define o financiamento da PESC e da PCSD, e a política é descrita mais pormenorizadamente nos artigos 42.o a 46.o, no Capítulo 2, Secção 2, do Título V («Disposições relativas à política comum de segurança e defesa»), nos Protocolos (n.o 1), (n.o 10) e (n.o 11) e nas Declarações n.o 13 e n.o 14. O papel específico do Parlamento Europeu na PESC e na PCSD é descrito no artigo 36.o do TUE.

(4)  As disposições relativas à CEP estão definidas no artigo 46.o do Tratado da União Europeia (TUE) e no Protocolo (n.o 10) relativo à cooperação estruturada permanente estabelecida no artigo 42.o, n.o 6, do TUE.

(5)  O Comité Militar da União Europeia (CMUE) é o órgão militar mais elevado criado no âmbito do Conselho (Decisão do Conselho, de 22 de janeiro de 2001, que cria o Comité Militar da União Europeia).

(6)  Visão partilhada, ação comum: uma Europa mais forte — Estratégia global para a política externa e de segurança da União Europeia.

(7)  Comunicação Conjunta ao Parlamento Europeu e ao Conselho — Melhorar a mobilidade militar na União Europeia [JOIN(2017) 41 final].