23.12.2016   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 482/152


P7_TA(2014)0046

Medidas recentes para a criminalização das LGBTI

Resolução do Parlamento Europeu, de 16 de janeiro de 2014, sobre as recentes tentativas de criminalização das pessoas lésbicas, gay, bissexuais, transexuais e intersexuais (LGBTI) (2014/2517(RSP))

(2016/C 482/24)

O Parlamento Europeu,

Tendo em conta a Declaração Universal dos Direitos do Homem, o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres, a Carta Africana dos Direitos do Homem e dos Povos e a Constituição da Índia,

Tendo em conta a Resolução A/HRC/17/19 do Conselho dos Direitos do Homem das Nações Unidas, de 17 de junho de 2011, sobre direitos humanos, orientação sexual e identidade de género,

Tendo em conta a segunda revisão do Acordo de Parceria entre os Estados de África, das Caraíbas e do Pacífico, por um lado, e a Comunidade Europeia e os seus Estados-Membros, por outro (Acordo de Cotonu), e as cláusulas sobre direitos humanos contidas nesse acordo, em particular o artigo 8.o, n.o 4, e o artigo 9.o,

Tendo em conta o artigo 2.o, o artigo 3.o, n.o 5, e o artigo 21.o do Tratado da União Europeia e o artigo 10.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, que impõem à União Europeia e aos seus Estados-Membros o respeito e a promoção dos direitos humanos universais e a proteção dos indivíduos nas suas relações com o mundo,

Tendo em conta as diretrizes para a promoção e a proteção do exercício de todos os direitos humanos por parte de lésbicas, gays, bissexuais, transgéneros e intersexuais (LGBTI), adotadas pelo Conselho em 24 de junho de 2013,

Tendo em conta a declaração, de 20 de dezembro de 2013, da Vice-Presidente da Comissão/Alta Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança sobre a aprovação do projeto de lei contra a homossexualidade no Uganda,

Tendo em conta a declaração de Catherine Ashton, de 15 de janeiro de 2014, em que esta manifestou a sua preocupação com a promulgação, na Nigéria, do projeto de lei sobre a proibição do casamento entre pessoas do mesmo sexo,

Tendo em conta a sua resolução, de 5 de julho de 2012, sobre a violência contra as lésbicas e os direitos das pessoas lésbicas, gays, bissexuais, transexuais e intersexuais (LGBTI) em África (1), a sua posição, de 13 de junho de 2013, sobre o projeto de decisão do Conselho relativa à celebração do Acordo que altera pela segunda vez o Acordo de Parceria entre os Estados de África, das Caraíbas e do Pacífico, por um lado, e a Comunidade Europeia e os seus EstadosMembros, por outro, assinado em Cotonu em 23 de junho de 2000 e alterado pela primeira vez no Luxemburgo em 25 de junho de 2005 (2), e a sua resolução, de 11 de dezembro de 2013, sobre o Relatório Anual da UE sobre os Direitos Humanos e a Democracia no Mundo em 2012 e a política da União Europeia nesta matéria (3),

Tendo em conta as suas anteriores resoluções, de 17 de dezembro de 2009, sobre o Uganda: projeto de legislação contra a homossexualidade (4), de 16 de dezembro de 2010, sobre o Uganda: o chamado «projeto de lei Bahati» e a discriminação contra a população LGBT (5) e, de 17 de fevereiro de 2011, sobre o Uganda: o assassínio de David Kato (6),

Tendo em conta as suas anteriores resoluções, de 15 de março de 2012 (7) e de 4 de julho de 2013 (8), sobre a situação na Nigéria,

Tendo em conta a sua resolução, de 11 de maio de 2011, sobre o estado das negociações relativas à celebração do Acordo de Comércio Livre UE-Índia (9),

Tendo em conta o artigo 122.o, n.o 5, e o artigo 110.o, n.o 4, do seu Regimento,

A.

Considerando que todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos; que todos os Estados têm a obrigação de impedir a violência, o incitamento ao ódio e a estigmatização com base em características individuais, como a orientação sexual, a identidade de género e a expressão de género;

B.

Considerando que 78 países continuam a considerar crime atos sexuais consentidos entre adultos do mesmo sexo e que 7 preveem a pena de morte para esses «crimes» (Irão, Mauritânia, partes da Nigéria, Arábia Saudita, partes da Somália, Sudão e Iémen); que estas restrições jurídicas são obsoletas à luz da abordagem global de integração dos direitos das pessoas lésbicas, gay, bissexuais, transexuais e intersexuais (LGBTI) ao longo das últimas décadas e que as evoluções positivas em muitos países devem servir de exemplo para a melhoria global da situação das pessoas LGBTI;

C.

Considerando que os atos sexuais consentidos entre pessoas do mesmo sexo já eram punidos com 14 anos de prisão no Uganda e com 7 anos de prisão na Nigéria (ou com a pena de morte nos 12 Estados onde vigora a lei islâmica (Sharia)) e foram despenalizadas na Índia com uma sentença de 2009 do Tribunal Superior de Nova Deli;

D.

Considerando que, em 20 de dezembro de 2013, o Parlamento do Uganda aprovou o projeto de lei contra a homossexualidade, que pune o apoio aos direitos das pessoas LGBTI com uma pena de prisão até 7 anos, a não denúncia das pessoas LGBTI com uma pena de prisão até 3 anos e os «infratores reincidentes» ou seropositivos com uma pena de prisão perpétua, e que a secção 145 do Código Penal do Uganda já considera crime os atos sexuais consentidos entre pessoas do mesmo sexo;

E.

Considerando que, em 17 de dezembro de 2013, o Senado da Nigéria aprovou um projeto de lei sobre a proibição do casamento entre pessoas do mesmo sexo, que pune as pessoas que mantenham relações com pessoas do mesmo sexo com uma pena de prisão até 14 anos e as pessoas que tenham conhecimento de relações entre pessoas do mesmo sexo ou que dirijam bares, organizações ou reuniões de pessoas LGBTI com uma pena de prisão até 10 anos; que o Presidente Goodluck Jonathan promulgou o projeto de lei em janeiro de 2014;

F.

Considerando que, em 11 de dezembro de 2013, o Supremo Tribunal da Índia anulou uma sentença do Tribunal Superior de Nova Deli de 2009 que determinava que a secção 377 do Código Penal indiano, uma lei da época colonial que proibia a homossexualidade, violava o princípio da igualdade consagrado na Constituição da Índia, e que a homossexualidade voltou a ser considerada um crime que pode ser punido mesmo com a pena de prisão perpétua;

G.

Considerando que, em junho de 2013, a Duma russa aprovou uma lei que proíbe a chamada «propaganda homossexual», a qual limita consideravelmente a liberdade de expressão e de reunião das organizações LGBTI, e que o Presidente Vladimir Putin a promulgou;

H.

Considerando que há uma tendência crescente para os órgãos de comunicação social, o público e os líderes políticos e religiosos destes países tentarem intimidar as pessoas LGBTI, limitar os seus direitos e legitimar a violência contra as mesmas;

I.

Considerando que grande número de chefes de Estado e de Governo, dirigentes das Nações Unidas, representantes governamentais e parlamentares, a União Europeia (incluindo o Conselho, o Parlamento, a Comissão e a Alta Representante), e muitas outras figuras mundiais têm condenado severamente as leis que penalizam as pessoas LGBTI;

1.

Condena firmemente estas graves ameaças aos direitos universais à vida, à proibição da tortura e de tratamentos cruéis, desumanos e degradantes, à privacidade e à liberdade de expressão e de reunião, bem como todas as formas de discriminação e as restrições jurídicas de que são alvo as pessoas LGBTI e qualquer pessoa que defenda os seus direitos humanos; sublinha que a igualdade dos LGBTI faz inegavelmente parte dos direitos humanos fundamentais;

2.

Condena firmemente a aprovação de leis cada vez mais repressivas contra as pessoas LGBTI; reitera que a orientação sexual e a identidade de género são questões que se enquadram no direito à vida privada, garantido pela legislação internacional e pelas Constituições nacionais; convida os 78 países atrás referidos a porem termo à penalização de atos consensuais entre adultos do mesmo sexo;

3.

Insta o Presidente do Uganda a não assinar o projeto de lei contra a homossexualidade e a revogar a secção 145 do Código Penal do país; recorda ao Governo ugandês as suas obrigações por força do direito internacional e do Acordo de Cotonu, que preconiza o respeito pelos direitos humanos universais;

4.

Condena veementemente a aprovação e a promulgação, na Nigéria, do projeto de lei sobre a proibição do casamento entre pessoas do mesmo sexo; insta o Presidente da Nigéria a revogar esta lei, bem como as secções 214 e 217 do Código Penal do país;

5.

Salienta o facto de os atos consensuais entre adultos do mesmo sexo serem legais no Burquina Faso, no Benim, no Chade, na República Centro-Africana, na República do Congo, na República Democrática do Congo, na Guiné Equatorial, no Gabão, na Guiné-Bissau, na Costa do Marfim, em Madagáscar, no Mali, no Níger, no Ruanda e na África do Sul, e de a discriminação com base na orientação sexual ser proibida pela Constituição sul-africana, o que demonstra que em África esta questão é objeto de diferentes abordagens;

6.

Exorta a Comissão, o Serviço Europeu para a Ação Externa (SEAE) e os Estados-Membros a manifestarem a sua firme oposição a estas três leis e a tornarem claro que as mesmas terão importantes repercussões nas relações bilaterais entre estes países e a União Europeia e os seus Estados-Membros;

7.

Regozija-se com a iniciativa do Governo indiano de solicitar ao Supremo Tribunal de Justiça que reveja a sua sentença, por a mesma violar o princípio constitucional da igualdade; solicita ao Parlamento indiano que revogue a secção 377 do Código Penal indiano se o Supremo Tribunal de Justiça não alterar a sua sentença;

8.

Manifesta a sua profunda preocupação com as consequências negativas da lei que proíbe a propaganda de «relações sexuais não tradicionais» na Rússia, a qual aumenta o nível de discriminação e violência contra as pessoas LGBTI; insta as autoridades russas a revogarem esta lei e exorta à prossecução da vigilância internacional em relação a esta questão;

9.

Recorda que as leis que criminalizam atos consensuais entre adultos do mesmo sexo e a defesa dos direitos humanos das pessoas LGBTI constituem um obstáculo importante à luta contra o VIH/SIDA, aumentam sistematicamente a transmissão do VIH e de doenças sexualmente transmissíveis, uma vez que os grupos de risco receiam interagir com o pessoal médico, e contribuem para um clima de extrema homofobia e discriminação; observa que estas leis, entre outros aspetos, tornam ainda mais difícil a prevenção do VIH/SIDA em países com elevadas taxas de prevalência;

10.

Salienta que o reforço da criminalização de atos consensuais entre adultos do mesmo sexo tornará ainda mais difícil a realização dos Objetivos de Desenvolvimento do Milénio, especialmente no que diz respeito à igualdade entre homens e mulheres e à luta contra as doenças, e o êxito do quadro de desenvolvimento pós-2015;

11.

Exorta a Comissão, o SEAE e os Estados-Membros a fazerem uso de todos os canais existentes, incluindo fóruns bilaterais e multilaterais e as negociações em curso relativas a um acordo de comércio livre com a Índia, para expressarem de forma veemente a sua oposição à criminalização das pessoas LGBTI;

12.

Exorta a Comissão, o SEAE e os Estados-Membros a prestarem toda a assistência possível às ONG e aos defensores dos direitos humanos, utilizando as diretrizes do Conselho sobre as pessoas LGBTI, o Instrumento Europeu para a Democracia e os Direitos Humanos e outros programas;

13.

Solicita à Comissão e ao Conselho que incluam uma referência explícita à não discriminação em razão da orientação sexual na próxima revisão do Acordo de Cotonu, como solicitado por diversas vezes pelo Parlamento;

14.

Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução à Comissão, ao Conselho, ao Serviço Europeu para a Ação Externa, aos Estados-Membros, aos Governos e aos Parlamentos do Uganda, da Nigéria, da Índia e da Rússia, bem como aos Presidentes do Uganda, da Nigéria e da Rússia.


(1)  JO C 349 E de 29.11.2013, p. 88.

(2)  Textos aprovados, P7_TA(2013)0273.

(3)  Textos aprovados, P7_TA(2013)0575.

(4)  JO C 286 E de 22.10.2010, p. 25.

(5)  JO C 169 E de 15.6.2012, p. 134.

(6)  JO C 188 E de 28.6.2012, p. 62.

(7)  JO C 251 E de 31.8.2013, p. 97.

(8)  Textos aprovados, P7_TA(2013)0335.

(9)  JO C 377 E de 7.12.2012, p. 13.