18.5.2016   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 177/41


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Recomendação de recomendação do Conselho sobre a política económica da área do euro

[COM(2015) 692 final]

(2016/C 177/07)

Relator:

Michael IKRATH

Correlatora:

Anne DEMELENNE

Em 22 de dezembro de 2015, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a

Recomendação de recomendação do Conselho sobre a política económica da área do euro

[COM(2015) 692 final].

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social, que emitiu parecer em 3 de março de 2016.

Na 515.a reunião plenária de 16 e 17 de março de 2016 (sessão de 17 de março de 2016), o Comité Económico e Social Europeu aprovou, por 201 votos a favor, 3 votos contra e 6 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O CESE acolhe favoravelmente, em princípio, a criação de programas de prioridades económicas com vista a estimular o crescimento nos países da área do euro no início do Semestre Europeu. Todavia, lamenta que a sociedade civil e, em particular, os parceiros sociais não tenham sido consultados sobre a conceção e durante os processos nacionais do Semestre Europeu.

1.2.

O CESE considera que estas recomendações devem ajudar a reduzir, e nunca a ampliar, o fosso existente entre os países da área do euro e os outros Estados-Membros. Pretende-se, em especial, manter uma visão de longo prazo para desenvolver o euro de modo que se torne a moeda comum de todos os Estados-Membros.

1.3.

O CESE reconhece a importância do documento da Comissão para o aprofundamento da União Económica e Monetária (UEM). Tal como já assinalado em pareceres anteriores (1), o Comité defende com vigor o reforço e a conclusão da UEM. Os Estados-Membros, de forma individual ou coletiva, devem tomar todas as medidas necessárias para assegurar uma maior convergência e integração, especialmente no domínio económico. Tal deve ser acompanhado de progressos na criação, no âmbito da área do euro, de uma união orçamental (incluindo um orçamento específico), de uma união social e de uma representação externa unificada em instituições financeiras internacionais.

1.4.

O CESE reconhece a necessidade política de proporcionar à área do euro uma base institucional e política sólida, o que ainda não foi feito desde o estabelecimento da união monetária (2). Iniciativas individuais, como a criação de uma união bancária ou de uma União dos Mercados de Capitais, são de louvar, mas não substituem a estrutura sólida que é necessária.

1.5.

É ainda de salientar que os programas de investimento recentes no âmbito de campanhas para a criação de postos de trabalho não atingiram suficientemente os seus objetivos. Para a retoma do crescimento e do emprego, é necessário articular as políticas financeiras, fiscais, orçamentais, económicas e sociais. Ao contrário da recomendação da Comissão, no âmbito da conceção da política orçamental deve colocar-se a tónica no sentido de esta ser mais expansionista do que neutra.

1.6.

O CESE considera que uma orientação orçamental neutra, embora seja preferível à prossecução da austeridade orçamental, não é adequada nas circunstâncias atuais. Tendo em conta que a recessão conduz à diminuição do potencial de crescimento, as políticas orçamentais da área do euro têm de fazer mais do que é habitual para estimular a economia da área do euro no seu conjunto. Neste momento, os riscos decorrentes do sobreaquecimento das economias são muito menos elevados do que os riscos da continuação de uma baixa taxa de inflação ou da deflação. Por conseguinte, o CESE recomenda um estímulo orçamental centrado no investimento público, o que conduziria ao reforço da procura no curto prazo, mas também aumentaria o potencial de crescimento no longo prazo.

1.7.

O CESE defende igualmente uma redução da carga fiscal sobre o trabalho desde que a viabilidade financeira dos sistemas de segurança social, já fragilizados, não se encontre ameaçada. O Comité recorda que os sistemas modernos de segurança social deviam basear-se nos princípios da solidariedade e da igualdade de oportunidades, e não só na promoção da empregabilidade. Além disso, ao nível orçamental, será de ter em conta as consequências da robótica e da transição digital, que trarão perturbações ao mercado de trabalho, com um impacto provável nas receitas fiscais.

1.8.

O CESE congratula-se por a noção de flexibilidade ter sido reexaminada, mas o ideal seria que os contratos temporários evoluíssem para contratos permanentes, e não para postos de trabalho precários. A fim de lutar contra as desigualdades sociais crescentes, é necessário criar emprego e colocar a tónica na qualidade do trabalho. Ao mesmo tempo, há que explorar o potencial da economia da partilha, e não fragilizá-lo, e devem ser introduzidas novas formas de emprego e de trabalho em prol da sociedade, sem pôr em perigo os direitos dos trabalhadores e os sistemas de segurança social.

1.9.

Durante os últimos oito anos o crescimento na área do euro tem sofrido devido à procura reduzida e não devido à oferta reduzida. O ajustamento dos mercados de trabalho foi desequilibrado e assimétrico, tendo-se concretizado principalmente através da redução dos salários nominais e reais e dos custos unitários do trabalho nos Estados-Membros mais afetados pela crise. Assim, o CESE conclui que as reformas estruturais com vista a melhorar o lado da oferta das economias e, desse modo, estimular o investimento e o crescimento, não podem, por si só, resolver o problema da fragilidade da retoma. Devem pelo menos ser consideradas prioritárias as reformas estruturais que podem ter efeitos positivos na procura no curto prazo, mesmo numa situação de restrições ao crédito para as famílias e empresas.

1.10.

O CESE também apela a medidas coordenadas para criar um ambiente empresarial mais favorável para as pequenas e médias empresas (99 % das empresas da UE e cerca de 60 % dos trabalhadores, ou seja, cerca de 65 milhões de pessoas) através do programa Legislar Melhor e da redução continuada da burocracia, e assegurando financiamento suficiente e adequado («Acesso ao financiamento») (3), bem como a facilitação sistemática das exportações para mercados fora da União Europeia. Tal permite criar perspetivas de negócio para o investimento no crescimento e no emprego.

1.11.

O CESE acolhe favoravelmente as iniciativas para o financiamento das PME no âmbito da União dos Mercados de Capitais. Porém, importa, em particular, proporcionar novas oportunidades de financiamento às microempresas e às empresas em fase de arranque, tais como o capital de arranque, o capital de risco, o investimento e financiamento colaborativos e, ainda, formas inovadoras de financiamento, tais como os capitais fechados. Neste contexto, o CESE sublinha a necessidade de criar, tal como previsto, um fundo de capital de risco da UE. É urgente realizar uma avaliação para descobrir as oportunidades que os novos modelos bancários (4) poderão oferecer para o financiamento das empresas na UE.

2.   Antecedentes

2.1.

Na sequência do Relatório dos Cinco Presidentes intitulado «Concluir a União Económica e Monetária Europeia», foi adotada uma abordagem renovada no quadro do Semestre Europeu para reforçar a integração entre a área do euro e os níveis nacionais. A Comissão publicou, pela primeira vez, uma recomendação para a área do euro, em novembro, juntamente com a Análise Anual do Crescimento para 2016, com vista a integrar melhor a área do euro e as dimensões nacionais da governação económica da UE.

2.2.

Pretende-se proporcionar o debate e a elaboração de recomendações sobre a área do euro, antes de entrar nos debates específicos por país, para que os desafios comuns sejam plenamente refletidos nas ações específicas por país. Esta é uma alteração importante relativamente aos ciclos anteriores do Semestre Europeu, em que as recomendações dirigidas à área do euro foram apresentadas no final do Semestre, simultaneamente às recomendações específicas por país.

2.3.

A Comissão apresentou quatro recomendações sobre a política económica da área do euro:

prosseguir políticas de apoio à recuperação, de fomento da convergência, de facilitação da correção dos desequilíbrios macroeconómicos e de melhoria da capacidade de ajustamento;

aplicar reformas que associem contratos de trabalho flexíveis e fiáveis, estratégias abrangentes de aprendizagem ao longo da vida, políticas eficazes que favoreçam a reintegração dos desempregados no mercado de trabalho, sistemas modernos de segurança social e mercados de produtos e de serviços abertos e concorrenciais; reduzir a carga fiscal sobre o trabalho, em particular sobre os salários baixos, de forma neutra, de modo a fomentar a criação de postos de trabalho;

manter a prevista orientação orçamental neutra em termos gerais em 2016; reduzir a dívida pública, na perspetiva de 2017, para restauração das reservas orçamentais, evitando, simultaneamente, a pró-ciclicalidade, no pleno cumprimento do Pacto de Estabilidade e Crescimento; e

facilitar a redução gradual dos empréstimos de má qualidade creditícia concedidos pelos bancos e o aperfeiçoamento dos processos de insolvência aplicáveis às empresas e às famílias.

3.   Observações na generalidade

3.1.

Pela primeira vez, os projetos de recomendações para a área do euro são publicados no início do ciclo do Semestre Europeu, juntamente com a Análise Anual do Crescimento (AAC), o Relatório sobre o Mecanismo de Alerta (RMA) e o projeto de Relatório Conjunto sobre o Emprego. O CESE concorda que este novo processo pode contribuir para melhor ter em conta considerações para toda a área do euro no âmbito da conceção das políticas nacionais apresentadas nos programas de estabilidade e nos programas nacionais de reformas.

3.2.

O CESE lamenta que os parceiros sociais e a sociedade civil em geral não tenham sido consultados sobre a conceção do projeto de recomendações económicas da área do euro e que os processos nacionais ainda não tenham sido ajustados a este novo processo do Semestre Europeu. No quadro do Semestre Europeu, o diálogo social pode ser o motor para reformas sociais, económicas e de emprego bem sucedidas, sustentáveis e inclusivas. Os parceiros sociais, a todos os níveis, devem chegar a um acordo com as autoridades públicas competentes sobre uma participação verdadeira, atempada e pertinente no Semestre Europeu. O CESE recomenda também com veemência uma cooperação estreita e permanente entre a Secção ECO do CESE e a Comissão ECON do PE no futuro.

3.3.

O CESE apoia a ênfase conferida a uma abordagem coordenada entre todos os Estados-Membros da área do euro, mas também a nível das políticas monetárias, orçamentais e estruturais/do lado da oferta. Além disso, propõe que a tónica das reformas estruturais seja colocada nas medidas políticas, de modo a sustentar a retoma económica no curto prazo. No que diz respeito à flexibilidade dos mercados de trabalho, tal não deve conduzir, como sucedeu em anos anteriores, à perda do poder de compra da força de trabalho, de modo a não comprometer o papel que a procura interna tem como motor essencial do crescimento. Isto significa que a concorrência deve ser estimulada através da melhoria da qualidade e do crescimento da produtividade resultantes da inovação, e não através de preços e salários baixos.

3.4.

O CESE reconhece os enormes desafios de continuar a reforçar e desenvolver o euro, que são atualmente necessários e continuarão a sê-lo no futuro próximo para garantir uma proteção duradoura para o euro e para a área do euro, mas recomenda que se tenha em vista os seguintes objetivos:

Criação de uma representação externa unificada da área do euro nos fóruns internacionais (Fundo Monetário Internacional, OCDE, etc.) (5).

Criação de uma união orçamental do euro.

Criação de uma união social, ou seja, a Comissão, o Conselho e o Parlamento devem incluir ainda mais os parceiros sociais em todas as iniciativas legislativas.

3.5.

Tendo em vista a revisão intercalar do quadro financeiro plurianual da UE para 2014-2020 e a preparação da reflexão sobre o mesmo após 2020, o CESE propõe que seja atribuído à área do euro um orçamento específico destinado a: i) proporcionar uma transferência temporária mas significativa de recursos em caso de choques regionais; ii) contrariar recessões graves em toda a área; iii) assegurar estabilidade financeira. Na mesma linha, como primeiro passo para um governo no domínio económico, a área do euro deve ter o seu próprio ministro das Finanças, com um sistema específico de recursos próprios pautado pelos princípios da simplicidade, transparência, equidade e responsabilização democrática.

4.   Observações na especialidade

4.1.    Desequilíbrios macroeconómicos

4.1.1.

O CESE perfilha a opinião da Comissão de que as reformas estruturais nos Estados-Membros devem ser prosseguidas tendo em conta as circunstâncias específicas de cada país, a fim de promover a convergência e facilitar a correção dos desequilíbrios macroeconómicos. Contudo, deve haver um equilíbrio entre as reformas estruturais e o investimento nas atividades produtivas que resulte na criação de emprego.

4.1.2.

O CESE congratula-se com a recomendação da Comissão Europeia de que os Estados-Membros que apresentam grandes excedentes da balança de transações correntes devem aplicar prioritariamente medidas que favoreçam a canalização do excesso de poupança para a economia interna e, por essa via, o aumento do investimento interno. No entanto, estas medidas não devem limitar-se ao lado da oferta (por exemplo, reformas nos mercados de produtos), mas incluir também iniciativas governamentais mais decisivas a nível do investimento público, como o atual Plano Juncker (6).

4.1.3.

O CESE considera que as subvenções estatais deverão ser dirigidas, em particular, às PME inovadoras. De modo a facilitar o acesso ao financiamento a esta categoria de empresas, incumbe ao Estado conceder financiamentos impulsionadores, por um lado, e fornecer um sistema de garantias públicas, por outro. A interação relevante entre o Estado, as PME e as universidades e instituições de investigação é um importante elemento do sistema de investimento.

4.1.4.

O CESE sublinha o facto de que as exportações são um dos principais motores de crescimento para as PME na área do euro. Para além da taxa de câmbio euro/dólar favorável que resulta da política monetária do BCE, os acordos de comércio livre são essenciais para aumentar as exportações. Embora o CESE apoie a atual prioridade de negociar a Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento (TTIP), também recomenda a celebração de um acordo que facilite o acesso aos mercados às empresas europeias nas suas trocas comerciais com os mercados emergentes de elevado crescimento. Importa assegurar a proteção dos direitos humanos e das normas da OIT, bem como dos direitos dos consumidores e da regulamentação ambiental em vigor na UE.

4.2.    Mercados de serviços, produtos e trabalho

4.2.1.

O CESE observa que, embora os mercados de trabalho continuem a melhorar gradualmente tal como comunicado pela Comissão Europeia, não é mencionado o facto de que a taxa de emprego na área do euro de 68,9 % em 2015 se situa muito abaixo do grande objetivo de 75 % fixado na Estratégia Europa 2020. O CESE observa que, de acordo com os elementos de prova fornecidos pelos serviços da Comissão Europeia (base de dados LABREF), não parece haver qualquer relação positiva entre o número de reformas do mercado de trabalho implementadas em qualquer fase (antes ou depois da crise) e o desempenho do mercado de trabalho dos Estados-Membros (7).

4.2.2.

As reformas estruturais dos mercados de trabalho devem favorecer o investimento social, ou seja, medidas que apoiem a formação contínua dos trabalhadores com e sem emprego e que garantam que a sua segurança financeira — em especial dos desempregados — seja promovida. Além disso, o CESE apoia a redução da carga fiscal sobre o trabalho, desde que compensada por outras fontes de receitas públicas. A médio prazo, uma maior participação no mercado de trabalho também pode contribuir para este processo.

4.2.3.

Para resolver o problema europeu de competitividade e de sustentabilidade, o CESE recomenda a constituição de uma holding digital, seguindo o modelo do Grupo Airbus que tem alcançado muito êxito. Esta cooperação multinacional, que integra filiais de diferentes Estados-Membros, é decisiva para a economia e a indústria europeias.

4.2.4.

A dominância digital dos EUA já representa uma nova forma de dominância mundial. Verificam-se efeitos particularmente significativos no setor financeiro, onde os grandes bancos de investimento americanos já estabeleceram ligações de capital muito fortes com as inovadoras FinTechs [empresas que inovam na área dos serviços financeiros com processos baseados em novas tecnologias] que, por sua vez, ameaçam o modelo europeu dos bancos de retalho clássicos (Boring Banks) com os quais podem competir com êxito nas suas funções essenciais.

4.2.5.

O CESE propõe a criação, a curto prazo, de um grupo de projeto interdisciplinar com vista à conceção e ao desenvolvimento das características de um modelo comparável de uma holding digital europeia. Tal grupo deve incluir representantes da Comissão (Comissário Günther Oettinger) e do Parlamento Europeu (Comissão ITRE) e funcionar com a participação do CESE. No que diz respeito ao financiamento, é importante desde o início prestar atenção à compatibilidade com o Plano de Investimento Juncker. A estreita cooperação entre as unidades de competência da holding digital com as próprias PME permitirá dinamizar consideravelmente o crescimento e a criação de emprego.

4.3.    Políticas orçamentais

4.3.1.

O CESE acolhe com agrado a ênfase da Comissão Europeia na orientação orçamental para a área do euro no seu conjunto aquando da elaboração das diretrizes para as políticas orçamentais nacionais. No entanto, assinala, sem prejuízo da independência do BCE, a falta evidente de uma análise da evolução da situação da política monetária na área do euro quando da avaliação da pertinência de uma orientação neutra da política orçamental. Isto é no mínimo estranho, tendo em conta que os membros do Conselho do BCE se têm referido repetida e publicamente às políticas orçamentais da área do euro (8).

4.3.2.

Esta omissão é preocupante, na medida em que a área do euro se encontra atualmente numa situação em que a capacidade da política monetária para estimular a procura é extremamente limitada. A procura é reduzida há tanto tempo que a inflação (mesmo não tendo em conta os preços do petróleo) se situa muito abaixo do objetivo de 2 % do BCE, enquanto as principais taxas de juro diretoras do BCE são quase zero, não permitindo mais reduções substanciais. A economia da área do euro encontra-se na denominada «armadilha da liquidez», e está em risco de cair numa «armadilha de deflação», se a inflação não aumentar em breve. Se tal acontecesse, a economia da área do euro permaneceria em estagnação durante muitos anos, acabando por ameaçar a viabilidade política do euro.

4.3.3.

A política não convencional de flexibilização quantitativa adotada de forma determinada pelo BCE desde o início de 2015 não parece ter feito uma diferença considerável (9) no sentido de estimular a procura. Nestas circunstâncias, e tendo em conta a presença dos fenómenos de «histerese» acima mencionados (quando a recessão conduz à diminuição do potencial de crescimento), as políticas orçamentais da área do euro devem fazer mais do que é habitual para estimular a economia da área do euro no seu conjunto (10). Dadas as limitações de política orçamental nos Estados-Membros na parte sul da área do euro, as políticas orçamentais dos Estados-Membros com uma inflação abaixo da meta, custos de captação públicos baixos, rácios dívida pública/PIB comparativamente baixos e excedentes da balança de transações correntes devem ser expansionistas, a fim de empurrar a inflação acima do objetivo do BCE de 2 %, para que, em média, a inflação na área do euro possa acelerar novamente e aproximar-se do objetivo. Neste momento, os riscos decorrentes do sobreaquecimento das economias são muito menos elevados do que os riscos da continuação de uma baixa taxa de inflação ou da deflação.

4.3.4.

Todavia, tendo em conta as preocupações sobre a sustentabilidade da dívida pública, num contexto de evolução demográfica, as políticas orçamentais expansionistas, especialmente nos Estados-Membros com excedentes da balança de transações correntes significativos, podem e devem expandir-se através do aumento das despesas em investimento público. Um estímulo orçamental centrado no investimento público conduziria ao reforço da procura no curto prazo, mas também aumentaria o potencial de crescimento no longo prazo. Esse investimento público poderia incidir, não só, nas infraestruturas, mas também nas políticas de educação e de desenvolvimento de competências («investimento social»).

4.4.    Setor financeiro

4.4.1.

O CESE insta à criação de uma lei europeia em matéria de insolvência, a fim de permitir o alívio da dívida das famílias, por um lado, e de tornar mais fácil para as empresas em fase de arranque lidar com as situações de insolvência, por outro. Desta forma, as famílias terão maior poder de compra e incentivar-se-á as empresas em fase de arranque.

4.4.2.

Um problema grave ainda por resolver são os empréstimos de má qualidade creditícia nos bancos da área do euro, que se elevam a cerca de 900 mil milhões de euros. Só através da redução dos mesmos os bancos poderão alargar a concessão de empréstimos às empresas e às famílias, aumentando assim a eficácia da política monetária laxista do BCE para melhorar as perspetivas de crescimento e reforçar a confiança do mercado. As instituições políticas e reguladoras competentes da área do euro deveriam ser obrigadas a apresentar ideias adequadas sobre este tema.

4.4.3.

Um dos objetivos fundamentais resultantes da crise financeira foi o consenso para diminuir significativamente os riscos das obrigações soberanas nos balanços dos bancos europeus. A situação atual da maior parte dos bancos mostra que os riscos das obrigações soberanas aumentaram drasticamente. O CESE sublinha que a primeira prioridade deve ser reduzir os riscos das obrigações soberanas nos balanços, a fim de assegurar a futura estabilidade dos setores bancário e financeiro, também à luz da recente proposta EDIS (11).

4.4.4.

O CESE assinala que, para assegurar a concretização de eventuais efeitos positivos na procura, as famílias e as empresas não devem ficar condicionadas em termos de liquidez. O restabelecimento de fluxos positivos de crédito contribuiria para estimular a procura, mas também para aumentar a eficácia da política monetária do BCE no sentido de melhorar as perspetivas de crescimento e de reforçar a confiança do mercado. As instituições políticas e reguladoras competentes da área do euro deveriam ser obrigadas a apresentar ideias adequadas sobre este tema.

4.4.5.

Além disso, o CESE apela para que a agenda de reformas e as entidades reguladoras deem mais destaque ao reforço da transparência e à supervisão das instituições financeiras não bancárias ou «bancos sombra», a fim de assegurar de forma sustentável a estabilidade dos sistemas financeiros e de restabelecer a sua função na economia real, em particular no domínio da titularização (12). É necessário assegurar que os títulos não sejam utilizados como instrumentos de investimento de natureza especulativa por fundos especulativos e por instituições financeiras obrigadas a cumprir objetivos de maximização de rendimentos (fundos abutre).

4.4.6.

Uma vez que a crise financeira foi, em grande parte, causada pelas atividades especulativas dos bancos de investimento, as atividades bancárias especulativas permanecem uma ameaça latente à estabilidade do mercado financeiro. Ainda não foi analisado cuidadosamente o modo como atividades de negociação altamente especulativas, tais como a negociação de alta frequência, podem ter lugar quando o objetivo é ter mercados mais estáveis no mundo. Além do mais, é necessário separar rigorosamente as práticas de investimento de baixo risco e a atividade de concessão de empréstimos das atividades de alto risco da banca de investimento. Para este efeito já existe uma série de modelos, como o modelo Vickers e a regra Volcker. O CESE recomenda a criação na União Europeia de uma lei igual à Lei Glass-Steagall, tendo em conta que outros mercados financeiros (como os EUA e os países BRIC) estão a debater a hipótese de retomá-la para aumentar a estabilidade do setor bancário. Deste modo, evitar-se-iam riscos para os detentores de poupanças e os contribuintes.

Bruxelas, 17 de março de 2016.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Georges DASSIS


(1)  Ver os pareceres do CESE sobre os temas «Realizar a União Económica e Monetária — Propostas do Comité Económico e Social Europeu para a próxima legislatura europeia» (JO C 451 de 16.12.2014, p. 10) e «Completar a UEM: o pilar político» (JO C 332 de 8.10.2015, p. 8).

(2)  Idem.

(3)  Ver o parecer do CESE sobre o «Plano de Ação para a criação de uma União dos Mercados de Capitais (JO C 133 de 14.4.2016, p. 17).

(4)  Ver, por exemplo, as observações constantes dos pareceres anteriores do CESE sobre as «Estruturas de financiamento para as PME no contexto da situação financeira atual» (JO C 48 de 15.2.2011, p. 33) e sobre o «Plano de ação para melhorar o acesso das PME ao financiamento» (JO C 351 de 15.11.2012, p. 45) no tocante ao sistema financeiro islâmico.

(5)  Ver o parecer do CESE sobre a «Representação externa da área do euro» (ver página 16 do presente Jornal Oficial).

(6)  Observatório Francês das Conjunturas Económicas (OFCE), ECLM, Instituto de Política Macroeconómica (IMK), Câmara dos Trabalhadores de Viena (AK-Wien), INE-GSEE [Instituto do trabalho da confederação grega geral do trabalho] (2015), «The Independent Annual Growth Survey 2016» [Análise Independente Anual de Crescimento para 2016], Paris.

(7)  Instituto Sindical Europeu (ISE)/Confederação Europeia de Sindicatos (CES) (2015), «Benchmarking Working Europe 2015» [Análise comparativa do trabalho na Europa 2015], Bruxelas, Instituto Sindical Europeu, p. 26.

(8)  O exemplo mais evidente foi o discurso «Unemployment in the Euro area» [O desemprego na área do euro] do Presidente Mario Draghi, em Jackson Hole, em agosto de 2014 (https://www.ecb.europa.eu/press/key/date/2014/html/sp140822.en.html).

(9)  http://epthinktank.eu/2015/12/10/the-ecbs-quantitative-easing-early-results-and-possible-risks/

(10)  Theodoropoulou S. (2015), «How to avert the risk of deflation in Europe: rethinking the policy mix and European economic governance» [Como evitar o risco de deflação na Europa: repensar a combinação de políticas e a governação económica europeia], Instituto Sindical Europeu, Bruxelas.

(11)  Ver o parecer do CESE sobre o «Sistema Europeu de Seguro de Depósitos» (ver página 21 do presente Jornal Oficial).

(12)  Ver o parecer do CESE sobre o «Quadro jurídico para a titularização» (JO C 82 de 3.3.2016, p. 1).