19.8.2016   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 303/122


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo ao mercúrio e que revoga o Regulamento (CE) n.o 1102/2008»

[COM(2016) 39 final — 2016/023 (COD)]

(2016/C 303/17)

Relator:

Vladimír NOVOTNÝ

Em 4 de fevereiro de 2016 e em 18 de fevereiro de 2016, o Parlamento Europeu e o Conselho, respetivamente, decidiram, nos termos do artigo 192.o, n.o 1.o, e dos artigos 207.o e 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a

«Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo ao mercúrio e que revoga o Regulamento (CE) n.o 1102/2008»

[COM(2016) 39 final — 2016/023 (COD)].

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente, que emitiu parecer em 11 de maio de 2016.

Na 517.a reunião plenária, de 25 e 26 de maio de 2016 (sessão de 25 de maio), o Comité Económico e Social Europeu adotou, por 153 votos a favor, 2 votos contra e 3 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O Comité recomenda vivamente a adoção da Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo ao mercúrio e que revoga o Regulamento (CE) n.o 1102/2008 enquanto ponto de partida para a ratificação da Convenção de Minamata pela União Europeia como um todo e pelos seus Estados-Membros.

1.2.

As emissões de mercúrio são um problema mundial que requer uma solução mundial, representada pela Convenção de Minamata. A UE tem sido, juntamente com o Japão, o principal motor da diminuição do fardo que o mercúrio representa para o ambiente (e a população), mas devemos estar conscientes de que o mercúrio e os seus compostos são elementos que irão permanecer no ambiente indefinidamente.

1.3.

O Comité constata que a atividade continuada desenvolvida pela UE em relação ao problema do mercúrio, a nível mundial e, sobretudo, da União, levou a uma redução de 75 % das emissões antropogénicas de mercúrio na UE desde 1990, e que as normas jurídicas em vigor garantem o prosseguimento dessa redução de forma progressiva.

1.4.

O CESE recomenda que as medidas adicionais que a UE venha a tomar cumpram a aplicação da Convenção de Minamata, logo que ratificada e em vigor. O Comité crê que o quadro legislativo que regulamenta antes de mais as emissões, mas também os processos de produção e os produtos, é suficiente para cumprir os compromissos assumidos no âmbito da convenção, sem comprometer a competitividade da UE no seu conjunto.

1.5.

O Comité considera essencial afetar uma percentagem adequada das capacidades da UE nos domínios da ciência e da investigação à problemática do mercúrio e dos seus substitutos nos processos de produção e nos produtos.

1.6.

O Comité recomenda ainda que as autoridades competentes da UE e os Estados-Membros signatários da Convenção de Minamata participem, após a sua ratificação, na primeira reunião, em curso de preparação, da conferência das partes (COP1) na convenção sobre o mercúrio, contribuindo com novos conhecimentos que permitam continuar a reduzir as emissões antropogénicas de mercúrio, bem como a sua utilização em produtos e processos de produção.

2.   Introdução

2.1.

O mercúrio é um elemento natural da terra, com uma abundância média de 0,05 mg/kg na crosta terrestre e variações locais significativas. O mercúrio está também presente em níveis muito baixos na biosfera. A absorção do mercúrio pelas plantas explica a sua presença em combustíveis como o carvão, o petróleo e o gás natural, e também nos biocombustíveis. A combustão de biomassa produz praticamente as mesmas emissões de mercúrio que a combustão do carvão. A problemática do mercúrio e das suas emissões encontra-se descrita em pormenor nos documentos do Programa das Nações Unidas para o Ambiente (PNUA) (1).

2.2.

Uma vez liberto, o mercúrio sobrevive no ambiente sob diversas formas circulando no ar, na água, nos sedimentos, no solo e na biota. Pode transformar-se (sobretudo através do metabolismo microbiano) em metilmercúrio, que tem a capacidade de se acumular nos organismos e, em particular, na cadeia alimentar aquática (peixes e mamíferos marinhos). A razão por que o mercúrio e os outros metais pesados são considerados uma ameaça para o ambiente mundial reside no facto de serem bioacumuláveis e capazes de se propagarem na atmosfera a longas distâncias.

2.3.

Em algumas zonas do mundo, em particular fora da UE, um número significativo de pessoas está exposto a quantidades de mercúrio muito acima dos níveis considerados seguros. De acordo com as melhores estimativas, as emissões antropogénicas de mercúrio na atmosfera elevam-se a 1 960 toneladas por ano a nível planetário, incluindo 87,5 toneladas por ano na UE (4,5 % do total). As emissões diretas de mercúrio para a água elevam-se a 900 toneladas por ano, e a contribuição das emissões naturais (erosão das rochas e atividade vulcânica) representa aproximadamente o mesmo valor. Do anexo 1 consta uma panorâmica das emissões antropogénicas de mercúrio.

2.4.

Não obstante o declínio no consumo mundial de mercúrio (a procura mundial decresceu mais de metade relativamente aos níveis de 1980) e os preços baixos, a extração mineira de mercúrio ocorre ainda em vários países do mundo, sendo a China e Cazaquistão os seus maiores produtores. Na Europa, a produção primária já cessou desde 2003, mas o mercúrio é isolado como um subproduto de outros processos de extração e processamento de matérias-primas minerais. Este mercúrio é classificado como resíduo e é tratado em conformidade com a legislação em matéria de resíduos.

2.5.

Quantidades importantes de mercúrio chegam igualmente ao mercado mundial na sequência da conversão ou encerramento de instalações destinadas à produção cloro-alcalina de países que utilizavam mercúrio em regiões onde, contrariamente à UE, o comércio do mercúrio ainda não foi proibido.

2.6.

As emissões da combustão de carvão e dos processos de incineração, incluindo os siderúrgicos e a produção de metais não ferrosos, constituem a principal fonte de emissões antropogénicas e sobretudo de imissões de compostos de mercúrio nas proximidades de fontes emissoras específicas na UE. A análise das diversas opções abrange tanto a retenção do mercúrio e de outros elementos no processo de depuração de efluentes gasosos, como os processos específicos de retenção do mercúrio sempre que pertinentes.

2.7.

Outra fonte importante de emissões antropogénicas, principalmente de mercúrio elementar, decorre da utilização de amálgamas como material de obturação dentária. Parece que, nesta área, as emissões (antes de mais para a água) são muito mais controláveis e que as tecnologias disponíveis nesta matéria são amplamente utilizadas no mundo desenvolvido.

2.8.

O Comité já manifestou as opiniões da sociedade civil sobre a questão das emissões nocivas de mercúrio e dos compostos de mercúrio em pareceres anteriores, sendo o presente parecer o seguimento natural desse trabalho (2).

3.   Documento da Comissão

3.1.

A União e 26 Estados-Membros assinaram a nova Convenção Internacional sobre o Mercúrio. Esta convenção, também denominada Convenção de Minamata, abrange, à escala mundial, todo o ciclo do mercúrio, da mineração primária até à gestão dos resíduos de mercúrio, com o objetivo de proteger a saúde humana e o ambiente das emissões antropogénicas de mercúrio e dos seus compostos para a atmosfera, a água e o solo. A UE e a maior parte dos seus Estados-Membros assinaram esta nova Convenção Internacional sobre o Mercúrio, que já recolheu 128 assinaturas e foi ratificada, até ao momento, por 25 países (3).

3.2.

A avaliação aprofundada do acervo da União identificou algumas lacunas regulamentares que importa colmatar para assegurar o pleno alinhamento do direito da União com a convenção (4). A proposta ora em apreciação visa colmatar essas lacunas, que dizem respeito às seguintes questões:

importação de mercúrio;

exportação de certos produtos que contêm mercúrio adicionado;

utilização de mercúrio em determinados processos de fabrico;

novas utilizações de mercúrio em produtos e processos de fabrico;

utilização de mercúrio em mineração aurífera artesanal e em pequena escala; e

utilização de mercúrio em amálgamas dentárias.

3.3.

Por motivos de clareza jurídica, as obrigações decorrentes da convenção que ainda não foram transpostas para o direito da UE devem ser integradas num único ato legislativo.

3.4.

É necessário reforçar a coerência e a clareza jurídica; para tal, a proposta em apreço deve revogar e substituir o Regulamento (CE) n.o 1102/2008, mantendo as suas obrigações substantivas ainda necessárias.

3.5.

Os objetivos da iniciativa ora em apreciação são também coerentes com os da estratégia «Europa 2020» para um crescimento inteligente, inclusivo e sustentável. A proposta contribuirá para criar condições equitativas, a nível mundial, para os processos industriais que utilizam ou emitem de forma não intencional mercúrio e compostos de mercúrio, bem como para o fabrico e o comércio de produtos com mercúrio adicionado, promovendo assim a competitividade da indústria da União.

3.6.

Além disso, a proposta promove, sempre que possível, a simplificação e a clarificação do acervo, de forma a proporcionar uma execução melhor e mais eficaz.

3.7.

A avaliação de impacto concluiu que a ratificação e aplicação da Convenção de Minamata trarão à UE benefícios significativos no domínio do ambiente e da saúde humana, devido, essencialmente, à redução prevista das emissões de mercúrio provenientes de outras partes do mundo.

4.   Observações na generalidade

4.1.

O CESE saúda a adoção da proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho, pois é um documento que representa o culminar de um longo esforço com vista a criar um enquadramento jurídico responsável que permita limitar, à escala mundial, a longo prazo e duradouramente os efeitos adversos do mercúrio e dos seus compostos. O Comité constata que a proposta de regulamento cumpre integralmente o principal objetivo de proteger a saúde e o ambiente dos efeitos nocivos do mercúrio.

4.2.

O Comité congratula-se vivamente com o contributo das instituições da UE, mas também dos diferentes Estados-Membros, para o processo de conceção e negociação da Convenção de Minamata e respetiva ratificação.

4.3.

O CESE congratula-se não menos vivamente com a aplicação sistemática, tanto no passado como no presente, em todo o processo, dos princípios essenciais da subsidiariedade e da proporcionalidade, sem detrimento para a eficácia dos atos jurídicos adotados à escala da UE e a nível mundial.

4.4.

O Comité está convencido de que o esforço desenvolvido pela Europa contribuirá para uma rápida ratificação da Convenção de Minamata até ao final de 2016 e para uma limitação adequada dos riscos sanitários e ambientais decorrentes das emissões antropogénicas de mercúrio e da sua utilização à escala do planeta. Além disso, o Comité manifesta a sua convicção de que o regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho não deve ultrapassar — e não ultrapassará — o âmbito das exigências impostas pela Convenção de Minamata.

5.   Observações na especialidade

5.1.

O CESE congratula-se igualmente com o facto de o regulamento refletir os resultados das consultas junto das partes interessadas na UE, bem como dos debates sobre a Convenção de Minamata realizados com especialistas sob a égide do PNUA. Felicita a Comissão por ter completado com êxito a sua análise muito exigente e extensa, que culminou com o projeto de regulamento ora em apreciação.

5.2.

O CESE faz seu o parecer da Comissão, segundo o qual não se justificam restrições ao comércio que ultrapassem as exigências da convenção, designadamente a proibição incondicional da importação de mercúrio, dado que seriam mais onerosas para a indústria da União e não proporcionariam benefícios ambientais significativos.

5.3.

O Comité também faz seu o parecer manifestado pela Comissão na sua proposta de regulamento, segundo o qual também não se justificam restrições às exportações de certos produtos com mercúrio adicionado, dado que o consumo e as descargas de mercúrio para o ambiente permaneceriam, na sua essência, inalterados e que, na sequência da proibição, as emissões de mercúrio poderiam aumentar nos países terceiros.

5.4.

O Comité endossa igualmente, sem restrições (em conformidade com as conclusões das consultas e os resultados dos estudos), a tese segundo a qual a restrição do uso do mercúrio em certos processos de fabricação e o seu uso nos novos processos de fabrico devem ser proporcionais aos riscos a eles associados e decorrerão de um processo evolutivo no desenvolvimento tecnológico de longo prazo.

5.5.

O Comité faz suas, no entanto, as disposições da Convenção de Minamata segundo as quais as partes devem tomar medidas com vista a desincentivar o desenvolvimento de novos processos de fabrico que utilizem mercúrio, bem como a produção e a colocação no mercado de novos produtos com mercúrio adicionado.

5.6.

O Comité constata que a aplicação da Diretiva 2001/80/CE relativa à limitação das emissões para a atmosfera de certos poluentes provenientes de grandes instalações de combustão provocou, e continua a provocar, uma limitação significativa das emissões de mercúrio no setor de energia, que é o setor que mais contribui para as emissões antropogénicas e as imissões de mercúrio no solo e na água, devido ao processo de deposição atmosférica. Desde 1990, a UE conseguiu reduzir as suas emissões antropogénicas de mercúrio em mais de 75 % (5). A execução integral da Diretiva 2010/75/UE relativa às emissões industriais contribuirá de forma significativa para reduzir ainda mais as emissões de mercúrio. O CESE concorda com o ponto de vista da Comissão e manifesta a sua convicção de que não é necessário, neste momento, alterar ou complementar os requisitos da Diretiva relativa às emissões industriais, concretamente no que respeita às emissões de mercúrio.

5.7.

O CESE aprova a abordagem proposta com vista a limitar as emissões de mercúrio de processos industriais com base no conceito de melhores técnicas disponíveis (MTD) e dos seus documentos de referência.

5.8.

O CESE defende a necessidade de adotar disposições legislativas relativas ao armazenamento permanente e seguro do mercúrio retirado do circuito de produção industrial em estruturas geológicas adequadas, por exemplo em minas de sal abandonadas. O CESE insta a Comissão a definir urgentemente critérios relativos às instalações de armazenamento, bem como exigências referentes ao armazenamento de resíduos contaminados com mercúrio.

5.9.

O Comité congratula-se com a posição equilibrada da Comissão Europeia sobre a questão do uso de amálgamas em estomatologia, baseada nos conhecimentos científicos já disponíveis. Considera que os requisitos em matéria de equipamento aplicáveis às instalações de cuidados dentários, nomeadamente a obrigação da instalação de separadores de mercúrio e a restrição do uso de amálgamas dentárias na sua forma encapsulada, são suficientes para limitar eficazmente as descargas de mercúrio para o ambiente e para proteger a saúde humana (6). Simultaneamente, o CESE chama a atenção para os potenciais riscos ainda mal conhecidos e definidos que poderão apresentar os novos materiais dentários que virão substituir o uso da amálgama.

5.10.

Simultaneamente, o CESE chama a atenção para o aumento dos custos de serviços reembolsados pelos orçamentos de saúde pública e para o eventual impacto sanitário e social em certas categorias de pacientes, caso esses encargos sejam repercutidos neles.

Bruxelas, 25 de maio de 2016.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Georges DASSIS


(1)  PNUA, 2013. «Global Mercury Assessment 2013: Sources, Emissions, Releases and Environmental Transport» [Avaliação sobre o mercúrio a nível mundial 2013: Fontes, emissões, descargas e propagação ambiental]. Departamento de Produtos Químicos do PNUA, Genebra, Suíça.

(2)  JO C 318 de 23.12.2006, p. 115.

JO C 168 de 20.7.2007, p. 44.

JO C 132 de 3.5.2011, p. 78.

(3)  http://mercuryconvention.org/Convention/tabid/3426/Default.aspx.

(4)  Avaliação de impacto que acompanha a Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho sobre o mercúrio e que revoga o Regulamento (CE) n.o 1102/2008 e a Proposta de decisão do Conselho relativa à celebração da Convenção de Minamata sobre o mercúrio — documento de trabalho dos serviços da Comissão, SWD(2016) 17 final.

(5)  Fonte: Agência Europeia do Ambiente (AEA), «Trends in Emissions of Heavy Metals» [Tendências em matéria de emissões de metais pesados], http://www.eea.europa.eu/data-and-maps/daviz/emission-trends-of-heavy-metals-3#tab-chart_3.

(6)  Comité Científico dos Riscos para a Saúde e o Ambiente (CCRSA): «Opinion on the environmental risks and indirect health effects of mercury from dental amalgam» [Parecer sobre os riscos ambientais e os efeitos indiretos sobre a saúde do mercúrio de amálgamas dentárias] (atualização de 2014).