11.10.2018   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 369/96


P8_TA(2017)0501

Aplicação da Diretiva relativa à luta contra o abuso sexual, a exploração sexual de crianças e a pornografia infantil

Resolução do Parlamento Europeu, de 14 de dezembro de 2017, sobre a aplicação da Diretiva 2011/93/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de dezembro de 2011, relativa à luta contra o abuso sexual e a exploração sexual de crianças e a pornografia infantil (2015/2129(INI))

(2018/C 369/13)

O Parlamento Europeu,

Tendo em conta os artigos 3.o e 6.o do Tratado da União Europeia (TUE) e o artigo 82.o, n.o 2, e o artigo 83.o, n.o 1, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE),

Tendo em conta os artigos 7.o, 8.o, 24.o, 47.o, 48.o e 52.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia,

Tendo em conta a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, de 20 de novembro de 1989, e os respetivos protocolos,

Tendo em conta a Convenção do Conselho da Europa para a Proteção das Crianças contra a Exploração e os Abusos Sexuais, de 25 de outubro de 2007,

Tendo em conta a Convenção do Conselho da Europa sobre o Cibercrime, de 23 de novembro de 2001,

Tendo em conta a adoção pelo Conselho da Europa da sua estratégia sobre os direitos da criança (2016-2021),

Tendo em conta a Diretiva 2011/93/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de dezembro de 2011, relativa à luta contra o abuso sexual e a exploração sexual de crianças e a pornografia infantil, e que substitui a Decisão-Quadro 2004/68/JAI do Conselho (1),

Tendo em conta a Diretiva 2012/29/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de outubro de 2012, que estabelece normas mínimas relativas aos direitos, ao apoio e à proteção das vítimas da criminalidade e que substitui a Decisão-Quadro 2001/220/JAI do Conselho (2),

Tendo em conta a sua resolução, de 27 de novembro de 2014, sobre o 25.o aniversário da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança (3),

Tendo em conta a sua resolução, de 11 de março de 2015, sobre o abuso sexual de crianças na Internet (4),

Tendo em conta a Comunicação da Comissão, de 2 de maio de 2012, intitulada «Estratégia europeia para uma Internet melhor para as crianças» (COM(2012)0196) e o relatório da Comissão, de 6 de junho de 2016, intitulado «Avaliação final do programa plurianual da União para a proteção das crianças que utilizam a Internet e outras tecnologias das comunicações (Internet Mais Segura)» (COM(2016)0364),

Tendo em conta o relatório da Comissão, de 16 de dezembro de 2016, que avalia até que ponto os Estados-Membros tomaram as medidas necessárias para dar cumprimento à Diretiva 2011/93/UE (COM(2016)0871) e o relatório da Comissão, de 16 de dezembro de 2016, que avalia a execução das medidas referidas no artigo 25.o da Diretiva 2011/93/UE (COM(2016)0872),

Tendo em conta o relatório da Europol, de 2016, sobre a avaliação da ameaça da criminalidade organizada dinamizada pela Internet (iOCTA),

Tendo em conta o relatório da Agência dos Direitos Fundamentais da União Europeia, de 27 de fevereiro de 2017, intitulado «Child-friendly justice: Perspectives and experiences of children involved in judicial proceedings as victims, witnesses or parties in nine EU Member States» (A justiça adaptada às crianças: perspetivas e experiências das crianças envolvidas em processos judiciais enquanto vítimas, testemunhas ou partes em nove Estados-Membros da UE),

Tendo em conta a Comunicação da Comissão, de 12 de abril de 2017, intitulada «Proteção das crianças no contexto da migração» (COM(2017)0211),

Tendo em conta o artigo 52.o do seu Regimento, bem como o artigo 1.o, n.o 1, alínea e), e o Anexo 3 da decisão da Conferência dos Presidentes, de 12 de dezembro de 2002, sobre o processo de autorização para a elaboração de relatórios de iniciativa,

Tendo em conta o relatório da Comissão das Liberdades Cívicas, da Justiça e dos Assuntos Internos e os pareceres da Comissão da Cultura e da Educação e da Comissão dos Direitos da Mulher e da Igualdade dos Géneros (A8-0368/2017),

A.

Considerando que o abuso sexual e a exploração sexual de crianças constituem violações graves dos direitos fundamentais, em especial do direito das crianças à proteção e aos cuidados necessários ao seu bem-estar, tal como estabelecido na Convenção das Nações Unidas de 1989 sobre os Direitos da Criança e na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia;

B.

Considerando que o superior interesse da criança deve prevalecer sobre qualquer outra consideração quando se aplicam medidas para combater estes crimes, em conformidade com a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança;

C.

Considerando que a Diretiva 2011/93/UE é um instrumento jurídico abrangente que contém disposições em matéria de direito penal substantivo e de processo penal, medidas de assistência e proteção das vítimas, bem como de prevenção, incluindo medidas administrativas, e que a sua aplicação exige a participação ativa de intervenientes de diferentes setores, tais como as autoridades policiais, as autoridades judiciais, as associações de pais e de famílias que desempenham um papel ativo no domínio da proteção de menores, as organizações não governamentais, os fornecedores de serviços Internet e outros;

D.

Considerando que o relatório de execução da Comissão não fornece quaisquer estatísticas no que diz respeito à retirada e ao bloqueio de sítios web que contenham ou divulguem imagens de atos de abuso sexual de crianças, nomeadamente estatísticas sobre a rapidez da eliminação dos conteúdos, a frequência com que os relatórios são objeto de acompanhamento pelas autoridades policiais, os atrasos na eliminação devido à necessidade de evitar interferências com os inquéritos em curso ou a frequência com que esses dados armazenados são efetivamente utilizados pelas autoridades judiciárias ou policiais;

E.

Considerando que um dos principais desafios da investigação de abusos sexuais de crianças e da acusação dos autores desses atos é a ausência de denúncia por parte das vítimas; que os rapazes são menos propensos a denunciar abusos;

F.

Considerando que as crianças que são vítimas de abuso ou exploração sexual sofrem uma multiplicidade de traumas físicos e/ou psicológicos que se prolongam pela vida adulta;

G.

Considerando que o abuso e a exploração sexual de crianças na Internet é um fenómeno em evolução e que surgiram na Internet novas formas de criminalidade, como a vingança pornográfica e a extorsão sexual, que devem ser combatidas com medidas concretas pelos Estados-Membros;

H.

Considerando que as autoridades policiais são confrontadas com os desafios colocados pela divulgação de material relativo ao abuso sexual de crianças pelas redes entre pares e privadas; que, na era digital, é necessário sensibilizar desde cedo as raparigas e os rapazes para os riscos e a importância de respeitarem a dignidade e a vida privada dos outros;

I.

Considerando que as crianças migrantes — sobretudo as raparigas mas também uma percentagem considerável de rapazes (5) — estão particularmente expostas ao risco de abuso e exploração sexuais por parte de traficantes, passadores, traficantes de droga, redes de prostituição, bem como outros indivíduos ou redes, que exploram a sua vulnerabilidade, ao longo de todo o trajeto e quando chegam à Europa;

J.

Considerando que a indústria do turismo sexual afeta um número significativo de crianças, em particular raparigas, mas também uma percentagem considerável de rapazes;

K.

Considerando que, a fim de cumprir o disposto na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, as medidas tomadas ao abrigo do considerando 47 da Diretiva 2011/93/UE para eliminar e bloquear sítios web devem respeitar as salvaguardas mencionadas no artigo 25.o da Diretiva;

L.

Considerando que a revisão sistemática e a meta-análise revelaram que, comparativamente aos seus pares sem deficiência, as crianças com deficiência têm uma probabilidade três vezes maior de serem vítimas de violência física ou sexual;

M.

Considerando que a utilização do termo «pornografia infantil» não é adequada para definir os crimes referidos no artigo 5.o e no artigo 2.o, alínea c), da Diretiva 2011/93/UE e pode ser prejudicial para as crianças que são vítimas desses crimes;

Principais conclusões e recomendações

1.

Condena inequivocamente qualquer forma de abuso ou exploração sexual de crianças, bem como a vitimização violenta e abusiva de crianças a todos os níveis; congratula-se com a adoção pelo Conselho da Europa da sua estratégia sobre os direitos da criança (2016-2021); solicita que todas as instituições da UE e os Estados-Membros tomem medidas adequadas para prevenir todas as formas de violência física e psicológica, incluindo os abusos físicos e sexuais e a exploração sexual, e para proteger as crianças dessa violência; exorta todas as instituições da UE e os Estados-Membros a tomarem medidas de forma concertada e eficaz, a fim de erradicar a exploração e os abusos sexuais e, em geral, todos os crimes sexuais cometidos contra crianças; insta as instituições da UE e os Estados-Membros a, de forma explícita, considerarem a proteção das crianças uma prioridade no âmbito da programação e da execução de políticas que possam afetá-las negativamente;

2.

Considera que a Diretiva 2011/93/UE constitui um quadro jurídico sólido e abrangente de luta contra o abuso sexual e a exploração sexual de crianças; lamenta que os Estados-Membros tenham enfrentado grandes desafios ao transporem e aplicarem esta Diretiva, em particular no que se refere às disposições em matéria de prevenção, investigação e ação penal, bem como de assistência e apoio às vítimas, e que ainda não tenha sido aproveitado todo o seu potencial; insta os Estados-Membros a intensificarem os seus esforços com vista à sua transposição correta e integral; insta os Estados-Membros a velarem por que a transposição implique uma aplicação eficaz, a fim de assegurar a assistência e o apoio às crianças vítimas de crimes e a tolerância zero para o abuso sexual de crianças;

3.

Lamenta que não tenha sido possível à Comissão apresentar os seus relatórios de execução no prazo estabelecido no artigo 28.o da Diretiva 2011/93/UE e que os dois relatórios de avaliação apresentados pela Comissão tenham documentado apenas a transposição para o direito nacional pelos Estados-Membros, sem avaliarem plenamente o cumprimento da diretiva; solicita aos Estados-Membros que cooperem e transmitam à Comissão todas as informações pertinentes sobre a aplicação da Diretiva, incluindo estatísticas;

4.

Salienta que, para este tipo de crimes contra crianças, o termo «material relativo ao abuso sexual de crianças» é mais adequado do que o termo «pornografia infantil»; insta a Comissão e os Estados-Membros a adotarem a utilização do termo «material relativo ao abuso sexual de crianças» em vez de «pornografia infantil»; realça, no entanto, que a nova terminologia não deve, de forma alguma, limitar os crimes de «pornografia infantil» definidos no artigo 5.o da Diretiva 2011/93/UE com base no artigo 2.o, alínea c);

5.

Considera lamentável que o relatório de execução da Comissão não mencione se foi feita uma avaliação da eficácia do sistema INHOPE aquando da transferência de relatórios aos seus homólogos de países terceiros;

6.

Considera lamentável que a Comissão não tenha recolhido dados sobre os tipos de bloqueio utilizados; considera lamentável que não tenham sido publicados dados sobre o número de sítios web constantes das listas de páginas bloqueadas em cada país; considera lamentável que a utilização de métodos de segurança, nomeadamente a encriptação, não tenha sido avaliada, a fim de assegurar que as listas de páginas bloqueadas não seja divulgadas, o que seria altamente contraproducente; congratula-se com o facto de a Comissão ter expressamente abandonado esta posição ao promover o bloqueio obrigatório em 2011;

Direito penal material (artigos 3.o, 4.o e 5.o da Diretiva)

7.

Constata que as disposições de direito penal material da Diretiva 2011/93/UE foram transpostas pelos Estados-Membros; manifesta, contudo, a sua apreensão pelo facto de alguns Estados-Membros não terem transposto integralmente as disposições sobre os crimes relativos à exploração sexual (artigo 4.o), sobre os crimes relativos ao abuso sexual quando se trate de abuso de uma posição manifesta de confiança, de autoridade ou de influência (artigo 3.o, n.o 5, alínea i)) ou ao abuso de uma situação particularmente vulnerável da criança (artigo 3.o, n.o 5, alínea ii)) e sobre a responsabilidade das pessoas coletivas (artigo 12.o);

8.

Considera, em particular, que os Estados-Membros devem envidar todos os esforços possíveis para combater a impunidade dos autores de abusos sexuais de crianças, bem como das pessoas singulares ou coletivas que ajudam, apoiam ou participam em crimes de abuso e exploração sexual de crianças; considera que é da maior importância que os Estados-Membros assegurem a responsabilização das pessoas singulares e coletivas, sempre que a falta de supervisão ou de controlo de uma pessoa que seja membro de uma entidade jurídica tenha permitido ou facilitado a prática de crimes;

9.

Manifesta particular preocupação com as ameaças e os riscos que a Internet representa para as crianças, nomeadamente no que se refere ao recrutamento de crianças em linha, bem como ao aliciamento e outras formas de incitamento; considera, por conseguinte, que devem ser encontradas formas de identificar, comunicar e investigar tais práticas perigosas; realça a necessidade de aumentar o nível de proteção das crianças na Internet, assegurando, ao mesmo tempo, o lançamento de programas de sensibilização e informação sobre os perigos existentes em linha;

10.

Relembra à Comissão que as restrições aos conteúdos em linha devem ser fundamentadas pela lei, bem definidas, proporcionadas, legítimas e ter um objetivo claro;

11.

Manifesta preocupação com o aumento da transmissão em direto de conteúdos de abuso sexual de crianças, cujos autores são muito hábeis e inovadores na utilização de tecnologias avançadas; considera que todos os Estados-Membros devem, por conseguinte, procurar desenvolver aplicações técnicas inovadoras para detetar e bloquear o acesso a esse tipo de conteúdos e, simultaneamente, colocar restrições ao pagamento de tais serviços;

12.

Sublinha a necessidade de combater as novas formas de criminalidade em linha, tais como a vingança pornográfica e a extorsão sexual, que afetam muitos jovens, em especial raparigas adolescentes; insta as autoridades policiais e judiciais dos Estados-Membros a adotarem medidas concretas para combater esta nova forma de criminalidade e exorta a indústria da Internet, as linhas de apoio, as ONG e todos os organismos relevantes a assumirem a sua parte de responsabilidade na procura de soluções para fazer face a estes crimes, incluindo uma melhor utilização das tecnologias disponíveis e o desenvolvimento de novas tecnologias para facilitar a identificação das pessoas que cometam crimes em linha;

13.

Reitera que todas as pessoas têm o direito de decidir sobre o destino dos seus dados pessoais, nomeadamente o direito exclusivo de controlar a utilização e a divulgação de informações pessoais e o direito a ser esquecido, que é definido como a possibilidade de obter a rápida remoção de conteúdos que possam prejudicar a sua dignidade;

14.

Insiste na necessidade de os Estados-Membros criminalizarem não só o aliciamento em linha, mas também a ciberperseguição e a atração enganosa de crianças na Internet, caso ainda não o tenham feito; recorda que o termo ciberperseguição se refere à situação em que os adultos comunicam em linha com um menor, ou com alguém que acreditam ser um menor, com o objetivo de cometer posteriormente um ato criminoso contra essa pessoa;

15.

Considera lamentável que não sejam fornecidas estatísticas relativamente ao recurso a procedimentos penais para a apreensão de equipamento nos casos pertinentes;

Investigação e ação penal

16.

Observa que vários Estados-Membros não transpuseram a obrigação de as ações penais serem intentadas durante um período de tempo suficientemente longo após a vítima atingir a maioridade; encoraja, por conseguinte, os Estados-Membros a velarem por que os limites legais para a notificação destes crimes e a instauração da ação penal sejam de molde a terem início, no mínimo, a partir da maioridade da criança vítima de um crime, a fim de assegurar a possibilidade de instaurar a ação penal;

17.

Sublinha a importância da aplicação do artigo 17.o para garantir que os Estados-Membros tenham competência jurisdicional relativamente aos crimes cometidos por meio de tecnologias da informação e da comunicação acessíveis no seu território, independentemente de estarem ou não baseadas no seu território; insiste na necessidade de desenvolver elementos concretos para uma abordagem comum da UE em matéria de jurisdição no ciberespaço, tal como assinalado na reunião informal dos ministros da Justiça e dos Assuntos Internos de 26 de janeiro de 2016;

18.

Lamenta que, no que se refere à jurisdição extraterritorial, nem todos os crimes enumerados na Diretiva 2011/93/UE sejam contemplados na legislação nacional dos Estados-Membros; considera lamentável que alguns Estados-Membros garantam que os crimes de abuso sexual cometidos no estrangeiro sejam objeto de ações penais sem apresentação de queixa por parte da vítima; apela aos Estados-Membros para que ponham termo a estas lacunas de forma eficaz;

19.

Exorta todos os Estados-Membros a afetarem às autoridades policiais e judiciais os recursos financeiros e humanos adequados, para que possam combater o abuso e a exploração sexual de crianças, o que inclui a formação específica de investigadores e forças policiais; insta a Comissão e os Estados-Membros a aumentarem os recursos destinados à identificação das vítimas e exorta os nove Estados-Membros que ainda não transpuseram o artigo 15.o, n.o 4, da Diretiva 2011/93/UE relativo à identificação das vítimas a fazê-lo sem demora e a aplicarem essa disposição através da criação de equipas especiais de investigação munidas de instrumentos e recursos adequados;

20.

Considera lamentável o défice de estatísticas e dados exatos sobre o número de crimes cometidos, em particular no que respeita ao abuso e à exploração sexual de crianças, devido à elevada percentagem de casos não denunciados, ao caráter de novidade dos crimes e às discrepâncias entre as definições e as metodologias empregues nos Estados-Membros;

21.

Salienta que alguns dos principais desafios com que os serviços policiais e as autoridades judiciais são confrontados na investigação e repressão dos crimes relativos a abuso sexual de crianças na Internet decorrem principalmente da natureza transfronteiriça de muitas investigações ou da dependência de provas eletrónicas; salienta, em particular, a necessidade de melhorar as técnicas de investigação digital a fim de acompanhar o rápido ritmo do desenvolvimento tecnológico;

22.

Exorta os Estados-Membros a reforçarem a cooperação entre as autoridades policiais, incluindo através de um maior recurso a equipas de investigação conjuntas; exorta as autoridades a reconhecerem que uma dependência excessiva das linhas de apoio e do setor pode ser contraproducente e apenas externaliza a luta contra o material relativo ao abuso sexual de crianças;

23.

Insta os Estados-Membros a aplicarem as disposições da Diretiva 2011/93/UE de forma orientada para o futuro; insta a indústria e os fornecedores de serviços Internet a utilizarem tecnologias modernas e a investirem em soluções inovadoras para aumentar as possibilidades de identificar e punir os criminosos, desmantelar as redes criminosas em linha e proteger as vítimas;

24.

Manifesta a sua preocupação com a utilização, pelos fornecedores de serviços Internet, de tecnologias de tradução de endereços de rede de alta qualidade (NAT CGN) que permitem que vários utilizadores partilhem um único endereço IP ao mesmo tempo, comprometendo assim a segurança em linha e a capacidade para determinar responsabilidades; insta os Estados-Membros a incentivarem os fornecedores de serviços Internet e os operadores de rede a tomarem as medidas necessárias para limitar o número de utilizadores por endereço IP, eliminar progressivamente a utilização de tecnologias CGN e fazer os investimentos necessários para adotar urgentemente a próxima geração de endereços de protocolo Internet (versão 6 — IPv6);

25.

Insta os Estados-Membros a intensificarem a cooperação policial e judicial e a fazerem pleno uso das ferramentas de cooperação existentes na UE fornecidas pela Europol — em particular, no contexto do projeto de análise Twins e do Centro Europeu da Cibercriminalidade — e pela Eurojust, a fim de garantir o êxito da investigação e da ação penal contra os autores dos crimes e eventuais cúmplices; salienta que a Europol e a Eurojust devem dispor de recursos adequados para desempenharem as suas atribuições neste domínio e incentiva os Estados-Membros a partilharem boas práticas;

26.

Apela aos Estados-Membros para que intensifiquem a cooperação policial e judicial, a fim de lutar contra o tráfico e a introdução clandestina de crianças migrantes, que são especialmente vulneráveis aos abusos, ao tráfico e à exploração sexual, sobretudo as raparigas, mas também os rapazes; apela a um reforço da cooperação e ao rápido intercâmbio de informações entre as autoridades com vista a encontrar crianças desaparecidas e a permitir a interoperabilidade das bases de dados; exorta os Estados-Membros a adotarem uma abordagem holística que envolva todos os intervenientes em causa e a reforçarem a cooperação com as autoridades policiais, os serviços sociais e a sociedade civil; reconhece o papel importante da sociedade civil na identificação de crianças vulneráveis, dada a falta de confiança que as crianças migrantes têm demonstrado em relação às autoridades policiais;

27.

Incentiva os Estados-Membros a intensificarem os seus esforços para combater o turismo sexual e julgar os seus autores e cúmplices, tendo em conta a responsabilidade de todos os envolvidos;

28.

Considera que os Estados-Membros devem ser incentivados a desenvolver uma rede internacional especializada na luta contra o turismo sexual, acompanhada de políticas públicas que incluam programas de financiamento destinados a ajudar as famílias e as crianças que vivam em zonas de risco;

Prevenção (artigos 22.o, 23.o e 24.o da Diretiva)

29.

Solicita aos Estados-Membros que criem programas eficazes de prevenção e intervenção, incluindo programas de formação regular, para todos os funcionários, educadores, associações de pais e outras partes interessadas que estejam em contacto com crianças, a fim de melhor avaliar o risco da prática de crimes;

30.

Insta todos os Estados-Membros a aplicarem medidas adequadas, como a sensibilização da opinião pública, campanhas de prevenção, a formação e a criação de programas educativos para as autoridades, os pais, os docentes, as crianças e os menores — também em cooperação com as associações de pais com um papel ativo no domínio da proteção de crianças e menores, bem como com as organizações pertinentes da sociedade civil — a fim de promover a literacia mediática, a segurança em linha e a importância dos valores da família (por exemplo, a responsabilidade mútua, o respeito e a prestação de cuidados), da dignidade humana, da autoestima, da não violência e, de um modo geral, do direito da criança à proteção contra todas as formas de abuso sexual e de exploração sexual;

31.

Insta as instituições da UE e os Estados-Membros a criarem um sistema de proteção das crianças com várias etapas, com base no interesse superior da criança e no pleno respeito pelos seus direitos fundamentais, a fim de enviarem um sinal claro de que todas as formas de abusos físicos, sexuais e emocionais contra crianças são inaceitáveis e puníveis por lei;

32.

Incentiva os Estados-Membros a partilharem boas práticas em matéria de materiais pedagógicos e programas de formação destinados a todos os intervenientes, como professores, pais, educadores e serviços policiais, a fim de os sensibilizar para o aliciamento e outros riscos para a segurança das crianças em linha; exorta os Estados-Membros a criarem programas educativos ambiciosos destinados tanto a pais como a jovens, a fim de os dotar de maiores capacidades, sensibilizando-os para os perigos da Internet e incentivando-os a denunciar incidentes que tenham testemunhado ou de que tenham sido vítimas, em particular através das linhas de apoio criadas especificamente para crianças; considera muito importante dar aos pais orientações para avaliarem os riscos a que os seus filhos possam estar sujeitos e detetarem os primeiros sinais de possíveis abusos sexuais em linha; insta os prestadores de serviços a intensificarem os seus esforços de sensibilização para os riscos associados à utilização da Internet, em particular junto das crianças, através do desenvolvimento de ferramentas interativas e de material informativo;

33.

Insta os Estados-Membros a preverem na sua legislação a verificação obrigatória dos antecedentes criminais das pessoas que se candidatam a empregos ou a atividades de voluntariado que impliquem o acesso a crianças ou o exercício de autoridade sobre elas, e a procederem a um intercâmbio sistemático de informações sobre os indivíduos que representam um risco para as crianças;

34.

Insta os Estados-Membros a procederem ao intercâmbio de informações sobre agressores sexuais de crianças, de forma a impedir que passem despercebidamente de um Estado-Membro para outro para trabalhar ou realizar atividades de voluntariado com crianças ou em instituições que acolhem crianças; incentiva os Estados-Membros a reforçarem o intercâmbio de informações relativas às condenações penais e inibições do exercício de determinadas atividades e a assegurarem a recolha sistemática e coerente de dados nos registos nacionais de agressores; insta os Estados-Membros a cumprirem as suas obrigações previstas no artigo 22.o da Diretiva 2011/93/UE e a oferecerem programas e medidas de intervenção eficazes e revistos por académicos, destinados a pessoas que receiem cometer crimes relativos ao abuso sexual de crianças e outros crimes contemplados nos artigos 3.o a 7.o da Diretiva;

35.

Constata que alguns Estados-Membros desenvolveram sistemas operacionais específicos e capacidades forenses, a fim de investigar casos de abusos sexuais de crianças; observa, no entanto, que a maioria dos Estados-Membros não dispõe de serviços de investigação especializados, nem de meios financeiros para adquirir material forense, como programas informáticos específicos que permitam realizar investigações em linha; recomenda, por conseguinte, que a UE apoie esses serviços, concedendo, se for caso disso, os fundos necessários;

36.

Constata que a maior parte dos casos de exploração e abusos sexuais de crianças não é denunciada às autoridades policiais; insta a Comissão e os Estados-Membros a adotarem medidas adequadas para melhorar e favorecer a denúncia de abusos por parte de crianças e a estudarem a possibilidade de criar mecanismos de denúncia sistemática direta;

37.

Insta os Estados-Membros a desenvolverem ou a reforçarem as linhas telefónicas de apoio às crianças, que oferecem ajuda e apoio às crianças que são vítimas de exploração ou abusos sexuais e que garantem o direito fundamental das crianças a serem ouvidas; solicita aos Estados-Membros que assegurem o funcionamento permanente destas linhas de apoio, a sua acessibilidade através de diferentes meios de comunicação, a confidencialidade, a gratuitidade tanto para as crianças como para as linhas de apoio, a sua posição clara no âmbito dos sistemas nacionais de proteção das crianças, bem como a garantia de financiamento estrutural e a longo prazo destas linhas;

Assistência e proteção às vítimas (artigos 18.o, 19.o e 20.o da Diretiva)

38.

Exorta os Estados-Membros a aplicarem integralmente a Diretiva 2012/29/UE relativa aos direitos das vítimas da criminalidade, a adotarem medidas específicas para proteger as crianças vítimas de crimes e a partilharem boas práticas, a fim de assegurar que as crianças recebam assistência e apoio ao longo de todo o processo penal e posteriormente;

39.

Congratula-se com as boas práticas adotadas em determinados Estados-Membros para a proteção das crianças, como, por exemplo, a Barnhuset na Suécia; insta os Estados-Membros a dedicarem especial atenção à prestação de assistência jurídica e assistência e apoio psicológicos e a evitarem a vitimização secundária das crianças; incentiva os Estados-Membros a lançarem campanhas de sensibilização tanto a nível regional como a nível nacional para promover o apoio às crianças vítimas de crimes e fomentar uma mudança cultural na opinião pública, a fim de evitar atitudes de culpabilização das vítimas, o que pode provocar traumas adicionais nas crianças vítimas de abuso;

Supressão e bloqueio (artigo 25.o)

40.

Congratula-se com o facto de os Estados-Membros terem adotado legislação e medidas administrativas destinadas a suprimir páginas web com material relativo ao abuso sexual de crianças armazenadas no seu território; insta os Estados-Membros a aplicarem na íntegra o artigo 25.o da Diretiva 2011/93/UE e darem prioridade à rápida retirada na fonte de material relativo ao abuso sexual de crianças, com as salvaguardas pertinentes; deplora o facto de apenas metade dos Estados-Membros ter incorporado nas respetivas legislações disposições que permitem bloquear o acesso, no seu território, a esse tipo de páginas web; recorda que, na luta contra a divulgação de material relativo ao abuso sexual de crianças, as medidas de supressão são mais eficazes do que o bloqueio, uma vez que este não elimina o conteúdo;

41.

Lamenta e constata com preocupação que a Comissão, apesar de ter afirmado que alguns Estados-Membros ainda não dispõem de procedimentos de notificação e retirada 16 anos após a entrada em vigor da Diretiva 2000/31/CE (Diretiva relativa ao comércio eletrónico), não indicou que serão tomadas medidas para exigir que esses Estados-Membros cumpram a legislação da UE;

42.

Exorta a Comissão a intensificar os seus esforços para recolher as informações necessárias para determinar quais os procedimentos em vigor nos Estados-Membros que não dispõem de procedimentos de notificação e retirada, nem de sanções penais, e a abrir processos por infração contra os Estados-Membros que não respeitem as obrigações previstas na Diretiva 2000/31/CE sobre esta matéria;

43.

Lamenta o facto de a Comissão não ter avaliado a segurança das listas de páginas bloqueadas, as tecnologias utilizadas para as bloquear nos países que aplicaram as medidas e a aplicação das medidas de segurança, tais como a encriptação, para o armazenamento e a transmissão de listas de bloqueio, nem ter realizado uma análise aprofundada da eficácia desta medida;

44.

Constata que a Diretiva 2011/93/UE não exige bloqueios obrigatórios; reconhece que o bloqueio não é uma tecnologia única, nem de confiança; recomenda a supressão na fonte de conteúdos relativos a abusos de crianças, exploração infantil e abusos sexuais de crianças, no âmbito de ações judiciais e policiais eficazes;

45.

Insta os Estados-Membros a acelerarem, em cooperação com a indústria da Internet, os procedimentos de notificação e retirada, que ainda são demasiado morosos, e a estabelecerem parcerias com as empresas em linha, a Europol e a Eurojust para evitar que as redes e os sistemas sejam pirateados e utilizados de forma abusiva para distribuir material relativo ao abuso sexual de crianças;

46.

Solicita aos Estados-Membros que, nos casos em que o conteúdo é disponibilizado a partir de países terceiros, intensifiquem a sua cooperação com os países terceiros em causa e com a Interpol, a fim de assegurar a supressão imediata dos conteúdos em questão;

47.

Recomenda que as listas negras de sítios web que contêm material relativo ao abuso sexual de crianças sejam regularmente atualizadas pelas autoridades competentes e comunicadas aos fornecedores de serviços Internet, a fim de evitar, por exemplo, situações de bloqueio excessivo e garantir a proporcionalidade; recomenda que os Estados-Membros partilhem essas listas negras de sítios web entre si, com a Europol e o seu Centro Europeu de Cibercriminalidade e com a Interpol; considera que, para o efeito, podem ser aplicadas as tecnologias de endereçamento calculado («hashing») recentemente desenvolvidas, que incluem a deteção e o reconhecimento automático de imagens; salienta que qualquer tecnologia utilizada deve ser rigorosamente testada para eliminar ou, pelo menos, minimizar a possibilidade de pirataria informática, abusos ou efeitos contraproducentes;

48.

Exorta a rede INHOPE a trabalhar com os seus membros no sentido de criar um mecanismo anónimo e seguro de denúncia nas redes da web profunda, tais como as redes da Dark Net que se encontram na rede TOR, que garante o mesmo nível elevado de anonimato que o assegurado pelas organizações de jornalistas para os autores de denúncias, a fim de oferecer aos utilizadores destas redes a possibilidade de fornecerem informações ou de denunciarem a existência de material relativo ao abuso sexual de crianças;

49.

Insta os Estados-Membros a imporem aos fornecedores de serviços Internet a obrigação de informarem pró-ativamente as autoridades policiais e as linhas telefónicas de apoio nacionais sobre material relativo ao abuso sexual de crianças detetado na sua infraestrutura; solicita à Comissão que continue a atribuir financiamento ao abrigo do Mecanismo Interligar a Europa (MIE), a fim de dotar as linhas de apoio dos recursos adequados para cumprirem as suas funções e lutarem contra os conteúdos ilegais em linha;

50.

Reconhece o ativo papel de apoio que desempenham na luta contra o material relativo ao abuso sexual de crianças na Internet as organizações da sociedade civil, como a rede de linhas diretas INHOPE, incluindo a Internet Watch Foundation no Reino Unido; insta a Comissão, em cooperação com a INHOPE, a identificar e aplicar as melhores práticas, nomeadamente no que diz respeito à comunicação de dados estatísticos e à interação eficaz com as autoridades policiais; insta os Estados-Membros que ainda não o fizeram a criarem linhas de apoio, e entende que deve ser autorizada a pesquisa pró-ativa de material relativo ao abuso sexual de crianças em linha;

51.

Insta os Estados-Membros que ainda o não tenham feito a criar, o mais rapidamente possível, mecanismos de denúncia e aconselhamento seguros e adaptados às crianças, tais como linhas diretas, telefónicas ou através da Internet, nomeadamente endereços de correio eletrónico e aplicações para tabletes e telemóveis inteligentes, para que os utilizadores da Internet possam denunciar, inclusive de forma anónima, a existência em linha de material relativo ao abuso sexual de crianças, e sejam capazes de avaliar rapidamente tais conteúdos na perspetiva de aplicar procedimentos de notificação e de retirada de conteúdo armazenado fora do respetivo território; solicita um claro reconhecimento e um reforço destas linhas de apoio e incentiva os Estados-Membros a dotá-las de recursos adequados, como um orçamento suficiente e profissionais com formação especializada; considera que estas linhas de apoio devem ser autorizadas a detetar de forma pró-ativa material relativo ao abuso sexual de crianças em linha e a receber informações por parte do público;

52.

Salienta a necessidade de promover e apoiar programas da UE de informação aos cidadãos, que permitam que estes chamem a atenção das autoridades para conteúdos de determinadas páginas da Internet que sejam ilegais ou nocivos para as crianças;

53.

Insta a Comissão a continuar a manter o Parlamento regularmente informado sobre a situação em matéria de cumprimento da Diretiva por parte dos Estados-Membros, com dados desagregados e comparáveis sobre o desempenho dos Estados-Membros no domínio da prevenção e da luta contra o abuso e a exploração sexual de crianças em linha e fora de linha; solicita à Comissão que apresente um relatório mais exaustivo sobre a aplicação da Diretiva, o qual deve incluir informações e estatísticas suplementares sobre a retirada e o bloqueio de sítios web que contenham material relativo ao abuso sexual de crianças, estatísticas sobre a rapidez de supressão de conteúdos ilegais para além de um período de 72 horas e sobre o seguimento dado pelas autoridades policiais a crimes denunciados, dados sobre os atrasos na retirada devido à necessidade de evitar interferências com inquéritos em curso e informações sobre a utilização de dados armazenados pelas autoridades judiciais e policiais e sobre as medidas tomadas pelas linhas de apoio para contactar os prestadores de serviços de armazenagem depois de informarem as autoridades policiais; encarrega a sua comissão competente de organizar uma audição sobre o estado de adiantamento da aplicação da Diretiva e, eventualmente, de considerar a possibilidade de aprovar um relatório adicional sobre o seguimento dado à sua aplicação;

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54.

Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho, à Comissão e aos parlamentos e governos dos Estados-Membros.

(1)  JO L 335 de 17.12.2011, p. 1.

(2)  JO L 315 de 14.11.2012, p. 57.

(3)  JO C 289 de 9.8.2016, p. 57.

(4)  JO C 316 de 30.8.2016, p. 109.

(5)  Estudos demonstram que os rapazes podem sentir maior inibição em denunciar abusos sexuais, nomeadamente por razões ligadas a preconceitos sociais em relação aos homens. Ver, por exemplo, o estudo da Unidade de Avaliação do Impacto Ex-Post do Serviço de Estudos do Parlamento Europeu, PE 598.614, p. 16, e Schaefer, G.A., Mundt, I.A, Ahlers, C. J., e Bahls, C, «Child sexual abuse and psychological impairment in victims: results of an online study initiated by victims» (Abusos sexuais de menores e transtornos psicológicos das vítimas: resultados de um estudo em linha iniciado pelas vítimas), Journal of Child Sex Abuse, Vol. 21, N.o 3, 2012, pp. 343-360.