23.12.2016   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 482/117


P7_TA(2014)0038

Cidadania europeia à venda

Resolução do Parlamento Europeu, de 16 de janeiro de 2014, sobre a cidadania europeia à venda (2013/2995(RSP))

(2016/C 482/16)

O Parlamento Europeu,

Tendo em conta os artigos 4.o, 5.o, 9.o e 10.o do Tratado da União Europeia,

Tendo em conta o artigo 20.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia,

Tendo em conta o artigo 110.o, n.os 2 e 4, do seu Regimento,

A.

Considerando que se espera que cada Estado-Membro aja de forma responsável, preservando os valores e as conquistas comuns da União, e que tais valores e conquistas são inestimáveis e não têm preço;

B.

Considerando que vários Estados-Membros introduziram sistemas que, direta ou indiretamente, conduzem à venda da cidadania europeia a cidadãos de países terceiros;

C.

Considerando que um número crescente de Estados-Membros emite autorizações de residência temporária ou permanente a cidadãos de países terceiros que investem nesses Estados-Membros;

D.

Considerando que nalguns Estados-Membros pode ser obtida a residência permanente com acesso a todo o espaço Schengen; considerando que em determinados Estados-Membros estão a ser tomadas medidas que poderão conduzir à venda efetiva da cidadania desses Estados-Membros;

E.

Considerando que, nalguns casos, estes programas de investimento têm eventuais efeitos colaterais negativos, como distorções nos mercados locais de habitação;

F.

Considerando que, em particular, o Governo de Malta tomou recentemente medidas para introduzir um sistema de venda definitiva da cidadania maltesa, que automaticamente implica a venda definitiva da cidadania europeia como um todo sem qualquer requisito de residência;

G.

Considerando que a venda definitiva da cidadania europeia desta forma mina a confiança mútua sobre a qual assenta a União;

H.

Considerando que, em particular, os cidadãos da UE têm o direito de circular e residir livremente na UE, de votar e ser eleitos nas eleições municipais e para o Parlamento Europeu onde quer que vivam na UE, nas mesmas condições que os respetivos nacionais, e de receber assistência da embaixada ou do consulado de outro país da UE fora da UE nas mesmas condições que um cidadão desse país, se o seu próprio país não se encontrar representado;

I.

Considerando que a UE assenta na confiança mútua entre os Estados-Membros, construída durante anos de trabalho e boa vontade graduais por parte dos Estados-Membros, bem como pela União como um todo;

J.

Considerando que têm sido expressas preocupações sobre o uso criminoso destes programas de investimento, incluindo questões como o branqueamento de capitais;

K.

Considerando que existem preocupações no que respeita a eventual discriminação visto que estas práticas dos Estados-Membros permitem apenas aos cidadãos mais ricos de países terceiros a obtenção de cidadania europeia, sem considerar quaisquer outros critérios;

L.

Considerando que não é claro que os cidadãos malteses beneficiem, com efeito, desta nova política, por exemplo através da cobrança de impostos, pois os investidores estrangeiros não terão a obrigação de pagar impostos; relembra que a cidadania não implica apenas direitos mas também responsabilidades;

M.

Considerando que a cidadania europeia é uma das maiores conquistas da UE e que, segundo os Tratados da UE, as questões de residência e cidadania são da competência exclusiva dos Estados-Membros;

1.

Manifesta a sua preocupação de que esta forma de obtenção de cidadania em Malta, bem como qualquer outro sistema nacional que possa implicar a venda definitiva direta ou indireta da cidadania europeia mine a própria ideia de cidadania europeia;

2.

Insta os Estados-Membros a reconhecerem e cumprirem as suas responsabilidades de salvaguarda dos valores e objetivos da União;

3.

Apela à Comissão como guardiã dos Tratados para que declare claramente se estes sistemas respeitam a letra e o espírito dos Tratados e o Código das Fronteiras Schengen, bem como as regras de não discriminação da UE;

4.

Reitera que o artigo 4.o, n.o 3, do Tratado da União Europeia consagra o princípio da «cooperação leal» entre a União e os Estados-Membros que devem respeitar-se e assistir-se mutuamente no cumprimento das missões decorrentes dos Tratados;

5.

Manifesta a sua preocupação perante as implicações de alguns sistemas de investidores e cidadania recentemente criados por diversos Estados-Membros da UE;

6.

Reconhece que questões de residência e cidadania são da competência dos Estados-Membros; convida, no entanto, os Estados-Membros a serem cautelosos no exercício das suas competências nesta matéria e a terem em conta eventuais efeitos colaterais;

7.

Considera que a cidadania europeia implica a detenção de um interesse na União e depende dos laços de uma pessoa com a Europa e os seus Estados-Membros ou dos laços pessoais com cidadãos da UE; relembra que a cidadania europeia não deve, em caso algum, transformar-se num bem comercial;

8.

Salienta o facto de os direitos concedidos através da cidadania europeia se basearem na dignidade humana e não deverem ser adquiridos ou vendidos a qualquer preço;

9.

Realça que o acesso a fundos não deve ser o critério principal na concessão de cidadania europeia a cidadãos de países terceiros; convida os Estados-Membros a terem em conta as preocupações relacionadas com fraudes como o branqueamento de capitais;

10.

Regista que a concorrência atual por condições de investimento ou recursos financeiros mais atraentes pode conduzir a uma redução dos padrões e requisitos para a obtenção de autorizações de residência no espaço Schengen e da cidadania europeia;

11.

Insta a Comissão a avaliar os diversos sistemas de cidadania à luz dos valores europeus e da letra e do espírito da legislação e práticas da UE, e a emitir recomendações a fim de evitar que esses sistemas minem os valores em que assenta a UE, bem como orientações para o acesso à cidadania europeia através de sistemas nacionais;

12.

Apela a Malta para que harmonize o seu sistema de cidadania atual com os valores da UE;

13.

Apela aos Estados-Membros que adotaram sistemas nacionais que permitem a venda direta ou indireta da cidadania europeia a cidadãos de países terceiros para que os harmonizem com os valores da UE;

14.

Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho, à Comissão e aos Governos e Parlamentos dos Estados-Membros.