16.3.2018   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 101/126


P8_TA(2016)0314

Situação das pessoas com albinismo em África, nomeadamente no Maláui

Resolução do Parlamento Europeu, de 7 de julho de 2016, sobre a situação das pessoas com albinismo em África, nomeadamente no Maláui (2016/2807(RSP))

(2018/C 101/10)

O Parlamento Europeu,

Tendo em conta a sua Resolução, de 4 de setembro de 2008, sobre a morte de albinos na Tanzânia (1),

Tendo em conta o Relatório da Perita Independente da ONU sobre o exercício dos direitos humanos pelas pessoas com albinismo, de 18 de janeiro de 2016,

Tendo em conta o comunicado de imprensa da UE, de 13 de junho de 2015 sobre o Dia Internacional de Sensibilização para o Albinismo,

Tendo em conta a Resolução 69/170 da Assembleia Geral das Nações Unidas, de 18 de dezembro de 2014, sobre um Dia Internacional de Sensibilização para o Albinismo,

Tendo em conta a Resolução n.o 263 da Comissão Africana dos Direitos do Homem e dos Povos, de 5 de novembro de 2013, sobre a prevenção dos ataques e da discriminação contra pessoas com albinismo,

Tendo em conta a Resolução 23/13 do Conselho dos Direitos do Homem das Nações Unidas, de 13 de junho de 2013, sobre ataques e discriminação contra pessoas com albinismo,

Tendo em conta a Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 10 de dezembro de 1948,

Tendo em conta o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos,

Tendo em conta a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança,

Tendo em conta a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência,

Tendo em conta a Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial,

Tendo em conta a Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas Pertencentes a Minorias Nacionais ou Étnicas, Religiosas e Linguísticas, de 18 de dezembro de 1992,

Tendo em conta a Carta Africana dos Direitos do Homem e dos Povos,

Tendo em conta o Acordo de Parceria de Cotonu,

Tendo em conta o artigo 135.o, n.o 5, e o artigo 123.o, n.o 4, do seu Regimento,

A.

Considerando que o albinismo é uma perturbação de caráter congénito que afeta cerca de uma pessoa em cada 20 000 em todo o mundo; que esta taxa é muito mais elevada nos países da África subsariana, tendo a Tanzânia, o Maláui e o Burundi umas das taxas mais elevadas de pessoas com albinismo;

B.

Considerando que as pessoas com albinismo enfrentam algumas das mais extremas formas de perseguição e violações dos direitos humanos, que vão desde a discriminação social generalizada, a violência verbal e a exclusão dos serviços públicos, a assassinatos, raptos, violações e mutilações; que, só em 2015, os observadores dos direitos humanos registaram 448 ataques contra albinos em 25 países africanos; que estes números são muito provavelmente subestimados, porquanto as autoridades não controlam, nem documentam estes crimes de forma sistemática ou não têm a capacidade e os recursos para procederem a inquéritos exaustivos;

C.

Considerando que a maior ameaça para as pessoas com albinismo em África origina nas superstições e crenças muito comuns, que induzem em erro sobre o seu estado, incluindo o mito de que as pessoas com albinismo têm poderes mágicos, o que se traduz no facto de as pessoas com albinismo serem regularmente assassinadas por grupos criminosos e traficantes para lhes retirarem partes do seu corpo, que se pensa trazerem sorte, saúde e riqueza; que, em vários países, os túmulos de pessoas com albinismo foram abertos e foram roubadas partes do corpo ou ossos;

D.

Considerando que, no Maláui, onde vivem cerca de 10 000 pessoas com albinismo, a polícia registou 69 ataques desde novembro de 2014, 18 dos quais foram assassinatos; que quatro pessoas foram assassinadas em abril de 2016, incluindo um bebé de dois anos, o que determinaram as autoridades a declararem as pessoas com albinismo uma «espécie ameaçada»;

E.

Considerando que o presidente do Maláui, Peter Mutharika, condenou publicamente o recente recrudescimento de ataques;

F.

Considerando que, para além do Maláui, foram assinalados ataques contra as pessoas com albinismo em vários outros países da África Oriental, mormente na Tanzânia, no Burundi, no Quénia e em Moçambique;

G.

Considerando que as mulheres e as crianças com albinismo são particularmente vulneráveis à exclusão social; que as mulheres albinas são frequentemente alvo de violência sexual, devido à crença generalizada de que as relações sexuais com uma mulher com albinismo podem curar o VIH/SIDA, e que as mulheres que deram à luz bebés albinos são excluídas e discriminadas no trabalho; que as crianças representam uma elevada proporção das vítimas de ataques rituais e enfrentam um risco elevado de abandono; que, devido ao receio de ataques, crianças em idade escolar que não tem a possibilidade de gozar do seu direito à educação;

H.

Considerando que o Governo da Tanzânia empreendeu ações sérias e tangíveis destinadas a enfrentar a bruxaria no país, incluindo a suspensão de licenças de curandeiros tradicionais e numerosas detenções de feiticeiros; que o Presidente da Tanzânia nomeou a primeira deputada com albinismo em 2008 e o primeiro ministro-adjunto albino em dezembro de 2015;

I.

Considerando que, apesar da crescente visibilidade internacional e da adoção de nova legislação nos países em causa, as ações penais e as condenações continuam a ser pouco numerosas e os crimes e a tortura continuam a ser cometidos com total impunidade em muitos países africanos;

J.

Considerando que, em 1 de março de 2016, no sul do Maláui, uma multidão enfurecida assassinou e queimou sete alegados «caçadores de albinos»; que o Inspetor-Geral da polícia do Maláui ordenou aos seus agentes que atirem para matar qualquer indivíduo surpreendido enquanto tenta raptar pessoas com albinismo;

K.

Considerando que a discriminação, o assédio e a estigmatização das pessoas com albinismo determinou centenas de pessoas a fugir e procurar refúgio em abrigos temporários; que esta situação causou maior precariedade e insegurança às pessoas com albinismo, limitando o seu acesso a serviços básicos, tais como cuidados de saúde e educação, as suas oportunidades de emprego, bem como a sua plena participação na sociedade;

L.

Considerando que esta discriminação pode conduzir a traumas e problemas psicossociais ao longo da vida e provoca uma grande apreensão e medo no seio da comunidade albina; que as pessoas com albinismo têm, em geral, mais dificuldades no acesso a cuidados de saúde adequados, incluindo medicação para prevenir o cancro da pele;

M.

Considerando que, em março de 2015, a ONU nomeou o primeiro perito independente em matéria de direitos humanos das pessoas com albinismo e declarou oficialmente o dia 13 de junho como Dia Internacional de Sensibilização para o Albinismo;

N.

Considerando que, em junho de 2016, as Nações Unidas patrocinaram o primeiro fórum regional de ação em matéria de albinismo em África, que elaborou um roteiro de medidas específicas, simples e eficazes para combater as violações dos direitos humanos cometidas contra pessoas com albinismo;

O.

Considerando que a UE realizou campanhas de sensibilização pública com vista a aumentar a sensibilização para essa questão e apoiou o empenho das organizações da sociedade civil e o reforço das capacidades das autoridades locais na luta contra os assassinatos de pessoas com albinismo;

1.

Recorda que as pessoas com albinismo têm o direito de viver como qualquer outra pessoa, sem medo, tal como enunciado nos artigos 2.o e 3.o da Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948;

2.

Manifesta a sua profunda preocupação com as contínuas e generalizadas perseguição e discriminação de que são alvo as pessoas com albinismo em África, nomeadamente na sequência do recente recrudescimento da violência no Maláui; condena veementemente os assassínios, os raptos, as mutilações e outros tratamentos desumanos ou degradantes sofridos por pessoas com albinismo e exprime as suas condolências e a sua solidariedade para com as famílias das vítimas; condena ainda qualquer comércio especulativo com partes do corpo de pessoas com albinismo;

3.

Lamenta o silêncio e a inércia em torno desses eventos; relembra que a responsabilidade primária de um Estado é proteger os seus cidadãos, incluindo os grupos de pessoas vulneráveis, e insta o Governo do Maláui e as autoridades de todos os países em causa, a tomarem todas as medidas necessárias para eliminar todas as formas de violência e discriminação contra as pessoas com albinismo e proteger a dignidade, os direitos humanos e o bem-estar dessas pessoas e dos seus familiares;

4.

Insta as autoridades do Maláui a porem termo à impunidade e a procurarem obter, com caráter de urgência, apoio internacional para a realização de investigações imparciais e eficazes em todos os ataques contra as pessoas com albinismo comunicados, a fim de entregar os responsáveis à justiça e responsabilizá-los pelas suas ações;

5.

Congratula-se com a declaração do Presidente Mutharika, que condena os ataques e exorta as agências de segurança a proteger ao máximo a pessoas com albinismo; adverte, porém, para uma escalada e recordando que o incitamento ao ódio e à violência não pode ser a resposta para a atual discriminação contra as pessoas com albinismo; condena, em particular, qualquer tentativa das pessoas de fazerem justiça pelas próprias mãos;

6.

Insta o Governo malauiano a responder de forma mais eficaz às necessidades médicas, psicológicas e sociais das pessoas com albinismo, assegurando-lhes a igualdade de acesso aos cuidados de saúde e à educação, no quadro das políticas de integração;

7.

Saúda o plano de resposta nacional do Maláui, de março de 2015, que visa reforçar a sensibilização, aumentar a segurança interna e melhorar o acompanhamento dos direitos humanos, a administração da justiça e a legislação, bem como capacitar as pessoas com albinismo; insta o Governo malauiano a executar o plano de ação em cinco pontos e solicita a atribuição de mais recursos a este projeto;

8.

Congratula-se com os esforços envidados pelo Governo da Tanzânia para combater a discriminação contra pessoas com albinismo e com a sua decisão de tornar ilegais as atividades dos feiticeiros, numa tentativa de pôr cobro aos assassínios de pessoas com albinismo, reconhecendo simultaneamente que muito poucos casos são levados a tribunal; exorta, por conseguinte, o Governo do Maláui a alterar a legislação em vigor, por forma a refletir a gravidade dos crimes contra as pessoas com albinismo;

9.

Considera que se devem envidar mais esforços para abordar as causas profundas da tal discriminação e violência, através de campanhas de sensibilização do público; salienta o papel crucial das autoridades locais e das organizações da sociedade civil na promoção dos direitos das pessoas com albinismo, na informação e na educação das populações tendo em vista destruir os mitos e os preconceitos relativos ao albinismo;

10.

Manifesta a sua preocupação com os desafios específicos com que se confrontam as mulheres e as crianças com albinismo, o que as expõe ainda mais à pobreza, à insegurança e ao isolamento; frisa que todas as vítimas devem ter acesso a assistência médica e psicológica adequada e que cumpre criar políticas apropriadas, com vista a facilitar a sua reintegração nas respetivas comunidades;

11.

Exorta as autoridades dos países afetados, em cooperação com os seus parceiros regionais e internacionais, a assumirem o compromisso de tomar as medidas necessárias a fim de prevenir e combater o comércio ilegal de partes de corpo de albinos, a reverem os casos suspeitados de roubos de túmulos, a encontrarem e identificarem a fonte da procura dessas partes do corpo, e a levarem os «caçadores de albinos» à justiça;

12.

Entende que os procuradores, os investigadores e os membros das forças policiais deveriam receber formação específica com vista a proporcionar-lhes os conhecimentos necessários para lidar com os casos que implicam pessoas com albinismo;

13.

Salienta que a falta geral de compreensão e de informações médicas sobre o albinismo tendem a agravar o estado de saúde das pessoas afetadas por essa perturbação; salienta a necessidade de assegurar o seu acesso a cuidados de saúde, designadamente em zonas rurais e remotas; considera que o pessoal da saúde deve receber formação para a sensibilização relativamente ao albinismo;

14.

Solicita uma melhoria da formação dos professores e da administração escolar sobre o albinismo e insta as autoridades do Maláui a facilitarem o acesso e a participação das pessoas com albinismo no ensino;

15.

Congratula-se com a criação, pelo Conselho dos Direitos Humanos da ONU, da posição de Perito Independente sobre o exercício dos direitos humanos pelas pessoas com albinismo em 2015, e o subsequente lançamento do primeiro fórum regional de ação em matéria de albinismo em África, em Dar es Salam, que teve lugar de 17 a 19 de junho de 2016;

16.

Insta a UE e os seus Estados-Membros a continuarem a dialogar com os países afetados, a fim de apoiar eficazmente os seus esforços no sentido de definir políticas que abordem as necessidades específicas e os direitos dos albinos, com base na não-discriminação e na inclusão social, através da prestação de assistência financeira e técnica;

17.

Incentiva todos os Estados afetados a partilharem as melhores práticas em matéria de proteção e promoção dos direitos das pessoas com albinismo;

18.

Exorta a UE a acompanhar de perto a situação dos direitos humanos das pessoas com albinismo em África, nomeadamente através de relatórios regulares e do trabalho de acompanhamento desenvolvido pelas suas delegações, e a continuar a promover melhorias significativas na sua proteção e integração social;

19.

Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho, à Comissão, à Vice-Presidente da Comissão/Alta Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, aos governos e parlamentos do Maláui e da Tanzânia, à União Africana e ao Secretário-Geral das Nações Unidas.


(1)  JO C 295 E de 4.12.2009, p. 94.