13.6.2018   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 204/68


P8_TA(2016)0337

Fundo Fiduciário da UE para África: implicações para o desenvolvimento e a ajuda humanitária

Resolução do Parlamento Europeu, de 13 de setembro de 2016, sobre o Fundo Fiduciário da UE para África: as implicações para o desenvolvimento e ajuda humanitária (2015/2341(INI))

(2018/C 204/08)

O Parlamento Europeu,

Tendo em conta o artigo 41.o, n.o 2, do Tratado da União Europeia (TUE),

Tendo em conta o artigo 208.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE),

Tendo em conta o Fundo Fiduciário de Emergência da União Europeia para a estabilidade e o combate às causas profundas da migração irregular e do fenómeno da deslocação de pessoas em África (Fundo Fiduciário da UE para África), criado na Cimeira de Valeta sobre migração, realizada em 11 e 12 de novembro de 2015,

Tendo em conta o plano de ação conjunta aprovado na Cimeira de Valeta,

Tendo em conta o Acordo de Parceria entre os membros do Grupo de Estados da África, Caraíbas e Pacífico, por um lado, e a Comunidade Europeia e os seus Estados-Membros, por outro, assinado em Cotonu em 23 de junho de 2000 (1), as suas sucessivas revisões e o Anexo I-C (Quadro Financeiro Plurianual para o período 2014-2020), correspondente ao 11.o Fundo Europeu de Desenvolvimento (FED),

Tendo em conta o Quadro Financeiro Plurianual para o período 2014-2020, em que assenta o orçamento da UE, e a rubrica 4 do orçamento («Europa Global») dele constante,

Tendo em conta a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, adotada na Cimeira das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, realizada em Nova Iorque em 2015,

Tendo em conta o documento de trabalho conjunto intitulado «Gender Equality and Women's Empowerment: Transforming the Lives of Girls and Women through EU External Relations 2016-2020» (Igualdade de género e capacitação das mulheres: transformar as vidas das raparigas e mulheres através das relações externas da UE 2016-2020) (SWD(2015)0182 final) e as conclusões do Conselho, de 26 de outubro de 2015, em que o respetivo «Plano de Ação sobre a Igualdade de Género 2016-2020» foi aprovado,

Tendo em conta a Plataforma de Ação de Pequim, de 1995, o Programa de Ação da Conferência Internacional sobre a População e o Desenvolvimento (CIPD), de 1994, e os resultados das respetivas conferências de análise,

Tendo em conta o artigo 52.o do seu Regimento,

Tendo em conta o relatório da Comissão do Desenvolvimento e o parecer da Comissão dos Orçamentos (A8-0221/2016),

A.

Considerando que o principal objetivo do Fundo Fiduciário da UE para África (FFUE), assinado pelo Presidente da Comissão e por 25 Estados-Membros, bem como pela Noruega e pela Suíça, e lançado na Cimeira de Valeta sobre migração, em 12 de novembro de 2015, pelos parceiros europeus e africanos, é ajudar a promover a estabilidade nessas regiões e contribuir para uma melhor gestão da migração; considerando, mais especificamente, que o FFUE visa atacar as causas profundas que estão na origem da desestabilização, das deslocações forçadas e da migração irregular, através da promoção da resiliência, de oportunidades económicas, da igualdade de oportunidades, da segurança e do desenvolvimento;

B.

Considerando que o Consenso Europeu sobre o Desenvolvimento continua a constituir o quadro doutrinário da política de desenvolvimento da UE e que o Consenso Europeu sobre a Ajuda Humanitária reitera os princípios fundamentais da ajuda humanitária; considerando que a paz foi reconhecida como fundamental para o desenvolvimento no quadro da nova Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável e do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) n.o 16 relativo à paz e à justiça que foi introduzido; considerando que a UE e os seus parceiros no domínio humanitário têm de ser capazes de garantir assistência e proteção com base nas necessidades e no respeito pelos princípios da neutralidade, imparcialidade, humanidade e independência da ação humanitária, tal como consagrados no direito internacional, designadamente no direito internacional humanitário;

C.

Considerando que a África continua a registar taxas bastante elevadas de crescimento demográfico e apenas um lento declínio das taxas de fertilidade, uma situação que, num futuro próximo, conduzirá a um aumento acentuado da população jovem em idade ativa, trazendo enormes potenciais benefícios sociais e económicos; considerando que, para promover a estabilidade, o crescimento económico sustentável, a coesão social e o desenvolvimento na região, é fundamental dotar os jovens da educação e das competências de que necessitam para realizar o seu potencial, bem como criar oportunidades de emprego;

D.

Considerando que o FFUE pretende ser um instrumento de desenvolvimento que reúne recursos provenientes de diversos doadores, a fim de permitir que a União Europeia dê uma resposta rápida, flexível, complementar, transparente e coletiva a uma situação de emergência nas suas diversas vertentes;

E.

Considerando que 1 500 milhões de pessoas em todo o mundo vivem em regiões frágeis e afetadas por conflitos e que os Estados frágeis e os espaços não governados têm vindo a aumentar, ficando muitas pessoas abandonadas à pobreza, à anarquia, à corrupção galopante e à violência; considerando que o FFUE foi concebido para apoiar 23 países em três regiões de África (o Corno de África, a região do Sael, a Bacia do Lago Chade e o Norte de África) onde se encontram alguns dos mais frágeis Estados africanos afetados pela migração, por serem o país de origem, de trânsito ou de destino, se não todos eles, e que tirarão o maior proveito deste tipo de assistência financeira da UE; considerando que os vizinhos africanos dos países elegíveis podem, numa base casuística, igualmente beneficiar dos projetos do FFUE que tenham uma dimensão regional, com vista a gerir os fluxos migratórios regionais e os correspondentes desafios transfronteiras;

F.

Considerando que o FFUE tem por objetivo combater as causas profundas da migração irregular e dos deslocados nos países de origem, de trânsito e de destino, através de um plano de ação articulado em torno de cinco setores prioritários, a saber: 1) vantagens da migração em termos de desenvolvimento; 2) migração legal e mobilidade; 3) proteção e asilo; 4) prevenção e luta contra a migração irregular; e 5) regresso, readmissão e reintegração;

G.

Considerando que a contribuição da UE ascende a 1,8 mil milhões de euros, embora a Comissão possa igualmente recorrer a fundos suplementares dos Estados-Membros da UE e de outros doadores para um montante equivalente; considerando que o FFUE se destina a complementar a atual ajuda da UE às regiões abrangidas num montante superior a 10 mil milhões de euros até 2020, no intuito de apoiar o crescimento económico inclusivo e sustentável;

H.

Considerando que foram criados dois FFUE em 2014, nomeadamente o Fundo Fiduciário Bekou, centrado na estabilização e reconstrução da República Centro-Africana, que mostra efeitos positivos, e o Fundo Madad, de resposta à crise síria;

I.

Considerando que o relatório do Fundo das Nações Unidas para a População (FNUP), intitulado «ICPD Beyond 2014 Global Report», publicado em 12 de fevereiro de 2014, salienta que a proteção das mulheres e adolescentes vítimas de violência deve ser uma prioridade da agenda internacional do desenvolvimento;

J.

Considerando que os fundos fiduciários fazem parte de uma resposta ad hoc, comprovando, assim, a escassez dos recursos e a flexibilidade limitada que caracteriza o quadro financeiro da UE, sendo, no entanto, vitais para garantir que seja dada uma resposta rápida e global às crises humanitárias, incluindo as de longa duração;

K.

Considerando que a UE continuará a envidar esforços para aplicar de forma eficaz a Resolução 1325 e as resoluções subsequentes do Conselho de Segurança das Nações Unidas sobre as mulheres, a paz e a segurança;

Dotação financeira e aspetos orçamentais

1.

Recorda que a dotação financeira é caracterizada por três fases principais: promessa, compromisso e ação/pagamento; assinala, no entanto, a necessidade de retirar os devidos ensinamentos dos FFUE anteriores; lamenta o facto de as contribuições dos Estados-Membros terem, até à data, permanecido baixas, representando apenas uma pequena parte da contribuição da União, afastando-se, assim, muito dos valores correspondentes aos compromissos oficialmente assumidos, ascendendo a apenas 81,71 milhões de euros em abril de 2016 (ou seja, 4,5 % dos 1,8 mil milhões de euros que estavam previstos); insiste em que as promessas e os compromissos têm de se traduzir em ações concretas; recorda ao Conselho e à Comissão que a eficácia da ajuda se caracteriza por um financiamento previsível e atempado e insta ao seu pagamento célere;

2.

Congratula-se com a intenção de disponibilizar os fundos de forma mais rápida e flexível em situações de emergência e de fazer confluir diferentes fontes de financiamento para melhor se poder fazer face à crise da migração e dos refugiados nas suas múltiplas dimensões; critica o facto de a Comissão ter transferido dotações dos objetivos e princípios dos atos de base, a fim de as encaminhar através do Fundo Fiduciário, uma vez que tal representa uma infração às disposições financeiras, pondo, além disso, em risco o sucesso das políticas a longo prazo da União; solicita, por conseguinte, que, sempre que possível, sejam utilizadas novas dotações e que fique salvaguardada uma total transparência quanto à origem e destino dos fundos;

3.

Observa que, no domínio da ação externa, os FFUE são principalmente concebidos para permitir responder rapidamente a crises específicas de emergência ou pós-emergência tirando partido da contribuição dos Estados-Membros da UE e de outros doadores, bem como para aumentar a visibilidade dos esforços europeus; frisa, porém, que os Estados-Membros não devem descurar o seu empenho no que respeita à realização do objetivo de 0,7 % do rendimento nacional bruto (RNB) para a ajuda pública ao desenvolvimento (APD); convida, por conseguinte, os Estados-Membros a respeitarem os seus compromissos em matéria de APD, tanto relativamente ao objetivo de 0,7 % como à sua contribuição para o FFUE para a África;

4.

Realça a volatilidade dos contributos voluntários e insta os Estados-Membros a honrarem os compromissos assumidos e a ajustarem rápida e efetivamente os seus contributos à contribuição da União, a fim de permitir que o fundo fiduciário desenvolva todo o seu potencial, em vez de apenas disponibilizarem o mínimo necessário para a obtenção de direitos de voto no Conselho Estratégico;

5.

Lamenta que os fundos fiduciários redundem numa situação em que a autoridade orçamental é contornada e em que a unidade do orçamento é posta em causa; constata que, com a criação deste instrumento ad hoc, se reconhece o sub-dimensionamento do Quadro Financeiro Plurianual (QFP) para 2014-2020; observa que 85 % do orçamento da União assenta nas contribuições dos Estados-Membros; considera que a criação do Fundo Fiduciário da UE para África equivale, de facto, a uma revisão dos limites máximos do atual Quadro Financeiro Plurianual, através de um aumento das contribuições dos Estados-Membros; salienta, por conseguinte, que a criação de instrumentos de financiamento fora do orçamento da UE deve continuar a constituir uma exceção; lamenta o facto de o Parlamento Europeu não estar representado no Conselho Estratégico, apesar de uma parte substancial dos fundos ser proveniente do orçamento da União; solicita que a autoridade orçamental seja convidada a participar no Conselho Estratégico;

6.

Observa que, presentemente, a dotação financeira da UE para o FFUE para África provém principalmente do 11.o FED; salienta que o FFUE foi criado porque o orçamento da UE e o QFP carecem da flexibilidade necessária para dar resposta pronta e integral às diferentes dimensões dessas crises; solicita à UE que chegue a acordo para encontrar uma solução mais global para o financiamento de emergência no âmbito da revisão do QFP para 2014-2020, que se realizará este ano, e da revisão dos instrumentos financeiros externos em 2016, com o objetivo de aumentar a eficácia e a capacidade de resposta da ajuda humanitária e da ajuda ao desenvolvimento financiadas pelo orçamento da UE;

7.

Apela, em particular, a uma reapreciação apropriada do limite máximo, a fim de permitir a inclusão no QFP dos mecanismos de crise e de restabelecer a unidade do orçamento; considera que uma revisão do QFP proporcionaria um grau mais elevado de segurança orçamental, democrática e jurídica; salienta, além disso, a necessidade de rever a regulamentação financeira, a fim de facilitar a gestão dos fundos do orçamento da UE e de criar maiores sinergias entre o orçamento da União, o FED e a cooperação bilateral, no âmbito de uma abordagem integrada, por forma a aumentar o impacto do financiamento para o desenvolvimento e abrir caminho para a inscrição orçamental do FED, mantendo, contudo, o atual nível de recursos, tal como previsto a partir de 2021; insta a Comissão, por um lado, a tomar medidas imediatas para reforçar a participação da autoridade orçamental e, por outro, a alinhar melhor os fundos fiduciários e outros mecanismos com a norma orçamental, nomeadamente fazendo-os constar do orçamento da União;

8.

Observa que o Parlamento Europeu deu provas de responsabilidade enquanto ramo da autoridade orçamental, ao aceitar desbloquear fundos de emergência; lamenta, no entanto, que a multiplicação dos instrumentos de emergência esteja a conduzir ao abandono do método comunitário; reafirma a sua vontade de preservar os princípios fundamentais do orçamento da União, nomeadamente a unidade orçamental e a codecisão; considera que a verdadeira urgência reside na revisão da capacidade de reação da União Europeia face às crises de grande envergadura, nomeadamente no que diz respeito às suas repercussões a nível orçamental; faz depender o seu acordo relativo a futuras propostas de instrumentos de crise à integração destas dimensões na revisão intercalar do QFP, prevista para antes do final de 2016;

9.

Observa que o financiamento adicional proveio de outros instrumentos financeiros inscritos no orçamento da União, como o Instrumento de Cooperação para o Desenvolvimento (ICD), no montante de 125 milhões de euros, o Instrumento de Ajuda Humanitária, no montante de 50 milhões de euros, e o Instrumento Europeu de Vizinhança (IEV), no valor de 200 milhões de euros;

10.

Assinala que, da contribuição total da UE de 1,8 mil milhões de euros, apenas o montante de mil milhões de euros provenientes da reserva do FED constitui um recurso adicional; manifesta a sua preocupação quanto à possibilidade de o FFUE ser financiado em detrimento de outros objetivos de desenvolvimento; recorda que o instrumento do FFUE deve complementar os instrumentos já existentes e insta a Comissão a assegurar a transparência e a responsabilização relativamente à utilização e ao montante das atuais rubricas orçamentais que contribuem para o FFUE;

11.

Insiste com veemência em que os fundos provenientes do FED e de fontes APD devem ser consagrados ao desenvolvimento económico, humano e social do país de acolhimento, conferindo especial atenção aos desafios em matéria de desenvolvimento identificados na decisão relativa ao Fundo Fiduciário, frisa que não é possível haver desenvolvimento sem segurança; condena toda e qualquer utilização de fundos do FED e da APD para fins de gestão e controlo da migração ou de toda e qualquer outra medida que não prossiga objetivos de desenvolvimento;

Financiamento dos países menos avançados

12.

Sublinha que a utilização do FED para financiar o FFUE para África pode ter um impacto nos países africanos beneficiários da ajuda que não estão cobertos pelo fundo fiduciário, em especial nos países menos avançados (PMA);

13.

Lamenta profundamente o facto de, não obstante a importância da ajuda pública ao desenvolvimento para os países menos avançados, os já baixos níveis de ajuda ao desenvolvimento a esses países terem diminuído pelo segundo ano consecutivo em 2014, assim como o facto de a proporção dos auxílios atribuídos a estes países ter atingido o nível mais baixo dos últimos dez anos; insta, por conseguinte, a Comissão e os Estados-Membros a assegurarem que a ajuda não seja desviada dos países mais pobres para cobrir o custo das crises atuais;

O papel da sociedade civil, das ONG, das autoridades locais e das organizações internacionais

14.

Considera que o FFUE para África deve contribuir para o desenvolvimento dos países de origem e de trânsito dos migrantes, o reforço e a melhoria dos serviços públicos locais — nomeadamente os serviços sociais e os serviços nos domínios da saúde, educação, alimentação e cultura — o reforço e a melhoria da participação política e da governação, nomeadamente através de projetos radicados na comunidade; considera que o Fundo deve contribuir para o desenvolvimento do emprego em setores locais, respeitando, simultaneamente, os direitos humanos e o ambiente; considera, neste contexto, que, enquanto forem dadas todas as garantias de boa governação e eficiência, em conformidade com os princípios da eficácia da ajuda, as autoridades locais têm de ser consultadas na qualidade de parceiros de pleno direito e ser os principais responsáveis pelos serviços públicos prestados a nível local; considera que a sociedade civil, as organizações não governamentais (ONG) e as organizações internacionais devem desempenhar um papel central no combate às causas profundas da migração e na melhoria dos serviços locais;

15.

Recorda que as autoridades locais e regionais, as organizações da sociedade civil e as ONG são parceiros naturais para uma política de desenvolvimento eficaz e que é fundamental manter um diálogo permanente com as autoridades nacionais e as comunidades locais para definir prioridades e estratégias comuns e para adotar uma abordagem factual na implementação do fundo, em especial nos Estados que não deem provas suficientes em matéria de boa governação e transparência; apela ao respeito dos princípios da subsidiariedade e da apropriação também neste domínio de ação; salienta que os órgãos de poder local, a sociedade civil local, as ONG e as organizações internacionais devem estar profundamente envolvidos nas fases de planeamento, implementação e avaliação do FFUE; insta a Comissão a clarificar e a formalizar os procedimentos de consulta destas partes interessadas, de modo a assegurar a sua participação efetiva nos debates realizados nos comités operacionais, na presença de critérios de elegibilidade claros e transparentes;

16.

Salienta a importância de estabelecer um melhor equilíbrio em matéria de financiamento entre os governos dos países beneficiários e os intervenientes fiáveis da sociedade civil, que tendem a ter um maior conhecimento dos domínios da sociedade em que existem deficiências e que necessitam de apoio;

17.

Recorda a importância de uma abordagem da resiliência centrada nas pessoas e na comunidade e está firmemente convicto de que o FFUE deve concentrar-se não só no desenvolvimento económico mas também em projetos concretos no terreno que visem especificamente melhorar a qualidade, a equidade e o acesso universal aos serviços básicos, bem como na formação destinada a desenvolver competências a nível local, permitindo assim responder às necessidades das comunidades vulneráveis, nomeadamente as minorias;

Transparência e clareza para uma melhor consecução dos objetivos

18.

Reconhece a complexidade e a natureza multidimensional da atual crise de refugiados; alerta, no entanto, para o grave risco de utilização indevida da ajuda ao desenvolvimento da UE, em especial em países afetados por conflitos onde as questões da segurança, da migração e do desenvolvimento estejam estreitamente interligadas; realça que os projetos financiados pelo FFUE, cujos recursos deveriam, em princípio, ser essencialmente orientados para a consecução de objetivos de desenvolvimento, têm de visar este tipo de objetivos; salienta que os projetos destinados a reforçar a capacidade de segurança em determinados países têm de ser concebidos de tal forma que os resultados finais se centrem na redução da pobreza, bem como na estabilidade e segurança dos países beneficiários;

19.

Recorda à Comissão e às autoridades diretamente responsáveis pela gestão do fundo fiduciário que os recursos provenientes do FED ou de outros fundos em prol do desenvolvimento têm de ser total e exclusivamente utilizados para ações diretamente consagradas à ajuda ao desenvolvimento; solicita à Comissão que garanta formalmente que os fundos sejam utilizados para estes fins e que assegure que a apresentação periódica de relatórios exaustivos sobre a utilização destes fundos;

20.

Insiste em que o orçamento da UE não pode ser usado para financiar diretamente operações no domínio militar ou da defesa (artigo 41.o, n.o 2, do TUE), mas que não existe qualquer exclusão explícita de operações de manutenção da paz que tenham objetivos de desenvolvimento; recorda, além disso, que os artigos 209.o e 212.o do TFUE não excluem explicitamente o financiamento do desenvolvimento de capacidades no domínio da segurança;

21.

Insta a Comissão, o Conselho Estratégico e o Comité Operacional a concentrarem-se, sobretudo, no reforço das capacidades, na estabilidade, na estabilidade e na paz, na resiliência, no bem-estar e na capacitação das populações locais, na promoção, proteção e observância dos direitos humanos e na criação de oportunidades de emprego e de formação, em particular para as mulheres e para os jovens;

22.

Salienta que o principal objetivo da política de desenvolvimento da UE, tal como consagrada no artigo 208.o do TFUE, deve ser a redução e a erradicação da pobreza; lamenta, neste contexto, que apesar de a contribuição da UE para o FFUE ser essencialmente constituída por recursos da ajuda pública ao desenvolvimento, este mecanismo de financiamento não incida exclusivamente em objetivos orientados para o desenvolvimento; salienta que deve ser estabelecida no quadro do FFUE uma distinção clara, transparente e apreensível entre, por um lado, as dotações destinadas a ações de desenvolvimento e, por outro, aquelas que se destinam a atividades relacionadas com a gestão da migração e os controlos nas fronteiras ou quaisquer outras atividades; salienta que uma diluição da APD, que reduza o financiamento para as ações de combate à pobreza extrema, comprometeria os progressos significativos alcançados no domínio do desenvolvimento a nível internacional e ameaçaria a consecução dos objetivos de desenvolvimento sustentável (ODS) recentemente adotados;

Coerência das políticas da UE e compromisso com os direitos humanos

23.

Exorta a UE a demonstrar uma maior coerência no domínio da cooperação internacional para o desenvolvimento, a partir de um duplo ponto de vista: a UE e os Estados-Membros deverão, por um lado, agir em conformidade com os compromissos assumidos e, por outro, revelar uma coerência sem falhas nas suas políticas externas e nos instrumentos para a região africana, mantendo particularmente presente o espírito de cogestão do Acordo ACP-UE de Cotonu; considera, com base nesta última perspetiva, que o FFUE deve refletir o princípio da coerência das políticas ao serviço do desenvolvimento sustentável e o princípio da complementaridade entre todos os intervenientes no desenvolvimento, devendo ainda evitar qualquer contradição entre os objetivos de desenvolvimento e as políticas no domínio da segurança, da ajuda humanitária e da migração; espera que o pacote «Legislar Melhor» contribua para promover a coerência das políticas em prol do desenvolvimento sustentável, ao ter em conta as questões do desenvolvimento e dos direitos humanos em todas as suas avaliações de impacto;

24.

Recorda que as regras e critérios pelos quais se rege a ajuda ao desenvolvimento para projetos financiados pelo FFUE devem ser definidos em conformidade com os valores e interesses comuns, em especial no que se refere ao respeito e à promoção dos direitos humanos; neste contexto, sublinha que a política da UE relativa à cooperação em matéria de segurança, gestão da migração, tráfico de seres humanos e introdução clandestina de migrantes deve incluir medidas específicas destinadas a garantir o respeito pelos direitos humanos e o Estado de direito, com especial atenção aos direitos das mulheres, das pessoas LGBTI, da sua saúde sexual e reprodutiva e direitos conexos, das crianças e das minorias, bem como de outros grupos particularmente vulneráveis; recorda que a UE deve promover o combate às discriminações em razão da religião ou de convicções pessoais, do género, da raça ou da origem étnica, da idade, de uma deficiência ou da orientação sexual;

25.

Recorda que os fundos fiduciários devem participar nos objetivos a longo prazo de consolidação da paz e de reforço da governação nos países beneficiários; salienta a necessidade de avaliar criteriosa e sistematicamente o impacto das ações financiadas através do FFUE para África na prestação da ajuda humanitária; sublinha que o FFUE não deve prejudicar a cooperação para o desenvolvimento a longo prazo da UE; salienta que a apropriação e a complementaridade dos projetos a curto e longo prazo têm de ser asseguradas, salvaguardadas e alinhadas com as estratégias regionais e as estratégias por país da UE para o Sael, o Golfo da Guiné, o Corno de África e o Norte de África; salienta que é necessário um diagnóstico completo a nível setorial e nacional para a uma boa afetação dos fundos, bem como para desenvolver parcerias estreitas com um vasto leque de intervenientes da sociedade civil; congratula-se com a integração da componente de investigação no FFUE enquanto possibilidade para criar oportunidades de desenvolvimento e sinergias entre a UE e os países em causa;

Objetivos e acompanhamento

26.

Insta a Comissão a acompanhar sistematicamente a utilização dos recursos financeiros do FFUE, bem como a sua afetação, e a reforçar os poderes de controlo do Parlamento sobre o FFUE; solicita, em particular, ao Conselho e à Comissão que comuniquem regularmente as ações concretas empreendidas pela UE e pelos Estados africanos aquando da utilização destes fundos, bem como os resultados obtidos;

27.

Expressa ainda a sua preocupação face à ausência de coordenação entre todas as partes envolvidas na gestão do FFUE (e, nomeadamente, entre a Direção-Geral da Cooperação Internacional e do Desenvolvimento (DEVCO) da Comissão e o seu Departamento para a Ajuda Humanitária e Proteção Civil (ECHO)) e à inexistência de linhas de orientação claras sobre a forma de aceder aos fundos disponíveis; denuncia a falta de clareza e de transparência dos critérios de financiamento e do volume dos fundos financeiros disponíveis para a sociedade civil no âmbito do FFUE; recorda a necessidade de uma melhor comunicação entre a Comissão, os Estados-Membros e o Parlamento a nível da programação e da execução das ações do FFUE em geral, com vista ao planeamento futuro de potenciais fundos fiduciários adicionais; recorda que a Comissão Europeia deve prestar especial atenção à coerência e à coordenação das suas ações com os programas de desenvolvimento regional, de modo a evitar sobreposições e a assegurar que estas intervenções incidam principalmente no desenvolvimento e não no controlo e na segurança das fronteiras, em prejuízo dos migrantes; solicita à Comissão que, por este mesmo motivo, mantenha um diálogo ativo com as Nações Unidas no âmbito do FFUE bem como a fim de maximizar o impacto e a eficácia da ajuda a nível mundial; insta, além disso, a Comissão a intensificar os seus esforços com vista a uma avaliação de impacto mais sistemática das suas políticas e financiamentos, incluindo do FFUE, em especial no que respeita aos seus efeitos no desenvolvimento sustentável, nos direitos humanos e na igualdade de género, e a integrar os resultados dessas avaliações nas suas políticas e programas;

28.

Salienta que, até à data, a criação do FFUE se pautou pela falta de envolvimento do Parlamento e insiste na necessidade garantir um controlo do Parlamento sobre a forma como o Fundo é executado, mediante a apresentação, pela Comissão, de relatórios periódicos e detalhados;

29.

Considera que, tendo em conta a extraordinária flexibilidade e rapidez próprias de um fundo fiduciário, a apresentação de relatórios periódicos ao Parlamento deveria ter lugar, pelo menos, de seis em seis meses; salienta com veemência a necessidade de um acompanhamento, de uma avaliação e de uma prestação de contas transparentes;

30.

Considera que a transparência, a comunicação e a visibilidade dos projetos desenvolvidos no quadro do FFUE são da maior importância para a divulgação dos resultados e a participação e sensibilização dos intervenientes privados europeus, das autoridades regionais e locais, das ONG e da sociedade civil, a fim de criar condições para um maior envolvimento e facilitar a participação dos Estados-Membros;

31.

Sublinha a necessidade de um controlo rigoroso da aplicação das disposições sobre a redistribuição, a substituição nos países de origem e os compromissos financeiros dos Estados-Membros, prestando especial atenção aos direitos humanos;

32.

Recorda que as políticas de migração da UE deveriam incidir sobretudo nas causas profundas da migração; salienta que as políticas de migração da UE deveriam contribuir para a instauração da paz e da estabilidade e promover o desenvolvimento económico, em conformidade com os objetivos 3, 4 e 5, com a meta 7 do objetivo 10, e com o objetivo 16 dos ODS da Agenda 2030, trabalhando mais estreitamente com os países terceiros para melhorar a cooperação em matéria de incentivos ao regresso e à reintegração nos países de origem dos migrantes, nomeadamente os migrantes altamente qualificados, por via da readmissão e do regresso voluntários, de forma a aumentar as suas oportunidades;

33.

Salienta que a instabilidade e a insegurança física são causas determinantes da deslocação forçada, pelo que apoia a adoção de uma abordagem sensível às situações de conflito na implementação do Fundo, que dê prioridade à prevenção de conflitos, à construção do Estado, à boa governação e à promoção do Estado de direito; considera que o FFUE constitui uma grande oportunidade para a UE, permitindo-lhe reforçar a sua cooperação e o diálogo político com os seus parceiros africanos, nomeadamente no que respeita à aplicação efetiva dos acordos em matéria de regresso e readmissão, bem como para elaborar estratégias comuns em matéria de gestão dos fluxos migratórios; assinala a necessidade de uma partilha de responsabilidades entre a UE e os seus parceiros africanos, em conformidade com as conclusões da Cimeira de Valeta de novembro de 2015; considera, porém, que a ajuda ao desenvolvimento não deve ser utilizada para travar o fluxo de migrantes e de requerentes de asilo e que os projetos financiados pelo FFUE não devem servir de pretexto para impedir as partidas ou aumentar o rigor nas fronteiras entre os países, ignorando, simultaneamente, os fatores que levam as pessoas a abandonar as suas casas; expressa a sua profunda preocupação face ao impacto que o FFUE possa vir a ter nos direitos humanos, sabendo que a contenção dos fluxos migratórios se processa através da cooperação com países que cometem graves e/ou sistemáticas violações dos direitos fundamentais; solicita à Comissão que garanta que o fundo sirva os seus propósitos, ajudando diretamente aqueles que necessitam e não financiando os governos responsáveis pelas violações dos direitos humanos; solicita o reforço dos direitos humanos dos migrantes no âmbito dos projetos financiados pela UE;

34.

Salienta que é importante compreender as causas e as consequências da migração internacional de uma perspetiva de género, nomeadamente o processo de tomada de decisão inerente e os mecanismos conducentes à migração; relembra que as mulheres e as raparigas, enquanto refugiadas e migrantes, são particularmente vulneráveis quando confrontadas com situações em que a sua segurança não pode ser assegurada e em que são suscetíveis de ser vítimas de violência sexual ou de exploração; frisa que o FFUE tem de contribuir para a proteção, o apoio e/ou a assistência aos migrantes vulneráveis, aos refugiados e às vítimas do tráfico de seres humanos e que deve ser dada especial atenção às mulheres e às crianças;

35.

Nota que o Fundo Fiduciário para África foi criado na sequência da Cimeira de Valeta dos Chefes de Estado ou de Governo africanos e europeus sobre as questões relacionadas com a migração; exorta a Comissão a fornecer ao Parlamento uma panorâmica das medidas concretas tomadas na sequência desta cimeira, nomeadamente no domínio do desenvolvimento, da luta contra os passadores e no que diz respeito à assinatura de acordos de regresso, readmissão e reintegração; convida o Conselho a atribuir à Comissão os mandatos necessários para a celebração de acordos desta natureza com os países abrangidos pelo FFUE;

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36.

Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução ao Presidente do Conselho Europeu, à Vice-Presidente da Comissão/Alta Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, ao Conselho, à Comissão, aos parlamentos dos Estados-Membros, aos copresidentes da Assembleia Parlamentar Paritária ACP-UE e ao Presidente do Parlamento Pan-Africano.

(1)  JO L 317 de 15.12.2000, p. 3.