12.10.2017   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 342/10


Parecer do Comité das Regiões Europeu — A PAC após 2020

(2017/C 342/02)

Relator:

Guillaume Cros (FR-PSE), vice-presidente do Conselho Regional da Occitânia

O COMITÉ DAS REGIÕES EUROPEU (CR)

I.   OBSERVAÇÕES GERAIS

1.

acolhe com agrado a iniciativa da Comissão Europeia de associar o Comité das Regiões Europeu ao exercício de prospetiva relativo à política agrícola comum (PAC) após 2020; observa que a agricultura, a alimentação e os territórios rurais se deparam com grandes desafios, que tornam fundamental reformar a PAC;

2.

salienta que a PAC desempenhou e deve continuar a desempenhar um papel fundamental na construção europeia; os objetivos estabelecidos no artigo 39.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia continuam a ser plenamente aplicáveis no contexto do atual processo de revisão;

3.

assinala que o setor agrícola é o segundo maior setor de emprego industrial da UE, empregando 22 milhões de agricultores e 44 milhões de pessoas no resto da cadeia agroalimentar, abastecendo mais de 500 milhões de europeus com produtos alimentares da mais elevada qualidade a preços acessíveis. O impacto da agricultura no emprego é ainda mais importante se se tiver em conta a produção, reparação e comercialização das máquinas agrícolas, bem como a produção e a comercialização dos insumos agrícolas;

4.

insta a que a PAC se torne uma política agrícola justa, sustentável, solidária e de qualidade ao serviço dos agricultores, dos territórios, dos consumidores e dos cidadãos; considera que só uma política agrícola e alimentar europeia forte e comum pode garantir a segurança alimentar europeia e o dinamismo dos territórios rurais;

5.

observa que os agricultores e os criadores de animais são os principais protagonistas e destinatários da PAC. Sem o seu contributo não é possível aplicar as medidas que se destinam a alcançar os objetivos pretendidos. A PAC deve ter em conta o seu papel e a sua participação, nomeadamente a necessidade de as explorações agrícolas e pecuárias serem economicamente sustentáveis, para que possam ser um meio de subsistência digno, mantendo um mundo rural vivo e com um nível de emprego adequado;

6.

entende que na elaboração da futura PAC haverá que levar em conta os consumidores europeus. A divulgação dos benefícios da PAC, a segurança alimentar e a proteção do ambiente são desafios que cabe partilhar com os consumidores europeus;

7.

estima que, a fim de tornar a agricultura uma profissão atraente e de garantir a segurança e a elevada qualidade da agricultura europeia, a regulação dos mercados permitiria remunerar melhor os agricultores, recorrendo a medidas e instrumentos de gestão públicos e privados que estabilizem os preços agrícolas e impeçam as práticas comerciais desleais; entende que importa reforçar a posição dos agricultores em relação aos restantes intervenientes do setor;

8.

reconhece que a legitimidade da PAC a nível económico, social, ambiental, territorial e internacional é fundamental para a sua sobrevivência. O setor agrícola europeu tem qualidades importantes que formam a base da sua competitividade, como sejam a capacidade de inovação, uma logística e infraestruturas fortes, a grande diversidade, importantes qualidades naturais e histórico-culturais das zonas agrícolas, para além do elevado número de empresas familiares e um espírito empreendedor altamente desenvolvido, bem como produtos resultantes de normas ambientais e sanitárias rigorosas. Todas estas qualidades oferecem potencial e devem ser mais bem aproveitadas através de uma PAC direcionada, a fim de continuar a reforçar a agricultura e as zonas rurais;

9.

reputa urgente reformar a PAC a fim de a tornar mais conforme às expectativas dos cidadãos e de legitimar o seu orçamento, o qual é muito cobiçado num cenário de recursos orçamentais constantes;

10.

está convicto de que o sucesso da PAC se baseia na unidade e que a mesma não deverá evoluir para uma renacionalização, preconizando um reforço das regiões, em conformidade com o princípio da subsidiariedade. Sem prejuízo do seu caráter de política comum, a PAC deve ser flexível e ter em conta as diversas realidades agrícolas, em particular das regiões mediterrânicas e ultraperiféricas;

11.

chama a atenção da Comissão Europeia para o facto de, como aliás o demonstra o aumento da procura neste domínio, os consumidores estarem cada vez mais sensibilizados para os alimentos produzidos localmente, de elevada qualidade e a preço justo, que respeitam as normas em matéria de proteção dos animais, apresentam elevado valor ambiental e social, criam emprego e geram valor acrescentado;

12.

considera que importa reforçar e apoiar a rastreabilidade alimentar dos modos de produção, enquanto garantia de segurança para os consumidores e os produtores;

13.

assinala a falta de atratividade económica da profissão de agricultor em numerosos setores e subsetores de produção, que agrava uma pirâmide etária já muito desfavorável à renovação das explorações (1); considera que a escassez de jovens que se dedicam à agricultura compromete a preservação da agricultura familiar europeia e a vitalidade das zonas rurais; considera essencial adotar medidas de apoio à entrada de jovens agricultores no setor;

14.

observa que a PAC, apesar de dispor de um orçamento considerável, é acompanhada de uma forte redução do emprego agrícola (o número de explorações agrícolas na UE diminuiu 20 % entre 2007 e 2013); constata que o orçamento da PAC tem diminuído nos últimos 30 anos, passando de 75 % para 40 % do orçamento da UE;

15.

recorda que a produção agrícola deve ser promovida pela PAC, como previsto no Tratado, dando aos agricultores meios para obterem o seu rendimento essencialmente através do mercado, a um custo razoável e justificado para os cidadãos e consumidores europeus; realça que vários estudos demonstram que a PAC contribuiu para concentrar a produção agrícola em determinadas regiões em detrimento de outras, o que contraria o objetivo europeu de coesão territorial;

16.

considera que a PAC deve refletir as diversas realidades agroclimáticas da Europa, nomeadamente as das zonas desfavorecidas, como por exemplo a agricultura de pradaria de colinas, a agricultura de montanha, a da bacia mediterrânica, a das regiões setentrionais e a das regiões ultraperiféricas; a PAC deve ter em conta as suas funções de proteção do território e dos solos e de apoio à preservação das comunidades rurais e dos seus valores culturais, bem como em prol da conservação de um sistema social ativo nestas regiões;

17.

recorda que, apesar das advertências do Tribunal de Contas Europeu, a repartição do apoio público da PAC apresenta ainda muitas disparidades entre explorações e entre Estados-Membros; constata que a atribuição de pagamentos diretos com base na superfície conduziu a uma forte concentração das terras agrícolas e dos pagamentos diretos, quando estes deveriam ter mais em conta a diversidade dos modelos agrícolas, o nível de rendimento, o valor acrescentado produzido e os empregos ocupados e procurar manter a agricultura presente em todos os territórios;

18.

constata que um grande número de agricultores dispõe de um rendimento muito baixo, inferior ao limiar de pobreza, que tal contraria o objetivo do Tratado de Roma de «assegurar […] um nível de vida equitativo à população agrícola» (artigo 39.o) e que é necessário aumentar a segurança dos rendimentos agrícolas (preços, ajudas diretas, etc.);

19.

considera que as ajudas da PAC se devem destinar apenas aos produtores que efetivamente exercem a atividade agrícola e não a explorações inativas em que o rendimento agrícola seja negligenciável para os seus titulares;

20.

assinala que os agricultores são muitas vezes obrigados a vender os seus produtos a preços inferiores ao custo de produção, sendo enredados numa espiral de redução dos custos/redução dos preços;

21.

apoia as conclusões do Grupo de Missão para os Mercados Agrícolas da Comissão Europeia, de novembro de 2016, e insta a Comissão a apresentar uma proposta legislativa destinada a combater as práticas comerciais desleais;

22.

constata que a exportação de recursos genéticos da UE, nomeadamente de raças animais, está a contribuir para a erosão genética de raças autóctones importantes, particularmente em países terceiros, e está em contradição com o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável n.o 15 das Nações Unidas, relativo à preservação da biodiversidade, em particular no que diz respeito aos recursos genéticos com implicações para a segurança alimentar;

23.

considera que a regulação dos mercados, como demonstrado pelo estudo do CR sobre o programa de responsabilização dos mercados no setor do leite, é, em muitos setores, mais eficaz e menos dispendiosa do que a ativação de medidas de crise a posteriori e, por conseguinte, permitiria utilizar melhor o orçamento da PAC;

24.

considera que os regimes de seguros de rendimento poderiam beneficiar mais as seguradoras do que os agricultores e ser dispendiosos para o contribuinte em caso de forte queda dos preços, sem combater a volatilidade dos mesmos; preconiza a realização de um estudo e de uma avaliação do regime de seguros aplicado nos EUA e de uma análise do caso concreto das regiões ultraperiféricas, com condições de mercado particulares;

25.

considera necessário dispor de um quadro legislativo claro e estável que garanta aos agricultores e criadores de animais a segurança jurídica necessária para poderem tomar decisões de negócio a médio e longo prazo;

26.

salienta que a UE, que se tornou o principal importador e exportador de alimentos a nível mundial, reforçou a sua dependência em relação a países terceiros e desenvolveu uma política comercial em contradição com os seus objetivos de redução das emissões de gases com efeito de estufa;

27.

observa que uma proporção crescente de produtos agrícolas que antes se produziam na Europa são importados de países com baixos custos de mão de obra, o que constitui uma desvantagem competitiva importante ao nível dos preços dos alimentos produzidos na UE;

28.

assinala igualmente os aspetos positivos das exportações da UE para a economia, quando se trata de produtos agrícolas e alimentares de elevado valor acrescentado, que geram rendimento e emprego no setor agrícola e agroalimentar europeu;

29.

considera que as cooperativas, as organizações de produtores e certas formas de integração de produtores podem desempenhar um papel fundamental nos setores agroalimentares, permitindo aos agricultores concentrar a oferta, reduzir os custos, fornecer uma série de serviços e reforçar a sua posição na cadeia alimentar;

30.

constata que as exportações europeias de excedentes (leite em pó, frango, concentrado de tomate, etc.) a preços inferiores aos custos de produção europeus e aos custos de produção africanos reduzem as capacidades de produção dos países africanos e favorecem a emigração das populações rurais, contrariando o compromisso da UE de ter em conta os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) adotados pelas Nações Unidas em 2015 no âmbito da sua «política de coerência para o desenvolvimento»; observa, além disso, que a União Europeia é o maior importador mundial de alimentos oriundos dos países em desenvolvimento, o que cria empregos no setor agroalimentar destes países; assinala, contudo, que as importações europeias (frutos, legumes, carne de borrego, etc.) a preços inferiores aos custos de produção europeus reduzem as capacidades produtivas na UE e podem comportar riscos do ponto de vista da segurança alimentar;

31.

observa que os preços agrícolas na Europa estão cada vez mais ligados aos preços mais baixos do mercado mundial e que os agricultores europeus estão, por conseguinte, sujeitos a uma maior concorrência, apesar de deverem respeitar normas ambientais e sanitárias mais rigorosas;

32.

salienta que o valor acrescentado do trabalho de produção agrícola foi em grande medida captado a montante e a jusante, dado que os produtores agrícolas têm muitas vezes uma posição demasiado fraca em comparação com a agroindústria e a distribuição; entende que uma melhor concertação ao longo da cadeia, entre o setor agrícola, a indústria agroalimentar e o setor comercial, deve conduzir a uma melhor distribuição das margens;

33.

observa que as zonas rurais estão a ficar para trás relativamente às zonas urbanas e que este fosso é particularmente preocupante porque se está a agravar, nomeadamente devido à aceleração do desenvolvimento das grandes cidades e das capitais (2);

34.

lamenta a perda acelerada de biodiversidade agrícola e selvagem, que põe em risco a capacidade de resistência dos nossos sistemas agrícolas e espaços naturais;

35.

manifesta preocupação pelo facto de a erosão e a degradação do solo provocadas por práticas agrícolas muito pouco sustentáveis porem em risco a sua fertilidade e por a crescente artificialização dos solos agrícolas conduzir ao desaparecimento de espaços necessários para a segurança alimentar europeia;

36.

constata a poluição agrícola de determinados lençóis freáticos e rios, bem como a sua utilização por vezes excessiva para fins de irrigação;

37.

salienta que o aquecimento global já tem impactos significativos a nível agrícola, o que torna ainda mais urgente reorientar os modos de produção;

38.

salienta a necessidade de investir na inovação digital, que pode ter um impacto positivo na sustentabilidade, na segurança alimentar, na eficiência na utilização dos recursos, na redução de resíduos, nos circuitos curtos, etc.; sublinha, ao mesmo tempo, que os efeitos económicos e sociais de uma evolução nesse sentido devem ser cuidadosamente estudados no que diz respeito à agricultura familiar; manifesta preocupação com a eventual utilização dos megadados por empresas privadas, que acarreta o risco de colocar as explorações agrícolas sob supervisão técnica e financeira;

39.

observa que a decisão do Reino Unido de sair da União Europeia pode conduzir a uma diminuição dos recursos destinados à PAC, bem como à perda de mercados da UE no Reino Unido; apela ao Reino Unido e à UE para que mantenham uma cooperação comercial estreita no domínio agrícola e alimentar;

40.

recorda que a percentagem do orçamento da UE consagrada à agricultura, apesar de estar fixada em apenas 0,7 % do PIB europeu em 2014, só permite apoiar uma verdadeira política europeia comum de importância estratégica para a segurança alimentar. Porém, no que se refere ao desenvolvimento rural e ao segundo pilar, os recursos não são suficientes num determinado número de domínios, sendo necessário ter em conta os novos objetivos da PAC no novo orçamento;

41.

rejeita a ideia de um cofinanciamento do primeiro pilar da PAC, que poria em causa o facto de a PAC ser a única política integrada da UE, renacionalizando-a na prática, e prejudicaria os agricultores dos Estados mais pobres da UE, cuja taxa de dependência dos financiamentos europeus é mais elevada;

42.

observa que o custo para a saúde pública de alguns regimes alimentares que favorecem a obesidade, a diabetes, etc., e de determinadas práticas agrícolas (uso excessivo de antibióticos em determinadas explorações pecuárias, cocktails de pesticidas, etc.) é muito mais elevado do que o orçamento da PAC; defende uma coordenação mais estreita das políticas agrícolas e alimentares;

43.

recomenda a divulgação de informação e a promoção do consumo de alimentos pertencentes a regimes alimentares saudáveis, como a dieta mediterrânica, através de programas específicos de apoio ao vinho, frutas, produtos hortícolas e apicultura, reforçando a qualidade e o valor acrescentado das produções;

44.

recorda, atendendo às especificidades das regiões ultraperiféricas e à impossibilidade de transpor para estas regiões o modelo agrícola europeu, que o artigo 349.o do Tratado da União Europeia (TFUE) autoriza expressamente o Conselho a adotar disposições específicas destinadas a adaptar a legislação da UE, incluindo a PAC, no quadro da sua aplicação às regiões ultraperiféricas. Neste âmbito, a PAC após 2020 deve manter um tratamento diferenciado para as regiões ultraperiféricas, consubstanciado nas necessárias adaptações do FEADER, POSEI, auxílios estatais e outros instrumentos que sejam instituídos;

II.   RECOMENDAÇÕES POLÍTICAS

45.

propõe que a futura política agrícola europeia após 2020 se articule em torno dos seguintes objetivos, amplamente partilhados:

a)

continuar a ser considerada uma política-chave do projeto europeu;

b)

prosseguir os objetivos enunciados no TFUE e dispor de um envelope financeiro adequado;

c)

desenvolver uma agricultura sustentável e próspera assente na diversidade dos territórios rurais;

d)

garantir a segurança alimentar da população que vive no território europeu a preços justos;

e)

fornecer uma alimentação sã, nutritiva, variada, de qualidade, promovendo o desenvolvimento e a consolidação dos setores de cariz local e consagrando especial atenção às intervenções de luta contra o desperdício alimentar e à solidariedade social;

f)

aplicar os princípios da economia circular e da bioeconomia para permitir realizar atividades economicamente rentáveis no meio rural;

g)

estabilizar os mercados e reforçar a posição dos agricultores nos mercados;

h)

assegurar um nível de vida equitativo aos agricultores, em particular através de um rendimento justo e suficientemente estável;

i)

assegurar a renovação do maior número possível de explorações agrícolas, que são a garantia de territórios rurais dinâmicos, apoiando designadamente os jovens agricultores;

j)

garantir o acesso a financiamento, a transferência de conhecimentos, a formação profissional e a redução dos obstáculos administrativos;

k)

evitar desestabilizar as economias agrícolas dos países terceiros;

l)

orientar todos os modos de produção agrícola para práticas que cuidem da saúde dos agricultores e dos consumidores, protegendo os recursos genéticos agrícolas, o ambiente e o meio aquático, reforcem a biodiversidade selvagem e agrícola, respeitem o bem-estar animal e limitem o aquecimento global;

m)

manter e preservar ao longo do tempo os solos agrícolas em termos quantitativos, combatendo de forma decidida o seu consumo, e melhorar a sua qualidade, fertilidade e biodiversidade mediante a divulgação de práticas agrícolas adequadas;

n)

promover os produtos de origem através das DOP, IGP ou de outros sistemas de qualidade, gerando valor acrescentado para o setor e o território, o que permite manter ativos os sistemas de produção locais e contribuir para a valorização da identidade rural e do património cultural e gastronómico;

o)

repartir de forma mais justa os fundos públicos da PAAC (política agrícola e alimentar comum) entre explorações agrícolas e entre Estados-Membros, segundo critérios objetivos e não discriminatórios, com base na sua capacidade de contribuir para os objetivos de desenvolvimento sustentável da UE (nomeadamente acelerando a convergência dos pagamentos diretos entre os Estados-Membros);

p)

aplicar o princípio da proporcionalidade ao sistema de controlos a que estão sujeitos os agricultores;

q)

reforçar o segundo pilar da PAC, o qual visa melhorar as condições de vida nas zonas rurais e reforçar a sua competitividade global;

r)

promover o desenvolvimento económico, social e ambiental de todos os territórios rurais;

s)

enfrentar o desafio do despovoamento e do envelhecimento de vastas zonas do meio rural, decorrente da falta de oportunidades de vida e de emprego, nomeadamente para os jovens e as mulheres;

46.

observa que a PAC é complexa, tornando-se difícil, senão mesmo arriscado, para os empresários em nome individual e os agricultores apresentar um pedido de subvenção. É imprescindível proceder a simplificações no sentido de incentivar a aceitação e a atratividade da PAC. É desejável simplificar e acelerar o processo, em particular para as transações de valor reduzido, racionalizando igualmente os encargos administrativos;

47.

espera que o orçamento da UE dedicado à PAC se mantenha a um nível suficientemente avultado, em conformidade com os princípios definidos nos Tratados europeus e à altura do seu estatuto enquanto única política integrada da União Europeia e das necessidades da agricultura europeia, dos territórios rurais e das respetivas comunidades, bem como para dar resposta às exigências da sociedade;

48.

entende que a agricultura consegue dar resposta a muitos dos desafios supramencionados, relacionados com o clima, a energia, a produção alimentar e a biodiversidade. Contudo, é necessário apoiar financeiramente as iniciativas técnicas e as abordagens inovadoras de caráter empresarial ou cooperativo, a fim de acelerar a transição;

49.

chama a atenção para a necessidade de, no tocante aos pagamentos diretos e aos pagamentos por superfície, concentrar os recursos sobretudo nas pequenas explorações e explorações familiares, privilegiando ao mesmo tempo soluções financeiras para as grandes explorações afetadas pelos limiares dos auxílios;

50.

solicita à Comissão Europeia que realize uma avaliação rigorosa dos resultados da PAC atual em relação à aplicação dos objetivos que lhe são conferidos pelos Tratados europeus em matéria de rendimento agrícola e de estabilização dos mercados;

51.

recomenda que se combata a volatilidade dos preços agrícolas, proporcione perspetivas de rendimento aos agricultores através do mercado e torne as cadeias de abastecimento alimentar mais equitativas (3);

52.

apela para que se continue a manter o tratamento concedido à agricultura das regiões ultraperiféricas, com base no artigo 349.o do Tratado sobre o Funcionamento da UE, ao abrigo do regime POSEI, tal como a própria Comissão Europeia reconhece no seu relatório COM(2016) 797 ao Parlamento Europeu e ao Conselho, de 15 de dezembro de 2016;

53.

solicita que se reforce o apoio à viticultura, à olivicultura e à criação de animais em terrenos muito declivosos ou de montanha, em zonas desfavorecidas que apresentam baixos rendimentos e nas regiões ultraperiféricas, bem como o apoio a métodos de gestão agrícola que contribuam para a melhoria da biodiversidade dos prados e das pastagens de montanha;

54.

exorta a UE a usar toda a sua influência enquanto maior importador e exportador mundial de produtos alimentares para alterar as regras do comércio agrícola internacional (OMC, 1994) no sentido de relações comerciais mais justas e mais solidárias; assinala que a volatilidade dos preços é um desafio para a agricultura europeia e insta a Comissão Europeia a ponderar medidas para atenuar os riscos decorrentes de uma maior exposição ao mercado mundial;

55.

considera que uma abordagem do rendimento agrícola mais baseada no mercado do que nas subvenções pode reforçar o reconhecimento económico da profissão de agricultor e nesse processo a sua atratividade; para o efeito, recomenda à UE que regule os mercados agrícolas para prevenir situações de escassez ou excedentes e estabilizar os preços agrícolas a níveis satisfatórios;

56.

propõe a constituição de uma poupança de precaução anual, transferida para o ano seguinte caso não seja utilizada na totalidade (4);

57.

insta a Comissão a assegurar condições equitativas nos acordos bilaterais de comércio livre e nas parcerias bilaterais com países terceiros; para o efeito, associa a obrigação de deixar de exportar produtos agrícolas e alimentares a preços inferiores aos custos médios de produção europeus, graças às ajudas públicas, ao direito de proteger a produção europeia de importações a preços demasiado baixos que destroem a sua capacidade de produção ou que não obedecem às normas de produção europeias;

58.

salienta a importância das cadeias de abastecimento regionais e locais curtas, quer pela sua maior sustentabilidade ambiental, graças à menor poluição produzida pelos meios de transporte, quer pelo facto de promoverem uma agricultura que exalta a qualidade do que é típico, a tradição e o património económico e cultural;

59.

insta a UE a rever a vertente agrícola dos acordos bilaterais de comércio «livre» ou de «parceria» económica com países terceiros, dotando-os de meios adequados e dando prioridade à agricultura familiar com forte intensidade de mão de obra, com base sobretudo nos mercados locais e regionais e nos circuitos curtos; exorta a UE a refletir de forma apropriada os interesses do setor agrícola europeu nos acordos comerciais, a fim de minimizar os riscos para a produção europeia, elaborando uma lista estratégica de produtos potencialmente vulneráveis a pressão excessiva; solicita que tais produtos, que poderão ser vulneráveis à liberalização, beneficiem de um tratamento especial e diferenciado nos acordos comerciais;

60.

propõe uma revisão do direito europeu da concorrência, que permita a todos os intervenientes de um setor, incluindo os consumidores e os poderes públicos, decidir sobre uma distribuição justa do valor acrescentado e das margens de lucro ao longo de toda a cadeia de valor e permita aos agricultores adquirir uma posição mais equitativa na cadeia alimentar e reforçar a sua posição no mercado;

61.

solicita uma revisão do direito europeu em matéria de adjudicação de contratos públicos no setor da restauração coletiva, que inclua uma cláusula de localidade relativamente ao abastecimento alimentar e incentive um maior intercâmbio de boas práticas entre os órgãos de poder local e regional, no intuito de favorecer uma alimentação local e um mercado local para uma produção agrícola biológica e uma transformação artesanal geradoras de emprego nas zonas rurais;

62.

solicita que a investigação financiada pelo orçamento da UE e pelo BEI em matéria agrícola e rural seja orientada em especial para:

a)

a eficácia sustentável dos processos de produção e das explorações agrícolas;

b)

métodos de produção de qualidade e respeitadores do ambiente, agroecologia;

c)

a restauração da fertilidade dos solos agrícolas degradados e da biodiversidade;

d)

a inovação social nos territórios rurais: dos serviços públicos locais aos modos de produção agrícola, transformação artesanal e distribuição local de produtos agrícolas;

e)

uma inovação técnica que reforce a autonomia e a capacidade de resistência das explorações agrícolas;

f)

a gestão sustentável das florestas;

g)

as práticas agrícolas que visam combater o aquecimento global;

h)

o bem-estar animal e soluções sustentáveis para patologias vegetais e animais;

i)

aplicações tecnológicas para os controlos in loco, a fim de simplificar as metodologias e torná-las mais eficientes;

63.

insta a que se passe de um modelo de pagamentos diretos por hectare a pagamentos diretos por hectare com limites máximos e variáveis por ativo agrícola — entendido como um agricultor ativo –, a fim de:

a)

manter e desenvolver a agricultura nas zonas desfavorecidas do ponto de vista agrícola e climático, nomeadamente nas zonas de montanha, que têm custos de produção mais elevados, ou geograficamente desfavorecidas, como as regiões ultraperiféricas;

b)

apoiar as pequenas explorações familiares com um volume de produção muitas vezes demasiado baixo para gerar um rendimento agrícola suficiente, mas que são importantes para dinamizar os territórios rurais, salientando que o apoio acrescido aos primeiros hectares é primordial para as pequenas explorações, designadamente no domínio da agricultura de montanha;

c)

apoiar a instalação de jovens agricultores;

d)

apoiar, em todas as regiões, a transição gradual para modos de produção mais resistentes, mais autónomos, mais económicos em termos de insumos, sem pesticidas químicos, que protejam a saúde, reduzam o aquecimento global, favoreçam a biodiversidade, melhorem a qualidade da água e respeitem o bem-estar animal;

e)

reforçar o desenvolvimento da agricultura biológica;

f)

reforçar a agricultura nas zonas de elevado valor ambiental;

g)

promover a utilização de raças e variedades autóctones, a fim de apoiar os produtos artesanais de elevado valor acrescentado e os produtos alimentares especializados;

h)

apoiar o desenvolvimento de cadeias de abastecimento regionais de qualidade com elevado valor acrescentado;

64.

apela, no quadro de ecologização, para um reforço gradual das práticas agrícolas benéficas para o clima e o ambiente mediante:

a)

a rotação obrigatória das culturas, incluindo as plantas leguminosas, a fim de tornar a pecuária europeia menos dependente das importações de proteínas vegetais e diminuir a utilização de adubos azotados, que têm um elevado consumo de energia e produzem uma grande quantidade de gases com efeito de estufa;

b)

a manutenção da proibição da lavoura dos prados permanentes, para favorecer o sequestro de carbono no solo e a biodiversidade;

c)

a manutenção de zonas de interesse ecológico, não cultivadas e sem utilização de produtos fitossanitários, para contribuir para travar o declínio da biodiversidade, permitindo, todavia, um pastoreio extensivo limitado, que contribui para o enriquecimento dos solos, beneficiando os criadores de animais;

d)

a disponibilização de instrumentos específicos para prevenir os riscos associados às alterações climáticas;

e)

a introdução de ajudas compensatórias, facilmente acessíveis, para encorajar compromissos suplementares nas zonas Natura 2000 onde existem compromissos adicionais relacionados com a biodiversidade, nas zonas com elevado valor natural, bem como em territórios afetados por grandes predadores protegidos;

f)

outras medidas de ecologização ao nível regional;

65.

recomenda que, a fim de respeitar os direitos dos trabalhadores agrícolas, se reduzam os futuros pagamentos diretos afetados a uma exploração agrícola que não tenha cumprido as normas sociais em vigor no Estado-Membro em causa;

66.

solicita o reforço do segundo pilar da PAC e o aumento das dotações afetadas ao desenvolvimento rural; preconiza mais subsidiariedade, para que os Estados-Membros possam transferir dotações do primeiro para o segundo pilar;

67.

chama a atenção para o contributo muito importante dado à realização dos objetivos da PAC, ao nível local e regional, pela abordagem do desenvolvimento local de base comunitária e pelo programa LEADER, e recomenda, por conseguinte, que, no âmbito dos programas nacionais e regionais de execução da PAC, se lhes consagre até 20 % dos recursos previstos para a execução do segundo pilar;

68.

reitera que devem ser conferidos aos Estados-Membros e às regiões poderes suplementares para regular as terras agrícolas e impor restrições nesse sentido, em particular para combater o fenómeno da apropriação ilegal e da concentração de terras na Europa, que está a reduzir as opções dos jovens agricultores em início de atividade (5);

69.

insta a que seja afetada uma percentagem de fundos suficientes ao desenvolvimento das zonas rurais — reforçando o Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural (FEADER), a fim de assegurar o desenvolvimento harmonioso e integrado destas zonas, incluindo a criação de infraestruturas locais, o apoio às PME, a renovação rural e uma maior diversificação económica;

70.

recomenda à UE que tenha em especial atenção as regiões ultraperiféricas, onde o setor agrícola é fundamental para a criação de emprego e de riqueza, assim como para o fomento do desenvolvimento da indústria agroalimentar, da investigação e da inovação, da salvaguarda de espaços ordenados de qualidade e sua promoção, e ainda para o combate às alterações climáticas;

71.

propõe que os fundos do segundo pilar se orientem a título prioritário para:

a)

a aproximação entre os agricultores e os consumidores através dos circuitos curtos;

b)

o apoio aos agricultores cujos meios de produção ultrapassem as normas ambientais, a fim de fomentar uma agricultura de elevado valor ecológico;

c)

o apoio ao desenvolvimento de práticas de cultivo respeitadoras do ambiente, que preservem os ecossistemas de alto valor ambiental e promovam a florestação de terras como sumidouro de CO2;

d)

o apoio à promoção da investigação e da inovação em prol de métodos de produção e transformação mais sustentáveis;

e)

a adaptação dos agricultores aos mercados (por exemplo, serviços de informação e aconselhamento, serviços de gestão agrícola, formação, etc.);

f)

o apoio à modernização sustentável das cadeias de transformação de produtos agrícolas organizadas em codesenvolvimento com as cadeias de produção, no respeito do ambiente, da saúde dos consumidores e de uma repartição justa do valor acrescentado;

g)

as iniciativas que incentivam os agricultores a criar cooperativas ou associações de produtores;

h)

o aconselhamento em matéria de gestão de riscos para fazer frente a imprevistos no plano do clima e da saúde;

i)

os investimentos sustentáveis para adaptar a oferta das explorações agrícolas familiares à procura dos consumidores;

j)

o apoio ao desenvolvimento de setores com uma marca oficial de qualidade;

k)

a transformação artesanal de produtos agrícolas locais;

l)

uma restauração coletiva abastecida com produtos biológicos e locais;

72.

propõe que se passe de uma lógica de «atendimento de balcão» para uma lógica de «convenção» entre tipos específicos de empresas, setores e territórios; partindo de um número reduzido de objetivos (qualidade, produtividade, sustentabilidade), propõe que se apoie a criação de projetos de inovação nessa ótica e capazes de ter incidências positivas no emprego;

Sinergias entre os fundos de desenvolvimento rural da UE

73.

propõe reforçar o apoio financeiro da UE ao desenvolvimento rural, que diminuiu de forma significativa relativamente ao período de programação anterior, mantendo uma quantidade suficiente de fundos disponíveis no primeiro pilar;

74.

propõe que se dê um apoio amplo e sólido aos investimentos sustentáveis para manter as explorações agrícolas familiares, em particular nos domínios da produção, da distribuição e da diversificação;

75.

recomenda a adoção de uma estratégia rural para que todas as políticas europeias contribuam mais para a inovação e a colaboração no desenvolvimento das zonas rurais, em consonância com os objetivos de coesão territorial (6);

76.

propõe simplificar a integração dos recursos dos diversos fundos que financiam o desenvolvimento rural não agrícola para apoiar:

a)

as iniciativas locais destinadas a desenvolver o emprego rural;

b)

a formação profissional relativa às profissões dos territórios rurais;

c)

a inovação técnica e social ao serviço de uma economia pós-carbono, digital, circular e convivial;

d)

a valorização das zonas florestais de um ponto de vista económico, ecológico e recreativo;

e)

a promoção de parcerias e de alianças entre o setor agrícola e os gestores das áreas protegidas;

f)

a eliminação do fosso rural em matéria de ligação digital;

g)

a manutenção e o desenvolvimento de serviços públicos locais;

h)

a manutenção e o desenvolvimento de paisagens e aldeias atrativas;

i)

o turismo rural;

j)

o desenvolvimento, a pequena escala, de fontes locais de energias renováveis;

k)

os investimentos públicos locais de pequena dimensão destinados a melhorar a qualidade de vida das comunidades rurais e a viabilidade das empresas, pelo menos nas regiões com um atraso considerável em relação à média dos Estados-Membros;

77.

defende, além disso, que se aproveite o potencial mais amplo das zonas agrícolas e florestais, designadamente das zonas periurbanas, para fins económicos, ambientais, climáticos, energéticos e recreativos, como, por exemplo, na produção local de alimentos e de energia e no turismo rural. Para tanto, é necessário que a PAC não se oriente apenas para os agricultores. As iniciativas LEADER são e devem continuar a ser uma oportunidade de colaboração e de inovação para os atores rurais e periurbanos;

78.

solicita uma avaliação rigorosa dos fundos estruturais, de modo a apoiar o desenvolvimento das zonas rurais e a impulsionar estratégias integradas para potenciar estas zonas mediante a melhoria da conectividade, tanto no que toca aos transportes como à banda larga digital, protegendo ao mesmo tempo o ambiente através da aplicação do «mecanismo de verificação» rural, como recomendado na Declaração de Cork 2.0 (7);

79.

sublinha que um desenvolvimento territorial equilibrado implica uma promoção adequada das zonas rurais, das zonas periurbanas do interior e das zonas desfavorecidas (por exemplo, zonas de montanha, zonas fronteiriças ou zonas com desafios naturais ou demográficos), a fim de assegurar o investimento necessário no crescimento, no emprego, na inclusão social e na sustentabilidade ambiental;

80.

apela para a melhoria das relações entre as zonas rurais e as zonas urbanas, com a plena participação das pequenas cidades e dos municípios rurais, de modo que as políticas da UE não fomentem uma relação de concorrência entre as dimensões urbana, costeira e rural;

81.

acolhe favoravelmente a iniciativa da Comissão Europeia em prol de «aldeias inteligentes», bem como o contributo do Parlamento Europeu para o êxito do processo, e propõe alargar este conceito ao dos «territórios rurais inteligentes»; solicita igualmente poder desempenhar um papel tão amplo quanto possível nos debates sobre a criação de um quadro de ação local e regional relacionado com esta iniciativa;

82.

reitera a necessidade de continuar a harmonizar as regras aplicáveis ao funcionamento dos fundos estruturais através do quadro estratégico comum, a fim de facilitar a programação e a gestão do desenvolvimento rural e fomentar as abordagens integradas e territoriais (8);

83.

propõe que seja reforçada a abordagem de utilização de um fundo principal, a fim de harmonizar a gestão de projetos financiados a título de vários fundos;

84.

propõe o lançamento de um debate sobre uma aproximação dos diversos fundos relacionados com o desenvolvimento regional não agrícola.

Bruxelas, 12 de julho de 2017.

O Presidente do Comité das Regiões Europeu

Markku MARKKULA


(1)  Parecer do Comité das Regiões Europeu sobre o «Apoio aos jovens agricultores europeus» (JO C 207 de 30.6.2017, p. 57).

(2)  «Investimento no crescimento e no emprego — Promover o desenvolvimento e a boa governação nas regiões e cidades da UE — Sexto relatório sobre a coesão económica, social e territorial», Comissão Europeia, 23 de julho de 2014.

(3)  Parecer do Comité das Regiões Europeu sobre a «Regulação da volatilidade dos preços dos produtos agrícolas» (JO C 185 de 9.6.2017, p. 36).

(4)  Parecer do CR (JO C 185 de 9.6.2017, p. 36).

(5)  Parecer do Comité das Regiões Europeu sobre o «Apoio aos jovens agricultores europeus» (JO C 207 de 30.6.2017, p. 57).

(6)  Parecer do Comité das Regiões Europeu sobre a «Inovação e modernização da economia rural» (JO C 120 de 5.4.2016, p. 10).

(7)  Declaração de Cork 2.0 — Uma vida melhor nas zonas rurais, Comissão Europeia, setembro de 2016.

(8)  JO C 120 de 5.4.2016, p. 10.