29.11.2019   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 404/44


Parecer do Comité das Regiões Europeu — Nova agenda europeia para acelerar o desenvolvimento das indústrias marítimas

(2019/C 404/09)

Relator

:

Christophe CLERGEAU (FR-PSE), membro do Conselho Regional do País do Loire

RECOMENDAÇÕES POLÍTICAS

I)   Recomendações políticas fundamentais para acelerar o desenvolvimento das indústrias marítimas europeias

Tomar consciência dos desafios e escolher uma nova política industrial mais ofensiva

O COMITÉ DAS REGIÕES EUROPEU

1.

apela para a consciencialização para as oportunidades de desenvolvimento e as ameaças enfrentadas pelas indústrias marítimas europeias, que precisam de se unir, com o apoio das autoridades aos níveis europeu, nacional e regional, a fim de contribuírem para o êxito da sua transição ecológica e energética, bem como da sua transformação digital e revolução industrial, voltando a tornar atrativas as carreiras no setor. Estes desafios devem ser superados num momento em que estas indústrias estão cada vez mais expostas a uma nova concorrência asiática nos segmentos dos navios com elevado valor acrescentado, em que a Europa é atualmente líder. Esta concorrência, que procura apropriar-se das tecnologias europeias, é uma concorrência desleal caracterizada pelo dumping social e ambiental, e em grande medida financiada por auxílios estatais, em contradição com as regras do comércio internacional. As autoridades europeias devem resolver este problema, no sentido de estabelecer condições de concorrência equitativas; cumpre assinalar que esta concorrência desleal afeta também, neste momento, o setor das pescas;

2.

sublinha a diversidade dos setores no âmbito das indústrias marítimas, o que constitui uma mais-valia na promoção das sinergias entre os setores e o impacto territorial: construção, reparação e desmantelamento naval civil e militar (desde navios transatlânticos a embarcações de recreio e de barcos de pesca a navios de serviço e navios de passageiros, além das frotas militares), energias renováveis marítimas, indústrias petrolíferas e do gás, infraestruturas portuárias, costeiras e ao largo, pesca, aquicultura, apanha de marisco e bioeconomia azul;

3.

apela para um empenho contínuo no desenvolvimento da pesca, da apanha do marisco e da aquicultura, tanto em termos de equilíbrio como de sustentabilidade ambiental, social e económica; salienta igualmente a necessidade de uma renovação geracional, cujas componentes principais seriam a formação e a melhoria das condições a bordo;

4.

considera que as indústrias marítimas, tal como as indústrias aeronáutica e aeroespacial, exigem uma estratégia industrial ambiciosa, bem como um quadro de execução concreto e adaptado às suas características específicas: a questão da soberania, elevada intensidade de capital, fases de produção curtas, ciclos longos e elevados níveis de risco e necessidades significativas de investigação, inovação e formação;

5.

chama a atenção para a necessidade de apoiar o desenvolvimento da energia eólica marítima em águas profundas, como meio de reduzir a ocupação de zonas marítimas costeiras em águas pouco profundas, em benefício de outras atividades da economia azul;

6.

recorda que as indústrias marítimas são o segundo maior setor dentro da economia azul em termos de emprego: num contexto de crescimento mundial, a Europa encontra-se numa posição de liderança numa série de domínios, criando muitos postos de trabalho altamente qualificados, sustentáveis e industriais;

7.

chama a atenção para o importante papel dos portos, enquanto infraestruturas estratégicas que são mais do que meras plataformas de comércio e transportes, mas crescentemente se afirmam como plataformas industriais e de inovação, cuja relação com as cidades limítrofes pode ser mais bem aproveitada. Por conseguinte, é importante planear um apoio adequado para as empresas que operam em terra (1) em domínios já relacionados com a economia azul ou que possam vir a operar nestes domínios através de mecanismos de diversificação comprovados;

8.

chama a atenção para a importância socioeconómica das atividades de pesca e marítimas para o fornecimento de alimentos seguros e de boa qualidade; assinala a importância da sua dimensão cultural e patrimonial, que é fundamental para a revitalização do turismo; salienta as sinergias e os aspetos complementares que são necessários entre essas atividades tradicionais e os novos setores a desenvolver, em benefício do emprego e do desenvolvimento sustentável;

9.

considera que as indústrias marítimas constituem uma das principais alavancas para atingir os objetivos de desenvolvimento sustentável enunciados na Europa; com efeito, os seus produtos, serviços e inovações contribuem de forma crucial para acompanhar as atividades indispensáveis à concretização das transições, em particular:

a exploração dos oceanos, o desenvolvimento dos conhecimentos sobre o mar e o fundo do mar;

o reforço da luta contra as alterações climáticas, em particular através do transporte marítimo;

o desenvolvimento das energias renováveis marítimas e dos parques eólicos ao largo, bem como das interconexões elétricas entre os países da União Europeia, a fim de aumentar o peso das energias renováveis no cabaz de eletricidade e a sua integração a nível europeu;

a presença no mar, a vigilância e a segurança; as intervenções no mar, inclusive na luta contra a presença de plásticos;

o conhecimento e a valorização dos biorrecursos marinhos, o desenvolvimento sustentável da pesca, da aquicultura e da economia circular azul;

10.

concorda com as conclusões da avaliação da Iniciativa LeaderSHIP 2020, adotadas pelo CESE em 2018 (2), que sublinham as limitações detetadas na sua aplicação e a ausência de objetivos precisos e quantificáveis;

11.

solicita a adoção de uma nova abordagem «LeaderSHIP 2030» profundamente revista, que proponha um «European blue new deal» [um novo «pacto azul» europeu] e combine três elementos: uma política comercial e de concorrência que vise preservar os nossos interesses e criar «campeões europeus», a mobilização e a adaptação de cada política europeia às necessidades e especificidades das indústrias marítimas, e a adoção de seis objetivos operacionais em torno dos quais deverão ser mobilizados os intervenientes locais, nacionais e europeus no período 2020-2027:

descarbonizar o transporte marítimo e construção de navios limpos sem emissões, sem descargas no mar e sem ruído;

eliminar os resíduos presentes no mar e, em especial, os plásticos;

indústrias marítimas 4.0, uma abordagem transversal em prol do desempenho e da qualidade do emprego em todas as indústrias marítimas;

tornar a Europa líder mundial em todas as tecnologias das energias renováveis marítimas;

estratégia europeia para uma nova bioeconomia azul, que dinamize a pesca, a aquicultura e a valorização dos biorrecursos marinhos;

lançar uma missão europeia de exploração dos oceanos para aprofundar o conhecimento do meio marinho em todos os mares do planeta.

Estes seis objetivos tratam questões industriais específicas e devem também ser tidos em conta no processo de reflexão sobre uma «missão» marítima no âmbito do Horizonte Europa;

12.

encorajar a adoção de estratégias para as indústrias marítimas nas ilhas e nas regiões ultraperiféricas da Europa, a fim de acelerar o progresso em três direções prioritárias: portos, uma autonomia energética descarbonizada mais económica e a bioeconomia azul, incluindo a pesca e aquicultura;

13.

recorda a importância, para o futuro das indústrias marítimas, de colocar as questões marítimas no centro das futuras políticas da UE, assim como no centro da execução dos fundos da política regional;

«European Sea Tech»: construir redes europeias para interligar os ecossistemas de inovação regionais, mobilizar as regiões para estruturar as cadeias de valor industriais

14.

considera que as indústrias marítimas se caracterizam, em primeiro lugar, pela sua implantação territorial nas regiões marítimas, que desenvolveram ecossistemas regionais de inovação de excelência consagrados a essas indústrias. É sobretudo nesses ecossistemas regionais de inovação e nas estratégias de especialização inteligente a eles associadas que as políticas nacionais e europeias se devem apoiar para serem céleres e eficazes;

15.

propõe o lançamento de um projeto «European Sea Tech» para interligar os ecossistemas de inovação regionais através da constituição de várias redes de cooperação:

para dinamizar subsetores e criar cadeias de valor europeias;

para identificar e acompanhar melhor os desafios da mutação industrial, nomeadamente a nível ecológico, energético e digital;

para desenvolver novos serviços, produtos e modelos económicos mais integrados e capazes de enfrentar a concorrência mundial.

A Comissão lançaria convites à manifestação de interesse para constituir redes temáticas e cada ecossistema regional (ou inter-regional) poderia candidatar-se a várias redes em conformidade com as estratégias de especialização inteligente da sua região. Os ecossistemas que combinassem muitas competências e reunissem várias redes constituiriam os «ecossistemas centrais» do projeto «European Sea Tech».

Cada rede procuraria ser tão inclusiva quanto possível, associando todas as competências das diferentes regiões europeias. No âmbito das redes, seriam sistematicamente abordadas as questões do desenvolvimento sustentável, da investigação e desenvolvimento (I&D), do desempenho industrial, do financiamento e das competências.

Estas redes constituiriam, mais eficazmente do que uma plataforma europeia centralizada, a base para o desenvolvimento de formas de cooperação entre regiões e para o estabelecimento de projetos operacionais pertinentes para as diversas políticas da União.

O projeto «European Sea Tech» teria igualmente a função de dinamizar as transferências de tecnologias, experiências e competências entre as diferentes redes e setores das indústrias marítimas;

16.

chama a atenção para a importância do projeto «European Sea Tech» para promover uma abordagem transversal das indústrias marítimas e acelerar a transição rumo a indústrias marítimas verdes e digitais, através da mobilização do conjunto de tecnologias e competências existentes em todos os setores das indústrias marítimas, a fim de as colocar à disposição dos outros setores;

17.

reitera o seu apoio ao projeto de comunidade de conhecimento e inovação marinha, mas observa que, devido à sua concentração na gestão sustentável dos recursos marinhos, este projeto apenas poderá representar, quando muito, uma das redes constitutivas do projeto «European Sea Tech»;

18.

espera que os projetos levados a cabo pelas redes dos ecossistemas de inovação do «European Sea Tech» possam ser apoiados no âmbito das parcerias europeias e cofinanciados pelo Horizonte Europa e por outros fundos disponíveis. Estes projetos devem também poder contemplar o financiamento de linhas-piloto, protótipos e demonstradores;

19.

reitera igualmente o seu apelo para um roteiro marítimo no âmbito do Horizonte Europa, a inclusão explícita dos desafios científicos e tecnológicos das indústrias marítimas no pilar 2 e a fixação de um objetivo de mobilização de 10% do Horizonte Europa para financiar projetos com um impacto significativo na economia azul e nas indústrias marítimas;

II)   Propostas concretas para mobilizar e adaptar as políticas pós-2020 da União Europeia ao serviço das indústrias marítimas

Comércio internacional e concorrência

20.

salienta, no que diz respeito às indústrias e serviços marítimos, a necessidade de uma nova política comercial «realista» e assente na reciprocidade para defender o emprego e a soberania europeia face às estratégias ofensivas e desleais de grandes países marítimos, nomeadamente asiáticos. Sempre que seja possível e eficaz, esta política deve promover um sistema comercial estável e multilateral, baseado em regras equitativas e transparentes que assegurem condições de concorrência leal, estabelecer acordos profícuos com os parceiros comerciais e ter como base o papel da Organização Mundial do Comércio (OMC);

21.

considera, no que respeita aos mercados mundiais e globalizados, que a política de concorrência deve permitir a constituição de «campeões europeus», assegurando em permanência uma concorrência equitativa e leal na União, e reitera o valor acrescentado das orientações em matéria de auxílios estatais ao transporte marítimo e a necessidade de um regime fiscal simples, estável e competitivo para cumprir esse objetivo;

22.

chama a atenção da Comissão para a importância de controlar melhor os fluxos de investimento estrangeiro e de limitar e reduzir os possíveis efeitos nocivos das transferências de tecnologias para a indústria europeia, nomeadamente das transferências incluídas nos grandes contratos internacionais;

23.

apela para que sejam assumidos compromissos precisos em matéria de gestão dos contratos públicos civis e militares, por exemplo, estabelecendo requisitos rigorosos para o fornecimento de determinados produtos e serviços anteriormente identificados como estratégicos ou particularmente vulneráveis à concorrência mundial;

Financiamento de projetos

24.

defende a rápida concretização do projeto de plataforma de financiamento dos projetos da economia azul, que deve incluir não só um mecanismo de assistência, mas também um fundo de investimento específico para financiar projetos inovadores e de risco. Com efeito, o principal objetivo da plataforma deverá ser o financiamento a taxas preferenciais de projetos considerados demasiado arriscados pelos intervenientes tradicionais, respondendo assim às deficiências do mercado. Esse mecanismo deverá funcionar em estreita ligação com os Estados-Membros e as regiões, a fim de assegurar a complementaridade dos instrumentos de intervenção e a continuidade do acompanhamento dos projetos. A plataforma deve apoiar-se, nomeadamente, nas redes e nos «ecossistemas centrais» do projeto «European Sea Tech»;

25.

solicita, além disso, à Comissão que estabeleça um objetivo e um método de mobilização, ao serviço da economia azul e das indústrias marítimas, para os instrumentos de investimento europeus a lançar no âmbito do InvestEU, nomeadamente relacionados com o Programa Horizonte Europa;

26.

insiste na necessidade de instrumentos que reduzam o custo financeiro dos projetos estruturantes e permitam um pré-financiamento eficaz das aquisições e dos investimentos mais elevados (navios, equipamento para gás natural liquefeito — GNL —, energias renováveis marítimas, etc.);

27.

reitera a necessidade de financiamentos específicos para as regiões ultraperiféricas, atentos os seus constrangimentos e especificidades. Estas regiões conferem à Europa uma dimensão marítima e oceânica excecional, pelo seu posicionamento estratégico nos oceanos Atlântico e Índico e no mar das Caraíbas, e constituem ativos naturais únicos, tal como reconhecido pela própria Comissão Europeia;

28.

salienta a importância de facilitar o recurso aos contratos públicos para soluções inovadoras, que permitem flexibilizar as regras de adjudicação para a aquisição de tecnologias emergentes que ainda não tenham sido introduzidas de forma normalizada no mercado. Esta prática acelera a introdução das inovações no mercado, permitindo que as empresas que oferecem novos serviços e produtos encontrem mais rapidamente os seus primeiros clientes;

29.

salienta que as barreiras regulamentares específicas do mundo marítimo e os prazos administrativos de tratamento dos pedidos entravam enormemente a realização de ensaios e testes no mar; propõe a criação de um grupo de trabalho europeu, englobando a Comissão, os Estados-Membros, as regiões e os operadores económicos, a fim de divulgar as boas práticas e promover uma evolução favorável dos quadros de referência nacionais;

30.

considera útil ponderar a possibilidade de ir ainda mais longe mediante a criação, a longo prazo, de uma «Agência de projetos de investigação avançada sobre assuntos marítimos», inspirada na Agência de Projetos de Investigação Avançada de Defesa (DARPA) dos Estados Unidos da América, e, deste modo, apoiar com um quadro de financiamento específico a inovação disruptiva, com o reconhecimento do direito ao fracasso e tendo plenamente em conta os condicionalismos de desenvolvimento das pequenas e médias empresas (PME) e das empresas de média capitalização;

31.

propõe, num contexto pós-Brexit, que os intervenientes nas indústrias marítimas beneficiem de uma parte dos fundos específicos destinados a apoiar os territórios mais afetados, a fim de neles criarem novas perspetivas de desenvolvimento e emprego;

32.

chama a atenção para a importância do projeto «European Sea Tech» na promoção de uma abordagem transversal das indústrias marítimas e na aceleração da transição rumo a indústrias marítimas verdes e digitais, mobilizando todas as tecnologias e competências de todos os setores das indústrias marítimas, a fim de as colocar à disposição dos outros setores. Esta promoção de uma abordagem transversal também deve ser incentivada no âmbito das atividades marítimas e costeiras, bem como de outros setores industriais e digitais que desenvolvam inovações diretamente mobilizáveis ou que possam ser adaptadas, de forma útil, ao mundo marítimo;

Indústrias marítimas 4.0

33.

recorda os desafios para a indústria 4.0 decorrentes da transição ecológica e energética, do desempenho industrial, da digitalização, designadamente dos processos de produção, bem como das iniciativas de cooperação no âmbito das cadeias de valor locais e europeias; apoia, a este respeito, o objetivo «Green Shipyard 2050» para estaleiros navais exemplares na transição ecológica e energética;

34.

recorda igualmente que a formação ao longo da vida, o desenvolvimento e a qualidade do emprego, as condições de trabalho, bem como a mobilização da experiência e da criatividade dos trabalhadores, são indissociáveis dessa transformação industrial;

35.

considera que as inovações e os investimentos produtivos nesta matéria devem constituir uma prioridade da política europeia de apoio às indústrias marítimas e concentrar-se principalmente nas PME;

36.

salienta que a cooperação entre os setores civil e militar permite estimular o progresso de forma partilhada, ao facilitar, nomeadamente — e nos dois sentidos —, a transferência de tecnologia e conhecimentos, bem como a mobilidade das competências humanas;

37.

assinala os benefícios de incentivar a transição das empresas de petróleo e gás ao largo e as suas estratégias de diversificação para outros setores da economia azul; estas empresas dispõem, com efeito, de conhecimentos especializados sobre o meio marinho, de um domínio exemplar de projetos longos e complexos e de competências preciosas para contribuir para o desenvolvimento das indústrias marítimas (navios de apoio, robótica submarina, sistema de ancoragem, sistemas de automatização, etc.). Poderiam reinvestir, de forma útil e coletiva, uma parte dos lucros provenientes dos hidrocarbonetos nos fundos de investimento na economia azul e nas energias marinhas renováveis;

38.

salienta que a revolução tecnológica significa que os navios deixam de ser unidades analógicas para passarem a ser plataformas de transporte digitalizadas, com a possibilidade de uma maior integração e interligação dos vários sistemas digitais. Isso altera os métodos de trabalho do setor, no que diz respeito, por exemplo, à interação entre os navios e os escritórios em terra, ao contacto entre navios e entre estes e as autoridades. A esse nível, importa que as indústrias marítimas e as autoridades europeias estejam recetivas às possibilidades criadas pela digitalização face à concorrência internacional;

39.

salienta a necessidade absoluta de ter em conta e apoiar a digitalização e, de forma mais geral, as novas tecnologias da inteligência artificial no domínio da inovação marítima;

40.

propõe que os programas de apoio e financiamento tenham em conta uma série de temas, não só tecnológicos, mas também específicos ao desenvolvimento de novos serviços, como os veículos autónomos submarinos, ou os serviços de vigilância marítima e de manutenção preditiva, em que os compromissos contratuais em termos de resultados e desempenho se estão a tornar cada vez mais importantes em relação aos compromissos em termos de recursos. Deve ainda promover-se a criação de plataformas que permitam assegurar a convergência de diferentes tecnologias de vigilância marítima, de diferentes Estados-Membros, de modo a aumentar a interoperabilidade das atividades de vigilância, melhorar a eficácia das operações no mar, facilitar a aplicação da legislação e das políticas da UE nesta matéria e, consequentemente, promover um melhor controlo do espaço marítimo europeu;

Emprego, competências e formação

41.

reconhece a importância de estimular o diálogo social setorial e de organizar a relação entre o emprego e a formação nas indústrias marítimas; apela para a criação de plataformas específicas que cumpram essas tarefas não só no âmbito do transporte marítimo e dos biorrecursos, como também da indústria transformadora e da construção naval. Chama-se a atenção, em particular, para a necessidade de adaptar e promover a formação no domínio marítimo e das pescas, para que se torne um elemento de apoio à renovação geracional na pesca, na aquicultura e na apanha de marisco, bem como de adaptar e incentivar a formação universitária para os oficiais da marinha mercante. De igual modo, considera-se necessário estabelecer um sistema que assegure a eficácia dos programas de formação e uma formação adequada dos formadores;

42.

sublinha que o desenvolvimento das atividades no mar exige uma mobilização dos trabalhadores com fortes competências marítimas ou uma formação complementar importante dos que não conheçam a vida no mar. Neste sentido, torna-se evidente a necessidade de realizar campanhas junto dos jovens, a fim de atrair talentos e de integrar novos profissionais no setor das indústrias marinhas, da marinha mercante e das pescas, tanto nas atividades em terra como no mar;

43.

congratula-se com os progressos realizados graças à adoção das recentes diretivas relativas ao destacamento de trabalhadores, que são muito relevantes para o setor marítimo, e apela para a criação de um sistema de reconhecimento das qualificações profissionais, e não apenas de diplomas e certificados, para aplicar plenamente o princípio de salário igual para trabalho igual;

44.

considera que a mobilidade dos trabalhadores na UE constitui um fator positivo para organizar, tão eficazmente quanto possível, as cadeias de valor das indústrias marítimas e para fazer face às evoluções da atividade. Este objetivo deve ser prosseguido, preservando e reforçando simultaneamente as competências necessárias para satisfazer as necessidades das empresas, primeiro a nível local e, em seguida, a nível europeu;

III)   Uma abordagem e propostas específicas para os grandes setores das indústrias marítimas

Digitalização das indústrias marítimas

45.

salienta a necessidade absoluta de ter em conta e apoiar a digitalização e, de forma mais geral, as novas tecnologias da inteligência artificial no domínio da inovação marítima;

propõe que os programas de apoio e financiamento tenham em conta uma série de temas, não só tecnológicos, mas também específicos ao desenvolvimento de novos serviços, como os veículos autónomos submarinos, ou os serviços de vigilância marítima e de manutenção preditiva;

Bioeconomia azul

46.

salienta o potencial promissor, mas ainda mal qualificado, do setor da bioeconomia azul, com múltiplas aplicações nos mercados (alimentação humana e animal, farmacologia, cosmética e energia) e fortes impactos territoriais; defende que se deve dar prioridade aos setores económicos mais maduros e mais importantes: pescas, aquicultura e culturas marinhas;

47.

congratula-se com a mobilização em torno deste setor emergente, designadamente através do «Blue Bioeconomy Forum» [Fórum da Bioeconomia Azul] liderado pela DG MARE; considera que, após uma fase de grande investimento em I&D, deverá ser dada prioridade à industrialização e comercialização de novos processos que tenham sido experimentados e testados em pequena escala;

48.

espera que se dê mais prioridade a este setor investindo em toda a sua cadeia de valor, desde a extração ou da produção controlada dos biorrecursos até à fase de transformação e de valorização dos produtos;

49.

propõe, para o efeito, a criação de ligações com setores marítimos mais maduros, como a pesca e a aquicultura, tendo em vista a cadeia a jusante de valorização e transformação dos produtos da pesca, que proporciona o maior valor acrescentado;

50.

salienta a importância da economia circular marítima para acompanhar o desenvolvimento da bioeconomia azul (aplicação de um nível zero de devoluções na pesca, recuperação de detritos da linha de baixa-mar, resíduos da valorização das algas, tratamento de resíduos e de plásticos, etc.);

51.

insta a União Europeia a apoiar a exploração de todos os mares e oceanos do mundo, em particular para reforçar o conhecimento do meio marinho e a ciência do clima (ciclo do carbono e absorção de CO2, acidificação e aumento do nível das águas, etc.) e para classificar as diversas reservas energéticas e não energéticas, de modo a avaliar melhor o potencial dos recursos marinhos (energia geotérmica, minerais estratégicos, etc.);

Construção naval civil e militar

52.

frisa o caráter estratégico do investimento europeu em fatores de diferenciação no setor da construção naval, como os referentes à digitalização e à transição ecológica e energética. O objetivo é melhorar a nossa competitividade e reconquistar quotas de mercado através da inovação. As questões de financiamento também são essenciais para a construção naval;

53.

chama a atenção para os novos mercados relacionados com estas transições: integração de sistemas de propulsão ecológica nos navios, sistemas inovadores de propulsão sem emissões de carbono (novos modelos de vela), abastecedores de navios, ferries elétricos, navios afetos ao transporte de mercadorias a curta distância, navios de serviço portuários e costeiros, etc.;

54.

sublinha a importância de reforçar as relações e a cooperação local entre os portos e as suas cadeias de cocontratação no âmbito dos polos de atividades marítimas; frisa igualmente a necessidade de apoiar os setores da construção e da reparação navais, que contam um número significativo de pequenas e médias empresas; defende um apoio específico para as cadeias de valor no setor transformador, que representa 50% da quota do mercado mundial e tem o dobro do volume de negócios da própria construção naval. Na sua política comercial e de financiamento, a UE deve igualmente promover a utilização de equipamentos europeus em navios construídos fora da UE;

55.

encoraja a realização, no âmbito do «European Sea Tech», de um trabalho sistemático de inclusão de novos intervenientes nas cadeias de valor do setor da construção naval, o que pode contribuir para aumentar a capacidade de produção, a mobilização de competências e a competitividade europeia;

56.

salienta que a reparação naval e a construção de pequenas embarcações são atividades industriais estratégicas para as regiões ultraperiféricas, uma vez que as frotas e as estruturas flutuantes que operam nas suas águas estão sujeitas a condições de insularidade e de afastamento em relação ao continente europeu, o que afeta fortemente a logística, a manutenção e a substituição das unidades de pequena dimensão; por conseguinte, a fim de apoiar um crescimento eficiente das atividades marítimas nestas regiões, deve dar-se apoio específico a estas atividades industriais;

57.

considera que as questões marítimas devem ser colocadas no cerne de novas políticas de defesa e segurança, que exigirão uma atenção especial à construção naval militar; para o efeito, propõe que seja tido mais em conta o apoio à criação de tecnologias de dupla utilização que possam ser aplicadas tanto no setor civil, como militar;

58.

salienta a necessidade de reforçar a capacidade das frotas que realizam missões de soberania de vigilância e segurança; considera que estas missões de soberania devem ser asseguradas por navios construídos na Europa; estima que a organização adequada destas missões, nomeadamente no contexto do Brexit e dos desafios migratórios, se deve basear nas frotas nacionais existentes, em estreita colaboração com a Frontex, e reclama um esforço de solidariedade europeu para apoiar os países mais envolvidos nestas missões de grande interesse comum;

Energias renováveis marítimas

59.

considera que as energias marinhas renováveis constituem um setor com elevado potencial não só para contribuir de forma significativa para a produção de energia renovável, mas também para estruturar uma cadeia de valor industrial, que em muitas regiões cria postos de trabalho locais sustentáveis, e ter êxito em termos de exportações, e recorda que a execução de projetos no mar deve ser feita de forma respeitadora do ambiente e compatível, ou mesmo em sinergia, com as atividades existentes;

60.

sublinha a tendência particularmente notável de redução dos custos registada, na Europa, no setor da energia eólica ao largo a partir de turbinas fixas, após a instalação dos primeiros parques em 1991 e, sobretudo, graças à estruturação de um setor industrial europeu produtivo nos últimos 10 anos;

61.

recorda a importância da reparação e do controlo técnico dos navios, bem como o facto de que as embarcações serão desmanteladas quando atingirem o seu fim de vida útil. Por conseguinte, recomenda à Comissão que elabore um plano específico com o objetivo de dotar a UE de instalações suficientes para a correta realização dessas tarefas, prevendo igualmente as verbas orçamentais necessárias para tal;

62.

salienta que um maior desenvolvimento deste setor implicará prosseguir os esforços levados a cabo a nível europeu, em particular em termos de I&D (mais de 3 mil milhões de euros de investimento), exigindo, no entanto, escolhas políticas claras que incumbem principalmente aos Estados-Membros: estabelecimento de volumes e calendários ambiciosos para os concursos, não só para a energia eólica fixa, que atualmente é o subsetor mais desenvolvido, mas também para as novas tecnologias, tais como turbinas eólicas flutuantes, a energia maremotriz ou ainda a energia ondomotriz, que necessitam urgentemente de demonstrar uma rentabilidade suficiente e garantida para desencadear o investimento e dar início à sua industrialização;

63.

incentiva a criação, a nível europeu, de instrumentos específicos de apoio ao investimento, mas também de instrumentos de garantia de projetos e de gestão do risco. A criação de tais instrumentos poderia reduzir significativamente o custo do financiamento e, por conseguinte, reduzir mais rapidamente o preço de custo da eletricidade produzida;

64.

congratula-se com os progressos significativos realizados nos últimos anos no teste, em condições reais, de protótipos e demonstradores de tecnologias emergentes, em particular no setor da energia maremotriz, com perspetivas de redução dos custos cada vez mais controladas e credíveis, suscetíveis de justificar o arranque do mercado através de tarifas de aquisição adaptadas, reforçando, assim, a liderança mundial dos intervenientes europeus;

65.

apela com veemência para que a Europa fixe como objetivo tornar-se líder mundial do setor das turbinas eólicas flutuantes e recomenda à Comissão Europeia e aos Estados-Membros que ponderem lançar concursos coordenados ou conjuntos, para proporcionar ao mercado maior visibilidade e volume. Poderia ser adotada uma abordagem semelhante para as energias maremotriz e ondomotriz para parques-piloto em fase pré-comercial;

66.

destaca a importância de adotar uma abordagem específica nas zonas não interconectadas, especialmente em territórios insulares, que proponha soluções globais de autonomia energética descarbonizada que conjuguem as tecnologias, nomeadamente as energias marinhas renováveis, em função das características de cada território; neste contexto, há que redobrar de esforços com vista ao desenvolvimento de máquinas de potência média;

67.

propõe que o desenvolvimento destas soluções de autonomia energética seja igualmente testado e validado em projetos de estruturas ao largo polivalentes, projetos estes que fazem antever uma «maritimização» crescente não só das atividades industriais, mas também, no futuro, da vida humana em sentido lato; de notar que estas perspetivas a mais longo prazo terão necessariamente de satisfazer exigências rigorosas em termos de sustentabilidade e impacto ambiental ao longo de todo o ciclo de vida dos projetos;

IV)   Os portos, um importante desafio para a dinâmica das indústrias marítimas

Plataformas portuárias e infraestruturas portuárias, costeiras e ao largo

68.

chama a atenção para o facto de os portos, tendo em conta a integração de atividades e o seu potencial, terem capacidade para ser espaços de desenvolvimento de projetos de crescimento azul. Poderão servir de exemplo para o seu alargamento a todas as regiões costeiras;

69.

insta a que, independentemente do seu estatuto, se continue a considerar os portos como ativos estratégicos em que o Estado deve investir, e a que as regras de concorrência e de controlo dos auxílios estatais permitam tais investimentos;

70.

sublinha a necessidade de apoiar, com financiamento da UE, as infraestruturas portuárias das regiões ultraperiféricas, considerando a ausência de alternativas para o transporte de mercadorias e tendo em conta que os auxílios estatais a essas infraestruturas não constituem, pela sua dimensão puramente local, distorções de concorrência no mercado interno da UE;

71.

salienta que a função de um porto é ser ao mesmo tempo uma plataforma de transporte marítimo e acolher as indústrias marítimas e as atividades de inovação e formação associadas; chama a atenção para o fator de atratividade regional proporcionado pelos portos, ao atraírem novas atividades industriais para o próprio território e o espaço circundante;

72.

destaca a importância dos setores da logística e dos serviços marítimos nos portos; salienta a necessidade de desenvolver, para além das inovações técnicas, novos modelos de negócios e de serviços nos portos, baseados, por exemplo, na sua digitalização progressiva (portos inteligentes) e no potencial para melhorar e otimizar os processos através da valorização dos dados (megadados);

73.

recomenda a promoção de uma melhor articulação dos portos com a sua envolvente urbana, sem pôr em causa a autonomia de decisão das comunidades portuárias e procurando preservar o património imobiliário dos portos, a fim de possibilitar o seu desenvolvimento futuro;

74.

propõe a criação, no âmbito do projeto «European Sea Tech», de uma rede de portos que contribuem para o desenvolvimento da economia azul, com base nos trabalhos do Fórum Europeu dos Portos e dos seus subgrupos «Portos e Plataformas para o Crescimento Azul» e «Portos Verdes»;

75.

sublinha a importância da intervenção da engenharia civil e ambiental nos portos e zonas costeiras para o ordenamento das áreas construídas e do litoral, bem como para o acompanhamento da adaptação às alterações climáticas;

76.

propõe que os portos se tornem locais de incubação e, eventualmente, operadores de novos projetos de infraestruturas ao largo, quer se tratem de portos ao largo quer, de forma mais geral, de plataformas mutualizadas para as atividades da economia azul (transbordo, plataforma logística, produção de energias marinhas renováveis, aquicultura, reparação naval, base científica, etc.);

77.

propõe que se lance uma reflexão sobre o papel funcional dos portos ditos «secundários», entre a especialização em mercados de volume reduzido e o reforço/a complementaridade com os grandes portos industriais limítrofes;

A descarbonização dos portos e do transporte marítimo

78.

entende que é urgente reforçar o apoio ao investimento nos portos para o abastecimento de GNL dos navios e mais globalmente para infraestruturas que contribuam para diminuir a pegada ecológica dos navios (ligação elétrica a terra quando o navio está atracado, com base em tecnologias de baixas emissões); considera que esta transição para combustíveis mais limpos ou novos vetores energéticos é prioritária para o cumprimento dos objetivos de redução das emissões de gases com efeito de estufa e de gases nocivos para a saúde humana e que os armadores devem receber apoio para adaptarem e renovarem as suas frotas; salienta que o biogás produzido a partir de biorrecursos (vegetais, agrícolas e alimentares) pode também contribuir para a cadeia de valor do GNL, permitindo reduzir ainda mais as emissões de gases com efeito de estufa em comparação com as atuais soluções;

79.

propõe que se avalie a oportunidade de criar um «corredor azul de GNL para as ilhas europeias e as regiões ultraperiféricas», em conformidade com a Resolução do Parlamento Europeu, de 25 de outubro de 2018, sobre a criação de uma infraestrutura para combustíveis alternativos na União Europeia: é tempo de agir! [2018/2023(INI)];

recorda, neste contexto, a necessidade de instrumentos financeiros adequados para apoiar esse tipo de investimentos, que continuam a ser relativamente elevados nestas áreas;

80.

chama a atenção para a necessidade de apoiar a investigação e o desenvolvimento relativamente à aquicultura em mar aberto, integrando os conhecimentos existentes de engenharia oceânica em águas profundas e da indústria 4.0, como forma de reduzir a presença de explorações aquícolas estabelecidas em zonas marítimas costeiras, em benefício de outras atividades da economia azul que necessitam de utilizar esse mesmo espaço marinho;

81.

indica que as atividades de investigação e desenvolvimento abrem a porta a uma eventual utilização de combustíveis sintéticos líquidos fabricados a partir da cadeia de valor do carbono e das energias renováveis; considera que esta possibilidade deve ser explorada com prudência e que estas tecnologias devem dar provas de que são competitivas relativamente a outras soluções alternativas, têm uma pegada ecológica reduzida e contribuem positivamente para a luta contra o efeito de estufa em todo o ciclo; observa que, por enquanto, ainda não se apresentaram tais provas;

82.

reconhece que o recurso ao GNL é transitório e apela para o desenvolvimento do abastecimento elétrico dos navios a partir dos portos e da utilização futura de navios elétricos, para a mobilização da energia solar e eólica nos navios e para a promoção da produção e de uma utilização competitiva do hidrogénio de origem renovável no transporte marítimo (em associação com o desenvolvimento das energias renováveis marítimas e, em especial, das fontes com forte potencial de produção, como a energia eólica ao largo a partir de turbinas fixas ou flutuantes);

83.

neste sentido, apela para o desenvolvimento de uma infraestrutura de redes inteligentes nos portos, que é necessária para a integração de fontes de energia elétrica renováveis e a implantação de sistemas de abastecimento elétrico a partir da costa, da mobilidade elétrica e de outras tecnologias relativas às redes inteligentes.

Bruxelas, 27 de junho de 2019.

O Presidente

do Comité das Regiões Europeu

Karl-Heinz LAMBERTZ


(1)  NAT-V-044 – A inovação na economia azul: materializar o potencial de crescimento e de emprego nos nossos mares e oceanos — relator: Adam Banaszak.

(2)  https://www.eesc.europa.eu/en/our-work/opinions-information-reports/opinions/leadership-2020-maritime-technology