8.5.2018   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 164/45


Parecer do Comité das Regiões Europeu — Revitalização das zonas rurais através de aldeias inteligentes

(2018/C 164/08)

Relator:

Enda STENSON (IE-AE), membro do Conselho do Condado de Leitrim

RECOMENDAÇÕES POLÍTICAS

O COMITÉ DAS REGIÕES EUROPEU

1.

acolhe com agrado a iniciativa da Comissão Europeia sobre a ação da UE para as aldeias inteligentes, como reconhecimento da necessidade de adotar medidas específicas que visem apoiar a revitalização das zonas rurais, enquanto locais sustentáveis para viver e trabalhar; observa que o aumento da prosperidade rural e a viabilidade das zonas rurais figuram entre as tarefas mais urgentes, uma vez que um desenvolvimento territorial mais equilibrado pode constituir a base para alcançar uma maior sustentabilidade socioeconómica e ambiental;

2.

observa que o documento da Comissão Europeia e a intervenção dos comissários para a Agricultura e o Desenvolvimento Rural, para a Política Regional e para a Mobilidade e os Transportes constituem uma base sólida para garantir a adoção de uma abordagem coordenada e transversal na elaboração desta iniciativa;

3.

lamenta, contudo, a falta de ambição delineada neste documento, que representa uma compilação de iniciativas já existentes; apela a uma maior ambição e à elaboração de uma política das aldeias inteligentes assestada e virada para o futuro, que vise o período pós-2020 e atenda à necessidade de consolidar os numerosos instrumentos «inteligentes» da UE de base local;

4.

salienta que, para que esteja em vigor no próximo período de financiamento um programa para aldeias inteligentes sustentável e eficaz, os trabalhos preparatórios devem ser realizados agora, devendo também ser considerada uma melhor coordenação e melhores sinergias entre a política da UE pertinente e as fontes de financiamento através do desenvolvimento de uma política integrada e de um instrumento de apoio às aldeias inteligentes;

5.

chama a atenção para a importância de uma estreita coordenação a todos os níveis de governação, com o devido respeito pelo princípio da subsidiariedade, a fim de definir soluções de abordagem ascendente e de base local; sublinha o papel fundamental dos órgãos de poder local e regional na aplicação do quadro estratégico;

6.

propõe o alargamento do conceito de «aldeias inteligentes» para «zonas rurais inteligentes» e a integração da iniciativa na agenda rural europeia, de modo a também favorecer e desenvolver as sinergias entre aldeias limítrofes no âmbito das zonas rurais inteligentes;

7.

apoia, neste contexto, a importância da Declaração de Cork 2.0, que estabelece um quadro para o reforço da política rural e agrícola, e apoia firmemente as dez orientações políticas identificadas, incluindo o reconhecimento da necessidade de dar uma atenção especial à superação do fosso digital (1);

8.

salienta que a revitalização das zonas rurais deve servir para superar o desafio a longo prazo do despovoamento, através de medidas que visem promover e apoiar a sustentabilidade, a renovação geracional e a capacidade das zonas rurais para atrair novos habitantes;

9.

convida a Comissão a prever medidas simples, facilmente reproduzíveis e acessíveis também a municípios de dimensão muito pequena, que amiúde não dispõem de uma estrutura suficiente para conseguirem pôr facilmente em prática medidas «inteligentes»;

10.

propõe que seja dada especial atenção aos desafios enfrentados pelas regiões rurais periféricas que, para além da infraestrutura de banda larga, se deparam com desafios críticos relacionados com os transportes e a conectividade energética, o que resulta na falta de acesso aos serviços públicos mais importantes; considera que o conceito de «verificação rural» (2) (rural proofing) deve ser integrado na iniciativa para as zonas rurais inteligentes, com vista a aplicar esta abordagem na elaboração de iniciativas estratégicas mais amplas com implicações para as zonas rurais;

11.

sublinha que as regiões fronteiriças periféricas enfrentam dificuldades crescentes, e assinala a necessidade de reforçar as possibilidades de cooperação transfronteiriça e os programas destinados a fazer face a estes desafios;

Redução do fosso digital

12.

salienta que a oferta de serviços digitais e a capacidade de operar corretamente numa economia globalizada exigem ligações de banda larga rápidas e fiáveis. As infraestruturas TIC são, por conseguinte, um fator determinante no potencial de desenvolvimento das regiões na União;

13.

reitera, por isso, o ponto de vista de que devem ser envidados esforços no sentido de garantir a mesma capacidade de rede de telecomunicações de alta velocidade em toda a UE, como condição prévia indispensável para a competitividade e o crescimento económico das zonas rurais, de acordo com os objetivos estabelecidos na Agenda Digital para a Europa 2020 (3);

14.

lamenta que os progressos continuem a ser insatisfatórios e desiguais, persistindo disparidades, nomeadamente entre as regiões urbanas e rurais. A dimensão do desafio é visível na medida em que 9,1 milhões de agregados familiares da UE, dos quais 90 % em zonas rurais, em 2012, ainda não estavam cobertos por redes fixas de banda larga (4);

15.

observa que, a nível da UE, o objetivo é ter, até 2020, uma ligação com velocidade superior a 30 megabytes por segundo, em toda a Europa, incluindo nas zonas mais rurais e isoladas. No entanto, trata-se apenas de uma média da UE, com grandes variações em função dos países e dos locais, nomeadamente nas regiões rurais e mais remotas, que por vezes, mesmo em Estados-Membros economicamente prósperos, têm velocidades de 10 megabytes por segundo. Este é o padrão normal para que um agregado familiar típico possa beneficiar dos serviços em linha mais populares. A falta de banda larga suficiente é atualmente um sério desafio para a coesão territorial. Exorta a Comissão Europeia a intensificar os esforços no sentido de desenvolver Internet de alta velocidade nas zonas rurais, através de modelos de financiamento acessíveis que não restrinjam o acesso de alguns Estados-Membros a fundos para o investimento em redes de banda larga, e a apoiar o acesso ao financiamento para o investimento em redes de banda larga para os projetos de pequena dimensão; além disso, solicita que se destine crédito especificamente ao desenvolvimento da banda larga nas zonas rurais e que o mesmo não possa ser utilizado noutras medidas;

16.

a fim de cumprir a promessa da iniciativa para as aldeias inteligentes, recomenda, vivamente, o reconhecimento do acesso à Internet como um serviço de interesse público, ao nível da UE e, se adequado, ao nível nacional, estabelecendo normas mínimas aceitáveis para a banda larga que, para além de garantirem um acesso fiável à Internet, possam também evitar futuras alterações na prestação de serviços (incluindo a supressão das linhas telefónicas de cobre e a introdução da tecnologia sucessora 4G), e que se assegure a prestação de serviços de emergência, nomeadamente para as comunidades isoladas do ponto de vista digital, como é já o caso na Suíça e na Finlândia, onde o acesso é garantido até ao último quilómetro. Pelo menos, esta deveria ser uma condicionalidade ex ante associada aos financiamentos concedidos às aldeias inteligentes;

17.

assinala que é importante que a tecnologia associada às iniciativas para as aldeias inteligentes se desenvolva recorrendo a normas abertas, o que promoverá a colaboração entre as administrações e as empresas, bem como a reutilização das soluções criadas, além de favorecer a interoperabilidade das mesmas;

18.

apoia a oferta de formação, destinada a diferentes faixas etárias da população, sobre a utilização das tecnologias digitais, e a adaptação do método de ensino ao público-alvo, tendo em vista a digitalização de determinados serviços públicos, a nível local ou a outros níveis (pedidos de documentos, declarações de rendimentos, faturas eletrónicas, rastreabilidade, PAC, etc.); reivindica, por outro lado, o direito à literacia digital, de modo a garantir a todos os cidadãos o acesso a esta formação — que deve ser financiada pelos Fundos Europeus Estruturais e de Investimento — para o desempenho de tarefas básicas no novo contexto digital;

19.

considera que a extensão da banda larga nas zonas rurais e o desafio do acesso até ao último quilómetro estão diretamente ligados à posição dominante no mercado e aos fornecedores tradicionais. Esta questão só será resolvida quando o quadro regulamentar incentivar a entrada de operadores alternativos que instalem redes de acesso da próxima geração (NGA) e encorajar o desenvolvimento da inovação dirigida pela comunidade;

20.

considera que os agricultores e o setor agrícola em geral devem ser um grupo prioritário para a formação digital, com vista a facilitar a aceitação e a conceção de ferramentas e métodos para a agricultura digital (e-farming);

21.

recomenda que se reforcem os recursos destinados à formação e sensibilização para as oportunidades que o atual contexto da economia digital oferece às empresas rurais, nomeadamente o acesso a novos mercados, o desenvolvimento de novos produtos ou a fidelização de clientes;

22.

reconhece a existência de diversas iniciativas para plataformas digitais, atualmente ativas em vários Estados-Membros, onde a banda larga de alta velocidade, embora não esteja presente em todas as habitações rurais, é disponibilizada em centros especializados (5);

23.

reconhece os benefícios adicionais destas plataformas, que vão além da mera superação do fosso digital, contribuindo para redefinir os espaços públicos em colaboração com a coletividade (placemaking), revitalizar os centros das povoações, criar postos de trabalho e proporcionar oportunidades de formação para as populações rurais;

24.

reconhece que estas plataformas podem atuar como potenciais âncoras para outros serviços em linha, como a saúde em linha (por exemplo, consultas em linha), o Direito em linha (nomeadamente, aconselhamento jurídico), a governação eletrónica (por exemplo, o voto eletrónico, declarações de rendimentos e pedidos de subsídios por via eletrónica), o comércio eletrónico (por exemplo, a banca e vendas em linha, etc.);

Cidades inteligentes e zonas rurais inteligentes

25.

considera que, tal como o modelo de cidade inteligente, a iniciativa para as zonas rurais inteligentes deve adotar uma abordagem alargada do desenvolvimento e da inovação, que inclua as seguintes seis dimensões:

a)

uma economia inteligente, inovadora, empreendedora e produtiva;

b)

uma maior mobilidade, com redes de transportes acessíveis, modernos e sustentáveis;

c)

uma visão de ambiente e de energia sustentável;

d)

cidadãos qualificados e empenhados;

e)

qualidade de vida em termos de cultura, saúde, segurança e educação;

f)

uma administração eficaz, transparente e ambiciosa;

26.

acolhe com agrado o novo regime Wifi4EU para melhorar a conectividade à Internet nas comunidades locais, observando contudo que os projetos serão selecionados por ordem de chegada mas de forma equilibrada a nível geográfico. Na seleção de projetos, deve ser dada atenção às barreiras adicionais com que se deparam os órgãos de poder nas zonas rurais de menor dimensão, que dispõem de menos recursos do que as cidades;

27.

salienta que os conceitos de «cidade inteligente» e de «aldeias inteligentes/zonas rurais inteligentes» não devem ser contraditórios, mas antes ser considerados como mutuamente complementares, em que cada um apoia e reforça o êxito do outro. Em termos estratégicos, uma zona não termina nas suas fronteiras administrativas, mas interage com as entidades vizinhas, rurais ou urbanas, e planeia o seu desenvolvimento em harmonia com o seu ambiente. Há que ponderar a criação de inter-relações positivas entre as populações rurais e urbanas e não apenas tornar as zonas rurais prestadoras de serviços para as zonas urbanas. Sublinha, a este respeito, que todo o sistema de povoações só será viável se todos os seus elementos forem viáveis, das grandes cidades às pequenas aldeias;

28.

reconhece, no entanto, que é importante identificar as diferentes características de cada modelo, nomeadamente que o modelo de cidade inteligente dispõe de muitos intervenientes para promover e estimular iniciativas, ao passo que tal não é o caso nas zonas rurais, onde os recursos, quer em termos de população quer em termos de capacidade administrativa, são, em geral, mais limitados. Estas diferenças devem refletir-se na conceção de um futuro quadro estratégico e nas oportunidades de financiamento;

29.

constata que a Direção-Geral da Energia da Comissão lançou uma Parceria Europeia de Inovação para Cidades e Comunidades Inteligentes, que visa promover e reforçar as experiências das zonas inteligentes na UE; lamenta que, até à data, as zonas rurais não tenham sido incluídas como uma prioridade no âmbito deste trabalho;

Mobilidade e energia

30.

considera que, na elaboração da iniciativa para as aldeias inteligentes/zonas inteligentes, a conectividade e as redes de transportes sustentáveis são tão fundamentais como a melhoria da conectividade digital, tendo em conta os desafios específicos que as zonas rurais enfrentam em termos de dispersão da população e custos mais elevados; observa que o documento da Comissão Europeia sobre aldeias inteligentes faz referência ao Mecanismo Interligar a Europa (MIE) como sendo uma área de apoio da UE para aldeias inteligentes, e solicita mais pormenores sobre a forma como este financiamento poderá ser utilizado para apoiar a conectividade das zonas rurais, em particular das regiões rurais mais periféricas;

31.

recorda as oportunidades económicas, sociais e ambientais que advêm da produção de energia (tanto eletricidade como calor) a nível local e as sinergias que, neste contexto, poderão ser criadas com o desenvolvimento regional e rural através da PAC (2.o pilar). São exemplos disso o papel da energia eólica e solar, da biomassa e do biogás para a produção de eletricidade, bem como o papel da biomassa (por exemplo, madeira) e/ou do biogás para o aquecimento local; sublinha a importância de conferir aos órgãos de poder local e regional a iniciativa e a gestão de medidas agroambientais específicas, permitindo-lhes a celebração de contratos territoriais com os fornecedores rurais de fontes de combustível/eletricidade de produção local (6);

Apoio a abordagens ascendentes

32.

reconhece os êxitos conseguidos através de abordagens ascendentes no desenvolvimento local, tais como a LEADER e, mais recentemente, o desenvolvimento local de base comunitária;

33.

acredita, no entanto, que pode haver uma dependência excessiva dessas abordagens e que outros intervenientes (por exemplo, mediadores da inovação) podem catalisar o potencial das zonas rurais. O mediador da inovação atua para identificar os pontos fortes e as oportunidades da aldeia/zona rural e aproximar as instituições relevantes (terceiro nível, órgãos de poder local, fontes de financiamento, etc.) para coordenar as atividades atuais e futuras e as potenciais fontes de financiamento. Deve envolver e informar a comunidade e obter a sua adesão para desenvolver a visão, apropriar-se da iniciativa e partilhar os seus benefícios;

34.

entende que tais mediadores podem incentivar o desenvolvimento de produtos por pequenas empresas e contornar as barreiras de acesso ao mercado, bem como promover o consumo local e cadeias curtas de distribuição dos produtos agroalimentares e produtos de energias renováveis locais;

35.

considera que os órgãos de poder local e regional estão numa posição privilegiada para desempenhar esta função e, em alguns casos, já o fazem sob a forma de conselhos de desenvolvimento, gabinetes de empresas, concursos públicos, etc.;

36.

considera essencial facultar o acesso ao financiamento para projetos de pequena dimensão acessíveis ao nível local. Tal deve incluir também o apoio a projetos e iniciativas inovadoras que possam ser adaptados às necessidades específicas das comunidades rurais em toda a UE, incluindo as regiões periféricas;

37.

apela à simplificação da candidatura de acesso a fontes de financiamento, uma vez que, no atual programa de desenvolvimento rural, o número de manifestações de interesse que não evolui para candidaturas completas é significativo devido à dificuldade em satisfazer os requisitos de candidatura; salienta que não deve haver um intervalo entre o término destes programas de desenvolvimento rural e o início do programa de desenvolvimento rural pós-2020, a fim de preservar a dinâmica e a confiança;

38.

sugere que as candidaturas que recebam efetivamente financiamento devem encorajar a criação de redes, de polos e de núcleos de cooperação, assim como a participação nesses grupos, o que é geralmente necessário nas zonas rurais inteligentes para criar um efeito de escala e fomentar a aprendizagem;

39.

sugere que as zonas inteligentes devem basear-se no seu património sociocultural, a fim de desenvolver e manifestar um sentido de pertença único com todas as infraestruturas, especialmente os serviços gerais, necessárias para explorar uma atividade comercial, e atrair a relocalização de empresas urbanas;

40.

reconhece que um outro desafio para os órgãos de poder local e regional é manterem-se informados sobre as oportunidades de financiamento e terem acesso às mesmas. Tal exigirá um papel ativo por parte das direções-gerais pertinentes da Comissão Europeia e das autoridades de gestão dos fluxos de financiamento pertinentes da UE a nível nacional e regional. O CR pode também desempenhar um papel importante na partilha de informação, apoiando redes e fornecendo exemplos de boas práticas, nomeadamente através do trabalho da plataforma para a banda larga, criada pelo CR e pela Comissão Europeia;

41.

considera que a criação, pela Comissão Europeia, de um prémio anual para reconhecer os desempenhos da aldeia inteligente/zona inteligente mais bem-sucedida na UE contribuiria para uma comunicação mais eficaz das oportunidades disponíveis a nível da UE. As redes existentes, como a rede europeia de empresas, e os seus parceiros de execução locais nos Estados-Membros poderiam também ser utilizados para fornecer informações atualizadas sobre vários temas pertinentes para os empresários em aldeias e zonas rurais;

42.

salienta o papel de facilitador que os órgãos de poder local e regional podem ter através da integração de uma abordagem inteligente nas estratégias de planeamento e de ordenamento do território regionais. Essas estratégias incluem a avaliação dos recursos e capacidades regionais, a identificação de locais para a instalação de serviços e medidas destinadas a estimular a economia.

Bruxelas, 1 de dezembro de 2017.

O Presidente do Comité das Regiões Europeu

Karl-Heinz LAMBERTZ


(1)  Declaração de Cork 2.0, ponto 3.

(2)  Verificação rural (rural proofing): garantir que as necessidades e os interesses das populações, comunidades e empresas rurais são devidamente tidos em conta aquando da elaboração e aplicação de todas as políticas e programas. Para o governo central, «verificação rural» significa avaliar as opções estratégicas no sentido de assegurar que são adotadas as soluções mais justas para as zonas rurais.

(3)  Parecer do Comité das Regiões Europeu sobre «Inovação e modernização da economia rural» (JO C 120 de 5.4.2016, p. 10).

(4)  Sexto relatório sobre a coesão económica, social e territorial, julho de 2014.

(5)  Por exemplo, Ludgate Hub (IE) e The Hive, em Leitrim (IE).

(6)  Parecer do Comité das Regiões Europeu sobre o tema «Rumo a uma política alimentar da UE sustentável que fomente o emprego e o crescimento nas regiões e municípios da Europa» (JO C 272 de 17.8.2017, p 14).