21.2.2018   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 66/2


P8_TA(2016)0142

Salvaguardar o superior interesse da criança na UE com base em petições dirigidas ao Parlamento Europeu

Resolução do Parlamento Europeu, de 28 de abril de 2016, sobre a salvaguarda do interesse superior da criança na UE com base nas petições apresentadas ao Parlamento Europeu (2016/2575(RSP))

(2018/C 066/01)

O Parlamento Europeu,

Tendo em conta o artigo 228.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE),

Tendo em conta o artigo 81.o, n.o 3, do TFUE,

Tendo em conta a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, nomeadamente o artigo 24.o,

Tendo em conta os artigos 8.o e 20.o da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, que realçam a obrigação dos governos no que se refere à proteção da identidade das crianças, designadamente das suas relações familiares,

Tendo em conta a Convenção de Viena sobre Relações Consulares, de 1963, nomeadamente o artigo 37.o, alínea b),

Tendo em conta a Convenção Relativa à Proteção das Crianças e à Cooperação em Matéria de Adoção Internacional, adotada na Haia em 29 de maio de 1993,

Tendo em conta o Regulamento (CE) n.o 2201/2003 do Conselho, de 27 de novembro de 2003, relativo à competência, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria matrimonial e em matéria de responsabilidade parental e que revoga o Regulamento (CE) n.o 1347/2000 (1) (Regulamento Bruxelas II-A),

Tendo em conta o programa da UE para os direitos da criança (COM(2011)0060),

Tendo em conta as orientações elaboradas no documento de reflexão para o 9.o Fórum Europeu sobre os Direitos da Criança,

Tendo em conta o levantamento dos sistemas de proteção da criança realizado pela Agência dos Direitos Fundamentais,

Tendo em conta as numerosas petições relativas às práticas das autoridades encarregadas do bem-estar da criança e à proteção dos direitos das crianças, à custódia de menores, ao rapto de crianças e à assistência à infância que a Comissão das Petições tem vindo a receber nos últimos anos de vários Estados-Membros, bem como as recomendações feitas nos relatórios sobre missões para recolha de informações à Alemanha (23-24 de novembro de 2011) (Jugendamt), à Dinamarca (20-21 de junho de 2013) (serviços sociais) e ao Reino Unido (5-6 de novembro de 2015) (adoções não consensuais),

Tendo em conta o papel e as atividades do Mediador do Parlamento Europeu para as crianças vítimas de rapto parental internacional;

Tendo em conta o artigo 216.o, n.o 2, do seu Regimento,

A.

Considerando que o interesse superior da criança tem de ocupar o lugar central em todas as decisões relativas a questões que se prendem com os cuidados infantis, a todos os níveis;

B.

Considerando que a UE pode adotar medidas relativas ao direito da família com incidência transfronteiriça (Artigo 81.o, n.o 3, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia — TFUE), designadamente no domínio das adoções;

C.

Considerando que a mobilidade acrescida na UE conduziu ao aumento das questões relativas à proteção transfronteiriça da criança que envolvem a perda da custódia;

D.

Considerando que as questões relativas à custódia de crianças têm um impacto significativo na vida de todas as pessoas envolvidas e na sociedade, em geral, que o Regulamento Bruxelas II-A apresenta lacunas e que a sua futura revisão seria uma boa oportunidade para melhorar as respetivas disposições;

E.

Considerando que o exercício de um direito fundamental como a liberdade de circulação e de residência não deveria ameaçar o direito à vida familiar das crianças;

F.

Considerando que as crianças cujos pais exercem o direito à livre circulação têm o direito de manter regularmente relações pessoais e contactos diretos com ambos os progenitores, exceto se isso for contrário aos seus interesses, em conformidade com o artigo n.o 24 da Carta dos Direitos Fundamentais;

1.

Recorda que o elevado número de petições recebidas, atinentes a casos relacionados com crianças, indica a existência de graves problemas na aplicação do Regulamento Bruxelas II-A;

2.

Considerando que todos os sistemas de proteção da criança devem beneficiar de mecanismos transnacionais e transfronteiriços que tenham em consideração as especificidades dos conflitos transfronteiriços;

Proteção da criança e cooperação judiciária na UE

3.

Exorta os Estados-Membros a estabelecerem mecanismos de acompanhamento e avaliação (com estatísticas socioeconómicas pertinentes e discriminadas por nacionalidades) no âmbito de um quadro nacional de coordenação dos casos transfronteiriços que envolvem crianças; recomenda à Comissão que coordene a transferência de informações entre autoridades pertinentes dos Estados-Membros;

4.

Exorta o Conselho a apresentar relatórios sobre as ações específicas implementadas pelos Estados-Membros, a fim de criar sinergias entre os 28 sistemas nacionais de proteção da criança;

5.

Solicita que a noção de «residência habitual» seja redefinida aquando da revisão do Regulamento Bruxelas II-A;

6.

Salienta a obrigação, definida no Regulamento Bruxelas II-A, de as autoridades nacionais reconhecerem e executarem as decisões proferidas noutro Estado-Membro em casos relacionados com crianças; insta os Estados-Membros a reforçarem e a melhorarem a cooperação dos respetivos poderes judiciais nos casos relacionados com crianças;

7.

Exorta a Comissão e os Estados-Membros a cofinanciarem e promoverem a criação de uma plataforma que proporcione apoio a cidadãos da UE nacionais de outros Estados-Membros nos processos relativos à família, a par de uma linha única europeia para casos de rapto ou abuso de crianças, bem como aconselhamento em matéria de prestação de cuidados e procedimentos para adoção;

8.

Insta a Comissão a proporcionar aos cidadãos da UE um guia claro e facilmente acessível, com informações sobre os acordos institucionais relativos à proteção da criança, mormente a adoção ou colocação sem consentimento parental, e sobre os direitos dos pais nos diferentes Estados-Membros;

Papel dos serviços sociais na proteção da criança

9.

Exorta os Estados-Membros a adotarem uma abordagem preventiva e a assegurarem políticas adequadas e dotadas de recursos que visem evitar, sempre que possível, os procedimentos de assistência, introduzindo sistemas de alerta rápido e mecanismos de monitorização, e proporcionando apoio adequado às famílias, enquanto primeiras prestadoras de cuidados, nomeadamente nas comunidades vulneráveis que apresentam um risco de exclusão social;

10.

Realça que a avaliação adequada dos casos individuais em questões relacionadas com a família não deve ser prejudicada por cortes orçamentais devido a medidas de austeridade, nomeadamente no que toca à qualidade dos serviços sociais;

11.

Apela à Comissão e aos Estados-Membros para que proporcionem formação e educação especializadas aos assistentes sociais e a outros profissionais que lidam com casos transfronteiriços que envolvam menores;

12.

Insta as autoridades pertinentes de um Estado-Membro que pretenda enviar assistentes sociais a outro Estado-Membro para investigar um caso de adoção ou colocação, a informarem as autoridades do Estado-Membro em causa sobre essa investigação;

Processos judiciais relativos a cuidados infantis

13.

Exorta os Estados-Membros a designarem secções especializadas nos tribunais de família ou organismos de mediação transfronteiras que lidem com processos transfronteiriços relativos a menores; salienta que um acompanhamento adequado da situação na fase posterior à sentença é crucial, nomeadamente quando se trata do contacto com os progenitores;

14.

Insta os Estados-Membros a aplicarem sistematicamente as disposições da Convenção de Viena, de 1962, e a assegurarem que as embaixadas ou as representações consulares sejam informadas desde o início sobre todos os processos relativos a cuidados infantis que envolvam os seus nacionais e tenham pleno acesso aos documentos pertinentes; entende que as autoridades consulares devem ter a possibilidade de estar presentes em todas as fases do processo;

15.

Exorta os Estados-Membros a garantirem aos pais direitos de visita regular, exceto nos casos em que tal prejudicaria o interesse superior da criança, e a permitir-lhes que utilizem a língua materna para comunicar com os seus filhos durante as visitas;

16.

Recomenda aos Estados-Membros que disponibilizem aos pais, desde o início e em todas as fases dos processos relativos a crianças, informações completas e claras sobre o processo e as suas possíveis consequências; solicita aos Estados-Membros que informem os pais sobre as regras relativas a apoio e assistência jurídica, fornecendo, por exemplo, uma lista de advogados especializados bilingues e proporcionando serviços de interpretação, de molde a evitar os casos em que os pais consentem sem compreenderem todas as implicações desse compromisso; recomenda igualmente que seja prestado apoio adequado aos pais com dificuldades de literacia;

17.

Recomenda a definição de normas mínimas para a audição de crianças em processos civis nacionais, em conformidade com o artigo 24.o da Carta dos Direitos Fundamentais;

18.

Recomenda audições separadas dos pais e das crianças perante juízes, peritos ou assistentes sociais, a fim de evitar que as crianças sejam influenciadas ou sejam vítimas de conflitos de lealdade;

19.

Recomenda que os prazos para a duração de cada fase dos processos transfronteiriços relativos a cuidados infantis sejam fixados de modo a que os membros da sua família alargada disponham de tempo suficiente para apresentar o pedido de adoção da criança ou que os pais possam resolver os seus problemas e propor alternativas sustentáveis antes da decisão final de adoção; considera que, antes de optar por qualquer solução permanente, tal como a adoção, há que reavaliar a situação da família biológica;

20.

Insta os Estados-Membros a concederem aos pais que sofrem de alcoolismo ou toxicodependência um intervalo de tempo razoável, a fim de lhes oferecer uma verdadeira oportunidade para recuperar antes de o tribunal tomar uma decisão final sobre a adoção da sua criança;

21.

Insta a Comissão a votar particular atenção às recomendações em matéria de mediação transfronteiras elaboradas por todos os intervenientes pertinentes a nível nacional e europeu;

Colocação da criança e adoção

22.

Afirma que não existe a nível da UE um mecanismo que preveja o reconhecimento automático das decisões de adoção nacionais emitidas por outros Estados-Membros; insta os Estados-Membros e a Comissão a legislarem sobre o reconhecimento das adoções nacionais, tendo em conta o interesse superior da criança e respeitando o princípio da não discriminação;

23.

Insta os Estados-Membros a incentivarem os Estados não contratantes a aderirem à Convenção da Haia de 1993, o que garantiria que todas as crianças beneficiem das mesmas normas e ajudaria a evitar um sistema paralelo, com menos salvaguardas; exorta os Estados-Membros a evitarem o excesso de burocracia no processo de reconhecimento das adoções convencionais já reconhecidas noutro Estado-Membro;

24.

Salienta a importância de proporcionar às crianças, aquando da adoção ou colocação numa família de acolhimento, qualquer que seja a forma escolhida, a colocação que oferece as melhores oportunidades para manter as ligações com a sua herança cultural e para aprender e utilizar a sua língua materna; insta as autoridades dos Estados-Membros envolvidas nos processos de adoção a fazerem todos os esforços possíveis para evitar a separação de irmãos;

25.

Solicita aos Estados-Membros que confiram especial atenção e apoio aos pais, em especial às mulheres, que tenham sido vítimas de violência doméstica, quer na infância quer enquanto adultos, a fim de evitar que sejam mais uma vez vítimas da supressão automática da custódia dos filhos;

Rapto parental transfronteiriço

26.

Exorta a Comissão a divulgar os resultados alcançados na promoção da cooperação transfronteiriça nos casos de rapto de crianças, a qual foi indicada como uma prioridade no programa da UE para os direitos da criança;

27.

Insta o Conselho a apresentar um relatório sobre os resultados alcançados na criação de sistemas de alerta em casos de rapto de crianças com implicações transfronteiriças e a concluir os acordos de cooperação pertinentes a fim de lidar com os casos de rapto transfronteiriço, com base nas orientações da Comissão;

o

o o

28.

Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho, à Comissão e aos governos e parlamentos dos Estados-Membros.


(1)  JO L 338 de 23.12.2003, p. 1.