Bruxelas, 26.10.2017

COM(2017) 626 final

RELATÓRIO DA COMISSÃO AO PARLAMENTO EUROPEU E AO CONSELHO

A situação dos medicamentos pediátricos na UE aos 10 anos do Regulamento Pediátrico


1.Introdução

Hoje em dia, é de consenso geral que as crianças merecem ter acesso a medicamentos especificamente desenvolvidos e investigados para ser utilizados nos doentes mais jovens. Contudo, até há pouco tempo, o desenvolvimento e ensaio de medicamentos pediátricos estavam longe de ser satisfatórios. Muitos dos medicamentos utilizados em crianças eram receitados e administrados com base na experiência pessoal dos médicos e não nos resultados de investigações clínicas. Além disso, muitas vezes, os medicamentos não se encontravam disponíveis sob uma forma farmacêutica adequada às crianças. Os pediatras viam-se obrigados a recorrer a medicamentos autorizados para adultos, adaptando a dosagem e a forma. Por exemplo, esmagando comprimidos para adultos e utilizando apenas uma porção. Esta utilização não contemplada no rótulo de medicamentos para adultos acarreta o risco de ineficácia e/ou reações adversas nas crianças. Os efeitos secundários que podem não afetar os adultos podem ser importantes e graves nas crianças.

Os inquéritos deram a entender que, em muitas áreas terapêuticas, a utilização não contemplada no rótulo era generalizada, atingindo frequentemente valores acima dos 50 %. A imunização infantil foi uma exceção notável, sendo um dos casos de êxito da medicina moderna.

Existem várias razões pelas quais o desenvolvimento da medicina pediátrica tem sido amplamente negligenciado. Até aos anos 80, argumentava-se frequentemente que as crianças não deviam ser alvo de investigação clínica por motivos éticos. Desde então, ocorreu uma mudança gradual para o consenso atual de que as crianças merecem o mesmo nível de cuidados de saúde que qualquer outro grupo etário, incluindo a prescrição de medicamentos com base em elementos de prova. As considerações económicas também foram um fator que contribuiu para que as empresas se abstivessem de investir proativamente neste setor. O facto de as crianças crescerem e amadurecerem significa que não constituem um subgrupo uniforme. As necessidades e as características biológicas e fisiológicas dos recém-nascidos são muito diferentes das dos adolescentes. Por isso, é muitas vezes necessária uma investigação adicional adequada a cada grupo etário, o que aumenta a complexidade do processo de desenvolvimento de medicamentos pediátricos.

O Regulamento Pediátrico 1 («Regulamento») foi adotado com vista a resolver este problema. Considerou-se necessária uma intervenção legislativa para reverter as tendências anteriores. Na base da legislação esteve um processo de consulta e debate que durou vários anos. Foi igualmente inspirada por desenvolvimentos que tiveram lugar nos Estados Unidos, os quais deram início a abordagens legislativas orientadas para o desenvolvimento de medicamentos pediátricos no final dos anos 90.

Em 2017, assinala-se o 10.º aniversário do Regulamento. De acordo com o artigo 50.º, n.º 3, do Regulamento, o presente relatório descreve as suas realizações, tanto em termos de saúde pública como económicos, e apresenta uma análise que indica em que medida os seus objetivos foram cumpridos. Embora um período de 10 anos proporcione uma valiosa base de dados de experiências, não deixa de ser um período relativamente reduzido face aos longos ciclos de desenvolvimento dos medicamentos, que ascendem, muitas vezes, a perto de uma década.

Este relatório tem por base um relatório decenal preparado pela Agência Europeia de Medicamentos (EMA) e pelo seu Comité Pediátrico 2 , um estudo externo sobre o impacto do Regulamento encomendado pela Comissão 3 , uma consulta pública e debates com os Estados-Membros, o Parlamento Europeu 4 , doentes, empresas, partes interessadas e parceiros externos acerca das respetivas experiências relativamente ao impacto do Regulamento.

2.O Regulamento Pediátrico

O Regulamento estrutura-se em torno de três objetivos principais:

·incentivar e possibilitar uma investigação de alta qualidade para o desenvolvimento de medicamentos para crianças;

·garantir que, no futuro, os medicamentos administrados às crianças são, na sua maioria, especificamente autorizados para o efeito e dotados de formas e formulações adequadas à idade; e

·aumentar a disponibilidade de informações de alta qualidade sobre os medicamentos administrados às crianças.

A fim de cumprir estes objetivos, o Regulamento estabelece um sistema de obrigações, recompensas e incentivos, e adota medidas para assegurar que os medicamentos são regularmente investigados, desenvolvidos e autorizados com vista a dar resposta às necessidades terapêuticas das crianças. Baseia-se na ideia simples de que uma empresa deve ter a obrigação de examinar cada medicamento que desenvolve quanto ao seu potencial uso em crianças, aumentando, assim, progressivamente, o número de medicamentos com indicações pediátricas.

O Regulamento obriga as empresas a acordarem com a EMA, numa fase precoce do desenvolvimento, num programa de Investigação e Desenvolvimento no domínio pediátrico («plano de investigação pediátrica»). O Regulamento tem um impacto direto nas despesas de I&D das empresas, na medida em que impõe um investimento no âmbito da investigação pediátrica. Caso uma empresa não cumpra o acordo, poderá ver bloqueada a respetiva autorização de introdução no mercado (de medicamentos para adultos). Deste modo, o Regulamento vai além dos mecanismos estabelecidos pela legislação relativa a medicamentos para doenças raras («Regulamento relativo aos medicamentos órfãos») 5 , a qual se limita à concessão de incentivos a empresas.

A obrigação estabelecida no Regulamento é complementada por outras medidas, especificamente:

·um sistema de isenções para os medicamentos que provavelmente não virão a beneficiar as crianças e um sistema de diferimentos em relação ao calendário das medidas pediátricas a aplicar;

·uma recompensa pelo cumprimento da obrigação: uma prorrogação de seis meses do certificado complementar de proteção 6 ;

·uma recompensa específica relativamente aos medicamentos órfãos: mais dois anos de exclusividade de comercialização, para além dos dez já concedidos ao abrigo do Regulamento relativo aos medicamentos órfãos;

·um novo tipo de autorização de introdução no mercado, a autorização de introdução no mercado para uso pediátrico (PUMA), para incentivar o desenvolvimento de indicações pediátricas para os medicamentos não protegidos por patente;

·um comité de peritos, o Comité Pediátrico (PDCO), no quadro da EMA; e

·um sistema de prestação de aconselhamento científico gratuito à indústria, assegurado pela EMA.

Além disso, o Regulamento promove informação e investigação de alta qualidade através de outras medidas, tais como

·uma rede da UE de redes de investigadores e centros de ensaio dedicada à investigação pediátrica (Enpr-EMA);

·um inventário de necessidades pediátricas a nível da UE;

·uma base de dados de estudos pediátricos pública; e

·uma exigência segundo a qual as empresas têm de apresentar quaisquer estudos pediátricos existentes relativos a medicamentos autorizados para serem examinados pelas autoridades regulamentares.

Uma das realizações indiscutíveis do Regulamento é a canalização de mais atenção e investimento financeiro para o desenvolvimento de medicamentos pediátricos. As empresas foram basicamente forçadas a estabelecer uma infraestrutura pediátrica e a criar competências para garantir a existência de capacidades de investigação pediátrica apropriadas que suportem o desenvolvimento dos seus medicamentos.

Em 2013, a Comissão publicou um primeiro relatório sobre o impacto do Regulamento e concluiu que existem alguns sinais promissores de progresso 7 . No entanto, determinou que, em virtude da duração do desenvolvimento dos medicamentos, serão necessários pelo menos 10 anos para se compreender plenamente a situação.

O artigo 50.º, n.º 3 do Regulamento requer que a Comissão publique um segundo relatório em 2017. O segundo relatório deve igualmente considerar se devem ser contempladas alterações ao Regulamento.

3.Mais medicamentos para as crianças

Os números demonstram que o Regulamento tem tido um impacto substancial no desenvolvimento dos medicamentos pediátricos na UE. As empresas farmacêuticas consideram agora o desenvolvimento de medicamentos para uso pediátrico como uma parte integrante do desenvolvimento global dos medicamentos, ainda que algumas continuem a encarar a investigação pediátrica como uma necessidade regulamentar e não como uma escolha empresarial.

Em 2007-2016, foram autorizados mais de 260 novos medicamentos para uso pediátrico (novas autorizações de introdução no mercado e novas indicações), a maioria dos quais associada aos requisitos do Regulamento. Em 2017, o número de planos de investigação pediátrica (PIP) aprovados ultrapassou os mil, dos quais 131 foram concluídos no final de 2016. Existe uma clara tendência ascendente no número de PIP concluídos, com mais de 60 % finalizados nos últimos três anos. Além disso, as avaliações de estudos pediátricos levadas a cabo pelas autoridades competentes antes do Regulamento (artigo 45.º) contribuíram para consolidar as provas já existentes e para complementar as informações sobre medicamentos com dados pediátricos.

Uma comparação da situação antes e depois do Regulamento demonstra um efeito claramente positivo em termos de novos medicamentos autorizados. O mesmo se aplica a comparações a nível internacional entre sistemas jurídicos com e sem legislação pediátrica específica: os sistemas jurídicos com disposições legislativas em vigor possuem um número significativamente superior de novos medicamentos pediátricos.

A análise quantitativa acima indicada demonstra um claro progresso. Esses resultados também estão de acordo com as expectativas, considerando que a colocação de um medicamento no mercado pode demorar até 10 anos, o que salienta a mudança incremental proporcionada pelo Regulamento.

Simultaneamente, a emissão de uma autorização de introdução no mercado ou a adição de informações pediátricas a autorizações de introdução no mercado existentes não se traduz automaticamente na disponibilidade imediata do medicamento para todos os doentes pediátricos na UE. Tal pode dever-se a decisões de reembolso pendentes a nível nacional ou a hábitos de prescrição, pois os médicos podem não adotar imediatamente os medicamentos recém-autorizados. Em resposta a um inquérito que contribuiu com informações para este relatório 8 , a maioria dos inquiridos estimou que o aumento dos medicamentos disponíveis se encontrava na ordem dos 5-10 %. Relativamente aos hábitos de prescrição, 58 % dos inquiridos indicaram que, como resultado do Regulamento, os médicos estão a prescrever cada vez mais medicamentos aprovados segundo a respetiva indicação aprovada para crianças. Isto demonstra uma tendência positiva, mas salienta igualmente uma certa inércia. Em última instância, a redução da utilização não contemplada no rótulo em crianças depende não só da existência de mais medicamentos pediátricos autorizados, como também da disponibilidade e utilização efetivas nos doentes.

Neste contexto, observa-se que as empresas recorrem frequentemente ao lançamento escalonado de novos medicamentos, com consequentes atrasos, até que o medicamento esteja finalmente disponível em toda a UE. Esta situação não pode ser evitada na totalidade, mesmo que o Regulamento inclua diversos instrumentos para garantir que, assim que um PIP esteja concluído e o medicamento pediátrico seja autorizado, o medicamento seja colocado no mercado. Por exemplo, a recompensa relativa ao certificado complementar de proteção ao abrigo do artigo 36.º só será concedida se o medicamento for autorizado em todos os Estados-Membros. O artigo 33.º prevê igualmente uma obrigação de colocar o medicamento no mercado no prazo de dois anos a contar da data de autorização de uma nova indicação pediátrica.

A rápida disponibilidade dos medicamentos pediátricos também pode ser influenciada por atrasos na conclusão dos estudos pediátricos em comparação com a finalização e a autorização do medicamento para adultos correspondente. O Regulamento inclui disposições para o diferimento do início ou da conclusão de algumas ou de todas as medidas constantes num PIP (artigo 20.º), a fim de garantir que a investigação só seja realizada nos casos em que tal seja seguro e ético. Além disso, destina-se a evitar bloqueios ou atrasos à autorização de medicamentos para a população adulta.

A experiência demonstra que o diferimento é um instrumento amplamente utilizado. Na prática, quase todos os PIP relativos a novos medicamentos associados ao desenvolvimento de um medicamento para adultos incluem um diferimento de uma ou mais medidas. O diferimento é, em princípio, um instrumento útil e apropriado e não existe qualquer evidência de que os requisitos pediátricos tenham atrasado o processamento de pedidos relativos a medicamentos para adultos. Contudo, em alguns casos, o Comité Pediátrico aceitou diferimentos muito longos. Esta situação pode ser frustrante para os médicos e para os doentes, especialmente se significar que um medicamento pediátrico promissor apenas estará disponível vários anos após a aceitação da autorização para uso em adultos. Além disso, a experiência demonstra que, se o início de um ensaio pediátrico for adiado para uma data posterior à autorização para uso em adultos, o recrutamento de doentes para ensaios pediátricos torna-se mais difícil. A partir do momento em que é possível utilizar o medicamento para adultos (de forma não contemplada no rótulo) em crianças, os pais podem não tomar consciência da mais-valia que advém de concordarem que o seu filho participe na investigação clínica. Em alguns casos, os diferimentos também estiveram associados à apresentação tardia de um PIP. Embora exista uma tendência decrescente nas apresentações tardia (atualmente na ordem dos 10-20 %), a aceitação de diferimento nesses casos pode requerer uma análise mais aprofundada para evitar que as mesmas comprometam o rápido progresso nas terapêuticas pediátricas.

Neste contexto, a EMA e o respetivo Comité Pediátrico encontram-se atualmente em processo de revisão das práticas anteriores a fim de assegurar a coerência e evitar diferimentos significativos. Tendo em vista o desenvolvimento científico, pode argumentar-se que a aceitação de longos diferimentos equivale a questionar os benefícios terapêuticos significativos decorrentes do desenvolvimento de medicamentos em relação a tratamentos já existentes para doentes pediátricos. Nesses casos, o valor acrescentado dos estudos pediátricos pode ser marginal. Além disso, os diferimentos prolongados podem comprometer a aplicação dos requisitos pediátricos e a disponibilidade de qualquer recompensa, especialmente se o diferimento terminar após os períodos de proteção do medicamento terem expirado.

4.Melhores medicamentos para as crianças

Nos últimos 10 anos, graças ao Regulamento, tem-se assistido a um progresso considerável na disponibilidade dos medicamentos para crianças em determinadas áreas terapêuticas. A reumatologia ou as doenças infecciosas são frequentemente referidas como exemplos paradigmáticos. O aumento significativo, após a conclusão dos PIP, de novos tratamentos para crianças com doenças reumatológicas transformou um setor que, anteriormente, se encontrava negligenciado.

Ao mesmo tempo, esses desenvolvimentos positivos não seguem um plano estratégico, estando muitas vezes associados a desenvolvimentos nos mercados dos medicamentos para adultos. Uma vez que o ponto de partida para a maioria dos PIP é um programa de investigação e desenvolvimento para adultos, o progresso num campo pediátrico depende da oferta de medicamentos para adultos pelas empresas e é influenciado pelas perspetivas de lucro num segmento de mercado específico. Nos casos em que as necessidades dos adultos ou as expectativas de mercado coincidem com necessidades pediátricas, as crianças beneficiarão diretamente. Contudo, existe um número considerável de doenças que são biologicamente diferentes nos adultos e nas crianças, em que a carga da doença difere ou que existem apenas nas crianças. É nessas doenças que, por vezes, o mecanismo introduzido pelo Regulamento se debate com as realidades científicas, clínicas e do mercado.

Esta situação funciona nos dois sentidos. Um exemplo recente em que uma vaga de novos desenvolvimentos de medicamentos para adultos pode representar um risco de sobrecarga do sistema é a diabetes tipo II: uma doença que é marcada pela prevalência sempre crescente entre jovens adultos desde os anos 80. Ao longo dos últimos anos, muitas empresas concentraram-se nesta área terapêutica, o que levou a um pico nas atividades e a uma maior oferta de novos medicamentos. Estas vagas conduzem paralelamente a um aumento do número de programas de investigação pediátrica, mesmo se (do ponto de vista das necessidades terapêuticas) um número menor pudesse ser suficiente, dado que a diabetes tipo II ainda é relativamente rara nas crianças. A discrepância entre a carga da doença ao nível dos adultos e das crianças também pode gerar problemas de exequibilidade na realização de ensaios pediátricos, na medida em que poderão não existir doentes jovens em número suficiente para participarem em estudos PIP. Para resolver esses problemas, sugeriu-se que as empresas deveriam participar em atividades de investigação colaborativa, a fim de fazerem um melhor aproveitamento do banco limitado de doentes. Contudo, as empresas estão hesitantes, especialmente no que diz respeito a desenvolvimentos com potencial estatuto de grande consumo em adultos. Paralelamente, o Comité Pediátrico não se encontra em posição de estabelecer prioridades entre PIP relativamente à mesma área terapêutica. Muitas vezes, trata-se de uma situação paradoxal, na medida em que somente os resultados de ensaios clínicos poderiam servir de base ao Comité Pediátrico para determinar a sua escolha dos componentes que poderão apresentar os resultados mais promissores em crianças. Contudo, a intervenção do Comité Pediátrico e a aprovação de um plano de investigação pediátrica têm normalmente lugar antes da disponibilidade desses resultados, na medida em que a finalidade de um PIP consiste em identificar e aprovar os estudos que é necessário realizar.

No outro extremo, encontram-se doenças que são exclusivas da população pediátrica, em que o desenvolvimento pediátrico depende tipicamente da decisão estratégica de uma empresa no sentido de investir nesta área, independentemente de qualquer programa para adultos em curso. Isto é especialmente verdadeiro no caso de doenças raras em crianças, tais como o cancro pediátrico.

Felizmente, uma análise dos PIP aprovados demonstra que abrangem um vasto leque de áreas terapêuticas, com as doenças infecciosas (12 %), a oncologia (10 %) e as doenças endócrinas/metabólicas (9 %) na linha da frente, embora não exista predominância de qualquer área. No geral, trata-se de um sinal positivo, na medida em que demonstra a existência de atividades pediátricas que abrangem um vasto leque de doenças. Contudo, um grande número de PIP aprovados não significa necessariamente um grande número de PIP concluídos. Atualmente, as patologias com o maior número de PIP concluídos encontram-se no campo da imunologia/reumatologia (14 %), doenças infecciosas (14 %), doenças cardiovasculares e vacinas (10 % cada), sendo que a oncologia e as doenças endócrinas/metabólicas correspondem apenas a 7 % dos PIP concluídos. Além disso, o desenvolvimento em termos de PIP aprovados e concluídos não corresponde necessariamente à incidência das doenças pediátricas, o que sublinha o facto de que o desenvolvimento de medicamentos pediátricos é muitas vezes impulsionado pelo desenvolvimento de medicamentos para adultos. As possibilidades que o Regulamento tem de orientar atividades para determinadas áreas terapêuticas são limitadas. Tal constitui um importante estímulo, mas o impacto qualitativo mantém-se dependente das forças de mercado, dos motores do crescimento e das considerações estratégicas das empresas.

No debate relativo às necessidades pediátricas, a oncologia pediátrica é frequentemente utilizada como estudo de caso quanto à insuficiência de avanços numa área com um grande número de necessidades pediátricas não satisfeitas. Embora o cancro seja raro nas crianças, continua a ser a principal causa de morte por doença após a primeira infância, apesar da melhoria das taxas de sobrevivência para alguns tipos de cancro nas últimas décadas.

O debate sobre a oncologia pediátrica está frequentemente associado ao conceito de isenção definido no artigo 11.º do Regulamento, que estabelece que a obrigatoriedade de um PIP pode ser derrogada para determinados medicamentos ou classes de medicamentos em circunstâncias específicas. Tal acontece se um medicamento for suscetível de ser ineficaz ou inseguro para crianças ou se não possuir um benefício terapêutico significativo face aos tratamentos existentes. A obrigação também é derrogada se a doença ou patologia para a qual o medicamento se destina ocorrer apenas em adultos.

A isenção destina-se a evitar a investigação desnecessária ou mesmo antiética, bem como a enquadrar devidamente o âmbito das obrigações e é considerada um instrumento apropriado. Entre 2007 e 2016, a EMA concedeu algumas isenções de classes e 486 isenções específicas relativamente ao uso de um medicamento em uma ou mais doenças. Contudo, embora a isenção de estudos pediátricos seja geralmente adequada, se a doença-alvo não existir nas crianças, não se exclui que o composto possa ainda ser eficaz para as crianças, embora no âmbito de uma doença diferente. Por exemplo, embora muitos cancros pediátricos partilhem semelhanças biológicas com os cancros na idade adulta, ocorrem em órgãos diferentes, sendo, por isso, geralmente considerados doenças diferentes. Consequentemente, uma empresa pode ter direito a uma isenção mesmo que o mecanismo de ação do composto desenvolvido para adultos e o respetivo alvo molecular também possa m ser eficazes no tratamento de certos cancros pediátricos.

Nos últimos anos, assistiu-se a uma vaga de fármacos inovadores para tratamento do cancro em adultos com a entrada no mercado de alguns medicamentos first-in-class (medicamentos com um novo mecanismo para o tratamento de uma doença), criando melhores opções de tratamento, melhores resultados para os doentes e taxas de sobrevivência mais longas. Atualmente, os tratamentos do cancro representam a maior categoria de novos medicamentos, atendendo igualmente ao potencial de lucro dos mesmos. Prevê-se ainda que continuarão a transformar o panorama terapêutico 9 .

Cerca de um quarto do total dos medicamentos atualmente em fase de desenvolvimento avançada corresponde a terapêuticas do cancro. Um indicador da continuação do grande interesse no desenvolvimento de medicamentos contra o cancro é o Regulamento relativo a medicamentos órfãos, no qual as terapêuticas do cancro pertencem às doenças órfãs mais frequentemente designadas, o que revela uma tendência para os medicamentos direcionados 10 . Contudo, até agora, este ritmo dos avanços observado nas terapêuticas para adultos não se reflete nos doentes pediátricos. Em alguns cancros pediátricos, os medicamentos mais utilizados, a existirem, remontam aos anos 90.

Simultaneamente, o Regulamento teve impacto e levou à autorização de novos medicamentos anticancro. Foram concluídos sete desenvolvimentos em PIP, proporcionando opções de tratamento para o glioma de alto grau, o rabdomiossarcoma, o astrocitoma e a leucemia linfoblástica aguda.

O número de PIP aprovados relativos a medicamentos anticancro (68), os quais abrangem mais de 30 mecanismos de ação diferentes, constitui uma promessa de desenvolvimentos adicionais no futuro. Alguns destes PIP baseiam-se no princípio do mecanismo de ação, isto é, embora a empresa pudesse ter potencialmente contado com uma isenção, comprometeu-se com a investigação pediátrica tendo em vista o potencial benefício do composto para o tratamento de cancros infantis.

O assumir deste compromisso pode ter sido um efeito secundário do Regulamento que, por definição, incentivou as empresas a reforçar as suas competências no desenvolvimento de medicamentos pediátricos. Tal pode ter influenciado as decisões estratégicas das empresas a favor da cobertura de necessidades pediátricas, em particular através da utilização de métodos de ensaio inovadores, tais como os ensaios basket, que consistem em testar um composto face a vários tipos de cancro para poder selecionar o mais cedo possível os desenvolvimentos mais promissores. Além disso, a UE oferece financiamento específico para investigação sobre o cancro, incluindo através do Fundo Europeu para Investimentos Estratégicos 11 .

Os resultados acima indicados são mistos, o que levou a que algumas entidades defendessem um maior recurso ao princípio do mecanismo de ação e alterações legislativas ao conceito de isenção com o intuito de forçar as empresas a investir mais no desenvolvimento de medicamentos contra o cancro pediátrico. Contudo, tal poderia ter impacto sobre a previsibilidade do âmbito de um PIP e levar as empresas a reconsiderarem o desenvolvimento global de medicamentos.

A EMA reviu, em 2015, a sua decisão de isenção de classe à luz do princípio do mecanismo de ação, limitando, assim, o âmbito da mesma. Esta abordagem poderá contribuir para uma colaboração com as empresas que desenvolvem medicamentos anticancro. Se essas empresas pretenderem continuar a recorrer a uma isenção, terão de o justificar através de um requerimento direto ao Comité Pediátrico (através de uma isenção relativa a um medicamento específico). O processo permite o debate direto para realçar o potencial pediátrico, não obstante o referido requerimento de isenção. Da mesma forma, irá forçar as empresas a contactarem o comité numa fase mais precoce do desenvolvimento, para se assegurarem dos requisitos do Regulamento. Os efeitos desta revisão de isenção de classe ainda não são visíveis, uma vez que o período de transição de três anos ainda não decorreu na totalidade, mas a abordagem pode permitir uma melhor adesão pelas empresas, em detrimento de regras estatutárias impostas.

Além disso, ainda não se compreendeu na totalidade o motivo pelo qual as empresas se abstêm de colher os benefícios do Regulamento relativo aos medicamentos órfãos para cancros pediátricos da mesma forma que o fazem no âmbito dos cancros em adultos. Um número considerável de novos medicamentos contra o cancro em adultos beneficia do estímulo proporcionado pelo Regulamento relativo aos medicamentos órfãos, embora o mesmo não se observe no caso dos cancros pediátricos, apesar de todos se qualificarem como raros à luz do Regulamento relativo aos medicamentos órfãos.

5.Avanço nos desenvolvimentos a nível puramente pediátrico

O impacto positivo do Regulamento e a mudança na cultura que o mesmo estimulou são particularmente visíveis na integração do desenvolvimento pediátrico no desenvolvimento global de novos medicamentos. É menos óbvio nos desenvolvimentos pediátricos puros, que não são um derivado de um projeto para adultos, mas onde uma empresa visa o desenvolvimento de um medicamento exclusivo para crianças para uma doença pediátrica específica.

Os dados disponíveis não fornecem provas suficientes para qualquer conclusão firme. Contudo, alguns defendem que, no caso de medicamentos apenas para crianças, o processo PIP acrescenta uma camada de complexidade adicional a um medicamento destinado ao tratamento de crianças, prolongando potencialmente os prazos de desenvolvimento. Embora a EMA e o Comité Pediátrico ainda possam fornecer orientações úteis e garantir um desenvolvimento que abrange todos os subconjuntos pediátricos relevantes, o impacto é menos significativo em comparação com os desenvolvimentos para adultos. Dito isto, pelo menos nos anos iniciais do Regulamento, as empresas podem ter dado prioridade a projetos pediátricos associados a um desenvolvimento para adultos em detrimento de projetos exclusivamente pediátricos, a fim de assegurar a conclusão atempada dos mesmos. Embora esta tendência possa mudar ao longo do tempo, especialmente no que diz respeito a doenças pediátricas raras, parece necessário compreender melhor o impacto combinado do Regulamento relativo aos medicamentos órfãos e do Regulamento Pediátrico e como estes se correlacionam para avaliar o valor acrescentado destes instrumentos estatutários em doenças exclusivamente pediátricas.

Existe uma categoria de desenvolvimentos exclusivamente pediátricos para a qual o Regulamento tenta gerar interesse específico mas, até à data, tal tentativa não teve êxito. Introduziu o conceito de uma autorização de introdução no mercado para uso pediátrico (PUMA). O objetivo principal do conceito PUMA (artigo 30.º) consiste em estimular a investigação de compostos existentes não protegidos por patente e/ou ajudar a transformar a utilização não contemplada no rótulo numa utilização autorizada que seja mais segura e melhor enquadrada através da autorização de introdução no mercado. Uma vez aprovada, a PUMA faculta ao fabricante um período de proteção de comercialização com a duração de 10 anos, durante o qual não é possível introduzir cópias genéricas no mercado.

Até à data, foram concedidas apenas três PUMA. Este número é claramente inferior aos níveis esperados, tendo em conta que, durante vários anos, tem sido fornecido financiamento da UE específico oriundo do programa FP7 destinado a medicamentos não protegidos por patente. Embora a EMA tenha aprovado mais de 20 PIP com vista à apresentação de uma PUMA, continua sem haver certezas quanto ao número de PUMA que virão a ser concluídas e que conduzirão à comercialização de um novo medicamento.

Numa tentativa de criar interesse adicional, a Comissão e a EMA esclareceram, em 2014, que um PIP relativo a uma PUMA não tem de abranger necessariamente todos os grupos etários mas, até agora, o impacto tem sido limitado. Embora esta situação possa permitir que as empresas centrem a investigação nos subconjuntos pediátricos com mais prevalência, pode conduzir a uma redução ainda maior da população-alvo e das potenciais receitas.

O conceito PUMA debate-se com problemas semelhantes aos de qualquer esquema destinado a incentivar as empresas a investir em investigação adicional relativa a compostos conhecidos que se encontram no mercado há muito tempo (reorientação). Os promotores de medicamentos receiam que uma PUMA não venha necessariamente a evitar que os médicos continuem a utilizar medicamentos da concorrência com o mesmo ingrediente ativo mas autorizados para outras indicações não contempladas no rótulo, a custos reduzidos, nem a substituição por formas mais baratas ao nível das farmácias. Além disso, os contribuintes do sistema nacional de saúde normalmente têm relutância em aceitar um preço superior por esses medicamentos.

Dado o número atualmente limitado de PUMA concedidas, não é possível verificar se esses riscos são justificados nem o valor económico da recompensa das PUMA. Embora os dados disponíveis demonstrem que os medicamentos autorizados através das PUMA foram objeto de decisões de reembolso positivas em vários Estados-Membros e representam casos comerciais bem-sucedidos, tal pode ser apenas a exceção à regra, suportada, em parte, pelas especificidades dos medicamentos e não pelo próprio conceito PUMA.

Isto demonstra que o êxito comercial de uma PUMA é influenciado por fatores complexos que dificilmente poderão ser tratados ao nível da UE. Dizem respeito a tomadas de decisão a jusante a nível nacional, o que não se inscreve no âmbito do direito da União. A existência de incentivos legislativos não pode compensar o êxito económico. Tem-se sugerido que uma PUMA pode ser eficaz em casos que requerem uma formulação ou dosagem específica para crianças mas, embora esta hipótese seja válida em teoria, a experiência demonstra que o rótulo PUMA não exclui inteiramente que os médicos continuem a prescrever medicamentos não adaptados às crianças.

6.Os custos dos medicamentos pediátricos

O Regulamento coloca um encargo adicional sobre as empresas farmacêuticas ao solicitar-lhes a realização de investigação pediátrica que, de outra forma, poderiam não ter levado a cabo. Tal requer investimento adicional e a vigilância da conformidade. Contudo, o Regulamento associa esta obrigação a um sistema de recompensa para permitir que as empresas recuperem os custos iniciais adicionais incorridos como resultado do mesmo, através de períodos de proteção prolongados. A este respeito, o sistema da UE difere do sistema norte-americano, em que os requisitos pediátricos impostos pela Food and Drug Administration (FDA) dos EUA não atraem uma recompensa, salvo aquelas em que uma empresa desenvolve voluntariamente uma investigação adicional na sequência de um «Pedido por escrito» da FDA dos EUA.

A recompensa fica disponível assim que o PIP é concluído e os resultados do mesmo se refletem numa autorização de introdução no mercado correspondente. A empresa tem direito à recompensa mesmo que os resultados dos estudos pediátricos acabem por não corroborar um uso pediátrico do composto, uma vez que se destina a compensar a investigação como tal e não um resultado específico. O Regulamento faz a distinção entre duas recompensas principais, a recompensa relativa ao CCP e a recompensa relativa aos medicamentos órfãos. Estas recompensas são mutuamente exclusivas e têm objetivos distintos, mas têm ambas o efeito de adiar a entrada no mercado de medicamentos da concorrência. Assim, as receitas adicionais provenientes das recompensas são, em última instância, cobertas pelos contribuintes do sistema nacional de saúde e/ou pelos doentes, na medida em que a sociedade não beneficia com o aumento da concorrência e a redução de preços durante a extensão da exclusividade.

Nos termos do artigo 36.º do Regulamento, a empresa pode obter uma prorrogação de seis meses da duração do CCP. Os CCP são um direito autónomo sui generis associado à existência de uma patente básica. Compensam o titular de uma patente pelos longos períodos até obter uma autorização de introdução no mercado, durante os quais não pode explorar comercialmente a patente. Deste modo, o CCP confere uma posição semelhante a um direito de patente com duração variável (de zero a um máximo de cinco anos). É este o período que será prolongado através da recompensa relativa ao CCP ou que poderá passar a positivo, caso fosse anteriormente negativo 12 . É interessante constatar que a legislatura optou por um sistema de recompensa externa associado ao estatuto de patente de um medicamento em detrimento do sistema de recompensa de proteção regulamentar de dados, específico para os medicamentos.

A recompensa relativa aos medicamentos órfãos (artigo 37.º) consiste numa prorrogação de dois anos do período de exclusividade de mercado dos medicamentos órfãos, ou seja, até 12 anos. Um dos motivos para a introdução de uma recompensa específica para os medicamentos órfãos foi o facto de que, quando a proposta jurídica relativa ao Regulamento foi debatida, a maioria dos medicamentos designados como órfãos não estava protegida por patente. Por isso, considerou-se apropriado facultar uma recompensa alternativa para garantir que os fabricantes de medicamentos órfãos também possam ter acesso a compensação.

O sistema do Regulamento assenta no pressuposto de que os medicamentos que se enquadram no requisito do PIP devem ser elegíveis para a recompensa, assim que o desenvolvimento pediátrico estiver concluído. Contudo, na realidade, nem todas as empresas conseguiram obter uma recompensa. Os números sugerem que, até à data, apenas 55 % dos PIP concluídos beneficiaram de uma recompensa. A maioria destas assumiu a forma de um prolongamento do CCP. Em alguns casos, foi concedido o período de exclusividade de mercado de um medicamento órfão. Embora se preveja que, ao longo do tempo, a proporção de medicamentos que beneficiam da recompensa venha a aumentar, na medida em que as empresas começam a planear a sua investigação pediátrica de forma mais adequada e antecipada, é pouco provável que a taxa de êxito venha a alcançar os 100 %.

6.1.A recompensa relativa ao certificado complementar de proteção

O prolongamento do CCP é muitas vezes considerado como a melhor recompensa. Até ao final de 2016, mais de 40 medicamentos beneficiaram da recompensa relativa ao CCP e as empresas candidataram-se aos respetivos certificados a nível nacional. O número de prolongamentos de CCP concedidos nos últimos 10 anos (mais de 500) demonstra que as empresas recebem regularmente a recompensa da parte do instituto nacional de patentes ao qual se candidatam. Esta situação aponta para um sistema de recompensa que funciona.

Ao mesmo tempo, o uso de um sistema de recompensa externo associado a outro instrumento jurídico leva a complicações e ineficiências. Por exemplo, os CCP são títulos nacionais, o que significa que as prorrogações têm de ser obtidas junto do instituto nacional de patentes de cada Estado-Membro em que um CCP existe sendo, por isso, considerado por alguns como um procedimento demasiado complexo.

Além disso, a candidatura à prorrogação do CCP deve ser apresentada dois anos antes do termo da validade do certificado. Em alguns casos, tal resultou na não obtenção da recompensa por algumas empresas, uma vez que não concluíram o PIP a tempo. Por outro lado, este prazo estimula as empresas a acelerarem a conclusão da investigação pediátrica e assegura que os concorrentes genéricos obtêm antecipadamente informações suficientes acerca de qualquer prolongamento do período de proteção que possa ter impacto sobre o lançamento de cópias genéricas no mercado.

O Regulamento relativo ao CCP é, neste momento, objeto de uma avaliação iniciada pela Comissão no sentido de analisar a utilidade do instrumento 13 . Os resultados e as consequências para o futuro do sistema CCP ainda não são conhecidos, mas estão previstos para os próximos meses. Qualquer modernização ou recalibração poderá responder a eventuais ineficiências do sistema CCP, mas pode também ter impacto direto sobre o funcionamento do sistema de recompensas pediátricas e, por conseguinte, sobre o próprio Regulamento. Assim, é importante ter em conta os resultados dessa avaliação em qualquer decisão política acerca do Regulamento.

O valor monetário das recompensas relativas ao CCP depende, em grande medida, das receitas globais geradas por um medicamento específico durante o período em que se encontra protegido por um CCP. A concorrência de genéricos será atrasada para a totalidade do medicamento (incluindo o uso por adultos), garantindo um período adicional de receitas extraordinárias ao titular da autorização de introdução no mercado. Historicamente, este período corresponde ao pico de vendas. Contudo, as novas tendências de mercado podem levar a uma redução dos prazos de retorno de receitas. A posição de mercado de um medicamento pode diminuir ao longo do tempo com a entrada no mercado de novos medicamentos inovadores da mesma classe terapêutica.

Para estimar o benefício económico para as empresas derivado da recompensa, é necessário estabelecer, em primeiro lugar, os custos regulamentares incorridos pelas empresas para fins de cumprimento de um PIP. Com base num estudo externo encomendado pela Comissão 14 , o custo total do Regulamento para toda a indústria está calculado em 2,1 mil milhões de EUR anuais. Este número deriva de uma extrapolação baseada em 85 PIP reais. Os custos totais de I&D totalizam, em média, 18,9 milhões de EUR por PIP, sendo que cada plano inclui uma média de três estudos clínicos. A juntar a tudo isto, as empresas incorrem em despesas gerais de cerca de 720 000 EUR relacionadas com a apresentação inicial de um PIP e modificações posteriores.

Embora estas médias se baseiem numa dimensão de amostra relativamente robusta, não se pode excluir eventuais riscos de sobrestimação ou subestimação. Além disso, as estimativas baseadas em médias significa que há desvios, em especial no que diz respeito aos custos relacionados com ensaios clínicos (fase II e fase III), que constituem a maior parcela dos custos de I&D 15 . No entanto, esses números sugerem que os custos adicionais em que a indústria incorre como consequência do Regulamento levam apenas a um aumento limitado do custo total do desenvolvimento dos medicamentos.

Para comparar os referidos custos com o valor da recompensa relativa ao CCP, foram especificamente analisados oito medicamentos. Esta seleção inclui medicamentos que receberam prorrogações de CCP e perderam a proteção antes do final de 2014. Naturalmente, a dimensão da amostra é muito reduzida, uma vez que, até agora, apenas uma fração dos medicamentos com PIP concluídos perdeu direitos de exclusividade e fornece dados sobre o impacto da perda sobre as receitas. Embora seja necessário interpretar os números relativos a esses medicamentos com alguma precaução, uma vez que, nos primeiros anos, as empresas podem ter dado prioridade a medicamentos que apresentaram os valores mais altos na estimativa do retorno do investimento resultante do prolongamento dos CCP, esses números permitem obter uma perspetiva interessante do valor económico da recompensa, comparando as receitas reais com a prorrogação do CCP com as receitas hipotéticas sem essa prorrogação.

Os dados demonstram que a queda de preço dos medicamentos de marca tem normalmente início no primeiro trimestre após a perda de exclusividade, mas de forma limitada (até 20 %), antes de sofrer uma maior diminuição. Existem diferenças significativas entre medicamentos e países, muito provavelmente associadas à competitividade do mercado terapêutico específico e/ou a políticas nacionais de estímulo à substituição por genéricos, o que conduz a uma grande variação do valor económico da prorrogação do CCP como uma percentagem do total das receitas (entre 10 e 93 %). Globalmente, o valor económico ajustado da recompensa relativa ao CCP para os oito medicamentos em questão ascende a 926 milhões de EUR, com as receitas especialmente orientadas para alguns medicamentos de grande consumo incluídos na dimensão da amostra.

Embora este número possa ser comparado com os custos médios de I&D por PIP (18,9 milhões), uma abordagem mais granular poderá concentrar-se numa relação custobenefício baseada nos oito desenvolvimentos. Isto traduz-se na comparação dos benefícios estimados para a sociedade e a saúde infantil, resultantes do desenvolvimento pediátrico posto em prática, com os custos para a sociedade resultantes da contrapartida adicional relativa ao monopólio obtida pela empresa através do sistema de recompensa.

Tal comparação é de natureza exploratória, uma vez que tem de colocar um valor monetário no impacto positivo em termos de melhoria dos tratamentos para crianças e de uma redução da utilização não contemplada no rótulo, bem como do potencial de reações adversas a medicamentos. Com base num modelo desenvolvido como parte do estudo económico, dois dos oito medicamentos revelam uma relação custo-benefício altamente favorável para os sistemas de saúde quando calculados ao longo de um período de 10 anos, isto é, os benefícios, em termos monetários, para a sociedade e para a saúde suplantam os custos adicionais decorrentes da contrapartida adicional relativa ao monopólio. Todos os outros medicamentos apresentam uma relação custo-benefício negativa ao longo de 10 anos, especialmente aqueles para os quais a conclusão do PIP não resultou numa nova indicação pediátrica. Embora seja ainda útil saber com segurança que um medicamento para adultos não deve ser utilizado em crianças, o valor económico dessa informação é muito menor quando comparado com o dos medicamentos que proporcionam novas alternativas de tratamento aos doentes pediátricos.

Contudo, poderá ser necessário ajustar esses resultados aos medicamentos que tiveram de cumprir a obrigação do PIP mas não conseguiram obter uma recompensa no período relevante (cerca de 45 %). Os resultados traduziram-se na disponibilidade de informações pediátricas valiosas sem que a sociedade tivesse de contribuir para os custos incorridos através das contrapartidas adicionais relativas ao monopólio. Se esses medicamentos fizerem parte da equação, os resultados melhoram, mas a relação custo-benefício mantém-se negativa.

Além disso, o Regulamento pode gerar efeitos colaterais a nível económico em virtude do investimento adicional em I&D para medicamentos novos e melhorados, o qual gera investimento acrescido e contribui para a criação de empregos, para o crescimento e para a atividade inovadora em vários setores. Uma taxa de retorno estimada mais conservadora resultante de um investimento anual de 2,1 mil milhões de EUR em I&D pediátrico poderá, ao fim de 10 anos, proporcionar um retorno societal total de cerca de 6 mil milhões de EUR 16 . Este retorno societal estimado é significativamente mais elevado do que o valor económico da prorrogação dos CCP, o que sugere que, em termos monetários, os benefícios do Regulamento para a sociedade suplantam os custos da contrapartida adicional relativa ao monopólio.

6.2.A recompensa relativa aos medicamentos órfãos

Até à data, sete medicamentos obtiveram a recompensa relativa aos medicamentos órfãos de dois anos adicionais de exclusividade de mercado, o primeiro dos quais em 2014. Contudo, em alguns casos, as empresas renunciaram voluntariamente à designação de medicamento órfão a fim de tornarem o medicamento elegível para a recompensa relativa ao CCP. Tal pode explicar-se pelo facto de que a recompensa relativa ao CCP protege toda a família de medicamentos de um composto específico em diversas indicações terapêuticas, enquanto a recompensa relativa a medicamentos órfãos se limita a proteger o uso de medicamentos órfãos. Assim, nos casos em que os medicamentos apresentam as condições tanto de comuns como de raros, as receitas de uma prorrogação de 6 meses do CCP poderão ser superiores às de uma exclusividade de mercado de dois anos na condição de órfãos.

Um fator determinante pode ser o facto de cada vez mais medicamentos órfãos recém-autorizados estarem protegidos por patente (atualmente, mais de 90 %), o que é uma notícia positiva, na medida em que demonstra que o sistema facultado pelo Regulamento relativo aos medicamentos órfãos atrai medicamentos inovadores baseados em nova investigação. Por outro lado, aponta para um ponto fraco da recompensa relativa aos medicamentos órfãos, que se destina principalmente a medicamentos não protegidos por patente e não incorpora a flexibilidade que permite que as empresas mantenham o estatuto de órfão do medicamento optando, contudo, pela recompensa relativa ao CCP.

Nesta fase e sem estudos adicionais, não é possível estimar o valor económico da recompensa relativa aos medicamentos órfãos, com base numa dimensão de amostra semelhante à da recompensa relativa ao CCP, uma vez que a maioria dos medicamentos ainda se encontra sob proteção. Assim, não é possível analisar o verdadeiro impacto sobre as receitas da perda de exclusividade. Por exemplo, não existe qualquer garantia de que os genéricos irão entrar no mercado ou de que entrarão ao mesmo ritmo que os medicamentos não órfãos, dada a raridade da doença e a dimensão limitada do mercado relevante. Contudo, para estimar o valor económico, poderá ser utilizado um modelo económico semelhante à abordagem utilizada para o cálculo da recompensa relativa ao CCP, com a principal diferença de que o atraso é de dois anos em vez de seis meses.

7.Implementação melhorada

O Regulamento atribui à EMA e ao seu Comité Pediátrico a principal responsabilidade pela gestão de PIP, diferimentos e isenções. Por isso, a EMA tem um papel preponderante na implementação do Regulamento. Foram envidados esforços para aprender com os primeiros anos da implementação e para simplificar os pareceres dos PIP no sentido de reduzir a necessidade de modificação, caso não existam alterações significativas ao programa. Estes esforços contribuíram para reduzir o índice global de alterações, ainda que os números demonstrem que, em média, um PIP foi modificado pelo menos uma vez. As causas mais comuns prendem-se com os prazos (43 %) ou o número de crianças inscritas num estudo (14 %).

Além disso, a revisão das diretrizes da Comissão relativamente ao formato e ao conteúdo dos planos de investigação pediátrica em 2014 17 introduziu medidas para simplificar o processo de aprovação dos planos. É também de salientar que, em 2015, a EMA levou a cabo reuniões de interação prévia com as empresas a fim de permitir a integração das necessidades pediátricas nas fases iniciais do desenvolvimento de medicamentos. Com base nesta experiência, revisita-se atualmente o conceito de participação em discussões sobre o desenvolvimento baseado em projetos a fim de promover o debate no momento apropriado, bem como a integração de medidas pediátricas no contexto do desenvolvimento global.

Assegurar um debate relativo aos medicamentos e a troca de conhecimentos entre os vários comités e grupos de trabalho dentro das respetivas competências é um fator essencial da função de coordenação da EMA. Na área do desenvolvimento pediátrico, tal diz respeito, em particular, à colaboração do Comité Pediátrico com outros comités científicos ou grupos de trabalho consultivos. Para permitir essa colaboração, estão em curso atividades de aperfeiçoamento contínuo.

Para aumentar a cooperação entre regiões, foi estabelecido, em 2007, um fórum de debate que permite a troca regular de informações, principalmente através de teleconferências («agrupamento pediátrico»), e que inclui membros da FDA dos EUA e da EMA. Desde então, aderiram ao agrupamento a Agência de Dispositivos Médicos e Farmacêuticos (PMDA) do Japão, os serviços de saúde do Canadá e a Therapeutic Goods Administration (TGA) da Austrália na qualidade de observador. Em 2013, a EMA e a sua homóloga dos EUA lançaram o que se designou por «comentários comuns» relativamente aos planos de desenvolvimento pediátrico que foram apresentados tanto à EMA como à FDA e que, como tal, estão em fase de revisão por ambas as agências. Embora sejam de natureza informal e não vinculativa, estes comentários e debates entre as duas agências contribuíram para alinhar perspetivas e evitar requisitos contraditórios no âmbito do programa de desenvolvimento pediátrico.

Contudo, continua a ser um desafio para a EMA e para o seu Comité Pediátrico, bem como para as empresas, considerar os principais aspetos do desenvolvimento de medicamentos quando algumas informações ainda não são conhecidas e quando os debates ainda se baseiam em suposições e dados escassos. Isto é especialmente verdade quando se tem em consideração que um dos objetivos dos planos de desenvolvimento pediátrico consiste na criação de segurança jurídica relativamente às expectativas das autoridades regulamentares no que diz respeito às empresas. Por outro lado, apenas um planeamento precoce faz com que seja possível integrar harmoniosamente o desenvolvimento pediátrico no desenvolvimento global de medicamentos, em vez de ser uma mera reflexão posterior. Em princípio, deverá propiciar igualmente uma I&D mais eficiente (também em termos de custos), na medida em que permite, por exemplo, ter em consideração a integração de doentes pediátricos (por exemplo, adolescentes) em ensaios com adultos e no planeamento precoce de desenvolvimento de formulações, reduzindo, assim, os custos globais de desenvolvimento.

8.Mais ensaios clínicos com crianças

O Regulamento visa garantir que existem provas da qualidade, da segurança e da eficácia dos medicamentos antes de estes serem utilizados por crianças. Isto traduz-se em mais investigação clínica realizada em crianças antes da autorização dos medicamentos. Os números disponíveis revelam um crescimento notável. A proporção de ensaios clínicos, que incluem crianças, disponível na base de dados europeia de ensaios clínicos EudraCT aumentou 50 % no período de 2007-2016, de 8,25 % para 12,4 %. Além disso, a investigação com subpopulações pediátricas anteriormente negligenciadas aumentou consideravelmente. Antes do Regulamento, a investigação em recém-nascidos era praticamente inexistente no âmbito do desenvolvimento de medicamentos.

De uma forma geral, a legislação da UE está devidamente equipada para garantir que a investigação pediátrica é válida a nível científico e eticamente aceitável. Estes aspetos são tidos em conta não só pelo Comité Pediátrico da EMA na avaliação de PIP, como também por comissões nacionais de ética e autoridades reguladoras responsáveis pela autorização de ensaios clínicos individuais.

O Regulamento fomentou a discussão de peritos relativamente à conceção ideal dos ensaios pediátricos. Esta discussão inclui iniciativas relacionadas com o intercâmbio de boas práticas e o desenvolvimento de novas diretrizes científicas. Um fator coadjuvante foi a criação de uma rede de redes de investigação no seio da EMA (Enpr-EMA), 18 a qual, em virtude do bom trabalho realizado, se expandiu já além da Europa, com o registo de redes nacionais e multiespecializadas dos Estados Unidos, do Canadá e do Japão.

Da mesma forma, estimulou-se o desenvolvimento adicional de conceitos de ensaio inovadores, bem como de estratégias de modelização e simulação com vista a reduzir o número de participantes necessários nos estudos. Além disso, o Regulamento chamou a atenção para o debate acerca do papel que as crianças devem representar em decisões relacionadas com a investigação. As iniciativas vão desde a criação de grupos consultivos de jovens para a discussão de informações adequadas acerca de estudos clínicos para os doentes e para os pais, até questões práticas, como formulários de consentimento.

Ainda assim, os ensaios pediátricos representam desafios especiais. Por exemplo, as dificuldades de recrutamento levam muitas vezes a atrasos na realização e na conclusão dos mesmos. Os ensaios pediátricos tendem também ser ensaios multicêntricos, por vezes apenas com alguns doentes por local, o que pode criar desafios operacionais, incluindo no que se refere a manter o pessoal e os conhecimentos especializados necessários no local. Para fornecer suporte adicional à infraestrutura de ensaios clínicos pediátricos, a «Iniciativa sobre medicamentos inovadores», uma parceria público-privada financiada pela UE, lançou, no final de 2016, um projeto para criação de uma rede pan-europeia sustentável de ensaios clínicos pediátricos 19 .

Além disso, com a iniciativa recente para estabelecer Redes Europeias de Referência 20 . a Comissão suporta redes virtuais que envolvem prestadores de cuidados de saúde de toda a Europa para combater patologias e doenças complexas ou raras que exigem tratamentos altamente especializados e uma concentração de conhecimentos e recursos. Algumas das redes temáticas incluídas no projeto centram-se especificamente em doenças pediátricas raras. Estas redes irão fomentar a cooperação e abrir caminho a iniciativas de investigação clínica adicionais que, anteriormente, poderiam não ser exequíveis.

De uma forma geral, o Regulamento potenciou a investigação pediátrica. Contudo, reconhece-se que essa investigação está orientada para o desenvolvimento de medicamentos. No caso de algumas doenças ou áreas terapêuticas, ainda não existe um bom entendimento da patologia subjacente. Assim, seria benéfica uma investigação básica adicional acerca das próprias doenças com vista a permitir e a fornecer informações para o desenvolvimento de medicamentos adequados. Esta situação não pode ser garantida através do Regulamento, exigindo esforços e fundos adicionais de fontes públicas e privadas.

9.Desafios futuros

A forma como os produtos farmacêuticos se desenvolvem pode mudar ao longo do tempo em virtude dos avanços científicos, dos desenvolvimentos tecnológicos e dos modelos de negócio em mudança. As tendências recentes incluem o desenvolvimento estratificado de medicamentos ou o conceito de medicina personalizada, que visa otimizar o uso dos medicamentos, orientando-os para a genética individual dos doentes a fim de garantir que estes responderão positivamente aos tratamentos. Por outro lado, poderemos assistir a uma entrada cada vez maior no mercado de empresas de tecnologia de apoio às terapêuticas através do apoio e de serviços assentes na tecnologia para os doentes.

Embora pareça perfeitamente compatível com o mecanismo introduzido pelo Regulamento, a maioria destes novos paradigmas de desenvolvimento pode influenciar o modo como as empresas tomam decisões acerca das prioridades de investimento e concebem ensaios clínicos. A curto prazo, é improvável que estas tendências afetem o Regulamento, uma vez que o número de novos medicamentos em fase avançada de preparação é historicamente elevado, com uma previsão de 45 novas substâncias ativas a serem lançadas anualmente até 2021. Contudo, o processo PIP tem de proporcionar a flexibilidade necessária para acomodar essas tendências, assegurando, ao mesmo tempo, que as crianças beneficiam plenamente de conceitos emergentes como, por exemplo, a medicina personalizada.

A um nível mais granular, também é necessário ter em conta que a implementação do Regulamento pressupõe um investimento significativo de recursos não só por parte da EMA 21 , como também pelos Estados-Membros, através da nomeação de membros para o Comité Pediátrico e contribuindo para a avaliação de planos de investigação pediátrica ou resultados de ensaios pediátricos, novos ou históricos, apresentados pelas empresas. O Regulamento prevê que os requerentes possam beneficiar destes procedimentos sem que lhes sejam cobradas quaisquer taxas, o que corresponde a parte dos incentivos que permitem o desenvolvimento pediátrico. Embora não existam provas de que a ausência de taxas teve, até à data, um impacto negativo sobre a qualidade da avaliação, ainda não se conhece o impacto a longo prazo sobre o funcionamento correto do sistema. Na sua avaliação contínua do sistema de taxas da EMA, o Comité irá também verificar os custos da avaliação dos PIP.

10.Conclusão

O Regulamento Pediátrico teve um impacto considerável no desenvolvimento dos medicamentos pediátricos na UE. Garantiu que o desenvolvimento de medicamentos pediátricos se tornasse parte integrante do desenvolvimento de medicamentos a nível global. Este resultado, que não teria sido possível sem legislação específica, sublinha que o regulamento continua pertinente. Além disso, as medidas tomadas no sentido de melhorar a sua implementação reforçaram a sua eficácia ao longo do tempo.

Em termos económicos, o Regulamento oferece resultados positivos globais do ponto de vista socioeconómico, demonstrando a adequação deste investimento direto à melhoria da disponibilidade dos medicamentos pediátricos. A combinação entre obrigações e recompensas parece ser eficaz no sentido de transferir o enfoque para o desenvolvimento de medicamentos pediátricos. Ainda assim, a utilização de recompensas limitou-se a 55 % dos PIP concluídos e há casos de sobrecompensação ou subcompensação que apontam para certas limitações do sistema atual. Além disso, o conceito PUMA, com a sua recompensa específica, não deu resultados.

O aumento da investigação pediátrica e do número de novos medicamentos com indicações pediátricas específicas é animador e irá garantir que, ao longo do tempo, a utilização não contemplada no rótulo de medicamentos para adultos na população pediátrica irá diminuir. Contudo, tais resultados positivos não são uniformes em todas as áreas terapêuticas, concentrando-se apenas em algumas, muitas vezes associadas a prioridades de investigação em adultos e não em crianças.

Isto é um indicador de que o Regulamento funciona melhor em áreas nas quais as necessidades dos doentes adultos e pediátricos coincidem. Em particular, no caso de doenças raras e/ou específicas das crianças e que, em muitos casos, são igualmente apoiadas pela da legislação sobre os medicamentos órfãos, muitos dos grandes avanços terapêuticos ainda não se materializaram. Os motivos para tal e pelos quais a recompensa relativa aos medicamentos órfãos não é, em certos casos, suficiente para promover o desenvolvimento de medicamentos pediátricos de modo semelhante ao desenvolvimento de medicamentos órfãos para adultos, requerem uma reflexão mais aprofundada.

Deste modo e antes de propor quaisquer alterações, a Comissão tenciona estudar atentamente os efeitos combinados da Regulação relativa aos medicamentos órfãos e da Regulação Pediátrica através de uma avaliação conjunta desses dois instrumentos jurídicos destinados a apoiar o desenvolvimento de medicamentos em subpopulações com necessidades específicas. Dado que os pontos fracos identificados no presente relatório se relacionam frequentemente com doenças pediátricas que se qualificam como patologias órfãs, somente esse esforço combinado irá garantir o ajuste dos parâmetros corretos, se necessário.

O presente relatório assinala não o fim, mas sim um passo intermédio essencial no debate acerca de uma visão conjunta sobre os futuros parâmetros dos medicamentos pediátricos e órfãos. A avaliação adicional que suporta este processo visa fornecer resultados até 2019, o que permite que a próxima Comissão possa tomar decisões informadas sobre possíveis opções políticas. De igual modo, permitirá que sejam tidos em conta os futuros resultados da avaliação dos CCP para o futuro do Regulamento Pediátrico.

Entretanto, a Comissão está empenhada numa série positiva de ações concretas com vista a racionalizar a aplicação e implementação atuais em conjunto com a EMA 22 , onde quer que seja necessário. Tal inclui:

·oferecer transparência adicional de novos medicamentos autorizados com indicações pediátricas;

·analisar a experiência com o uso de diferimentos e ter em consideração alterações à prática para garantir uma conclusão mais célere dos PIP;

·revisitar processos e expectativas no contexto da gestão de candidaturas a PIP e, se necessário, adaptar a diretriz da Comissão correspondente;

·explorar oportunidades para debater as necessidades pediátricas num diálogo aberto e transparente que envolva todos os intervenientes relevantes, tais como o mundo académico, prestadores de cuidados de saúde, doentes/cuidadores, redes de ensaios clínicos pediátricos, a indústria e as entidades reguladoras;

·fornecer regularmente informações atualizadas sobre o desenvolvimento e as tendências do panorama dos medicamentos pediátricos na UE; e

·fomentar a cooperação e a harmonização internacionais.

Além disso, apoiará ainda os cuidados de saúde e a investigação de alta qualidade para crianças através de projetos como as Redes Europeias de Referência, que ligam prestadores de cuidados de saúde e centros de especialização. Estas redes têm o potencial de virem a melhorar significativamente o acesso ao diagnóstico e tratamento a curto prazo e a fazer a diferença em termos de saúde infantil.

(1)  Regulamento (CE) n.º 1901/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, relativo a medicamentos para uso pediátrico, JO L 378 de 27.12.2006, p. 1.
(2)  Relatório decenal à Comissão Europeia – Relatório geral sobre a experiência adquirida com a aplicação do Regulamento Pediátrico.
(3)  Technopolis, Estudo relativo ao impacto económico do Regulamento Pediátrico, incluindo as suas recompensas e incentivos, 2017.
(4) Resolução do Parlamento Europeu, de 15 de dezembro de 2016, sobre o regulamento relativo aos medicamentos pediátricos.
(5) Regulamento (CE) n.º 141/2000 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de dezembro de 1999, relativo aos medicamentos órfãos, JO L 18 de 22.1.2000, p. 1.
(6)  Regulamento (CE) n.º 469/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de maio de 2009, relativo ao certificado complementar de proteção para os medicamentos, JO L 152 de 16.6.2009, p. 152.
(7)  Melhores Medicamentos para as Crianças — Do conceito à realidade, COM(2013) 443.
(8)  Estudo Technopolis, capítulo 5.
(9)  QuintilesIMS Institute, Outlook for global medicines through 2021, dezembro de 2016.
(10)  Comissão Europeia, Inventário de incentivos da União e dos Estados-Membros de apoio à investigação, desenvolvimento e disponibilidade de medicamentos órfãos, SWD(2015)13.
(11)   https://ec.europa.eu/commission/news/investment-plan-europe-eib-grants-financing-apeiron-2017-aug-28_en .
(12)  Tribunal de Justiça Europeu no processo C-125/10 Merck Sharp & Dohme contra Deutsches Patent- und Markenamt, ECLI:EU:C:2011:812.
(13)  DG GROW, Optimising the Internal Market’s industrial property legal framework relating to supplementary protection certificates (SPC) and patent research exemptions, 16.2.2017.
(14)  Estudo Technopolis, capítulo 2.
(15)  Estudo Technopolis, capítulo 2.2.
(16)  Estudo Technopolis, capítulo 6.
(17)  Linhas diretrizes sobre o formato e o conteúdo dos pedidos de aprovação ou alteração de um plano de investigação pediátrica, JO C 338, 27.9.2014, p. 1.
(18)  Rede Europeia de Investigação Pediátrica da Agência Europeia de Medicamentos.
(19)   https://www.imi.europa.eu/ .
(20)  Criadas nos termos do artigo 12.º da Diretiva 2011/24/UE relativa à aplicação de cuidados de saúde transfronteiriços, https://ec.europa.eu/health/cross_border_care/policy_pt .
(21)  De acordo com o artigo 48.º do Regulamento, a contribuição orçamental paga pela UE à EMA cobre a realização das respetivas atividades pediátricas.
(22)  Neste contexto, poderá ser necessário ter em conta as prioridades de continuidade comercial devido à relocalização da EMA.